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Document 61999CJ0462

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 22 de Maio de 2003.
Connect Austria Gesellschaft für Telekommunikation GmbH contra Telekom-Control-Kommission, e Mobilkom Austria AG.
Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgerichtshof - Áustria.
Telecomunicações - Serviços de telecomunicações móveis - Artigo 5.º-A, n.º 3, da Directiva 90/387/CEE - Recurso contra uma decisão da autoridade reguladora nacional interposto para um órgão independente - Artigos 82.º CE e 86.º, n.º 1, CE - Artigo 2.º, n.os 3 e 4, da Directiva 96/2/CE - Artigos 9.º, n.º 2, e 11.º, n.º 2, da Directiva 97/13/CE - Atribuição a uma empresa pública em posição dominante titular de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900 de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 sem imposição de uma taxa específica.
Processo C-462/99.

Colectânea de Jurisprudência 2003 I-05197

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2003:297

61999J0462

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 22 de Maio de 2003. - Connect Austria Gesellschaft für Telekommunikation GmbH contra Telekom-Control-Kommission, e Mobilkom Austria AG. - Pedido de decisão prejudicial: Verwaltungsgerichtshof - Áustria. - Telecomunicações - Serviços de telecomunicações móveis - Artigo 5.º-A, n.º 3, da Directiva 90/387/CEE - Recurso contra uma decisão da autoridade reguladora nacional interposto para um órgão independente - Artigos 82.º CE e 86.º, n.º 1, CE - Artigo 2.º, n.os 3 e 4, da Directiva 96/2/CE - Artigos 9.º, n.º 2, e 11.º, n.º 2, da Directiva 97/13/CE - Atribuição a uma empresa pública em posição dominante titular de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900 de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 sem imposição de uma taxa específica. - Processo C-462/99.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-05197


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Aproximação das legislações - Sector das telecomunicações - Oferta de uma rede aberta das telecomunicações - Directiva 90/387 - Disposição que obriga os Estados-Membros a instituir instâncias de recurso - Falta de transposição - Consequências - Obrigação, que incumbe aos órgãos jurisdicionais nacionais, de verificar a existência de uma possibilidade de recurso com base no direito nacional - Não aplicação da disposição nacional que exclui a competência de um órgão jurisdicional que de outra forma seria competente

(Artigo 10.° CE; Directiva 90/387 do Conselho, artigo 5.° -A, n.° 3)

2. Concorrência - Empresas públicas e empresas a que os Estados-Membros concedem direitos especiais ou exclusivos - Sector das telecomunicações - Regulamentação nacional que permite atribuir frequências suplementares numa banda de frequências a uma empresa pública em posição dominante, sem impor uma taxa distinta, não obstante o pagamento de uma taxa por um novo operador pela utilização da mesma banda de frequências - Medida que cria as condições de um abuso de posição dominante - Inadmissibilidade sob reserva de uma equivalência económica entre a taxa anteriormente imposta à empresa pública cobrindo igualmente as frequências suplementares e a paga pela sua concorrente para aceder ao mercado

(Artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE)

3. Concorrência - Empresas públicas e empresas a que os Estados-Membros concedem direitos especiais ou exclusivos - Sector das telecomunicações - Directiva 96/2 - Comunicações móveis e pessoais - Regulamentação nacional que permite atribuir frequências suplementares numa banda de frequências a uma empresa pública em posição dominante, sem impor uma taxa distinta, não obstante o pagamento de uma taxa por um novo operador pela utilização da mesma banda de frequências - Inadmissibilidade sob reserva de uma equivalência económica entre a taxa anteriormente imposta à empresa pública cobrindo igualmente as frequências suplementares e a paga pela sua concorrente para aceder ao mercado, ou de uma saturação das frequências inicialmente atribuídas - Regulamentação que permite esta atribuição decorrido um determinado período ou em caso de saturação das frequências inicialmente atribuídas ao operador - Admissibilidade

(Directiva 96/2 da Comissão, artigo 2.° , n.os 3 e 4)

4. Aproximação das legislações - Sector das telecomunicações - Quadro comum para autorizações gerais e licenças individuais - Directiva 97/13 - Processos de concessão - Proibição de discriminação

(Directiva 97/13 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2)

Sumário


1. As exigências de uma interpretação do direito nacional em conformidade com a Directiva 90/387, relativa à realização do mercado interno dos serviços de telecomunicações mediante a oferta de uma rede aberta de telecomunicações, e da protecção efectiva dos direitos dos interessados impõem aos órgãos jurisdicionais nacionais que verifiquem se as disposições pertinentes do seu direito nacional permitem reconhecer aos interessados um direito a recorrer das decisões da autoridade reguladora nacional encarregada de conceder as autorizações para a oferta de serviços de telecomunicações, que respeite os critérios do artigo 5.° -A, n.° 3, da referida directiva. Se não for possível uma aplicação do direito nacional em conformidade com as exigências desse artigo, um órgão jurisdicional nacional que cumpra as referidas exigências e que seria competente para conhecer dos recursos contra as decisões da autoridade reguladora nacional, se não se confrontasse com uma disposição do direito nacional que expressamente exclui a sua competência, tem a obrigação de não aplicar esta disposição.

Com efeito, quando uma disposição de uma directiva criando direitos para os particulares não tenha sido transposta para a ordem jurídica nacional, a obrigação, decorrente de uma directiva, de os Estados-Membros alcançarem o resultado por ela previsto, bem como o seu dever, por força do artigo 10.° CE, de tomarem todas as medidas gerais ou especiais adequadas a assegurar o cumprimento dessa obrigação impõem-se a todas as autoridades dos Estados-Membros, incluindo, no âmbito das suas competências, às autoridades jurisdicionais. Daqui resulta que, ao aplicar o direito nacional, quer se trate de disposições anteriores quer posteriores à directiva, o órgão jurisdicional nacional chamado a interpretá-lo é obrigado a fazê-lo, em toda a medida do possível, à luz do texto e da finalidade da directiva para atingir o resultado por ela prosseguido e desta forma cumprir o artigo 249.° , terceiro parágrafo, CE.

Se a aplicação do direito nacional com respeito pelas exigências da directiva não for possível, o órgão jurisdicional nacional tem a obrigação de aplicar integralmente o direito comunitário e de proteger os direitos que este confere aos particulares, não aplicando se necessário qualquer disposição, na medida em que a sua aplicação, nas circunstâncias do caso, levasse a um resultado contrário à dita directiva, ao passo que a sua não aplicação colocará o direito nacional em conformidade com ela.

( cf. n.os 38, 40, 42, disp. 1 )

2. Um Estado-Membro viola as proibições contidas no artigo 86.° , n.° 1, CE, conjugado com o artigo 82.° CE, quando adopta uma medida legislativa, regulamentar ou administrativa que cria uma situação na qual uma empresa pública ou uma empresa à qual concedeu direitos especiais ou exclusivos é levada a abusar da sua posição dominante. É um abuso deste tipo o facto de uma empresa em posição dominante adoptar um comportamento tendente, por uma concorrência falseada, ou seja, uma concorrência onde não se encontra assegurada a igualdade de oportunidades dos diferentes operadores económicos, a reforçar essa posição ou a alargá-la a um mercado vizinho mas distinto.

Daqui resulta que os artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE se opõem, em princípio, a uma regulamentação nacional que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares numa banda de frequências a uma empresa pública em posição dominante já titular de uma licença para a prestação dos mesmos serviços de telecomunicações numa outra banda, quando uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa pela aquisição da licença para a prestação de serviços na primeira banda de frequências. Estas disposições não se opõem, no entanto, a uma tal regulamentação nacional se a taxa imposta à empresa pública pela sua licença, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao novo concorrente.

( cf. n.os 80-83, 95, disp. 2 )

3. Resulta do artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2, que altera a Directiva 90/388 relativa à concorrência nos mercados de serviços de telecomunicações, no que respeita às comunicações móveis e pessoais, que os Estados-Membros só podem ampliar o âmbito de aplicação das licenças existentes para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais a combinações de sistemas de telecomunicações móveis digitais conformes à norma GSM 900 e à norma DCS 1800, quando tal extensão for justificada pela necessidade de garantir uma concorrência efectiva entre operadores de sistemas concorrentes nos mercados em causa.

Daqui resulta que estas disposições se opõem, em princípio, a uma regulamentação nacional que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 a uma empresa pública em posição dominante já titular de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900, quando uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa pela aquisição de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800. Estas disposições não se opõem, no entanto, a uma tal regulamentação se a taxa imposta à empresa pública pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao concorrente a quem foi concedida a licença DCS 1800. De igual modo, não se opõem a uma regulamentação que permite essa atribuição limitada de frequências suplementares após o esgotamento de um prazo de, pelo menos, três anos desde a concessão da licença DCS 1800 ou antes do esgotamento desse período, quando a capacidade de a empresa pública titular de uma licença GSM 900 aceitar novos clientes se esgotou apesar da utilização de todas as possibilidades técnicas economicamente admissíveis.

( cf. n.os 98, 105, 112, disp. 3-4 )

4. A proibição de discriminação entre operadores prevista nos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13, relativa a um quadro comum para autorizações gerais e licenças individuais no domínio dos serviços de telecomunicações, não se opõe a uma regulamentação nacional, que permite atribuir numa banda de frequências, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares aos operadores já titulares de uma licença numa outra banda de frequências, quando uma taxa foi imposta ao operador a quem foi concedida uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações na primeira banda de frequências, se a taxa imposta aos operadores já existentes pela sua licença, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao novo concorrente.

( cf. n.° 118, disp. 5 )

Partes


No processo C-462/99,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pelo Verwaltungsgerichtshof (Áustria), destinado a obter, no litígio pendente nesse órgão jurisdicional entre

Connect Austria Gesellschaft für Telekommunikation GmbH

e

Telekom-Control-Kommission,

sendo interveniente:

Mobilkom Austria AG,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387/CEE do Conselho, de 28 de Junho de 1990, relativa à realização do mercado interno dos serviços de telecomunicações mediante a oferta de uma rede aberta de telecomunicações (JO L 192, p. 1), com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 97/51/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997 (JO L 295, p. 23), do artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2/CE da Comissão, de 16 de Janeiro de 1996, que altera a Directiva 90/388/CEE no que respeita às comunicações móveis e pessoais (JO L 20, p. 59), dos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 10 de Abril de 1997, relativa a um quadro comum para autorizações gerais e licenças individuais no domínio dos serviços de telecomunicações (JO L 117, p. 15), e dos artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: D. A. O. Edward, exercendo funções de presidente da Quinta Secção, A. La Pergola (relator) e P. Jann, juízes,

advogado-geral: L. A. Geelhoed,

secretário: H. A. Rühl, administrador principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Connect Austria Gesellschaft für Telekommunikation GmbH, por P. Hoffmann, Rechtsanwalt,

- em representação da Telekom-Control-Kommission, por W. Schramm, seu presidente,

- em representação da Mobilkom Austria AG, por P. Lewisch, Rechtsanwalt,

- em representação do Governo austríaco, por H. Dossi, na qualidade de agente,

- em representação do Governo sueco, por A. Kruse, na qualidade de agente,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por B. Doherty e C. Schmidt, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Connect Austria Gesellschaft für Telekommunikation GmbH, representada por A. Foglar-Deinhardstein, Rechtsanwalt, e P. Hoffmann, da Telekom-Control-Kommission, representada por W. Schramm, da Mobilkom Austria AG, representada por P. Lewisch, do Governo austríaco, representado por T. Kramler, na qualidade de agente, e da Comissão, representada por C. Schmidt, na audiência de 11 de Outubro de 2001,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 13 de Dezembro de 2001,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 24 de Novembro de 1999, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 2 de Dezembro seguinte, o Verwaltungsgerichtshof submeteu, nos termos do artigo 234.° CE, duas questões prejudiciais relativas à interpretação do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387/CEE do Conselho, de 28 de Junho de 1990, relativa à realização do mercado interno dos serviços de telecomunicações mediante a oferta de uma rede aberta de telecomunicações (JO L 192, p. 1), com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 97/51/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997 (JO L 295, p. 23, a seguir «Directiva 90/387»), do artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2/CE da Comissão, de 16 de Janeiro de 1996, que altera a Directiva 90/388/CEE no que respeita às comunicações móveis e pessoais (JO L 20, p. 59), dos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 10 de Abril de 1997, relativa a um quadro comum para autorizações gerais e licenças individuais no domínio dos serviços de telecomunicações (JO L 117, p. 15), e dos artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE.

2 Estas questões foram suscitadas no quadro de um litígio que opõe a Connect Austria Gesellschaft für Telekommunikation GmbH (a seguir «Connect Austria») à Telekom-Control-Kommission (a seguir «TCK») a propósito da atribuição à Mobilkom Austria AG (a seguir «Mobilkom»), já titular de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900 (GSM - Global System for Mobile Communication) (a seguir «licença GSM 900»), de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 (DCS - Digital Cellular System) sem imposição de uma taxa específica.

Quadro jurídico

A regulamentação comunitária

3 A Directiva 96/2 tem por finalidade estabelecer a livre concorrência no mercado das comunicações móveis e pessoais.

4 Nos termos do oitavo considerando da Directiva 96/2:

«Alguns Estados-Membros têm actualmente concedido licenças para serviços digitais móveis com base rádio utilizando frequências da banda 1700-1900 Mhz, de acordo com a norma DCS 1800. A Comunicação da Comissão de 23 de Novembro de 1994 estabelecia que o DCS 1800 devia ser considerado parte da família de sistemas GSM. [...] Os Estados-Membros que não estabeleceram ainda um procedimento de concessão dessas licenças deverão fazê-lo num prazo razoável. Neste contexto, deve ter-se em devida consideração a necessidade de promover os investimentos por parte das novas empresas que começam a operar neste domínio. O n.° 4 do artigo 2.° estabelece que os Estados-Membros podem não conceder uma licença aos operadores existentes, por exemplo, os operadores de sistemas GSM já presentes no seu território, se se puder demonstrar que tal situação eliminará uma concorrência efectiva, nomeadamente, através da extensão de uma posição dominante. Quando, em especial, um Estado-Membro concede ou já concedeu licenças DCS 1800, a concessão de novas licenças ou de licenças suplementares para actuais operadores GSM ou DCS 1800 só pode realizar-se em condições que assegurem uma concorrência efectiva.»

5 O décimo quinto considerando da Directiva 96/2 indica:

«No contexto dos sistemas de comunicações móveis e pessoais, as radiofrequências revelam-se [...] [um recurso raro mas essencial]. O desenvolvimento de uma concorrência efectiva no sector das telecomunicações pode constituir uma justificação objectiva para recusar a atribuição de frequências a operadores já dominantes no mercado geográfico.

Os Estados-Membros devem assegurar que os processos de atribuição de radiofrequências se baseiem em critérios objectivos e não tenham efeitos discriminatórios. [...] As eventuais taxas para a utilização de frequências devem ser proporcionais e cobradas de acordo com o número de canais efectivamente concedidos.»

6 O artigo 2.° , n.° 1, da Directiva 96/2 dispõe que «[...] os Estados-Membros não recusarão a atribuição de licenças para os sistemas móveis que funcionem de acordo com a norma DCS 1800 o mais tardar após a adopção de uma decisão do Comité Europeu de Radiocomunicações relativa à atribuição de frequências DCS 1800 e, de qualquer modo, até 1 de Janeiro de 1998».

7 Segundo o artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2:

«3. Os Estados-Membros não restringirão a combinação de tecnologias ou sistemas móveis, nomeadamente quando se tratar de equipamento multinormas. Ao alargarem as actuais licenças a fim de cobrir essas combinações, os Estados-Membros assegurarão que essa extensão se justifica em conformidade com o disposto no n.° 4.

4. Os Estados-Membros adoptarão, se for caso disso, medidas para assegurar a execução do presente artigo tomando em consideração a exigência de garantir uma concorrência efectiva entre operadores que concorrem nos mercados relevantes.»

8 A Directiva 97/13 tem por objecto, segundo o seu artigo 1.° , n.° 1, os «processos relativos à concessão de autorizações e as condições associadas a essas autorizações, para efeitos de prestação de serviços de telecomunicações, incluindo as autorizações para o estabelecimento e/ou a exploração das redes de telecomunicações necessárias à prestação desses serviços».

9 O artigo 2.° , n.° 1, alínea b), da Directiva 97/13 define a autoridade reguladora nacional como «o organismo ou os organismos, juridicamente distintos e funcionalmente independentes dos organismos de telecomunicações, encarregados por um Estado-Membro de elaborar autorizações e de fiscalizar a aplicação das mesmas».

10 O artigo 9.° , n.° 2, primeiro travessão, da Directiva 97/13 determina:

«Caso um Estado-Membro tencione conceder licenças individuais, deve fazê-lo:

- através de procedimentos abertos, não discriminatórios e transparentes e, para esse efeito, deve submeter todos os requerentes ao mesmo procedimento, a menos que exista um motivo objectivo para diferenciação.»

11 Nos termos do artigo 11.° da Directiva 97/13:

«1. Os Estados-Membros devem zelar por que quaisquer taxas cobradas a empresas no quadro dos processos de autorização se destin[e]m apenas a cobrir os custos administrativos decorrentes da emissão, gestão, controlo e aplicação das licenças individuais. As taxas relativas a uma licença individual devem ser proporcionais ao trabalho envolvido e devem ser publicadas de modo adequado e suficientemente pormenorizado, por forma a facilitar o acesso a essas informações.

2. Não obstante o n.° 1, quando forem utilizados recursos escassos, os Estados-Membros poderão permitir que as suas autoridades reguladoras nacionais imponham encargos que reflictam a necessidade de assegurar a utilização óptima desses recursos. Esses encargos devem ser não discriminatórios e devem ter particularmente em conta a necessidade de fomentar o desenvolvimento de serviços inovadores e a concorrência.»

12 Nos termos do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387:

«Os Estados-Membros devem garantir a existência de mecanismos adequados ao nível nacional que confiram ao interessado afectado por uma decisão da autoridade reguladora nacional o direito de recorrer para um órgão independente das partes envolvidas.»

A regulamentação nacional

13 O artigo 130.° , n.° 1, alínea a), da Bundes-Verfassungsgesetz (lei constitucional federal, a seguir «B-VG») precisa que «[o] Verwaltungsgerichtshof pronuncia-se sobre os recursos em que são alegadas [...] a ilegalidade de uma decisão das autoridades administrativas, nestas se incluindo as câmaras administrativas independentes».

14 Nos termos do artigo 133.° da B-VG:

«Ficam excluídos da competência do Verwaltungsgerichtshof:

1. O processos que são da competência do Verfassungsgerichtshof;

2. Revogado;

3. Os processos relativos a patentes;

4. Os processos decididos em última instância por uma autoridade colegial quando, de acordo com as leis da Federação ou dos Länder reguladoras dessas autoridades, dos seus membros faça parte pelo menos um juiz, os demais membros também não estejam sujeitos a instruções no exercício das suas funções, as decisões dessa autoridade não possam ser anuladas ou modificadas por instâncias administrativas superiores e quando, apesar de todas estas condições estarem reunidas, a admissibilidade de um recurso para o Verwaltungsgerichtshof não esteja expressamente estipulada.»

15 Resulta da decisão de reenvio que, por força do § 49, n.° 12, da Telekommunikationsgesetz (lei das telecomunicações, BGBl. I, 1997/100, a seguir «TKG»), a repartição das frequências previstas para o estabelecimento dos serviços públicos de telecomunicações móveis se faz através de licenças cuja atribuição se rege pelo procedimento previsto nos §§ 22 e seguintes da mesma lei. O § 22, n.° 1, da TKG prevê que a licença de serviços de radiotelefonia móvel seja atribuída pela autoridade reguladora nacional ao candidato que, preenchendo as condições gerais, garanta a utilização mais eficaz das frequências, o que é comprovado pelo montante da taxa proposta por essa utilização. Segundo o § 22, n.° 2, da TKG, a atribuição efectua-se de acordo com os princípios de um procedimento aberto, equitativo e não discriminatório, assente num concurso público.

16 De acordo com o § 20, n.° 4, da TKG, a atribuição a um titular de novas frequências para o mesmo serviço é uma extensão da licença já existente que é realizada nas condições por esta indicadas. Não contendo a licença indicações a este respeito, o procedimento a seguir é o do § 22 da TKG.

17 O § 125, n.° 3, da TKG, disposição transitória que reproduz literalmente o § 20a, n.° 3b, inserido com efeitos a partir de 1 de Março de 1997 na Fernmeldegesetz 1993 (lei de 1993 sobre as comunicações à distância, na versão do BGBl. I, 1997/44), dispõe:

«Em caso de necessidade, as autoridades poderão atribuir aos actuais titulares de uma licença para a prestação do serviço reservado de telecomunicações por radiotelefonia móvel digital celular, frequências suplementares, até 5 MHz por cada um deles, retiradas da banda de frequências reservada à norma DCS 1800, desde que tenham decorrido pelo menos três anos a contar da data em que se tornou definitiva a decisão que atribuiu, em 1997, a licença DCS 1800 a um candidato. Antes desse momento, aos actuais titulares apenas poderão ser atribuídas frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 se for demonstrado que a sua capacidade de aceitarem novos clientes está esgotada apesar de terem utilizado todas as possibilidades técnicas economicamente admissíveis.»

O litígio no processo principal e as questões prejudiciais

18 Resulta da decisão de reenvio que, na Áustria, uma licença GSM 900, relativa a um feixe de frequências de 2 x 8 MHz, foi atribuída por decisão de 6 de Novembro de 1996, alterada por decisão de 23 de Julho de 1997, à Mobilkom, sociedade cujo capital é maioritariamente detido pelo Estado. A sociedade max.mobil Gesellschaft für Telekommunikation GmbH, anteriormente Ö CALL-MOBIL Telekommunikation Service GmbH (a seguir «max.mobil»), é titular de uma licença do mesmo tipo, atribuída por decisão de 25 de Janeiro de 1996, alterada por decisão de 23 de Julho de 1997. Esta última sociedade propôs pagar uma taxa no montante de 4 000 milhões de ATS. Uma taxa de igual montante foi imposta, em 2 de Julho de 1996, à Post & Telekom Austria AG, à qual a Mobilkom sucedeu no que se refere aos direitos em causa.

19 Em 19 de Agosto de 1997, na sequência de um concurso público, a primeira licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800 (a seguir «licença DCS 1800») foi atribuída à Connect Austria, mediante o pagamento de uma taxa de 2 300 milhões de ATS. À Connect Austria foi atribuído um feixe de frequências de 2 x 16,8 MHz, que devia elevar-se a 2 x 22,5 MHz quando o número de 300 000 clientes fosse atingido, tendo em perspectiva uma taxa de cobertura de 75%.

20 Por decisão de 10 de Agosto de 1998, baseada no § 125, n.° 3, da TKG (a seguir «decisão controvertida»), a TCK, actuando na qualidade de autoridade reguladora nacional, atribuiu à Mobilkom, a título de extensão da sua licença GSM 900 e para prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais com utilização exclusiva de estações de base situadas no Land de Viena, um feixe de frequências suplementar de 2 x 5 MHz retirado à banda de frequências reservada à norma DCS 1800.

21 A Connect Austria impugnou esta decisão da TCK no Verfassungsgerichtshof. Por acórdão de 24 de Fevereiro de 1999, este negou provimento ao recurso, declarando que a decisão controvertida não lesara a recorrente, quer no que se refere a um direito garantido pela lei constitucional quer por aplicação de uma regra geral ilegal.

22 Na fundamentação do seu acórdão, o Verfassungsgerichtshof considerou no entanto que o artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 é, no que respeita ao direito de recorrer de uma decisão de uma autoridade reguladora nacional, suficientemente preciso, na acepção da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 19 de Novembro de 1991, Francovich e o., C-6/90 e C-9/90, Colect., p. I-5357), para ter efeito directo, na medida em que tem de existir uma via de recurso efectiva para um órgão independente. O Verfassungsgerichtshof declarou seguidamente que, tendo a conta a limitação das suas possibilidades de controlo, o recurso para ele interposto não respeitava as exigências dessa disposição, mas que, em contrapartida, o controlo da legalidade no quadro da acção administrativa, que é da competência do Verwaltungsgerichtshof, estava apto a responder às exigências do direito comunitário. Deste modo, no interior do âmbito de aplicação da Directiva 90/387, a primazia do direito comunitário devia, segundo ele, levar ao afastamento do artigo 133.° , ponto 4, da B-VG que se opõe à competência do Verwaltungsgerichtshof para conhecer dos recursos interpostos das decisões da TCK.

23 Por decisão de 3 de Março de 1999, o Verfassungsgerichtshof remeteu ao Verwaltungsgerichtshof o recurso interposto pela Connect Austria contra a decisão controvertida.

24 O Verwaltungsgerichtshof faz notar que a TCK é designada pela TKG como a autoridade reguladora nacional no que respeita, nomeadamente, à atribuição, suspensão e revogação de licenças, bem como à aprovação das transferências ou das modificações de licenças. Precisa que a TCK é um órgão colegial independente, composto por três membros, dos quais um magistrado, nomeados pelo governo federal, e que decide em primeira e última instância.

25 Segundo o Verwaltungsgerichtshof, resulta do artigo 144.° , n.° 1, da B-VG que as decisões da TCK podem ser impugnadas no Verfassungsgerichtshof na medida em que o recorrente alegue ter sido lesado pela violação de um direito que lhe seja garantido por uma lei constitucional ou pela aplicação de um regulamento não conforme à lei, de uma lei inconstitucional ou de um tratado internacional não conforme ao direito.

26 Resulta ainda da decisão de reenvio que, por força do artigo 133.° , n.° 4, da B-VG, os recursos baseados na ilegalidade das decisões da TCK interpostos para o Verwaltungsgerichtshof não são admissíveis, uma vez que a sua admissibilidade não está expressamente prevista nessa disposição.

27 Neste contexto, o Verwaltungsgerichtshof coloca a questão de saber se, tendo em conta o acórdão de 17 de Setembro de 1997, Dorsch Consult (C-54/96, Colect., p. I-4961, n.os 40 e seguintes), o artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 tem efeito directo, em consequência do que ele deveria não aplicar o artigo 133.° , n.° 4, da B-VG e declarar-se competente para conhecer do recurso interposto pela Connect Austria contra a decisão controvertida.

28 No caso de esta primeira questão ter resposta afirmativa, o Verwaltungsgerichtshof faz notar que o § 125, n.° 3, da TKG permite, sem imposição de uma taxa suplementar, a atribuição de frequências na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 a uma empresa pública em posição dominante no mercado dos serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900. Por um lado, uma tal regulamentação poderia, reforçando ainda a posição já dominante da empresa pública, levar a uma distorção de concorrência contrária às disposições conjugadas dos artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE, e do artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2, à custa do titular da licença DCS 1800. Por outro lado, tendo em conta a obrigação sobre este incidente de pagar uma taxa pela utilização de frequências segundo a norma DCS 1800, a referida regulamentação poderia infringir a proibição de discriminação prevista nos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13.

29 Nestas condições, o Verwaltungsgerichtshof decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1) O n.° 3 do artigo 5.° -A da Directiva 90/387/CEE do Conselho, na redacção dada pela Directiva 97/51/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, deve ser interpretado no sentido de que, com primado sobre disposição de direito interno atributiva de competência judicial contrária, produz efeito directo, atribuindo competência a um determinado órgão independente já existente a nível nacional para, através de mecanismo adequado, conhecer de recurso interposto pelo interessado de decisão da autoridade reguladora nacional?

2) No caso de resposta afirmativa à primeira questão:

Os artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE, o artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2/CE da Comissão, bem como os artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, ou outras disposições do direito comunitário, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma disposição de direito nacional que prevê que aos titulares de uma licença de exploração de serviços reservados de telecomunicações através de sistemas digitais móveis com base rádio podem ser atribuídas frequências adicionais na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 antes de terminados três anos a contar da entrada em vigor da decisão de 1997 que concedeu a um candidato uma licença segundo a norma DCS 1800, no caso de se demonstrar que a sua capacidade de servir utilizadores, após terem sido empregues todos os meios técnicos economicamente viáveis, está esgotada, podendo, nesse caso, fazer-se a atribuição de frequências independentemente de uma contrapartida financeira específica, mesmo a uma empresa pública com posição dominante no mercado da banda de 900 MHz?»

Quanto à primeira questão prejudicial

Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça

30 Segundo a Connect Austria, é evidente que, de acordo com o princípio da primazia do direito comunitário sobre o direito nacional, a disposição do artigo 133.° , n.° 4, da B-VG, que exclui a competência do Verwaltungsgerichtshof, não deve ser aplicada. Em consequência, este deve ser considerado competente para conhecer dos recursos interpostos contra as decisões da TCK, na condição de uma tal via de recurso satisfazer a exigência de um mecanismo adequado na acepção do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387.

31 Baseando-se nos n.os 25 e seguintes do acórdão Francovich e o., já referido, o Governo austríaco sustenta que o artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 não tem efeito directo. Na verdade, esta disposição não é incondicional na medida em que atribui aos Estados-Membros a missão de assegurar, ao nível nacional, a existência de mecanismos adequados e deixando-lhes, por este facto, uma margem de apreciação para a realização concreta de um tal mecanismo, nomeadamente no que respeita à designação do «órgão independente».

32 De qualquer modo, segundo o Governo austríaco, a possibilidade de interpor recurso para o Verfassungsgerichtshof contra as decisões da TCK, nos termos do artigo 144.° da B-VG, dá simultânea satisfação aos princípios da equivalência e da efectividade da protecção jurídica (v. acórdãos de 14 de Dezembro de 1995, Peterbroeck, C-312/93, Colect., p. I-4599, n.° 12; Dorsch Consult, já referido, n.° 40, e de 21 de Janeiro de 1999, Upjohn, C-120/97, Colect., p. I-223, n.° 32) e às exigências do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387.

33 Segundo o Governo sueco, o artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 não indica qual o órgão competente para conhecer dos recursos, pressupondo que os Estados-Membros tomem medidas suplementares para determinar o órgão competente e as regras processuais aplicáveis. Essa disposição não tem, portanto, efeito directo. Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão Dorsch Consult, já referido) que não lhe compete intervir na resolução das questões de competência que a aplicação de direitos individuais resultantes da ordem jurídica comunitária pode colocar à organização judiciária nacional.

34 A Comissão alega que o artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 tem um teor idêntico ao do artigo 1.° , n.° 1, da Directiva 89/665/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas relativas à aplicação dos processos de recurso em matéria de adjudicação dos contratos de direito público de obras [e] de fornecimentos (JO L 395, p. 33), na versão que resulta da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1). Com efeito, ambas estas disposições impõem aos Estados-Membros a instituição de órgãos independentes das autoridades investidas do poder de decisão, aos quais podem recorrer as partes interessadas com o fim de obterem o controlo das decisões tomadas por estas autoridades. Deste modo, a Comissão propõe ao Tribunal de Justiça que, para responder à primeira questão prejudicial, se baseie na jurisprudência relativa aos processos de recurso em matéria de celebração de contratos públicos (v. acórdãos Dorsch Consult, já referido; de 24 de Setembro de 1998, Tögel, C-76/97, Colect., p. I-5357, e EvoBus Austria, C-111/97, Colect., p. I-5411).

Apreciação do Tribunal de Justiça

35 Importa recordar, por um lado, que, segundo jurisprudência constante, compete à ordem jurídica de cada Estado-Membro designar o órgão jurisdicional competente para decidir os litígios que põem em causa direitos individuais resultantes da ordem jurídica comunitária, entendendo-se, no entanto, que os Estados-Membros são responsáveis por assegurar, em todas as circunstâncias, a protecção efectiva desses direitos. Com esta reserva, não compete ao Tribunal de Justiça intervir na solução dos problemas de competência que possa suscitar, no plano da organização judiciária nacional, a qualificação de certas situações jurídicas assentes no direito comunitário (v., designadamente, acórdãos de 9 de Julho de 1985, Bozzetti, 179/84, Recueil, p. 2301, n.° 17, e de 4 de Março de 1999, HI, C-258/97, Colect., p. I-1405, n.° 22).

36 Há que, por outro lado, realçar que o artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387, embora obrigue os Estados-Membros a garantir a existência de mecanismos adequados ao nível nacional que confiram ao interessado afectado por uma decisão da autoridade reguladora nacional o direito de recorrer para um órgão independente, não indica qual é o órgão independente de cada Estado-Membro competente para conhecer de tais recursos.

37 É forçoso constatar que, na data em que o Verfassungsgerichtshof remeteu o recurso da Connect Austria ao Verwaltungsgerichtshof, ou seja, em 3 de Março de 1999, o artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 não tinha sido transposto para o direito austríaco. Com efeito, como o Verfassungsgerichtshof correctamente declarou e contrariamente ao que sustenta o Governo austríaco, um direito a recorrer como o que existe quanto ao recurso para o Verfassungsgerichtshof, limitado aos casos em que o recorrente sustenta ter sido lesado pela violação de um direito que lhe é garantido por uma lei constitucional ou pela aplicação de um regulamento não conforme à lei, de uma lei inconstitucional ou de um tratado internacional não conforme ao direito, não pode constituir um mecanismo adequado na acepção do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 e, portanto, não cumpre as exigências desse artigo.

38 Em tais circunstâncias, há que recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a obrigação, decorrente de uma directiva, de os Estados-Membros alcançarem o resultado por ela previsto bem como o seu dever, por força do artigo 10.° CE, de tomarem todas as medidas gerais ou especiais adequadas a assegurar o cumprimento dessa obrigação se impõem a todas as autoridades dos Estados-Membros, incluindo, no âmbito das suas competências, às autoridades jurisdicionais. Daqui resulta que, ao aplicar o direito nacional, quer se trate de disposições anteriores quer posteriores à directiva, o órgão jurisdicional nacional chamado a interpretá-lo é obrigado a fazê-lo, em toda a medida do possível, à luz do texto e da finalidade da directiva para atingir o resultado por ela prosseguido e desta forma cumprir o artigo 249.° , terceiro parágrafo, CE (v. acórdãos de 14 de Julho de 1994, Faccini Dori, C-91/92, Colect., p. I-3325, n.° 26; EvoBus Austria, já referido, n.° 18; HI, já referido, n.° 25, e de 26 de Setembro de 2000, Engelbrecht, C-262/97, Colect., p. I-7321, n.os 38 e 39).

39 Esta exigência obriga o órgão jurisdicional nacional a verificar a existência, no direito nacional, de mecanismos adequados que permitam reconhecer aos interessados um direito de recurso contra as decisões da autoridade reguladora nacional. Em circunstâncias como as do processo principal, o órgão jurisdicional nacional está em especial obrigado a verificar se esse direito de recurso pode ser exercido no órgão jurisdicional em princípio competente para controlar a legalidade dos actos da administração pública (v., neste sentido, acórdão EvoBus Austria, já referido, n.° 19).

40 Se a aplicação do direito nacional com respeito pelas exigências do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 não for possível, o órgão jurisdicional nacional tem a obrigação de aplicar integralmente o direito comunitário e de proteger os direitos que este confere aos particulares, não aplicando se necessário qualquer disposição, na medida em que a sua aplicação, nas circunstâncias do caso, levasse a um resultado contrário à dita directiva, ao passo que a sua não aplicação colocará o direito nacional em conformidade com ela (v., neste sentido, acórdão Engelbrecht, já referido, n.° 40).

41 Daqui resulta que um órgão jurisdicional nacional que cumpra as exigências do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387 e que seria competente para conhecer dos recursos interpostos contra as decisões da autoridade reguladora nacional se não se confrontasse com uma disposição do direito nacional que, como o artigo 133.° , n.° 4, da B-VG, exclui expressamente a sua competência, tem a obrigação de não aplicar esta disposição.

42 Deve, assim, responder-se à primeira questão prejudicial que as exigências de uma interpretação do direito nacional em conformidade com a Directiva 90/387 e da protecção efectiva dos direitos dos interessados impõem aos órgãos jurisdicionais nacionais que verifiquem se as disposições pertinentes do seu direito nacional permitem reconhecer aos interessados um direito a recorrer das decisões da autoridade reguladora nacional que respeite os critérios do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387. Se não for possível uma aplicação do direito nacional em conformidade com as exigências do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387, um órgão jurisdicional nacional que cumpra as referidas exigências e que seria competente para conhecer dos recursos interpostos contra as decisões da autoridade reguladora nacional se não se confrontasse com uma disposição do direito nacional, como a que está em causa no processo principal, que expressamente exclui a sua competência, tem a obrigação de não aplicar esta disposição.

Quanto à segunda questão prejudicial

Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça

43 A Connect Austria alega que a Mobilkom é uma empresa pública, na acepção do artigo 86.° , n.° 1, CE, que goza, além disso, de direitos exclusivos na acepção desta mesma disposição, na medida em que é a única empresa habilitada a explorar uma rede de telecomunicações móveis analógicas, a «rede D». Por esta licença, que se manterá em vigor até 31 de Dezembro de 2007 e permite a utilização de um feixe de frequências de 2 x 11 MHz, a Mobilkom não pagou uma taxa específica, o que ela justifica invocando uma alegada obrigação de exploração.

44 Em razão da sua parte de mercado preponderante, de cerca de 70%, a Mobilkom ocupa uma posição dominante no mercado austríaco dos GSM, de modo que o artigo 82.° CE lhe é aplicável.

45 A Connect Austria sustenta que, nestas condições, a atribuição a título gratuito de frequências DCS 1800 à Mobilkom, que lhe permite manter e reforçar a sua posição dominante, é contrária às disposições conjugadas dos artigos 82.° CE e 86.° CE. Com efeito, por esta atribuição, a Mobilkom é o único operador que pode oferecer a gama completa dos serviços de telecomunicações móveis tecnicamente disponíveis (analógicas e também digitais baseadas, respectivamente, na norma GSM 900 e norma DCS 1800). As consideráveis vantagens concorrenciais de que a Mobilkom já beneficia em razão da situação de monopólio de que beneficiou durante longos anos, bem como da posição dominante no mercado que ela ocupa também desde há numerosos anos e de que continua a beneficiar actualmente, foram reforçadas de modo muito importante. Este efeito só poderia ser compensado pela obrigação de pagar uma compensação pela obtenção de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800.

46 Resulta claramente das Decisões 95/489/CE da Comissão, de 4 de Outubro de 1995, relativa às condições impostas ao segundo operador da radiotelefonia GSM em Itália (JO L 280, p. 49), e 97/181/CE da Comissão, de 18 de Dezembro de 1996, relativa às condições impostas ao segundo operador de serviços de radiotelefonia GSM em Espanha (JO 1997, L 76, p. 19), que o facto de impor unilateralmente uma taxa ao recém-chegado aos mercados GSM em Itália e em Espanha permitia às antigas sociedades públicas de telefonia, que gozavam de um monopólio, reforçar a sua posição dominante nesses mercados, em violação dos artigos 82.° , segundo parágrafo, alínea b), CE e 86.° CE. Segundo a Connect Austria, este raciocínio é também aplicável no processo principal.

47 Segundo ela, o tratamento de favor da Mobilkom resulta de um acto legislativo, a saber, o § 125, n.° 3, da TKG, tal como interpretado pela TCK.

48 No que se refere ao artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2, estas disposições, lidas à luz do oitavo considerando da mesma directiva, prevêem expressamente a possibilidade de excluir um operador já titular de uma licença GSM 900 da atribuição das licenças DCS 1800, nomeadamente no caso de reforço de uma posição dominante. No processo principal, a manutenção de uma concorrência efectiva na acepção da Directiva 96/2 só pode ser garantida, segundo a Connect Austria, por meio de uma exclusão da Mobilkom da tecnologia DCS 1800 ou, pelo menos, pelo pagamento de uma taxa pela utilização de frequências DCS 1800. A este respeito, a Connect Austria faz referência a custos de investimento de vários milhares de milhões de ATS, aos quais ela própria teve de fazer face desde meados do ano de 1997.

49 Quanto à Directiva 97/13, a Connect Austria sustenta que uma interpretação do § 125, n.° 3, da TKG que dispensasse a Mobilkom e a max.mobil da obrigação de pagamento de uma taxa pela utilização de frequências suplementares, quando todos os outros candidatos são obrigados a passar pelo procedimento previsto nos §§ 22 e seguintes da TKG, implicaria uma desigualdade de tratamento dos candidatos, na acepção do artigo 9.° , n.° 2, desta directiva.

50 A TCK sustenta que resulta dos fundamentos do projecto de lei relativo ao § 20a, n.° 3b, da Fernmeldegesetz 1993 que a disposição do § 125, n.° 3, da TKG tem por finalidade contribuir para a garantia de uma concorrência efectiva no mercado dos serviços de telecomunicações móveis, em consideração, nomeadamente, dos artigos 82.° CE e 86.° CE, bem como das Directivas 90/388/CEE da Comissão, de 28 de Junho de 1990, relativa à concorrência nos mercados de serviços de telecomunicações (JO L 192, p. 10), e 96/2.

51 A necessidade de uma disposição transitória como a do § 125, n.° 3, da TKG, que prevê medidas especiais para os operadores já titulares de uma licença GSM 900 no que respeita à atribuição de frequências, resulta da modificação do processo de adjudicação para a concessão das licenças. Com efeito, a Mobilkom e a max.mobil obtiveram cada uma a sua licença numa época em que, em regra, a atribuição de frequências suplementares não necessitava de um concurso nem do pagamento de uma taxa pela utilização dessas frequências.

52 Esta disposição transitória garante simultaneamente ao vencedor do concurso para a atribuição da licença DCS 1800, que foi emitida em 1997, uma segurança de previsão e um período durante o qual ele está protegido da concorrência, considerados necessários pelo legislador austríaco para que os operadores já titulares de uma licença GSM 900 não pudessem «minar» a entrada no mercado do novo operador graças às suas vantagens de partida resultantes de uma rede já desenvolvida e, por este facto, falsear a concorrência efectiva oferecendo, também eles, serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800.

53 Os operadores já titulares de uma licença GSM 900 deviam, no entanto, poder oferecer tais serviços quando fosse atingido o limite de capacidade da rede GSM 900 posta à sua disposição, a fim de que a possibilidade de adquirirem um maior número de assinantes não se confrontasse com limitações técnicas e económicas inultrapassáveis.

54 Com efeito, o § 125, n.° 3, da TKG não tem por finalidade, segundo a TCK, travar a expansão da actividade comercial, mas sim garantir uma utilização eficaz das frequências.

55 No que respeita à aplicação das disposições conjugadas dos artigos 82.° CE e 86.° CE, a TCK alega que as frequências da banda de frequências reservada à norma DCS 1800 não permitem oferecer serviços que não pudessem ser também oferecidos graças às frequências da banda reservada à norma GSM 900, dado que estas duas bandas são exploradas pelos mesmos sistemas técnicos. Deste modo, a concessão de frequências suplementares à Mobilkom não constitui uma vantagem concorrencial para ela.

56 Em contrapartida, nas circunstâncias do processo principal, a recusa de conceder frequências suplementares à Mobilkom teria ocasionado uma restrição da concorrência no mercado dos serviços de telecomunicações móveis, dado que, nesta hipótese, só duas empresas, a max.mobil e a Connect Austria, teriam efectivamente podido tomar parte na concorrência, enquanto a Mobilkom deixaria, por razões técnicas, de estar em condições de fornecer uma qualidade de serviços equivalente.

57 Além disso, a TCK considera que a concessão de frequências suplementares, de acordo com o § 125, n.° 3, da TKG, sem imposição de uma taxa específica não suscita qualquer objecção do ponto de vista do direito da concorrência. Com efeito, haverá que considerar, de modo global, as taxas pagas pela concessão de uma licença ou pela utilização de frequências, bem como a importância da dotação de frequências e o momento da entrada no mercado.

58 Ora, a Mobilkom e a max.mobil pagaram, cada uma, uma taxa de 4 000 milhões de ATS pela dotação de frequências de 2 x 8 MHz na banda de frequências reservada à norma GSM 900. A Connect Austria, por seu lado, pagou uma taxa de 2 300 milhões de ATS pela dotação de frequências de 2 x 16,8 MHz, susceptíveis de serem posteriormente elevadas a 2 x 22,5 MHz sem pagamento de uma taxa suplementar. A TCK deferiu, aliás, em 3 de Abril de 2000, um pedido neste sentido. A Connect Austria pagou portanto uma taxa de um montante muito inferior ao da taxa paga pelos seus concorrentes e obteve, por esse preço, uma muito melhor dotação de frequências.

59 No que se refere ao artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2, a TCK alega que resulta das suas precedentes observações que, aquando da adopção da decisão controvertida, ela teve em conta as exigências do direito da concorrência.

60 Quanto às disposições dos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13, a TCK sustenta que, por deixarem aos Estados-Membros uma ampla margem de apreciação, na medida em que lhes deixam a opção de imporem ou não as taxas, elas não têm efeito directo.

61 No que respeita às disposições conjugadas dos artigos 82.° CE e 86.° CE, a Mobilkom alega, por um lado, que apenas é um operador entre outros no sector dos serviços de telecomunicações móveis, uma vez que não é titular de um direito exclusivo nem de um direito especial. Por outro lado, a atribuição que lhe foi feita de frequências suplementares não pode constituir uma extensão de uma posição dominante a um mercado vizinho, uma vez que os dois sistemas de telecomunicações móveis digitais, respectivamente conformes à norma GSM 900 e à norma DCS 1800, se incluem no mesmo mercado de produtos e são intermutáveis do ponto de vista da capacidade técnica e das características do produto.

62 No que se refere à Directiva 96/2, a Mobilkom sustenta que a atribuição a operadores titulares de uma licença GSM 900 de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 em caso de esgotamento das capacidades dos referidos operadores, para lhes permitir continuar a ser concorrenciais, não prejudica a concorrência, antes a favorecendo. Em contrapartida, haveria violação da concorrência se à Connect Austria fosse pura e simplesmente concedido o monopólio dos serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800.

63 Quanto à Directiva 97/13, a Mobilkom observa que ela parte do princípio de que as atribuições de frequências têm lugar sem pagamento de taxas e que só em determinados casos particulares permite impor as taxas. O artigo 11.° da Directiva 97/13 submete os Estados-Membros a restrições no que respeita à imposição de taxas, mas de modo algum os obriga a exigir tais taxas. O artigo 9.° da mesma directiva não permite chegar a uma conclusão diferente, uma vez que esta disposição regula o procedimento de concessão de licenças individuais e não a atribuição de frequências suplementares.

64 A Mobilkom realça por fim que, relativamente a ela própria e à max.mobil, à Connect Austria foi atribuído um feixe de frequências bem mais importante e a um preço bem mais vantajoso. A atribuição a título gratuito de frequências suplementares à Mobilkom e à max.mobil foi, pois, absolutamente indispensável para compensar, pelo menos em parte, essa vantagem.

65 O Governo austríaco realça que o § 125, n.° 3, da TKG foi adoptado para dar ao titular da primeira licença DCS 1800 atribuída na Áustria, que é simultaneamente o terceiro titular de uma licença no sector dos serviços de telecomunicações móveis, a possibilidade de recuperar as vantagens concorrenciais dos seus dois concorrentes que entraram no mercado antes dele.

66 Além disso, segundo o Governo austríaco, a taxa inicialmente paga pelos dois primeiros titulares de uma licença no sector dos serviços de telecomunicações móveis foi determinada tendo em conta uma eventual atribuição posterior, a título gratuito, de frequências suplementares com base no § 125, n.° 3, da TKG, no caso de estes dois titulares terem necessidade delas. Tendo em conta a situação jurídica da época, podiam legitimamente contar com isso.

67 No que respeita às disposições conjugadas dos artigos 82.° CE e 86.° CE, o Governo austríaco alega que a atribuição de frequências suplementares por força do § 125, n.° 3, da TKG é decidida com base em critérios objectivos, que são função do sucesso comercial do operador móvel e da procura de serviços de telecomunicações móveis. Nestas condições, a possibilidade de atribuir frequências suplementares a uma empresa pública não pode constituir, só por si, uma violação das disposições conjugadas dos artigos 86.° CE e 82.° CE (v. acórdão de 13 de Fevereiro de 1979, Hoffmann-La Roche/Comissão, 85/76, Colect. 1979/I, p. 217, n.° 91).

68 No que se refere ao artigos 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2, o Governo austríaco alega que o conceito de «concorrência efectiva» aí utilizado deve ser interpretado à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao artigo 82.° CE e, a este respeito, refere-se nomeadamente ao n.° 38 do acórdão Hoffmann-La Roche/Comissão, já referido. Ora, tendo em conta os números de que dispõe, o Governo austríaco considera que nenhuma das empresas presentes no mercado dos serviços de telecomunicações móveis na Áustria dispõe de uma autonomia apreciável relativamente aos seus concorrentes, de modo que a existência de uma concorrência efectiva que responda às exigências do direito comunitário está, segundo ele, garantida.

69 Além disso, o § 125, n.° 3, da TKG destina-se a proteger os investimentos de novos chegados ao mercado, como é exigido pelo oitavo considerando da Directiva 96/2.

70 Por último, quanto aos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13, o Governo austríaco faz notar que a Connect Austria pagou 2 300 milhões de ATS por um feixe de frequências de 2 x 22,5 MHz, enquanto a Mobilkom pagou 4 000 milhões de ATS por um feixe de frequências de 2 x 8 MHz.

Apreciação do Tribunal de Justiça

71 A título liminar, no que respeita à interpretação do § 125, n.° 3, da TKG, importa recordar que não incumbe ao Tribunal de Justiça pronunciar-se sobre a interpretação de disposições nacionais, mas que lhe cabe ter em conta, no quadro da repartição das competências entre os tribunais comunitários e nacionais, o contexto factual e regulamentar no qual se insere a questão prejudicial, tal como definida pela decisão de reenvio (v. acórdão de 25 de Outubro de 2001, Ambulanz Glöckner, C-475/99, Colect., p. I-8089, n.° 10).

Quanto à interpretação dos artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE

72 Deve recordar-se que, por força do artigo 86.° , n.° 1, CE, os Estados-Membros, no que respeita às empresas públicas e às empresas a que concedam direitos especiais ou exclusivos, não tomarão nem manterão qualquer medida contrária ao disposto no Tratado CE, designadamente ao disposto no artigo 82.° CE.

73 O artigo 82.° CE proíbe, na medida em que o comércio entre Estados-Membros seja susceptível de ser afectado, a exploração abusiva de uma posição dominante no mercado comum ou numa parte substancial deste.

74 A este respeito, há que constatar, em primeiro lugar, que resulta do despacho de reenvio que a Mobilkom é uma empresa pública que ocupa uma posição dominante no mercado dos serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900.

75 Neste contexto, embora incumba ao órgão jurisdicional de reenvio definir o mercado dos serviços em causa, há no entanto que recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para que o mercado seja considerado suficientemente homogéneo e distinto dos demais, o serviço deve poder ser individualizado por características específicas que o diferenciem de outros serviços a ponto de ser para o consumidor pouco intermutável com estes e só de modo pouco sensível sofrer a sua concorrência (v., neste sentido, acórdãos de 14 de Fevereiro de 1978, United Brands/Comissão, 27/76, Colect., p. 77, n.os 11 e 12, e de 11 de Abril de 1989, Ahmed Saeed Flugreisen e Silver Line Reisebüro, 66/86, Colect., p. 803, n.° 40). A este respeito, há que tomar em consideração não apenas as características objectivas dos serviços em causa mas também as condições de concorrência e a estrutura da procura e da oferta no mercado (v. acórdão de 9 de Novembro de 1983, Michelin/Comissão, 322/81, Colect., p. 3461, n.° 37).

76 Incumbe, portanto, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, no caso vertente:

- se existem três mercados distintos, ou seja, o dos serviços de telecomunicações móveis analógicas, o dos serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900 e o dos serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800, ou

- se existem dois mercados distintos, ou seja, o dos serviços de telecomunicações móveis analógicas e o dos serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas nas normas GSM 900 e DCS 1800, ou

- se só existe um único mercado, ou seja, o dos serviços de telecomunicações móveis, englobando tanto os serviços de telecomunicações móveis analógicas como os de telecomunicações móveis digitais baseadas nas normas GSM 900 e DCS 1800.

77 Para este fim, o órgão jurisdicional de reenvio deve nomeadamente investigar se, do ponto de vista dos consumidores, os serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900 e os serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800 são intermutáveis e, no quadro deste exame, verificar a disponibilidade dos telefones móveis bi-banda, susceptíveis de funcionar nas duas bandas de frequência. Deve ainda averiguar a importância do mercado dos serviços de telecomunicações móveis analógicas e se, em especial ao nível local nas grandes cidades, há concorrência entre os três sistemas.

78 Há que realçar que, se o órgão jurisdicional de reenvio vier a apurar que o mercado dos serviços em causa é o da totalidade dos serviços de telecomunicações móveis, resulta do processo que a Mobilkom ocupa uma posição dominante também nesse mercado.

79 Uma vez que a posição dominante da Mobilkom abarca o território de um Estado-Membro, é susceptível de constituir uma posição dominante numa parte substancial do mercado comum contrária ao artigo 82.° CE (v., neste sentido, acórdão de 17 de Maio de 2001, TNT Traco, C-340/99, Colect., p. I-4109, n.° 43).

80 Em segundo lugar, há que recordar que é jurisprudência constante que um Estado-Membro viola as proibições contidas no artigo 86.° , n.° 1, CE, conjugado com o artigo 82.° CE, quando adopta uma medida legislativa, regulamentar ou administrativa que cria uma situação na qual uma empresa pública ou uma empresa à qual concedeu direitos especiais ou exclusivos é levada a abusar da sua posição dominante (v., neste sentido, nomeadamente, acórdãos de 13 de Dezembro de 1991, GB-Inno-BM, C-18/88, Colect., p. I-5941, n.° 20; de 17 de Julho de 1997, GT-Link, C-242/95, Colect., p. I-4449, n.os 33 e 34, e de 25 de Junho de 1998, Dusseldorp e o., C-203/96, Colect., p. I-4075, n.° 61).

81 Ora, práticas de uma empresa em posição dominante que tendem a reforçar esta posição por uma concorrência falseada constituem uma exploração abusiva de uma posição dominante na acepção do artigo 82.° CE (v., neste sentido, os acórdãos já referidos Hoffmann-La Roche/Comissão, n.° 90, e Michelin/Comissão, n.° 73).

82 O mesmo se passa quando o comportamento de uma empresa que tem uma posição dominante num dado mercado tende a alargar, por uma concorrência falseada, essa posição a um mercado vizinho, mas distinto.

83 Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um sistema de concorrência não falseada, como o que está previsto no Tratado, só pode ser garantido se estiver garantida a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores económicos (v. acórdãos de 19 de Março de 1991, França/Comissão, C-202/88, Colect., p. I-1223, n.° 51, e GB-Inno-BM, já referido, n.° 25).

84 Se a desigualdade de oportunidades entre os operadores económicos e, portanto, a concorrência falseada, for o resultado de uma medida estatal, tal medida constitui uma violação do artigo 86.° , n.° 1, CE, lido em conjugação com o artigo 82.° CE.

85 A este respeito, há que declarar que o facto de, no processo principal, uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa, no caso o terceiro operador nacional no sector dos serviços de telecomunicações móveis, dever pagar uma taxa pela concessão da sua licença DCS 1800, enquanto ao primeiro operador nacional, uma empresa pública que ocupa uma posição dominante, foram atribuídas frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 sem que tivesse de pagar uma taxa específica, é susceptível de constituir uma vantagem concorrencial que permita a este, por uma concorrência falseada, quer alargar a sua posição dominante ao mercado dos serviços das telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800, quer reforçar a sua posição dominante no mercado dos serviços de telecomunicações móveis digitais ou no mercado dos serviços de telecomunicações móveis, consoante a definição do mercado dos serviços em causa, e, portanto, violar o artigo 82.° CE.

86 Com efeito, em razão do encargo financeiro imposto à Connect Austria, o seu concorrente que obteve a licença DCS 1800, a Mobilkom, empresa pública em posição dominante e, como correctamente afirma a Connect Austria, antigo monopólio que já beneficiava de determinado número de vantagens, tais como a presença nos mercados dos serviços de telecomunicações móveis analógicas e de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900, bem como um stock importante de clientes, poderia encontrar-se numa situação em que seria nomeadamente levada a oferecer tarifas reduzidas, em especial aos assinantes potenciais do sistema DCS 1800, e a fazer campanhas de publicidade intensivas em condições tais que a Connect Austria teria dificuldades para concorrer com ela.

87 Deste modo, uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 a uma empresa pública em posição dominante, quando uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa pela sua licença DCS 1800, é susceptível de levar a empresa pública em posição dominante a violar as disposições do artigo 82.° CE, alargando ou reforçando a sua posição dominante, consoante a definição de mercado em causa, por uma concorrência falseada. Dado que, nesse caso, a concorrência falseada seria a consequência de uma medida estatal criadora de uma situação na qual a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores económicos em causa não estaria garantida, tal medida é susceptível de constituir uma violação do artigo 86.° , n.° 1, CE, lido em conjugação com o artigo 82.° CE.

88 Resulta, no entanto, do despacho de reenvio que, no processo principal, a Mobilkom e a max.mobil pagaram, cada uma, 4 000 milhões de ATS por licenças que atribuíram a cada uma delas um feixe de frequências de 2 x 8 MHz na banda de frequências reservada à norma GSM 900, ao passo que a Connect Austria pagou uma taxa de 2 300 milhões de ATS por uma licença que lhe atribuiu um feixe de frequências de 2 x 16,8 MHz, que deveria ser elevado a 2 x 22,5 MHz quando o número de 300 000 clientes fosse atingido, na banda de frequências reservada à norma DCS 1800.

89 A este respeito, importa notar que uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal não é contrária aos artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE quando, tendo em conta as taxas impostas aos diferentes operadores pelas suas respectivas licenças, se deva entender que a atribuição, sem imposição de uma taxa específica, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 à empresa pública em posição dominante respeitou a exigência de garantir a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores económicos e, portanto, garantiu uma concorrência não falseada.

90 Com efeito, se a taxa imposta à empresa pública em posição dominante pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao concorrente a quem foi concedida a licença DCS 1800, deve entender-se que uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal garante a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores económicos e assegura, portanto, uma concorrência não falseada.

91 Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se é este o caso no processo principal.

92 A este respeito, deve sublinhar-se, por um lado, que, dado que a fixação do montante das taxas implica apreciações complexas de ordem económica, não pode impor-se às autoridades nacionais que, nesta matéria, respeitem critérios rígidos, desde que se atenham aos limites decorrentes do direito comunitário.

93 Por outro lado, no quadro do seu exame, o órgão jurisdicional de reenvio deve verificar o valor económico das licenças concedidas tendo em conta, nomeadamente, a importância dos diferentes feixes de frequências atribuídos, o momento de acesso ao mercado de cada um dos operadores em causa e a importância da possibilidade de apresentar uma oferta completa de sistemas de telecomunicações móveis.

94 Quanto ao argumento da Connect Austria assente em a Mobilkom não ter pago qualquer taxa pela sua licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis analógicas, compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se esta licença deve ser tida em conta no quadro do seu exame do cumprimento pelas autoridades austríacas da obrigação de garantir a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores económicos, tendo nomeadamente em conta a data em que esta licença foi concedida, a regulamentação em vigor na época, uma eventual obrigação de exploração bem como, sendo caso disso, o valor económico da referida licença, em especial a partir da abertura dos sectores das telecomunicações móveis à concorrência.

95 Daqui resulta que os artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE se opõem, em princípio, a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 a uma empresa pública em posição dominante já titular de uma licença GSM 900, quando uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa pela aquisição de uma licença DCS 1800. Estas disposições não se opõem, no entanto, a uma tal regulamentação nacional se a taxa imposta à empresa pública em posição dominante pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao concorrente a quem foi concedida a licença DCS 1800.

Quanto à violação do artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2

96 No que se refere à Directiva 96/2, convém recordar que visa instituir um quadro regulamentar que permita explorar o potencial das comunicações móveis e pessoais suprimindo, logo que possível, todos os direitos exclusivos e especiais, eliminando, para os operadores de redes móveis, tanto as restrições à liberdade de explorar e desenvolver as referidas redes com vista ao exercício das actividades abrangidas pelas suas licenças ou autorizações como as distorções da concorrência e permitindo a estes operadores o controlo dos seus custos (v. acórdão de 16 de Outubro de 2001, Comissão/Grécia, C-396/99 e C-397/99, Colect., p. I-7577, n.° 25).

97 De acordo com este objectivo, o artigo 2.° , n.° 1, da Directiva 96/2 impõe, a partir de 1 de Janeiro de 1998, que os Estados-Membros não recusem a atribuição de licenças para os sistemas móveis que funcionem de acordo com a norma DCS 1800 (v. acórdão Comissão/Grécia, já referido, n.° 26).

98 Resulta do artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2 que os Estados-Membros só podem ampliar o âmbito de aplicação das licenças existentes para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais a combinações de sistemas de telecomunicações móveis digitais conformes à norma GSM 900 e à norma DCS 1800 quando tal extensão for justificada pela necessidade de garantir uma concorrência efectiva entre operadores de sistemas concorrentes nos mercados em causa.

99 De acordo com o oitavo considerando da Directiva 96/2, os Estados-Membros, aquando da instituição de um procedimento para a concessão de licenças DCS 1800, devem ter em devida consideração a necessidade de promover os investimentos por parte das novas empresas que começam a operar neste domínio. Podem não conceder uma licença aos operadores existentes, por exemplo, os operadores de sistemas GSM 900 já presentes no seu território, se se puder demonstrar que tal situação eliminará uma concorrência efectiva, nomeadamente através da extensão de uma posição dominante. Quando, em especial, um Estado-Membro concede ou já concedeu licenças DCS 1800, a concessão de novas licenças ou de licenças suplementares para actuais operadores GSM 900 ou DCS 1800 só pode realizar-se em condições que assegurem uma concorrência efectiva.

100 A este respeito, é forçoso constatar que, se, pela extensão, sem imposição de uma taxa específica, de uma licença GSM 900 já existente, concedida a uma empresa pública em posição dominante, a frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, quando a empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa para obter uma licença DCS 1800, a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores em causa deixar de estar garantida e a concorrência for assim falseada, não pode entender-se que esta extensão se justifica de acordo com o disposto no artigo 2.° , n.° 4, da Directiva 96/2.

101 Deste modo, uma regulamentação nacional como a do § 125, n.° 3, da TKG, que permite uma tal extensão, é susceptível de ser contrária ao artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2.

102 Como, todavia, foi declarado no n.° 90 do presente acórdão, se a taxa imposta à empresa pública em posição dominante pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao concorrente a quem foi concedida a licença DCS 1800, deve entender-se que uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal garante a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores económicos, assegurando assim uma concorrência não falseada e sendo, portanto, conforme, por garantir uma concorrência efectiva entre operadores de sistemas concorrentes nos mercados em causa, ao artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2.

103 Compete ao órgão jurisdicional de reenvio, baseando-se nas indicações dadas pelo Tribunal de Justiça nos n.os 92 a 94 do presente acórdão, verificar se é esse o caso no processo principal.

104 Neste contexto, há que realçar que, de acordo com o décimo quinto considerando da Directiva 96/2, as eventuais taxas para a utilização de frequências devem ser proporcionais ao número de canais efectivamente concedidos.

105 Daqui resulta que o artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2 se opõe, em princípio, a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 a uma empresa pública em posição dominante já titular de uma licença GSM 900, quando uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa pela aquisição de uma licença DCS 1800. Esta disposição não se opõe, todavia, a uma tal regulamentação nacional se a taxa imposta à empresa pública em posição dominante pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao concorrente a quem foi concedida a licença DCS 1800.

106 No processo principal, a Connect Austria alega ainda, no entanto, que a manutenção de uma concorrência efectiva na acepção da Directiva 96/2 só pode ser garantida através da exclusão completa da Mobilkom da atribuição de frequências na banda de frequências reservada à norma DCS 1800.

107 A este respeito, convém recordar que, por força do primeiro período do § 125, n.° 3, da TKG, a administração não pode atribuir frequências suplementares, na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 aos operadores já titulares de uma licença GSM 900, antes de se ter esgotado o prazo de pelo menos três anos desde a concessão da licença DCS 1800, ocorrida em 1997, e apenas até um máximo de 5 MHz por cada um deles. Uma tal disposição tem devidamente em conta a exigência de promover os investimentos por parte das novas empresas que começam a operar neste domínio, como dispõe o oitavo considerando da Directiva 96/2, e a preocupação expressa pelo primeiro parágrafo do décimo quinto considerando da mesma directiva, segundo o qual, dado que as radiofrequências constituem um recurso raro mas essencial, o desenvolvimento de uma concorrência efectiva no sector das telecomunicações pode constituir uma justificação objectiva para recusar a atribuição de frequências a operadores já dominantes no mercado geográfico.

108 Resulta, no entanto, do segundo período do § 125, n.° 3, da TKG que, se for demonstrado que os operadores já titulares de uma licença GSM 900 esgotaram a sua capacidade de aceitar novos clientes, apesar de terem utilizado todas as possibilidades técnicas economicamente admissíveis, podem ser-lhes atribuídas frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800.

109 A este respeito, há que notar que o DCS 1800 é um sistema de telecomunicações móveis digitais baseado na norma internacional do GSM, mas que utiliza uma banda de frequências de cerca de 1800 MHz, em vez de 900 MHz. Em princípio, há mais frequências disponíveis na banda de frequências do DCS 1800 que na do GSM 900, o que permite a esse sistema ter um maior número de assinantes e suportar maior volume de tráfego simultâneo. Dado que o alcance das frequências superiores é mais limitado, as células de cada estação de base DCS 1800 são mais pequenas do que as do sistema GSM 900, o que implica uma densidade de estações de base maior e, portanto, uma rede que apresenta uma maior capacidade.

110 Ora, no momento da adopção do § 20a, n.° 3, alínea b), da Fernmeldegesetz de 1993, cujo texto é retomado literalmente pelo § 125, n.° 3, da TKG, havia o risco, em vários Estados-Membros, de as redes de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900 sofrerem rapidamente problemas de saturação nas grandes cidades durante as horas de ponta, em razão do aumento muito rápido do número de assinantes. Com a chegada dos telefones bi-banda, susceptíveis de passar de um sistema a outro, a instalação de estações de base DCS 1800 nas grandes cidades, em acréscimo às estações de base GSM 900, podia permitir aos operadores das redes GSM 900 diminuir estes problemas de saturação devidos ao aumento do número de assinantes.

111 Nesta situação, deve entender-se que uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que, por um lado, permite a atribuição, após o esgotamento de um prazo de pelo menos três anos desde a concessão da licença DCS 1800, ocorrida em 1997, de um feixe limitado de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 aos operadores já titulares de uma licença GSM 900, incluindo a uma empresa pública em posição dominante, e, por outro, permite essa atribuição antes do esgotamento do referido prazo quando se demonstre que a capacidade de os referidos operadores aceitarem novos clientes está esgotada, apesar da utilização de todas as possibilidades técnicas economicamente admissíveis, se justifica pela necessidade de garantir uma concorrência efectiva entre operadores que concorrem nos mercados relevantes, na acepção do artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2.

112 Daqui resulta que o artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2 não se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite a atribuição, após o esgotamento de um prazo de, pelo menos, três anos desde a concessão da licença DCS 1800, ocorrida em 1997, de um feixe limitado de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 aos operadores já titulares de uma licença GSM 900, incluindo a uma empresa pública em posição dominante. Esta disposição também não se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite essa atribuição antes do esgotamento desse mesmo prazo quando se demonstre que a capacidade de os referidos operadores aceitarem novos clientes se esgotou apesar da utilização de todas as possibilidades técnicas economicamente admissíveis.

Quanto à interpretação dos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13

113 Quanto aos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, em substância, saber se a proibição de discriminação neles prevista se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 aos operadores já titulares de uma licença GSM 900, quando ao titular da licença DCS 1800 foi imposta uma taxa para a aquisição dela.

114 A este respeito, há que constatar, por um lado, que, contrariamente ao que sustenta a TCK, os artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13 são, do ponto de vista do seu conteúdo, incondicionais e suficientemente precisos, e podem, portanto, segundo jurisprudência constante (v., nomeadamente, acórdãos de 19 de Janeiro de 1982, Becker, 8/81, Recueil, p. 53, n.° 25, e de 10 de Setembro de 2002, Kügler, C-141/00, Colect., p. I-6833, n.° 51), ser invocados, na falta de medidas de aplicação adoptadas no prazo, contra toda e qualquer disposição nacional que não esteja em conformidade com a directiva, ou ainda na medida em que sejam susceptíveis de definir direitos que os particulares estejam em condições de invocar contra o Estado.

115 Por outro lado, há que precisar que, em conformidade com jurisprudência constante, uma discriminação consiste, designadamente, no tratamento diferenciado de situações comparáveis, que causa uma desvantagem para certos operadores em relação a outros, sem que esta diferença de tratamento seja justificada pela existência de diferenças objectivas com uma certa relevância (v., nomeadamente, acórdãos de 13 de Julho de 1962, Klöckner-Werke e Hoesch/Alta Autoridade, 17/61 e 20/61, Recueil, pp. 615, 652, Colect. 1962-1964, p. 131,, e de 26 de Setembro de 2002, Espanha/Comissão, C-351/98, Colect., p. I-8031, n.° 57).

116 Sem que seja necessário pronunciar-se sobre a questão de saber se o artigo 9.° , n.° 2, da Directiva 97/13 se aplica unicamente à concessão de licenças ou também à atribuição de frequências suplementares, é forçoso constatar que, se a taxa imposta aos operadores já existentes pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao operador a quem foi concedida a licença DCS 1800, tal atribuição não constitui um tratamento diferente de situações comparáveis.

117 Compete ao órgão jurisdicional de reenvio, baseando-se nas indicações dadas pelo Tribunal de Justiça nos n.os 92 a 94 do presente acórdão, verificar se é esse o caso no processo principal.

118 Daqui resulta que a proibição de discriminação prevista nos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13 não se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 aos operadores já titulares de uma licença GSM 900, quando uma taxa foi imposta ao operador a quem foi concedida uma licença DCS 1800, se a taxa imposta aos operadores já existentes pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao operador titular da licença DCS 1800.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

119 As despesas efectuadas pelos Governos austríaco e sueco, bem como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Verwaltungsgerichtshof, por decisão de 24 de Novembro de 1999, declara:

1) As exigências de uma interpretação do direito nacional em conformidade com a Directiva 90/387/CEE do Conselho, de 28 de Junho de 1990, relativa à realização do mercado interno dos serviços de telecomunicações mediante a oferta de uma rede aberta de telecomunicações, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva 97/51/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997, e da protecção efectiva dos direitos dos interessados impõem aos órgãos jurisdicionais nacionais que verifiquem se as disposições pertinentes do seu direito nacional permitem reconhecer aos interessados um direito a recorrer das decisões da autoridade reguladora nacional que respeite os critérios do artigo 5.° -A, n.° 3, da Directiva 90/387, alterada pela Directiva 97/51. Se não for possível uma aplicação do direito nacional em conformidade com as exigências do artigo 5.° -A, n.° 3, da referida directiva, um órgão jurisdicional nacional que cumpra as referidas exigências e que seria competente para conhecer dos recursos contra as decisões da autoridade reguladora nacional se não se confrontasse com uma disposição do direito nacional, como a que está em causa no processo principal, que expressamente exclui a sua competência, tem a obrigação de não aplicar esta disposição.

2) Os artigos 82.° CE e 86.° , n.° 1, CE opõem-se, em princípio, a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 a uma empresa pública em posição dominante já titular de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900, quando uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa pela aquisição de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800. Estas disposições não se opõem, no entanto, a uma tal regulamentação nacional se a taxa imposta à empresa pública em posição dominante pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao concorrente a quem foi concedida a licença DCS 1800.

3) O artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2/CE da Comissão, de 16 de Janeiro de 1996, que altera a Directiva 90/388/CEE no que respeita às comunicações móveis e pessoais, opõe-se, em princípio, a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 a uma empresa pública em posição dominante já titular de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900, quando uma empresa que posteriormente entrou no mercado em causa teve de pagar uma taxa pela aquisição de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800. Esta disposição não se opõe, todavia, a uma tal regulamentação nacional se a taxa imposta à empresa pública em posição dominante pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao concorrente a quem foi concedida a licença DCS 1800.

4) O artigo 2.° , n.os 3 e 4, da Directiva 96/2 não se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite a atribuição, após o esgotamento de um prazo de, pelo menos, três anos desde a concessão da licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800, ocorrida em 1997, de um feixe limitado de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 aos operadores já titulares de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900, incluindo a uma empresa pública em posição dominante. Esta disposição também não se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite essa atribuição antes do esgotamento desse mesmo prazo quando se demonstre que a capacidade de os referidos operadores aceitarem novos clientes se esgotou apesar da utilização de todas as possibilidades técnicas economicamente admissíveis.

5) A proibição de discriminação prevista nos artigos 9.° , n.° 2, e 11.° , n.° 2, da Directiva 97/13/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 10 de Abril de 1997, relativa a um quadro comum para autorizações gerais e licenças individuais no domínio dos serviços de telecomunicações, não se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, que permite atribuir, sem impor uma taxa específica, frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800 aos operadores já titulares de uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma GSM 900, quando uma taxa foi imposta ao operador a quem foi concedida uma licença para a prestação de serviços de telecomunicações móveis digitais baseadas na norma DCS 1800, se a taxa imposta aos operadores já existentes pela sua licença GSM 900, incluindo a posterior atribuição, sem pagamento complementar, de frequências suplementares na banda de frequências reservada à norma DCS 1800, se revelar equivalente, em termos económicos, à taxa imposta ao operador titular da licença DCS 1800.

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