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Document 61999CC0167
Opinion of Mr Advocate General Geelhoed delivered on 26 September 2002. # European Parliament v Société d'aménagement et d'équipement de la région de Strasbourg (SERS) and Ville de Strasbourg. # Arbitration clause - Late performance of a contract - Penalties for delay - Interim interest. # Case C-167/99.
Conclusões do advogado-geral Geelhoed apresentadas em 26 de Septembro de 2002.
Parlamento Europeu contra Société d'aménagement et d'équipement de la région de Strasbourg (SERS) e Ville de Strasbourg.
Cláusula compromissória - Execução tardia de um contrato - Penalidades por mora - Juros intercalares.
Processo C-167/99.
Conclusões do advogado-geral Geelhoed apresentadas em 26 de Septembro de 2002.
Parlamento Europeu contra Société d'aménagement et d'équipement de la région de Strasbourg (SERS) e Ville de Strasbourg.
Cláusula compromissória - Execução tardia de um contrato - Penalidades por mora - Juros intercalares.
Processo C-167/99.
Colectânea de Jurisprudência 2003 I-03269
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2002:531
Conclusões do advogado-geral Geelhoed apresentadas em 26de Septembro de2002. - Parlamento Europeu contra Société d'aménagement et d'équipement de la région de Strasbourg (SERS) e Ville de Strasbourg. - Cláusula compromissória - Execução tardia de um contrato - Penalidades por mora - Juros intercalares. - Processo C-167/99.
Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-03269
I - Introdução: antecedentes dos autos
1. Entre o Parlamento Europeu (a seguir «Parlamento»), por um lado, e a Société d'aménagement et d'équipement de la région de Strasbourg (a seguir «SERS») e o município de Estrasburgo, por outro lado, surgiu um litígio no que toca à interpretação e execução de algumas disposições de um contrato-quadro que celebraram em 31 de Março de 1994. Este contrato tinha, nomeadamente, por objecto a definição das relações entre as partes durante a construção de um complexo imobiliário a efectuar pela SERS para o Parlamento.
2. Já anteriormente, em 5 de Outubro de 1992, o município de Estrasburgo tinha decidido ceder um terreno para esse fim. Por contrato de 31 de Agosto de 1993, foi adjudicada à SERS a realização e a exploração do edifício. A SERS é o que se convencionou designar por sociedade de capitais mistos, constituída pelo município de Estrasburgo e que tem por objecto o desenvolvimento e a realização de projectos imobiliários para esse município. O contrato-quadro, com os respectivos aditamentos, celebrado em 31 de Março de 1994, rege as relações mútuas entre as partes durante a construção, no momento da conclusão das obras e da recepção/aceitação do novo imóvel e após esta recepção. No presente processo, trata-se, mais especificamente, das disposições do contrato-quadro relativas à data para a conclusão das obras, aos atrasos na construção que podem levar à prorrogação dessa data, à cláusula relativa às penalidades por mora na conclusão das obras e, relacionado com este último aspecto, a obrigação de pagamento de juros ditos intercalares.
3. Por diversas razões, a construção sofreu atraso e o novo imóvel só foi concluído cerca de um ano após a data de 31 de Dezembro de 1997 prevista no contrato-quadro. Segundo a SERS, as causas do atraso justificarão a data mais tardia do que o contratualmente fixado. Segundo o Parlamento, não será esse o caso. Na origem, o litígio referia-se à interpretação das disposições do contrato-quadro relativas à data para a conclusão das obras, às penalidades em caso de conclusão tardia e à obrigação de pagamento dos juros ditos intercalares sobre o período decorrido entre a data acordada para a conclusão das obras e a data efectiva de conclusão (15 de Dezembro de 1998).
4. A fim de resolverem o seu diferendo respeitante à data efectiva para a conclusão das obras e de recepção do imóvel, bem como à data acordada para esta conclusão, o Parlamento e o município de Estrasburgo celebraram, em 14 de Janeiro de 1999, três novos acordos que, em 19 de Janeiro seguinte, foram também assinados pela SERS.
Tratou-se concretamente de:
- um aditamento ao contrato-quadro, completando o seu artigo 29.° , e que tinha por objecto a instituição de um tribunal arbitral com a missão específica de se pronunciar sobre os termos do litígio referente às divergências de interpretação e de execução no que toca à fixação da data contratual para conclusão das obras com base nos artigos 3.° , 5.° , 6.° e 25.° do contrato-quadro;
- uma convenção de arbitragem pela qual as partes acordavam cometer à decisão dos árbitros o litígio descrito no aditamento antes referido;
- um acto de fixação da data efectiva para a conclusão das obras do imóvel, no qual as partes acordavam designadamente que a data para a conclusão das obras prevista no artigo 4.° , primeiro parágrafo, do contrato-quadro ficava fixada em 15 de Dezembro de 1998 e que, por conseguinte, a enfiteuse acordada entre a SERS e o Parlamento Europeu produzia efeitos a partir dessa data e segundo as condições previstas no contrato-quadro.
5. Em 22 de Março de 1999, o tribunal arbitral proferiu a decisão que lhe tinha sido cometida. O Parlamento Europeu, que não concorda com alguns pontos desta decisão, dela interpôs recurso nos termos do artigo 1.° 2., do aditamento ao contrato-quadro antes referido no n.° 4, apresentado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância.
II - As disposições contratuais relevantes
A - O contrato-quadro de 3 de Março de 1994
6. Para os presentes autos, são relevantes as seguintes disposições do contrato-quadro:
O artigo 3.° 2.
«A conclusão do imóvel fica prevista para, o mais tardar, 31 de Dezembro de 1997.»
O artigo 3.° 3.
«Os trabalhos de elevação do imóvel serão iniciados em 1 de Outubro de 1994. A SERS disporá, a partir dessa data, de um período previsto de 36 meses para a conclusão das obras do imóvel.
Fica, contudo, acordado que o prazo para a conclusão das obras na acepção do presente artigo será prorrogado na medida necessária em caso de atraso devidamente justificado pela SERS. Assim será, nomeadamente, em caso de:
- obras suplementares ou de alterações solicitadas pelo Parlamento Europeu;
- atrasos na obtenção de licença(s) administrativa(s) devidos às autoridades a quem incumbe a sua instrução ou emissão ou devidos a terceiros;
- consequências da sujeição a um plano de recuperação ou liquidação judicial de um (ou vários) co-contratante(s) do adjudicatário;
- força maior ou caso fortuito na acepção da jurisprudência e da doutrina;
- greves que afectem o estaleiro das obras de construção;
- decisões ou intimações administrativas ou judiciais que ordenem a paralisação das obras;
- vandalismo, intempéries, catástrofes naturais, guerra, terrorismo, escavações arqueológicas;
- falta ou atraso superior a três semanas na resposta do Parlamento Europeu às comunicações que lhe forem feitas.»
O artigo 5.° 1.
«Mesmo quando os 36 meses referidos no artigo 3.° 3. terminem após a data prevista no artigo 3.° 2., eventualmente prorrogada nos termos do artigo 5.° 2., a SERS será, automaticamente, sem exigências de forma e pelo simples facto de se exceder esse período, devedora, a partir da data referida no artigo 3.° 2., eventualmente prorrogada nos termos do artigo 5.° 2., de uma penalidade no montante de 28 000 ecus por cada dia útil, no valor máximo de 3% do custo fixado para a construção (montante do valor das obras acrescido dos honorários referentes aos estudos).
[...]
A penalidade diária - ou a penalidade reduzida adiante referida - deixa de correr no dia em que for fixada a conclusão das obras em conformidade com as disposições do artigo 4.° e, em todo o caso, quando tiver sido atingido o seu valor máximo.»
O artigo 5.° 2.
«A data prevista no artigo 3.° 2. é prorrogada em caso de:
- força maior ou caso fortuito devidamente estabelecido;
- decisão de um órgão jurisdicional administrativo ou judicial que ordene a paralisação das obras;
- catástrofe natural, guerra, terrorismo, escavações arqueológicas;
- intempéries reconhecidas pela Caisse des Congés Payés du Bâtiment de Strasbourg;
- atraso na obtenção de licença(s) administrativa(s) devidos às autoridades a quem incumbe a sua instrução ou emissão, com excepção daquelas para as quais é competente o município de Estrasburgo.
Nestes casos, será fixado, por mútuo acordo das partes ou, na sua falta, pelo órgão jurisdicional referido no artigo 29.° , um prazo suplementar.
A SERS informará o Parlamento Europeu, logo que de tal tenha conhecimento, de qualquer eventual motivo de atraso que ocorra. Na falta dessa informação, não poderá invocar esse motivo de atraso para a concessão de um prazo suplementar.»
O artigo 5.° 3.
«A data referida no artigo 3.° 2. não tem em conta as obras suplementares ou as alterações pedidas ou aceites pelo Parlamento Europeu.»
[...]
O artigo 6.° 3.
«Os juros intercalares aplicam-se a todas as rubricas de despesas que constam do mapa financeiro a contar da data do seu pagamento pela SERS e até à data de fixação do primeiro mapa intercalar dos custos de investimento [...].
[...]
O Parlamento Europeu não é devedor de juros intercalares no que toca ao período que decorrer desde a data para a conclusão das obras prevista no artigo 3.° 2., eventualmente prorrogada por força do artigo 5.° 2., e a data de conclusão efectiva se o atraso quanto à data para a conclusão das obras decorrer de falta imputável à SERS ou de atraso que não seja considerado justificado pelo órgão jurisdicional mencionado no artigo 29.° »
O artigo 25.°
«O calendário geral (anexo 6 do presente contrato-quadro) deverá ser respeitado e a SERS deverá apresentar, a par do seu relatório mensal sobre a evolução das obras, os calendários das obras a realizar no estaleiro. Os eventuais atrasos devem ser indicados e explicados e a SERS deverá, nesse caso, informar o Parlamento Europeu das medidas de correcção adequadas que pretende tomar, sem prejuízo da aplicação do artigo 5.° »
O artigo 29.°
«Na falta de prévio acordo mútuo, todos os litígios relacionados com o presente contrato-quadro serão dirimidos pelo Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias [...]»
B - O aditamento ao contrato-quadro de 14 de Janeiro de 1999
7. A disposição relevante do aditamento é o seu artigo 1.° , que estipula o seguinte:
«1. Em aditamento ao artigo 29.° do contrato-quadro, e única e exclusivamente para dirimir os termos do litígio sobre a interpretação e a execução no que toca à fixação da data contratual para a conclusão das obras com base no disposto nos artigos 3.° , 5.° , 6.° e 25.° do contrato-quadro, é instituído um tribunal arbitral nos termos das modalidades enunciadas na Convenção de arbitragem que é junta ao presente como anexo I.
2. O tribunal arbitral proferirá sobre o referido litígio uma decisão exclusivamente sobre as questões de direito e com base nas disposições do contrato-quadro.
Cada uma das partes obriga-se a aceitar esta decisão, sem prejuízo da possibilidade para cada uma delas de, no prazo de 30 dias de calendário contados após a sua notificação, dela interporem recurso para o órgão jurisdicional mencionado no artigo 29.° do contrato-quadro.»
III - A tramitação processual e os pedidos das partes
8. Após a petição do Parlamento ter dado entrada no Tribunal de Primeira Instância, em 20 de Abril de 1999, o secretário do Tribunal acusou a sua recepção por ofício de 21 de Abril de 1999. Nesse ofício, o secretário chamava a atenção do Parlamento para o facto de o Tribunal de Primeira Instância não ser competente para se pronunciar com base numa cláusula compromissória nos termos do artigo 181.° do Tratado CE (actual artigo 238.° E) em recursos interpostos por uma instituição, anunciando-lhe a sua intenção de transmitir a petição ao secretário do Tribunal de Justiça, em conformidade com o disposto no artigo 47.° , primeiro parágrafo, do Estatuto CE do Tribunal de Justiça, salvo indicação da sua parte, antes de 3 de Maio de 1999, da efectiva intenção de interpor esse recurso para o Tribunal de Primeira Instância.
9. Em 28 de Abril de 1999, o Parlamento confirmou que não tinha qualquer objecção quanto à remessa da petição ao secretário do Tribunal de Justiça. Após o que, em 4 de Maio de 1999, a petição deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça, tendo sido registada no dia seguinte.
10. Em 23 de Julho de 1999, a SERS, nos termos do artigo 91.° , n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, apresentou formalmente pedido para que o Tribunal se pronuncie sobre a excepção de inadmissibilidade do recurso que deduziu.
11. Por despacho de 7 de Dezembro de 1999, o Tribunal de Justiça, ouvido o advogado-geral, decidiu, em conformidade com o n.° 4 do artigo 91.° do seu Regulamento de Processo, reservar para final a decisão sobre a excepção de inadmissibilidade deduzida.
12. Em 7 de Abril de 2000, o Parlamento, nos termos do artigo 82.° -A, n.° 1, alínea b), do Regulamento de Processo, pediu a suspensão da instância em razão das negociações em curso entre as partes. A SERS e o município de Estrasburgo a tal se opuseram por requerimento de 17 de Abril de 1999, entrado na Secretaria do Tribunal de Justiça no dia 20 de Abril seguinte, invocando que a SERS não terá sido parte nas negociações que invocava o Parlamento. Nestas condições, a instância não foi suspensa.
13. Em 24 de Janeiro de 2002, foram ouvidas as alegações das partes na audiência.
14. No que toca à excepção de inadmissibilidade, o Parlamento conclui pedindo que o Tribunal se digne:
- julgar a excepção de inadmissibilidade improcedente;
- indeferir o pedido das partes que deduzem a excepção de pagamento de um montante de 20 000 euros em razão de despesas incorridas que consideram vexatórias;
- condenar nas despesas as partes que deduzem a excepção;
- prosseguir o andamento dos autos ou, a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância.
15. Quanto ao mérito, o Parlamento conclui pedindo que o Tribunal se digne:
- condenar a SERS no pagamento de penalidades por mora a contar de 9 de Janeiro de 1998, data contratual para a conclusão das obras do imóvel IPE IV, e até 14 de Dezembro de 1998, inclusive, véspera do dia em que foi fixada a data efectiva para a conclusão das obras do referido imóvel, ou, a título subsidiário, condenar a SERS no pagamento de penalidades por mora a contar da data contratual para a conclusão das obras que o Tribunal de Justiça fixará;
- declarar não justificados os atrasos ocorridos a partir de 9 de Janeiro de 1998, data contratual para a conclusão das obras do imóvel IPE IV e, portanto, declarar que o Parlamento Europeu não é devedor de juros intercalares a contar da referida data contratual para a conclusão das obras do imóvel IPE IV e até 14 de Dezembro de 1998, inclusive, véspera do dia em que foi fixada a data efectiva para a conclusão das obras do referido imóvel, ou, a título subsidiário, declarar que o Parlamento Europeu não é devedor de juros intercalares a contar da data contratual para a conclusão das obras que o Tribunal de Justiça fixará;
- anular a decisão do tribunal arbitral;
- condenar os recorridos nas despesas;
- julgar inadmissível o recurso subordinado interposto pelos recorridos contra a decisão do tribunal arbitral;
- indeferir o pedido dos recorridos de pagamento de um montante de 300 000 FRF em razão de despesas vexatórias incorridas;
- negar provimento aos demais pedidos dos recorridos.
16. No que respeita à excepção de inadmissibilidade, a SERS e o município de Estrasburgo concluem pedindo que o Tribunal se digne:
- em aplicação dos artigos 91.° e seguintes do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, julgar admissível e procedente a excepção de inadmissibilidade suscitada pelo município de Estrasburgo e pela SERS no que respeita ao recurso interposto pelo Parlamento Europeu;
- declarar que o prazo preestabelecido de 30 dias para interpor no órgão jurisdicional competente recurso da decisão do tribunal arbitral estava terminado na data em que o recurso entrou no Tribunal de Justiça (5 de Maio de 1999);
- declarar que a decisão do tribunal arbitral se tornou definitiva e inatacável;
- condenar o Parlamento Europeu nas despesas da instância e no pagamento, a favor de cada uma das partes que o requerem, ou seja, o município de Estrasburgo e a SERS, de um montante de 20 000 euros em razão das despesas vexatórias incorridas;
- a título muito subsidiário e para a hipótese, que se crê impossível, de o Tribunal de Justiça reservar a sua decisão para final ou julgar a excepção improcedente através de decisão autónoma: conferir à SERS e ao município de Estrasburgo prazos adequados para alegarem quanto ao mérito.
17. Quanto ao mérito, a SERS e o município de Estrasburgo concluem pedindo que o Tribunal se digne:
- declarar que a SERS e o município de Estrasburgo interpõem recurso subordinado da decisão do tribunal arbitral, na medida em que os árbitros decidiram que a data para a conclusão das obras corresponde a 31 de Dezembro de 1997 e que esta data só podia ser prorrogada unicamente pelas razões previstas no artigo 5.° 2.;
- declarar que a data de 31 de Dezembro de 1997 corresponde a uma data provisória, prorrogável nos termos de quaisquer das causas justificativas e por aplicação de todas as disposições do artigo 3.° , que constituem um todo indivisível;
seguidamente, no que respeita ao recurso interposto pelo Parlamento Europeu:
- negar provimento ao referido recurso;
- declarar que o Tribunal de Justiça só é competente na estrita medida em que o era o tribunal arbitral;
- declarar que o Tribunal de Justiça só se pode pronunciar sobre os princípios jurídicos aplicáveis ao litígio, com exclusão da análise dos factos, e, a fortiori, que o Tribunal de Justiça não pode nem condenar uma das partes nem fixar a data para a conclusão das obras, tratando-se de questões de facto que extravasam do objecto da arbitragem e relativamente às quais o Tribunal de Justiça se pronuncia nos termos do efeito devolutivo que tem o recurso interposto pelo Parlamento;
- confirmar a decisão do tribunal arbitral, relativamente a todos os pontos, com excepção daquele que é objecto do recurso da SERS e do município de Estrasburgo;
- condenar o Parlamento no pagamento das despesas da instância e num montante de 300 000 FRF em razão das despesas vexatórias incorridas.
IV - Apreciação
A - Observação preliminar
18. Nestes autos, suscitam-se três categorias de questões, respectivamente sobre:
- a admissibilidade;
- a interpretação de algumas cláusulas do contrato-quadro celebrado entre o Parlamento, a SERS e o município de Estrasburgo;
- a execução das referidas cláusulas no contexto factual das obras de construção.
19. Os diversos aspectos deste processo serão analisados sob o ângulo das questões assim agrupadas, pela ordem anteriormente indicada.
B - As questões relativas à admissibilidade
20. Nos seus pedidos, as partes deduziram três excepções de inadmissibilidade distintas.
a) A excepção formal de inadmissibilidade deduzida pela SERS e o município de Estrasburgo contra o recurso do Parlamento, nos termos do artigo 91.° , n.° 1, do Regulamento de Processo.
b) A conclusão do Parlamento de que é inadmissível o recurso subordinado da SERS e do município de Estrasburgo contra a decisão do tribunal arbitral.
c) As alegações avançadas pela SERS e o município de Estrasburgo que concluem implicitamente pela inadmissibilidade dos fundamentos invocados pelo Parlamento e destinados a conduzir o Tribunal de Justiça a se pronunciar sobre a aplicação do contrato-quadro no contexto factual das obras de construção. Segundo os recorridos, o recurso do Parlamento tem efeito devolutivo e, portanto, está limitado, ratione materiae, pelo objecto da decisão do tribunal arbitral. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça deverá restringir o seu exame do recurso do Parlamento às questões de direito analisadas na decisão do tribunal arbitral. Pode-se inferir, a contrario, que os recorridos consideram inadmissível o recurso do Parlamento na medida em que versa também sobre a aplicação do contrato-quadro ao contexto factual dos autos.
a) A excepção de inadmissibilidade
21. Os dois fundamentos invocados pela SERS e o município de Estrasburgo para deduzir a excepção de inadmissibilidade do recurso do Parlamento podem ser facilmente resumidos.
22. Em primeiro lugar, o recurso terá sido interposto intempestivamente pelo facto de a petição só ter sido registada na Secretaria do Tribunal de Justiça, que é o órgão jurisdicional competente, em 5 de Maio de 1999. O facto de a petição ter entrado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância já em 20 de Abril de 1999, ou seja, dentro do prazo de 30 dias fixado para a sua interposição, não terá, a esse respeito, qualquer importância.
23. Em segundo lugar, o secretário do Tribunal de Primeira Instância não podia transmitir os autos ao secretário do Tribunal de Justiça por meio de uma simples carta. Este procedimento simplificado, previsto no artigo 47.° , primeiro parágrafo, do Estatuto CE do Tribunal de Justiça (a seguir «Estatuto») só se pode aplicar quando a petição destinada ao Tribunal de Justiça tenha sido apresentada por erro na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância (e vice-versa). No caso em apreço, contudo, não houve qualquer erro: a petição era dirigida ao Tribunal de Primeira Instância e foi apresentada na Secretaria deste último. O Tribunal de Primeira Instância deveria ter feito aplicação do artigo 47.° , segundo parágrafo, do Estatuto.
24. Contra o primeiro destes fundamentos, o Parlamento defende a posição de que a forma como o Tribunal de Primeira Instância e o Tribunal de Justiça rectificam, nas suas relações mútuas, o destino dos recursos não tem qualquer incidência sobre os próprios prazos de recurso. Tal decorrerá do próprio teor do artigo 47.° do Estatuto, que não faz qualquer menção nem de um qualquer prazo nem da sua expiração. Para que o recurso seja interposto no prazo fixado, basta que a petição seja apresentada em tempo útil numa das secretarias do «Tribunal de Justiça», enquanto instituição.
25. No que respeita ao segundo fundamento, o Parlamento observa que repousa numa interpretação excessivamente formalista do artigo 47.° do Estatuto. Uma aplicação rígida dos procedimentos previstos pelo artigo 47.° , primeiro e segundo parágrafos, não contribui para uma boa e flexível administração da justiça. Além disso, resulta claramente da carta que acompanhava a petição que o Parlamento teve em conta o facto de o seu recurso poder não estar dirigido ao órgão institucional correcto. Tendo em conta esta eventualidade, o Parlamento solicitou ao secretário do Tribunal de Primeira Instância que transmitisse a petição à Secretaria do Tribunal de Justiça se tal fosse o caso. A título subsidiário e para o caso de o Tribunal de Justiça considerar contudo que a transferência foi irregular, o Parlamento requer que os autos sejam remetidos ao Tribunal de Primeira Instância a fim de este último poder formalmente declarar-se incompetente e remeter de novo o processo ao Tribunal de Justiça.
26. A minha conclusão no que toca ao primeiro fundamento será breve. Resulta do teor do artigo 47.° , primeiro parágrafo, do Estatuto, que em caso da remessa, por despacho, de um recurso do Tribunal de Justiça para o Tribunal de Primeira Instância e vice-versa, do Tribunal de Primeira Instância para o Tribunal de Justiça, o processo considera-se regularmente apresentado neste segundo órgão jurisdicional, mesmo estando, no dia do despacho de remessa, expirado o prazo de recurso. De onde deduzo que, para apreciar se um recurso foi interposto dentro do prazo fixado, basta ter em conta a data em que a petição foi apresentada pela primeira vez, quer tenha sido na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância ou na do Tribunal de Justiça.
27. Além disso, esta interpretação é confirmada pelo artigo 3.° , n.° 6, das Instruções ao secretário do Tribunal de Primeira Instância, que dispõe que em caso de transmissão de uma petição pela Secretaria do Tribunal de Justiça à do Tribunal de Primeira Instância, a data de apresentação que deve figurar no registo é a data em que a petição foi apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça. Apesar de não existir qualquer instrução expressa destinada ao secretário do Tribunal de Justiça a este respeito, este aplica este modo de proceder, em conformidade com o segundo parágrafo do artigo 47.° do Estatuto.
28. Por conseguinte, não colhe o primeiro fundamento que conclui pela inadmissibilidade do recurso do Parlamento.
29. A minha conclusão é idêntica no que respeita ao segundo fundamento. Estando estabelecido que o recurso foi interposto dentro do prazo, a forma como uma petição dirigida por erro ao Tribunal de Primeira Instância foi transmitida por este ao Tribunal de Justiça não tem qualquer incidência sobre a admissibilidade do recurso. É à luz destas considerações que cabe interpretar os primeiro e segundo parágrafos do artigo 47.° do Estatuto.
30. Do ponto de vista do princípio da economia processual, importa interpretar amplamente o âmbito de aplicação do artigo 47.° , primeiro parágrafo, do Estatuto, aí incluindo não apenas o caso em que a petição é «dirigida por erro» à secretaria de um órgão jurisdicional ao qual não se destinava, mas também os casos em que a petição é dirigida por erro à secretaria de um órgão jurisdicional incompetente, quando for evidente, à primeira vista, que deveria ter sido dirigida à secretaria do outro órgão jurisdicional. A fim de corrigir estes erros «técnicos», o procedimento apropriado por excelência é o do artigo 47.° , primeiro parágrafo, do Estatuto. Portanto, é este o procedimento que na prática é utilizado pelos secretários do Tribunal de Primeira Instância e do Tribunal de Justiça.
31. No que toca aos casos em que a apresentação de uma petição numa das secretarias não constitui um erro manifesto, é o procedimento mais árduo do artigo 47.° , segundo parágrafo, do Estatuto que é aplicável. Nessa hipótese, o Tribunal de Primeira Instância (ou, eventualmente, o Tribunal de Justiça) deve, após exame prévio, proferir despacho em que se declare incompetente para conhecer do recurso.
32. No caso em apreço, não podia haver qualquer dúvida de que o recurso interposto pelo Parlamento deveria ter sido dirigido ao Tribunal de Justiça. Foi correctamente que o secretário do Tribunal de Primeira Instância, no seu ofício de 21 de Abril de 1999, chamou a atenção do Parlamento para o facto de que, por força do artigo 3.° , n.° 1, alínea c), da decisão que institui o Tribunal de Primeira Instância , este último é incompetente para se pronunciar com base numa cláusula compromissória, nos termos do artigo 238.° E, nos recursos interpostos por uma instituição comunitária. A sua intenção, a este respeito, de transmitir a petição ao secretário do Tribunal de Justiça, em conformidade com o primeiro parágrafo do artigo 47.° do Estatuto, constituía a sequência lógica dessa conclusão.
33. Por conseguinte, o segundo fundamento que contesta a admissibilidade do recurso do Parlamento também não pode ser acolhido.
b) A admissibilidade do recurso subordinado da SERS e do município de Estrasburgo
34. Não partilho da conclusão do Parlamento de que o recurso subordinado da SERS e do município de Estrasburgo contra a decisão do tribunal arbitral é inadmissível por ter sido interposto fora de prazo, uma vez que só foi apresentado com a contestação inscrita no registo da Secretaria em 8 de Março de 2000.
35. A decisão do tribunal arbitral era vinculativa para as partes, sem prejuízo da possibilidade de interposição de recursos. O conteúdo dessa decisão, ainda que não dê cabalmente ganho de causa a uma das partes interessadas, pode ser ainda assim aceitável para esta. Contudo, se a outra parte interpõe, por razões que lhe dizem respeito, recurso dessa decisão, com, portanto, a possibilidade do resultado final ser ainda mais desfavorável para a parte que se tinha resignado com essa decisão, resulta do princípio segundo o qual as partes implicadas no processo devem beneficiar da igualdade de armas que esta última parte também deve ter a possibilidade de invocar as suas críticas contra a decisão vinculativa que foi impugnada.
36. A este respeito, remeto também para o artigo 116.° , primeiro parágrafo, segundo travessão, do Regulamento de Processo, que prevê, para o recorrido nos recursos das decisões do Tribunal de Primeira Instância, um direito análogo de interpor recurso subordinado . A jurisprudência do Tribunal de Justiça confirma que este recurso subordinado é possível, mesmo estando expirado o prazo original para a interposição do recurso . Concluo, portanto, que o recurso subordinado da SERS e do município de Estrasburgo, cujo objecto coincide de resto com os pedidos que tinham apresentado no tribunal arbitral, é admissível.
37. A título superabundante, refiro ainda que o pedido reconvencional em questão também seria admissível por força das regras processuais francesas em matéria administrativa, a serem estas as aplicáveis .
c) A admissibilidade dos pedidos do Parlamento respeitantes à aplicação dos artigos 5.°1. e 6.°3. do contrato-quadro no contexto do não respeito do prazo contratual para a conclusão das obras
38. A posição defendida pela SERS e pelo município de Estrasburgo, segundo a qual o recurso do Parlamento se deve limitar aos elementos que foram objecto da decisão do tribunal arbitral, não encontra qualquer apoio no artigo 29.° do contrato-quadro ou no aditamento de 14 de Março de 1999.
39. Por força do artigo 1.° 1., do aditamento, as partes acordaram, para a resolução do seu diferendo relativo às divergências de interpretação e de aplicação dos artigos 3.° , 5.° , 6.° e 25.° do contrato-quadro no que toca à fixação da data contratual para a conclusão das obras, sujeitar estas questões a um tribunal arbitral. Por força do n.° 2, segundo parágrafo, comprometeram-se a respeitar esta decisão do tribunal arbitral, salvo se dela interpuserem recurso para o órgão jurisdicional mencionado no artigo 29.° do contrato-quadro.
40. Contudo, do ponto de vista do seu objecto, esse carácter vinculativo apenas respeita às questões descritas no artigo 1.° 1., do aditamento. Para além destas questões, as partes mantêm a possibilidade de submeter ao órgão jurisdicional referido no artigo 29.° do contrato-quadro os demais diferendos que as possam opor no que toca à execução deste último.
41. O Parlamento, em meu entender correctamente, alega que uma concepção segundo a qual o Tribunal de Justiça deverá pronunciar-se separadamente sobre críticas suscitadas contra a decisão do tribunal arbitral e, seguidamente e no âmbito de um processo separado, sobre as demais questões referentes à execução do contrato-quadro não prospera à luz do princípio da economia processual.
42. Acrescento igualmente que, à luz do seu conteúdo, as questões submetidas ao tribunal arbitral no que respeita à interpretação e à aplicação do contrato-quadro prendem-se estreitamente com os pedidos do Parlamento com os quais esta instituição solicita ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a data em que deveria estar concluído o novo imóvel em conformidade com as disposições do contrato-quadro, com as consequências que daí decorrem nos termos dos artigos 5.° 1. e 6.° 3. do referido contrato.
43. Por conseguinte, sou do parecer que no caso em apreço o Tribunal de Justiça pode plenamente conhecer e decidir do mérito dos pedidos apresentados pelo Parlamento.
C - Interpretação dos artigos 3.°2., 3.°3., 5.° e 6.°3. do contrato-quadro
1) A decisão do tribunal arbitral
44. As partes no contrato-quadro submeteram ao tribunal arbitral as seguintes questões respeitantes à interpretação dos artigos 3.° 2., 3.° 3., 5.° e 6.° 3.:
- Qual é o mecanismo previsto pelas disposições dos artigos 3.° 2., 3.° 3. e 5.° do contrato-quadro para a fixação da data contratual para a conclusão das obras do imóvel?
- No que toca mais precisamente à cláusula de exoneração do pagamento dos juros intercalares pelo Parlamento decorrente do último parágrafo do artigo 6.° 3. do contrato-quadro, o que se deve entender pela expressão «falta imputável à SERS» ou «atraso que não seja considerado justificado pelo órgão jurisdicional mencionado no artigo 29.° »?
45. Quanto à primeira questão, o Parlamento, por um lado, e a SERS, por outro, estavam divididos pelas concepções diferentes que a decisão do tribunal arbitral resume no seu título V.2.
46. Para o Parlamento, há que distinguir entre as disposições dos artigos 3.° 2. e 5.° , por um lado, e a do artigo 3.° 3., por outro. O artigo 3.° 2. fixará uma data contratual para a conclusão das obras que só poderá ser protelada nos termos das causas de prorrogação previstas pelo artigo 5.° 2. As causas previstas pelo artigo 3.° 3. não podem ser tomadas em consideração para esse efeito. O único objecto desta última disposição será de fixar o período estimado para a realização das obras. A função do artigo 3.° 3. no sistema do contrato será:
- por um lado, precisar o período estimado em consequência do qual foi determinada a data para a conclusão das obras (36 meses) e,
- por outro, prever as causas de prorrogação do referido período, mas apenas no quadro de um limite máximo de três meses que expirava, em todo o caso, em 31 de Dezembro de 1997.
Assim, terá sido por adição do período estimado fixado para a construção e do prazo suplementar concedido à SERS na condição de estar devidamente justificado por uma das causas de prorrogação, de ampla interpretação, do artigo 3.° 3. que terá sido determinada a data de 31 de Dezembro de 1997 que figura no artigo 3.° 2.
47. Para a SERS, as estipulações dos artigos 3.° 3. e 5.° 2. devem ser cumuladas para a determinação da data contratual para a conclusão das obras. Em seu entender, a data para a conclusão das obras é, na realidade, definida pelo artigo 5.° 1., na medida em que nele se faz alusão aos «36 meses referidos no artigo 3.° 3.» O que permitirá afirmar que a data contratual para a conclusão das obras deverá ser determinada por aplicação de um prazo de 36 meses calculado a contar de 1 de Outubro de 1994, acrescido de um prazo fixo de três meses, podendo esse todo ser prorrogado, nos termos tanto das causas de prorrogação a que se refere o artigo 3.° 3. como aquelas a que se refere o artigo 5.° 2.
48. A este respeito, no título V.3. da sua decisão, o tribunal arbitral considerou que se deviam interpretar as estipulações pertinentes do contrato de forma a evitar que algumas das suas cláusulas fiquem destituídas de qualquer utilidade ou sejam consideradas redundantes. O que o conduziu a considerar que:
- em primeiro lugar, o contrato comporta duas séries de estipulações bem distintas, as do artigo 3.° 3. referentes ao período estimado e as dos artigos 3.° 2. e 5.° respeitantes à data para a conclusão das obras;
- em segundo lugar, que o contrato prevê causas de prorrogação que são elas próprias diferentes no que toca ao período estimado e à data para a conclusão das obras;
- em terceiro lugar, que, de forma constante, o contrato relaciona a data para a conclusão das obras fixada no artigo 3.° 2. com as causas de prorrogação previstas pelo artigo 5.° 2. Designadamente, assim é, nos artigos 5.° 1. e 6.° 3., e
- em quarto lugar, que o artigo 5.° 1. estipula que:
«même au cas où le délai de 36 mois visé à l'article 3.° 3. dépasserait la date prévue à l'article 3.° 2. éventuellement prorogé[e] en vertu de l'article 5.° 2., la SERS sera redevable, à partir de la date visée à l'article 3.° 2. éventuellement prorogé[e] en vertu de l'article 5.° 2. de plein droit et sans formalité, d'une pénalité [...]».
Segundo os árbitros, esta estipulação, apesar da falta de concordância entre o substantivo «date» e o particípio passado «prorogé» que perturba a sua interpretação, mas que as partes acordaram reconhecer como tal, só pode ter o seguinte sentido: qualquer colocação à disposição do imóvel após o prazo fixado pelo artigo 3.° 2., eventualmente protelado por uma das causas de prorrogação do artigo 5.° 2., origina o pagamento das penalidades por mora previstas no contrato, mesmo quando o período estimado fixado no artigo 3.° 3. tenha sido excedido em razão de causas de prorrogação legítimas previstas no artigo 3.° 3., mas não retomadas no artigo 5.° 2. Por conseguinte, os próprios termos do artigo 5.° 1., conjugado com as estipulações que relacionam o artigo 3.° 2. (data para a conclusão das obras) com o artigo 5.° 2. (causas de prorrogação da data para a conclusão das obras), obrigam a proceder a uma distinção entre o período estimado do artigo 3.° 3. e a data para a conclusão das obras. Por estas razões, o tribunal arbitral conclui que a data contratual para a conclusão das obras corresponde a 31 de Dezembro de 1997, com as eventuais prorrogações, mas apenas em razão das causas previstas no artigo 5.° 2., e que é a partir desta data que começam a vencer as penalidades por mora.
49. o que respeita à interpretação do artigo 6.° 3., último parágrafo, do contrato-quadro, o tribunal arbitral considerou, no título VIII da sua decisão, que o regime dos juros intercalares é autónomo relativamente às penalidades por mora. O que se explicará pela diferença dos seus objectivos respectivos. Resulta do artigo 6.° 3., último parágrafo, que a exoneração da obrigação referente ao pagamento de juros intercalares está sujeita à dupla condição de:
- por um lado, a data para a conclusão efectiva das obras do imóvel ser posterior à data contratual para a conclusão destas obras;
- por outro lado, esta diferença no tempo ser imputável a uma falta da SERS ou então resultar de um atraso não considerado justificado pelo órgão jurisdicional referido no artigo 29.°
Segundo o tribunal arbitral, há que entender por «falta» imputável à SERS a falta cometida por esta sociedade, com exclusão das imputáveis aos seus co-contratantes ou aos seus subempreiteiros. No que respeita à interpretação da expressão «atrasos não considerados justificados pelo órgão jurisdicional referido no artigo 29.° », o tribunal arbitral considera que as partes devem inspirar-se nas causas de prorrogação enumeradas no artigo 3.° 3., na medida em que são mais amplas do que as previstas no artigo 5.° 2.
2) Fundamentos e argumentos das partes
50. No seu recurso subordinado, a SERS e o município de Estrasburgo tomam antes de mais por alvo o título V da decisão do tribunal arbitral, respeitante à determinação da data contratual para a conclusão das obras nos termos dos artigos 3.° 2. e 5.° 1. do contrato-quadro.
51. Mantêm a posição que defenderam perante o tribunal arbitral, segundo a qual a data contratual para a conclusão das obras será determinada por aplicação do período de 36 meses visado no artigo 3.° 3., aumentado de um prazo fixo de três meses e podendo seguidamente ser protelado pelas causas de prorrogação referidas nos artigos 3.° 3. e 5.° 2. Esta posição repousa essencialmente na leitura dos artigos 3.° 2. e 3.° 3. do contrato-quadro, nos quais a utilização consequente do termo «prévu» (previsto) demonstrará que a data de 31 de Dezembro de 1997 é apenas uma «date prévisionelle» (data estimada), que, a esse título, não pode constituir o termo de um prazo para a conclusão das obras imperativo e irrevogável.
52. Esta interpretação será, além disso, confortada pela enumeração das causas legítimas de prorrogação do prazo estimado de 36 meses que, dada a utilização do termo «notamment» (nomeadamente), tem carácter não exaustivo.
53. Segundo esta interpretação, nos termos da qual a data para a conclusão das obras em 31 de Dezembro de 1997, considerada como «prévisionnel», poderá ser protelada nos termos das causas enumeradas no artigo 3.° 3., o artigo 5.° 1. deverá então ser lido no sentido de que as penalidades por mora só são devidas quando não exista qualquer razão legítima para a prorrogação do referido prazo para a conclusão das obras do imóvel. A manutenção da data de 31 de Dezembro de 1997 como ponto de início para a aplicação conjunta dos artigos 5.° 1. e 5.° 2. conduzirá a um resultado paradoxal, ou seja, o da SERS poder, mesmo no respeito do contrato-quadro, concluir as obras do imóvel após essa data e estar ainda assim obrigada ao pagamento de penalidades por mora.
54. O Parlamento, que partilha do entendimento dos árbitros expresso no título V.3. da sua decisão, sustenta que decorre do artigo 5.° 1. que a data de 31 de Dezembro de 1997 tem carácter absolutamente firme. O que se demonstra pelo automatismo da sanção prevista por esta cláusula penal em caso de ultrapassagem do prazo. O facto de esta data poder ser prorrogada nos termos dos artigos 5.° 2. e 5.° 3. nada retira ao seu carácter incondicional. Com efeito, mesmo as prorrogações do prazo para a conclusão das obras que estas disposições permitem são calculadas a partir da data de 31 de Dezembro de 1997.
55. O Parlamento refere que a interpretação a que procedeu o tribunal arbitral do artigo 6.° 3. do contrato-quadro não foi praticamente motivada. Segundo o último parágrafo do artigo 6.° 3., os juros intercalares não são devidos em caso de atraso - ou seja, conclusão das obras após a data contratual para o efeito - quer este resulte de um comportamento culposo da SERS quer não seja considerado justificado pelo órgão jurisdicional referido no artigo 29.°
56. No que respeita ao segundo termo desta condição alternativa, ou seja, a hipótese de um atraso não considerado justificado pelo órgão jurisdicional competente, o Parlamento sustenta que o artigo 6.° do contrato-quadro não comporta qualquer disposição que permita reconhecer um atraso como justificado ou não em condições autónomas relativamente ao resto do contrato. Na medida em que o último parágrafo do artigo 6.° 3. só pode produzir efeitos após a data contratual para a conclusão das obras, o carácter justificado ou não de um atraso só pode ser apreciado, segundo o Parlamento, à luz do artigo 5.° 2. É antes de mais por aplicação desta disposição que se determina a data contratual para a conclusão definitiva das obras.
57. Daí conclui que um atraso, na acepção do artigo 6.° 3. do contrato-quadro, só se justifica se:
- a SERS tiver informado o Parlamento, logo após a sua ocorrência, de qualquer eventual causa de atraso reconhecida pelo artigo 5.° 2. e lhe tiver pedido um prazo suplementar, correspondendo a uma prorrogação da data contratual para a conclusão das obras;
- as partes tiverem fixado este prazo suplementar de comum acordo;
- a SERS tiver indicado ao Parlamento quais foram as medidas correctivas adequadas que tomou para recuperar esse atraso.
58. No que respeita à hipótese de o atraso resultar de uma falta cometida pela SERS, o Parlamento alega que esta última desempenhava, na sua qualidade de dono da obra, um papel essencial para a realização do projecto. A este título, devia zelar pelo bom andamento do projecto, fiscalizar as obras de construção e assegurar-se de que os empreiteiros eram pagos. A SERS deveria ainda ter dado as instruções adequadas aos executantes e às empresas presentes no estaleiro de construção e assumir as respectivas responsabilidades, com todas as consequências inerentes. De resto, esta responsabilidade constitui a contrapartida da substancial remuneração que lhe foi paga pelo Parlamento.
59. A SERS e o município de Estrasburgo sustentam que não existe um nexo automático entre a imposição das penalidades por mora e a suspensão do vencimento dos juros intercalares prevista no artigo 6.° 3. do contrato-quadro. A dispensa de pagamento destes juros só se verificará caso se demonstre uma falta cometida pela SERS e se o órgão jurisdicional competente não considerar o atraso justificado. No que respeita à primeira condição, o tribunal arbitral terá correctamente considerado que o Parlamento devia demonstrar a existência de um comportamento ilícito da SERS e que deverá poder ser imputado a ela própria. Esta abordagem será, de resto, conforme com os princípios que regem, em direito francês, a responsabilidade do dono da obra. No que respeita à segunda condição, as recorridas referem que, mesmo podendo ser imputada uma falta à própria SERS, o órgão jurisdicional referido no artigo 29.° poderá considerar essa falta desculpável. Em apoio deste ponto de vista, invocam a decisão do tribunal arbitral.
3) Apreciação
60. Como dá a entender a decisão do tribunal arbitral, o contrato-quadro, no que toca ao seu teor e à sua sistemática, não constitui um modelo de clareza e, por essa razão, pode ser objecto de interpretações muito divergentes.
61. Se não nos deixarmos influenciar pela formulação um pouco infeliz dos artigos 3.° 2. e 5.° 1., não subsiste, contudo, qualquer dúvida de que existe uma relação essencial entre o artigo 3.° 2., por um lado, e o artigo 5.° 1., lido conjuntamente com os artigos 5.° 2. e 5.° 3., por outro.
62. No artigo 3.° 2., a data final para a conclusão das obras do imóvel foi fixada em 31 de Dezembro de 1997. Que não se trata de uma data estimada, mas sim de uma obrigação de resultado «firme», resulta do próprio teor desta disposição: «est prévu pour le 31 décembre 1997 au plus tard» . A utilização do termo «prévu» não tem por efeito - como defendem a SERS e o município de Estrasburgo - conferir a esta disposição um carácter condicional, no sentido de que a data aí referida constituirá uma data provável ou estimada. Na prática jurídica, este termo significa simplesmente «estabelecida» . O facto de o termo ser aqui utilizado nesse sentido é demonstrado pela parte da frase «au plus tard» que lhe foi acrescentada. Assim, é indiscutível que o prazo estabelecido para a construção foi predeterminado.
63. O artigo 5.° 1. confirma que 31 de Dezembro de 1997 constitui uma data final firme e incondicional. Segundo esta disposição, o período durante o qual as penalidades por mora são devidas começa a correr a partir, em princípio, de 31 de Dezembro de 1997 («la date visée à l'article 3.° 2.»).
64. Apesar da data de 31 de Dezembro de 1997, enquanto momento a partir da qual são devidas as penalidades, poder ser protelada pelas razões referidas nos artigos 5.° 2. e 5.° 3., o certo é que continua a constituir a data de referência desta cláusula penal, pois que as derrogações ao prazo contratual para a conclusão dos trabalhos que permitem os artigos 5.° 2. e 5.° 3. são calculadas a partir desta data .
65. Se esta data só tivesse carácter condicional e pudesse ser protelada por qualquer uma das causas enumeradas no artigo 3.° 3., como afirmam as recorridas, a cláusula penal, na medida em que se destina a sancionar a ultrapassagem do prazo contratual, ficaria antecipadamente privada do seu efeito. Uma interpretação que seria assim contrária ao objectivo da cláusula também não encontra apoio nas disposições do artigo 5.° 1. e 3.° 3.
66. No artigo 3.° 3., que respeita ao período estimado («prévisionnel») de 36 meses, a expirar em princípio em 1 de Outubro de 1997, prevê-se que o prazo para a conclusão das obras, no sentido deste preceito («au sens de ce sous-article»), pode ser prorrogado pela razões que enumera de forma não exaustiva. Por conseguinte, as causas de prorrogação do artigo 3.° 3. só valem no âmbito da aplicação desta disposição. Portanto, só podem dizer respeito ao período decorrido entre 1 de Outubro de 1997 (a data de expiração do período «estimado» de 36 meses) e 31 de Dezembro de 1997 (a data de expiração do prazo para a conclusão das obras, sob reserva do previsto nos artigos 5.° 2. e 5.° 3.).
67. Por estas razões, chego à mesma conclusão que o tribunal arbitral na sua decisão: a data contratual para a conclusão das obras é 31 de Dezembro de 1997, eventualmente prorrogada pelas causas enumeradas nos artigos 5.° 2. e 5.° 3. É a partir desta data que são devidas as penalidades por mora.
68. Concluo, portanto, que não procede o recurso subordinado interposto pela SERS e o município de Estrasburgo contra o título V.3. da decisão do tribunal arbitral.
69. Os fundamentos que o Parlamento invoca contra o título VIII da decisão do tribunal arbitral não são, em meu entender, mais convincentes.
70. Apesar da decisão dos árbitros ser sobre este ponto de uma concisão digna do historiador latino Tácito, o seu raciocínio é irrefutável.
71. Por força do artigo 6.° 3., último parágrafo, do contrato-quadro, o período durante o qual o Parlamento está exonerado da sua obrigação de pagamento de juros intercalares começa a correr a partir da data contratual para a conclusão das obras decorrente das disposições dos artigos 3.° 2. e 5.° 1., lidos conjuntamente com os artigos 5.° 2. e 5.° 3.
72. Esta exoneração está, todavia, sujeita a uma condição alternativa:
- o atraso que ultrapasse o prazo contratual para a conclusão das obras deve resultar de um comportamento culposo imputável à SERS
ou
- não deve ser reconhecido justificado pelo órgão jurisdicional referido no artigo 29.°
73. Não partilho do ponto de vista do Parlamento de que o atraso só poderia ser «justificado» pelas causas enumeradas no artigo 5.° 2., o que implica a contrario que não se podem admitir outras causas de justificação.
74. Pelo contrário, as razões ou causas possíveis de um atraso que adie a conclusão das obras do imóvel para além da data prevista contratualmente para esse efeito devem ser apreciadas de forma distinta, a fim de determinar se decorrem de uma falta por parte da SERS ou se não poderão justificar o atraso por motivos diversos.
75. Assim interpretada, a decisão do tribunal arbitral é, em meu entender, correcta.
76. Por conseguinte, concluo que os fundamentos invocados pelo Parlamento contra o título VIII da decisão do tribunal arbitral não são procedentes.
D - A aplicação dos artigos 3.°2., 3.°3., 5.°1., 5.°2., 5.°3. e 6.°3. do contrato-quadro às circunstâncias do caso em apreço
1) O contexto factual
77. Resulta dos autos que ocorreram certos incidentes após a assinatura do contrato-quadro de natureza a influenciar o andamento das obras. Segundo os autos, alguns destes incidentes foram objecto de uma troca de correspondência, por vezes seguida de uma concertação mais aprofundada entre o Parlamento e a SERS. Para outros incidentes, tal não se verificou. É, antes de mais, esta constatação que decorre das peças apresentadas pelas partes no tribunal arbitral.
78. O primeiro convite para a apresentação de propostas lançado na Primavera do ano de 1994 no que respeita aos toscos para o novo edifício do Parlamento gorou-se devido à existência de um conluio em matéria de preços entre as empresas proponentes. De tal facto foi informado o Parlamento. Decorre da troca de correspondência que se seguiu entre o Parlamento e a SERS (respectivamente, cartas de 6 de Outubro de 1994 e de 5 de Janeiro de 1995) que o Parlamento se inquietava das consequências destas ocorrências sobre o respeito dos prazos previstos pelo contrato-quadro, ao passo que a SERS não lhe atribuía tanta importância. Esta última deixava a entender que, apesar do atraso ocasionado, havia amplamente tempo para concluir a construção dentro dos referidos prazos.
79. Nas suas alegações de 2 de Março de 1999 dirigidas ao tribunal arbitral, a SERS menciona, contudo, que a adjudicação definitiva só se verificou em 2 de Fevereiro de 1995 e que as obras no estaleiro só começaram efectivamente em 3 de Abril, ou seja, com um atraso de mais de seis meses. Por essa razão, pediu uma prorrogação do prazo para a conclusão das obras de 128 dias.
80. Neste mesmo documento, a SERS alega que uma das empresas às quais foi adjudicada uma parte das obras, ou seja, o grupo DRE-Lefort-Francheteau, decidiu, após a adjudicação, não se contentar com o preço acordado e, com o pretexto de que não tinha sido celebrado qualquer acordo válido, interrompeu, em 6 de Setembro de 1995, as suas obras no estaleiro. A necessidade de lançar um novo convite para apresentação de propostas traduziu-se num atraso de 53 dias úteis. Não resulta das demais peças dos autos que o Parlamento tenha sido informado em tempo útil dessa circunstância.
81. Por cartas de 1 de Março, 11 de Abril e 9 de Julho de 1996 e de 3 de Fevereiro, 9 de Abril e de 13 de Agosto de 1997, a SERS informou o Parlamento de que tinham ocorrido intempéries que justificavam, em seu entender, uma protelação da data para a conclusão das obras. Nestas cartas, apoiava-se, tanto unicamente no artigo 5.° 2. do contrato-quadro como nos artigos 3.° 3. e 5.° 2. do referido contrato. Tudo somado, a SERS pediu o benefício, em razão das intempéries, de uma protelação do prazo para a conclusão das obras de 80 dias.
82. O Parlamento reagiu a esta correspondência por cartas datadas de 18 de Março, 25 de Março, 21 de Junho, 10 de Julho e 18 de Julho de 1996. Nestas afirmou, de forma constante, que a prorrogação do prazo não tinha carácter automático, mas pressupunha o consentimento mútuo das partes. Além disso, os eventuais atrasos imputáveis às intempéries deviam ser devidamente justificados. Nesta correspondência, a SERS foi convidada a precisar por que razão e em que medida as condições meteorológicas tinham afectado o andamento das obras e quais tinham sido os seus efeitos sobre a evolução global das obras de construção.
83. Resulta de uma carta enviada pelo Parlamento à SERS bastante após essa data, ou seja, em 10 de Dezembro de 1997, que tinha sido acordado, no início do mês de Dezembro de 1997, realizarem-se contactos a fim de determinar se era possível encontrar uma posição comum no que respeita à protelação dos prazos. Pelo que se pode verificar, estes contactos não conduziram a qualquer resultado.
84. Em 27 de Junho de 1995, o competente director-geral do Parlamento assinou a fiche modificative PEU 008 respeitante a certas alterações a introduzir no hemiciclo do edifício. Segundo o seu conteúdo, as alterações pedidas podiam originar um atraso na evolução crítica do calendário das obras de 20 dias úteis.
85. Numa carta de 29 de Julho de 1997, o Parlamento confirmou a sua aprovação da fiche modificative PEU 055, respeitante à instalação de uma rede informática. Esta alteração terá exigido cinco dias suplementares.
86. Nas suas alegações enviadas ao tribunal arbitral, a SERS refere ainda atrasos suplementares devidos:
- aos não cumprimentos por parte das empresas: 106 dias úteis;
- às greves: quatro dias úteis;
- às consequências de intempéries e de levantamento de barreiras nas entradas devido ao gelo: dezasseis dias úteis;
- às intimações administrativas: 20 dias úteis;
- ao abandono das obras pelo estucador: 28 dias úteis.
Também não parece, vistos os autos, que esses atrasos tenham sido notificados pela SERS ao Parlamento ou que entre ambos se tenha realizado uma qualquer concertação.
87. Para estabelecer os factos dos autos, também é importante considerar dois relatórios redigidos pelo gabinete de engenharia Bovis, que o Parlamento consultou durante o período da construção. O primeiro relatório, datado de 20 de Agosto de 1997, afirma que o pessoal empregue nas obras era absolutamente insuficiente para permitir terminá-las em meados de Abril de 1998, data então estimada para a conclusão das obras. O Parlamento exprimiu então, por carta de 16 de Setembro de 1997 enviada à SERS e ao município de Estrasburgo, a sua preocupação a esse respeito e insistiu para que fossem tomadas medidas necessárias para garantir que a ultrapassagem do prazo permanecesse limitada.
88. No segundo relatório, de 19 de Novembro de 1997, o gabinete Bovis referiu-se a um agravamento do atraso das obras relativamente ao calendário previsto e indicou que, visto o ritmo das obras, mesmo a data de 25 de Maio, que era então a última data anunciada para a conclusão das obras, não seria respeitada. Em duas cartas enviadas à SERS, em 6 de Abril e de 5 de Maio de 1998, o Parlamento declarou que esta data também não lhe parecia ser realista e fazia menção dos problemas logísticos e orçamentais que tal lhe colocava. Não se encontra nos autos qualquer reacção das SERS em resposta às críticas do Parlamento de que a evolução do pessoal ocupado nas obras e a sua afectação, bem como o volume dos pagamentos após o mês de Junho de 1997, eram absolutamente insuficientes para assegurar a conclusão do imóvel no prazo fixado, ou mesmo para manter o atraso relativamente aos prazos fixados dentro de limites aceitáveis.
89. Entretanto, o Parlamento tinha recordado à SERS, através da missiva de 10 de Dezembro de 1997 mencionada no n.° 83, que o prazo contratual para a conclusão das obras chegava a seu termo em 31 de Dezembro de 1997. Na mesma missiva, o Parlamento observava ainda que as cartas da SERS através das quais esta comunicava os atrasos devidos às intempéries em nada alteravam esse facto, dado que os atrasos alegados não tinham sido objecto de qualquer justificação ou estavam insuficientemente justificados. Além disso, o Parlamento declarava que, na falta de acordo entre ele próprio e a SERS a esse respeito, como prevê o artigo 5.° 2. do contrato-quadro, o dia 1 de Janeiro de 1998 mantinha-se como a data contratual para a conclusão das obras.
2) Apreciação
a) Observações prévias
90. No quadro do exame dos vários factos e circunstâncias alegados pela SERS e o município de Estrasburgo, e que constituem em seu entender causas legítimas de justificação, ou nos termos do artigo 3.° 3., ou nos termos do artigo 5.° 2., importa antes de mais referir que os autos são, a este respeito, incompletos. Assim é, em todo o caso, no que toca aos atrasos alegados que se prendem com o abandono das obras pelo grupo DRE-Lefort-Francheteau e pelo estucador. O mesmo se diga no que respeita aos atrasos alegados que se prendem com os não cumprimentos por parte de empresas, às greves, às intempéries, ao gelo e às intimações administrativas.
91. Mesmo admitindo que estes factos e circunstâncias poderiam constituir causas de justificação nos termos, ou do artigo 3.° 3. ou do artigo 5.° 2., os documentos juntos aos autos não permitem estabelecer em que medida afectaram concretamente o andamento das obras de construção.
92. Estas observações também se aplicam aos atrasos que se prendem com as intempéries. Se é certo que os autos contêm uma correspondência abundante a este respeito, os documentos que os acompanham não dão indicações suficientes para permitir determinar se e em que medida a sua ocorrência atrasou as obras de construção. Adiante regressarei a esta questão.
93. A minha segunda observação refere-se aos contactos ocorridos entre o Parlamento e a SERS no que respeita às circunstâncias que poderiam, em conformidade com o contrato-quadro, justificar o recurso aos artigos 3.° 3. e 5.° 2. Cada uma destas disposições prevê, a este respeito, um contacto e uma concertação das partes. Por força do artigo 3.° 3., um atraso, para que possa ser invocado, deve ser devidamente justificado, ao passo que as prorrogações do prazo para a conclusão das obras nos termos do artigo 5.° 2. exigem o consentimento mútuo das partes. Apesar de tê-lo recordado com insistência e por diversas vezes o Parlamento na sua correspondência com a SERS, os autos, salvo uma única excepção que referirei adiante, não contêm qualquer indício que demonstre que estes contactos, seguidos de concertação, se realizaram efectivamente.
94. Em terceiro lugar, e uma vez mais sob reserva de uma única excepção, não resulta dos autos que a SERS tenha informado o Parlamento, no quadro da sua obrigação de comunicar o andamento das obras, de qualquer iniciativa que tenha tomado para compensar o atraso provocado pelas ocorrências ora em causa. A mesma conclusão se impõe após o Parlamento lhe ter assinalado, no segundo semestre do ano de 1997, a falta de pessoal ocupado nas obras e os atrasos que podiam decorrer desse facto.
95. Em quarto lugar, pode-se inferir dos fundamentos e argumentos invocados pelo Parlamento que este considerou implicitamente que a margem de três meses para a protelação do período estimado de construção de 36 meses, decorrente da conjugação dos artigos 3.° 2. e 3.° 3., já não é de actualidade na presente instância. Por conseguinte, basta que o Tribunal de Justiça analise a questão de saber quais as consequências que as circunstâncias anteriormente descritas, nos n.os 77 a 89, inclusive, têm no que toca à aplicação dos artigos 5.° 1., 5.° 2., 5.° 3. e 6.° 3. do contrato de base.
96. Por força do artigo 5.° 2., a data contratual para a conclusão das obras de 31 de Dezembro de 1997 pode ser prorrogada pelas seguintes causas:
«1) força maior ou caso fortuito devidamente estabelecido;
2) decisão de um tribunal administrativo ou judicial que ordene a paralisação das obras;
3) catástrofe natural, guerra, terrorismo, escavações arqueológicas;
4) intempéries reconhecidas pela Caisse des congés payés du bâtiment de Strasbourg;
5) atrasos na obtenção de licença(s) administrativa(s) devidos às autoridades a quem incumbe a sua instrução ou emissão, com excepção daquelas para os quais é competente o município de Estrasburgo.
97. Em razão das circunstâncias anteriormente descritas, as causas mencionadas nos pontos 1), 2) e 4) podem - eventualmente - ser invocadas. Analisarei seguidamente os factos dos autos para verificar a aplicação destas causas. Posteriormente, analisarei a questão de saber se e em que medida se deverá aplicar o disposto no artigo 5.° 3. no que respeita à prorrogação da data para a conclusão das obras. Por último, examinarei mais demoradamente a aplicação, no contexto anteriormente descrito, do artigo 6.° 3.
b) Força maior
98. Segundo a doutrina francesa em direito administrativo, o conceito de força maior abrange três elementos constitutivos:
- extériorité, significa o facto de ser independente da vontade da pessoa que invoca esta causa de justificação;
- imprévisibilité, significa que o facto deve ter sido anormalmente imprevisível, e
- irrésistibilité, significa que as consequências não poderiam ter sido evitadas mesmo com a maior diligência .
99. O primeiro incidente invocado pela SERS e que pode ser considerado como caso de força maior é o malogro do primeiro convite para apresentação de propostas que, em seu entender, terá provocado 128 dias úteis de atraso.
100. A este respeito, o tribunal arbitral declarou, na sua decisão, que tal se verificou independentemente da vontade da SERS. Além disso, tratar-se-á de uma ocorrência imprevisível, pois que a SERS, como autoridade adjudicante, não podia razoavelmente prever que os potenciais proponentes iriam cometer um delito, conluindo-se no que respeita aos preços.
101. O principal problema com que se defrontou o tribunal arbitral respeita ao carácter invencível das consequências do malogro do convite para apresentação de propostas. Julgou assente que, em sua consequência, as obras tiveram início com um atraso de cerca de seis meses e que este atraso, relativamente ao período de 36 meses previsto para as obras, pode surgir como impossível de recuperar. Refere, a este respeito, a declaração do representante do Parlamento segundo a qual o malogro do primeiro convite para apresentação de propostas teria podido, no entender do Parlamento, justificar a protelação da data contratual para o início dos trabalhos e, por conseguinte, uma prorrogação da data contratual para a conclusão das obras na respectiva medida, caso a SERS lhe tivesse feito o pedido. O tribunal arbitral considera seguidamente que o novo convite para apresentação de propostas foi benéfico para o Parlamento, pois permitiu reduzir de forma substancial os custos da construção.
102. É certo que, na sua carta de 20 de Dezembro de 1994, a SERS garantiu ao Parlamento que respeitaria os prazos previstos no contrato-quadro, apesar do atraso sofrido, mas o tribunal arbitral não considerou que esta carta fosse determinante. Em seu entender, os elementos constitutivos da força maior têm carácter objectivo. Portanto, devem ser apreciados em si mesmos, independentemente da estimativa, eventualmente errada, que deles fez uma das partes num momento em que todas as consequências desta ocorrência ainda não surgiam claramente.
103. Com base nestas considerações, o tribunal arbitral convidou as partes a se porem de acordo para examinar conjuntamente a posteriori o impacto do malogro do primeiro convite para apresentação de propostas sobre o andamento das obras. Será em função deste exame que deverão então decidir se se deverá admitir, e em que medida, que esta ocorrência seja considerada uma causa de prorrogação da data contratual para a conclusão das obras [título VII.1., capítulo A, secção 2, alínea a), da decisão do tribunal arbitral].
104. O Parlamento contesta o raciocínio do tribunal arbitral, invocando os seguintes argumentos:
- o pedido da SERS para que lhe seja concedida uma prorrogação do prazo contratual para a conclusão das obras de 128 dias úteis é intempestivo. Foi apenas após terem sido designados os árbitros, ou seja, muito após a ocorrência dos factos, que dele foi informado o Parlamento;
- o facto de a própria SERS ter admitido, na sua carta de 20 de Dezembro de 1994, que, apesar do resultado infrutuoso do primeiro convite para apresentação de propostas, a margem de que dispunha para terminar as obras do imóvel lhe permitia manter-se amplamente dentro do prazo para a conclusão das obras previsto pelo contrato-quadro. Além disso, o atraso invocado não surge nos relatórios mensais sobre o calendário previsional do andamento das obras. Com efeito, no relatório mensal n.° 34, de 6 de Fevereiro de 1997 - ou seja, menos de onze meses antes do termo da data contratual para a conclusão das obras -, o planning do calendário geral das obras de 31 de Outubro de 1996 não referia qualquer ultrapassagem significativa no que toca ao prazo previsto, ao passo que outros atrasos já tinham ocorrido nesse momento. Nestas circunstâncias, pode-se afirmar, como fizeram os árbitros, que a SERS procedeu, na sua carta de 20 de Dezembro de 1994, a uma estimativa errada das consequências decorrentes do malogro do convite para apresentação de propostas.
105. Segundo o Parlamento, resulta dos precedentes elementos que foi incorrectamente que o tribunal arbitral concluiu pelo carácter irresistível e invencível das consequências do primeiro convite para apresentação de propostas.
106. Resulta dos autos que o malogro do primeiro convite para apresentação de propostas, que se referia aos toscos, foi anunciado ao Parlamento e que esta circunstância conduziu a que as partes se concertassem. Na sua carta de 6 de Outubro de 1994, o Parlamento exprimiu a sua preocupação no que respeita à situação criada pelo malogro do primeiro convite para apresentação de propostas. Nesta mesma missiva, sublinhou a importância de se respeitar os prazos definidos no contrato-quadro, sob pena de serem devidas as penalidades por mora previstas por este último.
107. A SERS tentou sossegar o Parlamento sobre este ponto na sua carta de 20 de Dezembro de 1994, que lhe enviou em resposta. A este propósito, aí se encontra a afirmação expressa de que «o reatamento do processo de adjudicação, apesar do atraso sofrido, permitirá mantermo-nos amplamente dentro dos prazos previstos no contrato-quadro». Daí não resulta que se tenha procurado invocar um atraso justificável nos termos do artigo 5.° 2.
108. Decorre, além disso, do planning do calendário geral das obras de 1 de Janeiro de 1995, junto pelo Parlamento, que, à época, ou seja, mais de meio ano após o malogro do primeiro convite para apresentação de propostas, o planning previa ainda a conclusão das referidas obras o mais tardar no mês de Outubro de 1997.
109. É neste contexto que importa apreciar o fundamento relativo à força maior invocado pela SERS nas suas alegações de 2 de Março de 1999, dirigidas ao tribunal arbitral e assente no malogro do primeiro convite para apresentação de propostas referente aos toscos.
110. Começo por observar que, segundo uma jurisprudência constante do Conseil d'État francês, as cláusulas contratuais respeitantes à força maior devem ser estritamente respeitadas: quando a parte interessada não invoque a força maior nos prazos previstos, deixa de o poder fazer relativamente ao seu co-contratante .
111. É certo que a SERS comunicou em tempo útil ao Parlamento o malogro do primeiro convite para apresentação de propostas, mas não resulta de forma alguma dos autos que tenha invocado, nessa ocasião, a existência de um caso de força maior. Pelo contrário, pode-se concluir que não retirou desse incidente, quaisquer que tenham sido as suas consequências, qualquer motivo para o fazer. Nestas circunstâncias, a excepção de força maior, deduzida mais de quatro anos após perante os árbitros, mais não pode do que ser considerada intempestiva. Com efeito, segundo o artigo 5.° 2. do contrato-quadro, qualquer ocorrência em razão da qual a parte interessada invoque uma das causas de prorrogação da data contratual para a conclusão das obras previstas por esta disposição deve ser imediatamente assinalada. Sendo certo que os incidentes foram-no concretamente, não se verifica que estes tenham sido invocados para solicitar uma prorrogação.
112. Mesmo admitindo-se que a força maior foi invocada em tempo útil, não partilho do ponto de vista do tribunal arbitral de que as consequências do malogro do convite para apresentação de propostas tenham sido tais, à luz das circunstâncias, que a SERS só as pode suficientemente compreender no momento em que redigiu a sua carta de 20 de Dezembro de 1994. Esta carta foi redigida mais de meio ano após a ocorrência do facto e num momento em que a preparação do segundo convite para apresentação de propostas estava a tal ponto avançado que os riscos de atraso para o andamento das obras podiam ser perfeitamente avaliados. O planning do calendário geral mencionado no n.° 108, supra, confirma-o. Neste contexto, não se pode sustentar que as consequências do malogro do primeiro convite para apresentação de propostas tenham sido irresistíveis e inevitáveis para a SERS no que toca ao respeito da data contratual para a conclusão das obras ou que tenham, de forma irresistível e inevitável, impedido que a SERS respeitasse a data contratual para essa conclusão.
113. Tendo em conta estas considerações, entendo que a excepção de força maior que invoca a SERS devido ao malogro do primeiro convite para apresentação de propostas relativas aos toscos é intempestiva, inadmissível e, a título subsidiário, improcedente.
114. Na sua decisão, o tribunal arbitral abordou os casos de força maior invocados pela SERS relacionados com os não cumprimentos de certas empresas e, designadamente, com o abandono das obras pelo grupo DRE-Lefort-Francheteau e pelo estucador [título VII.1., capítulo A, secção 2, alínea d), da decisão].
115. O tribunal considerou, de um modo geral, que estes incidentes não podem inserir-se no conceito de força maior, na medida em que não satisfazem o critério da imprevisibilidade. Os casos de não cumprimento das suas obrigações por parte das empresas serão, com efeito, relativamente frequentes no que respeita à realização de obras importantes e são, portanto, considerados pela jurisprudência como riscos normais incorridos nas obras de construção.
116. Todavia, o tribunal arbitral admite uma excepção no que respeita ao não cumprimento das suas obrigações pelo grupo DER-Lefort-Francheteau, devido às condições específicas em que esta se verificou. Trata-se, no caso em apreço, de um grupo que, após lhe ter sido adjudicado a empreitada, se recusou a assinar o respectivo contrato. A SERS, na sua qualidade de autoridade adjudicante, não terá estado na posição de prever tal ocorrência. Portanto, este poderá ser considerado como um caso de força maior se as partes reconheçam como irrecuperável o importante atraso daí decorrente. Incumbe-lhes examinar essa questão.
117. Caso, todavia, venham a chegar à conclusão de que se trata de um caso de força maior, o tribunal arbitral considera que esta ocorrência não tem por efeito, em si mesma, desobrigar a SERS do seu dever de pagamento das penalidades por mora. Com efeito, a exoneração deste pagamento poderá conduzir a que o grupo de empresas não cumpridor das suas obrigações fique isento das consequências do seu comportamento ilícito e a que seja o Parlamento a suportar o prejuízo daí decorrente. Contudo, este prejuízo foi sofrido em primeiro lugar pela própria SERS e esta pode pedir reparação do mesmo ao referido grupo.
118. Caso o órgão jurisdicional competente chegue à conclusão de que o grupo DRE-Lefort-Francheteau não actuou ilicitamente, a questão do caso de força maior deverá ser então reexaminada pelas partes à luz desta decisão judicial.
119. O Parlamento contesta esta parte da decisão do tribunal arbitral na medida em que diz respeito ao grupo DRE-Lefort-Francheteau. A este propósito, avança dois argumentos. Em primeiro lugar e em conformidade com o artigo 24.° do contrato-quadro, as adjudicações celebradas pela SERS devem resultar directamente dos convites para apresentação de propostas que tenha organizado. Portanto, a recusa por parte de uma sociedade de assinar o contrato para o qual a sua proposta foi vencedora constituirá uma forma de incumprimento das obrigações que de forma alguma se distingue de outros tipos de incumprimento. Em semelhante caso, a SERS, como em todos os casos de abandono das obras pelas empresas, deveria ter assegurado a substituição desta empresa no respeito das condições fixadas pelo contrato-quadro.
120. Em segundo lugar, o Parlamento refere que a SERS intentou uma acção de indemnização contra o grupo em questão. Essa acção indica que o atraso invocado não resulta de um caso de força maior, mas sim de um facto ilícito de terceiro.
121. Observo que esta excepção de força maior, na medida em que o tribunal arbitral a tenha considerado como tal, é, ao que tudo leva a crer, intempestiva. Não resulta dos autos que os factos em que repousa, que ocorreram entre 3 de Fevereiro e 5 de Setembro de 1995, tenham sido levados imediatamente ao conhecimento do Parlamento, nem que tenham sido objecto, durante este período, de qualquer concertação entre as partes para efeitos da aplicação do artigo 5.° 2. do contrato-quadro. Se é esse efectivamente o caso, então a excepção de força maior deduzida nas alegações de 2 de Março de 1999 da SERS deve ser julgada inadmissível.
122. Quanto ao mérito, entendo que esta situação não pode ser qualificada como um caso de força maior. Apesar de uma atitude como a do grupo DRE-Lefort-Francheteau, que não cumpriu as obrigações que assumiu na sequência da conclusão de um processo de adjudicação, ser realmente excepcional, não se distingue de um modo fundamental dos outros tipos de incumprimento que podem cometer as empresas que participam em obras de construção. Visto que um incumprimento por parte de empresas pode, enquanto tal e seja qual for a sua causa, ocorrer frequentemente nas grandes obras de construção e que é, portanto, previsível para o dono da obra (maître d'ouvrage), o qual pode, pois, premunir-se, estipulando obrigações de resultado no que respeita aos prazos para a conclusão das obras, a verificação desta eventualidade, sejam quais forem as circunstâncias que a rodeiam, não pode justificar a invocação de um caso de força maior.
123. O meu ponto de vista é confortado pela doutrina e jurisprudência francesas, que se revelam extremamente restritivas no que toca à admissão de casos de força maior quando o incumprimento de um participante num concurso público possa ser imputável ao subempreiteiro ou a um terceiro .
124. Concluo, portanto, que a alegação de um caso de força maior no que toca ao incumprimento do grupo DRE-Lefort-Francheteau é inadmissível e, a título subsidiário, improcedente.
125. No que respeita aos dois outros casos em que a SERS invoca a existência de um caso de força maior, ou seja, a greve e o encerramento de estradas devido ao gelo, posso ser breve. A este respeito, os árbitros consideraram, no título VIII.1., capítulo A, secção 2, alíneas b) e c), da sua decisão, que tal só se poderia admitir em circunstâncias excepcionais. De resto, não resulta dos autos que a SERS tenha informado o Parlamento destas ocorrências em tempo útil a fim de se poder aplicar o disposto no artigo 5.° 2. do contrato-quadro, nem que se tenha verificado qualquer concertação a esse respeito entre as partes.
126. Em todo o caso e na medida em que a SERS não referiu ao tribunal arbitral ou ao Tribunal de Justiça qualquer circunstância específica que possa justificar o recurso à cláusula de força maior, esta alegação será, em meu entender, improcedente.
c) Intempéries
127. No que toca à pretensão da SERS de beneficiar de uma prorrogação da data contratual para a conclusão das obras de 80 dias em razão das intempéries que terão diminuído o ritmo das obras no estaleiro, o tribunal arbitral pronunciou-se do seguinte modo, no título VII.1., capítulo B, da sua decisão.
128. É certo que as intempéries podem, por força do artigo 5.° 2. do contrato-quadro, ser invocadas como causa justificativa para a obtenção da prorrogação da data contratual para a conclusão das obras caso sejam reconhecidas pela Caisse des congés payés du bâtiment de Strasbourg. Todavia, o tribunal arbitral acrescenta que a aplicação do artigo 5.° 2. pressupõe implicitamente que as situações aí enumeradas enquanto causas de prorrogação tenham realmente afectado o andamento das obras.
129. Por conseguinte, incumbe às partes entenderem-se para examinar as consequências concretas das intempéries reconhecidas pela Caisse des congés payés du bâtiment de Strasbourg sobre o efectivo andamento das obras de construção.
130. Na audiência no Tribunal de Justiça, o Parlamento salientou que a SERS parece, na correspondência que consigo trocou, partir do princípio errado de que o simples facto de ter assinalado o número de dias de atraso devidos a intempéries bastava para obter, de forma quase automática, a prorrogação da data contratual para a conclusão das obras. Esta concepção é juridicamente inexacta pois que, nos termos do artigo 5.° 2. do contrato-quadro, isso pressupõe o comum acordo das partes, o que exige a sua prévia concertação. Além disso, o artigo 25.° impõe que a SERS informe o Parlamento das medidas que preveja tomar para obstar aos atrasos.
131. O Parlamento sustenta que a concepção da SERS é também materialmente inexacta. Nem todas as condições meteorológicas adversas têm por efeito suspender a totalidade das obras no estaleiro. Portanto, é através de uma concertação que as partes estabelecem quais são as suas consequências concretas para o andamento das obras.
132. Constitui um facto geralmente reconhecido que as obras de construção ao ar livre são vulneráveis às intempéries: ao gelo e à neve, às chuvas abundantes e ao vento forte. As cláusulas que regulam as consequências dos atrasos devidos às condições atmosféricas adversas são, portanto, frequentes nos contratos de empreitada. A este respeito, o artigo 5.° 2. do contrato-quadro nada tem de excepcional.
133. Partilho da decisão do tribunal arbitral de que está implícita como condição no artigo 5.° 2. o facto de a simples ocorrência de um atraso devido a intempéries não justificar automaticamente, enquanto tal, uma prorrogação do prazo contratual para a conclusão das obras. Apenas contam as consequências concretas das condições atmosféricas adversas para o andamento das obras.
134. As intempéries não têm todas os mesmos efeitos. Por exemplo, uma tempestade pode tornar perigoso e impossível o prosseguimento num determinado estaleiro de certas obras sujeitas aos efeitos do vento, ao passo que praticamente não impede as demais actividades abrigadas no edifício. Por outro lado, quanto mais as obras avançam, menos vulneráveis são às intempéries. Normalmente, um edifício será protegido em primeiro lugar contra a chuva, seguidamente contra o vento e, por último, contra o gelo. A este respeito, há ainda que referir que as obras, enquanto tais, podem ser mais ou menos vulneráveis consoante as medidas de precaução que tenham sido tomadas. Por último, as consequências dos atrasos devidos a intempéries devem ser avaliadas à luz da importância assumida no que toca ao conjunto das actividades no estaleiro e ao seu impacto no andamento crítico do calendário das obras.
135. Neste contexto, impõe-se uma análise aprofundada de cada caso de atraso devido a intempéries para apreciar se, e em que medida, pode ser invocado para obter a prorrogação da data contratual para a conclusão das obras. A cláusula 5.° 2. do contrato-quadro, que prevê que as partes devem concertar-se a este respeito, é, a este propósito, útil e necessária.
136. Resulta dos autos que houve comunicação entre as partes, mas que não houve concertação. A SERS informava regularmente o Parlamento das intempéries que se iam verificando e enviava, pela mesma ocasião, os atestados da Caisse des congés payés du bâtiment de Strasbourg. Assim, enviou-lhe designadamente as cartas de 1 de Março, 11 de Abril e 9 de Julho de 1996 e de 3 de Fevereiro, 9 de Abril e 13 de Agosto de 1997. O Parlamento reagiu, designadamente, pelas suas missivas de 18 de Março, 25 de Março, 21 de Junho e 18 de Julho de 1996. O conteúdo destas últimas era invariavelmente que o Parlamento não podia aceitar qualquer prorrogação do prazo para a conclusão das obras sem o acordo prévio das partes. Todavia, não decorre dos autos que as partes se tenham alguma vez concertado para esse fim.
137. Resulta, porém, claramente dos autos que esta concertação era necessária. Verifica-se, à luz dos documentos juntos aos autos e de algumas das cartas enviadas pela SERS, que subsídios respeitantes a intempéries foram pagos a um número reduzido de trabalhadores. Tal é o caso, por exemplo, do certificado da sociedade SMAC ACIEROID, de 6 de Junho de 1997, que se refere a um número de entre três a oito trabalhadores. Parece desde logo pouco provável que a ausência de um número tão reduzido de trabalhadores numas obras que empregavam centenas e, por vezes, mais de mil trabalhadores, tenha podido conduzir à paralisação completa das obras.
138. Não posso afirmar em que medida os autos são completos. Mas é claro que, como foram presentes ao tribunal, não lhe permitem tomar uma decisão fundada, ainda que aproximativa, sobre as questões de facto às quais deve responder antes de abordar a de saber em que medida as intempéries invocadas pela SERS justificam a aplicação do artigo 5.° 2. do contrato-quadro.
139. Razão pela qual concluo, no que toca a este ponto, que o Tribunal de Justiça deve designar por despacho interlocutório um perito, cuja missão será a de responder às seguintes questões:
- As intempéries assinaladas pela SERS tiveram um impacto desfavorável significativo no andamento crítico do calendário das obras, tendo em conta que a sua conclusão estava prevista o mais tardar para 31 de Dezembro de 1997?
- Eventualmente, qual foi a importância deste atraso, em número de dias úteis?
As partes ficarão obrigadas a comunicar ao perito todas as informações de que este necessite para a formulação do seu parecer.
d) As intimações administrativas
140. O tribunal arbitral rejeitou o pedido da SERS para uma prorrogação do prazo para a conclusão das obras de 20 dias úteis com o argumento de que este fundamento de prorrogação do prazo para a conclusão das obras está efectivamente previsto no artigo 3.° 3. do contrato-quadro, mas não no artigo 5.° 2. desse contrato (título VII.1., capítulo C, da decisão).
141. Partilho deste entendimento que, de resto, não foi expressamente contestado pelas partes.
e) Obras suplementares e alterações (artigo 5.°3. do contrato-quadro)
142. Nos termos do artigo 5.° 3., as obras suplementares e as alterações solicitadas ou aceites pelo Parlamento são consideradas como uma razão autónoma para a prorrogação da data para a conclusão das obras. Para cada uma destas alterações, os novos prazos para a conclusão das obras do imóvel são fixados segundo o procedimento estabelecido no protocolo, que se encontra em anexo e que constitui o aditamento 5 ao contrato-quadro.
143. Nos termos deste protocolo, a SERS deve informar o Parlamento das consequências que as alterações possam ter sobre o orçamento global previsto para as obras de construção. A assinatura pelo Parlamento torna possível a consequente prorrogação do prazo para a conclusão das obras previsto no artigo 3.
144. No que toca à fiche modificative PEU 008, o tribunal arbitral daí retirou a conclusão de que a aceitação explícita da mesma pelo Parlamento, que decorre da sua assinatura por um funcionário competente, tem como consequência ser a data contratual para a conclusão das obras prorrogada de 20 dias úteis (título VII.1., capítulo D, da decisão).
145. O Parlamento contesta esta interpretação, argumentando que essa ficha não dava qualquer indicação relativamente ao atraso daí decorrente. Além disso, segundo o Parlamento, as obras de execução das alterações solicitadas não causaram, na realidade, qualquer atraso.
146. Entendo que o ponto de vista do Parlamento não é defensável. Tomando em consideração esta fiche modificative PEU 008, de que o Parlamento apresentou cópia como anexo XVIII da sua petição, lê-se na rubrica «atraso previsto» que o atraso decorrente destas alterações relativamente ao calendário analítico previsional será igual ao período decorrido entre 31 de Agosto de 1995 e a data em que a SERS receberá de volta a ficha aprovada pelo Parlamento. O director-geral para a administração do Parlamento assinou esta ficha em 26 de Setembro de 1995; a SERS recebeu-a de volta em 28 de Setembro de 1995. Na própria ficha, ou no seu anexo, não se encontra qualquer menção a uma reserva do Parlamento no que respeita ao cumprimento dos prazos.
147. Observo ainda que não procede o argumento do Parlamento de que a execução efectiva das obras relacionadas com a alteração não provocou quaisquer atrasos. Nos termos do protocolo anexo ao contrato-quadro, a aprovação pelo Parlamento de uma proposta de alteração tem, por si só, a consequência de ser o prazo para a conclusão das obras prorrogado pelo período a que essa proposta se refere.
148. Concluo, por isso, que a assinatura em nome do Parlamento da fiche modificative PEU 008 conduziu a uma prorrogação do prazo para a conclusão das obras, referido no artigo 3.° 2. do contrato-quadro, de 20 dias úteis.
f) A aplicação do artigo 6.°3. do contrato-quadro
149. Decorre do artigo 6.° 3., último parágrafo, do contrato-quadro, como concluí supra no n.° 71, que o Parlamento fica dispensado da obrigação de pagamento de juros intercalares a contar da data contratual para a conclusão das obras, a fixar definitivamente pela aplicação simultânea dos artigos 3.° 2. e 5.° 1., em conjugação com os artigos 5.° 2. e 5.° 3.
150. Resta ainda saber se o facto de se ter ultrapassado esta data decorre de um comportamento ou omissão da SERS cuja ilicitude lhe possa ser imputável ou se o Tribunal de Justiça deve considerar que não existe qualquer justificação para esse facto.
151. Tendo em conta a sistemática do contrato-quadro, que atribui num primeiro momento à SERS, no artigo 3.° 3., uma série de justificações, definidas de forma ampla, para dispor do prazo «adicional» de três meses e que seguidamente oferece ainda à SERS, nos artigos 5.° 2. e 5.° 3., algumas possibilidades para obter uma prorrogação no que toca à data contratual última para a conclusão das obras do imóvel, considero que a cláusula do artigo 6.° 3., último parágrafo, deve ser interpretada e aplicada de forma restritiva. Caso contrário, a protecção oferecida ao Parlamento por essa disposição tornar-se-ia ilusória.
152. Resulta desta interpretação que, ao contrário das referidas no artigo 5.° 2., as razões que podem justificar a superação do prazo contratual para a conclusão das obras devem ser claras, ou seja, cognoscíveis e preponderantes. A SERS não apresentou razões deste tipo. Os seus argumentos relativos à interpretação e aplicação da cláusula em apreço têm em vista, sobretudo, uma restrição ao seu alcance.
153. Também não encontro nos autos elementos para afirmar que a SERS, quando se tornou claro que a conclusão das obras do imóvel excederia em muito a data de 31 de Dezembro de 1997, tenha tomado iniciativas para iniciar conversações com o Parlamento sobre as dificuldades encontradas para a conclusão das obras do imóvel. Limitou-se a invocar as razões de prorrogação, enumeradas no artigo 5.° 2., sem encetar quaisquer conversações sobre essa questão com o Parlamento.
154. A este respeito, considero relevantes as cartas de 16 de Setembro de 1997, 6 de Abril de 1998 e 5 de Maio de 1998, nas quais o Parlamento exprime a sua preocupação, ao que parece com boas razões, sobre as consequências daí decorrentes no que toca à data prevista para a conclusão das obras e que foi sucessivamente protelada. Tenham ou não ficado sem resposta, não levaram, pelo menos, a uma alteração sensível do comportamento da SERS como dono da obra. Entretanto, foram sempre aumentando as consequências financeiras decorrentes para o Parlamento das posteriores protelações.
155. Sempre que faltarem razões cognoscíveis e preponderantes, a determinar por aplicação dos artigos 5.° 2. e 5.° 3., para novas protelações da data para a conclusão das obras, considero que o Parlamento fica a partir desse momento dispensado da sua obrigação de pagamento de juros intercalares.
g) As despesas
156. A SERS e o município de Estrasburgo requereram a condenação do Parlamento nas despesas e no pagamento de um montante de 20 000 euros pelas despesas vexatórias incorridas no que respeita à excepção de inadmissibilidade por estas deduzida. Quanto ao mérito, requereram a condenação do Parlamento nas despesas e num montante de 300 000 FRF por despesas vexatórias incorridas.
157. O Parlamento requereu a condenação nas despesas da SERS e do município de Estrasburgo.
158. A este respeito, refira-se que, nos termos do n.° 3 do artigo 69.° do Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça pode condenar uma parte, mesmo vencedora, a pagar à outra parte as despesas em que a tenha feito incorrer e que o Tribunal considere inúteis ou vexatórias. Visto que a SERS e o município de Estrasburgo não alicerçaram com factos e argumentos os seus pedidos nesse sentido e que o andamento dos autos não oferece qualquer motivo de crítica do Parlamento, os seus pedidos devem ser julgados improcedentes.
159. Uma vez que o acórdão a proferir nos presentes autos pelo Tribunal de Justiça não porá termo ao processo, a decisão sobre as despesas deve ser reservada para final.
V - Conclusão
160. Com base no anteriormente exposto, concluo o seguinte.
1) Relativamente à admissibilidade
a) A excepção de inadmissibilidade deduzida nos termos do artigo 91.° , n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça contra o recurso do Parlamento Europeu pela Société d'aménagement et d'équipement de la région de Strasbourg (SERS) e pelo município de Estrasburgo é julgada improcedente.
b) O recurso subordinado interposto pela SERS e o município de Estrasburgo da decisão do tribunal arbitral é julgado admissível.
c) O recurso do Parlamento Europeu também é julgado admissível, na medida em que tem por objecto questões diversas da impugnação da decisão do tribunal arbitral.
2) Quanto ao mérito
a) A data contratual para a conclusão das obras do imóvel IPE IV corresponde ao dia 31 de Dezembro de 1997, podendo eventualmente ser prorrogada pelas razões previstas nos artigos 5.° 2. e 5.° 3. do contrato-quadro, celebrado entre, por um lado, o Parlamento Europeu e, por outro lado, a SERS e o município de Estrasburgo. Portanto, o recurso subordinado interposto pela SERS e o município de Estrasburgo contra o título V.3. da decisão do tribunal arbitral é julgado improcedente.
b) Nos termos do artigo 6.3., último parágrafo, do contrato-quadro, o Parlamento Europeu fica exonerado da obrigação de pagamento de juros intercalares a partir da data contratual para a conclusão das obras, fixada por aplicação dos artigos 3.° 2. e 5.° 1., em conjugação com os artigos 5.° 2. e 5.° 3. Esta exoneração está, contudo, sujeita a duas condições, formuladas em alternativa:
- o atraso ocorrido após a data contratual para a conclusão das obras deve ser imputável a um comportamento ilícito da SERS,
ou
- deve ser reconhecido não justificado pelo órgão jurisdicional referido no artigo 29. do contrato-quadro, concretamente, o Tribunal de Justiça.
c) A SERS e o município de Estrasburgo não podem invocar casos de força maior, previstos no artigo 5.° 2. do contrato-quadro, no que respeita:
- ao malogro do primeiro convite para apresentação de propostas para os toscos do imóvel IPE IV;
- ao incumprimento das empresas envolvidas na construção, incluído o grupo DRE-Lefort-Rocheteau;
- à paralisação das obras;
- ao encerramento de estradas devido ao gelo.
d) A SERS e o município de Estrasburgo podem invocar as intempéries, referidas no artigo 5.° 2. do contrato-quadro. Por decisão intercalar, o Tribunal de Justiça nomeará um perito que se pronunciará sobre as seguintes questões:
- As intempéries assinaladas pela SERS tiveram um impacto desfavorável significativo no andamento crítico do calendário das obras, tendo em conta que a sua conclusão estava prevista o mais tardar para 31 de Dezembro de 1997?
- Eventualmente, qual foi a importância deste atraso, em número de dias úteis?
e) As intimações administrativas não podem ser invocadas pela SERS e pelo município de Estrasburgo como base para a aplicação do artigo 5.° 2. do contrato-quadro.
f) A fiche modificative PEU 008, devidamente assinada pelo Parlamento Europeu, confere à SERS uma prorrogação do prazo contratual para a conclusão das obras de 20 dias, nos termos do disposto no artigo 5.° 3. do contrato-quadro.
g) A SERS não alegou razões suficientemente cognoscíveis e preponderantes que justifiquem mais atrasos relativamente à data para a conclusão das obras, por aplicação dos artigos 5.° 2. e 5.° 3. Portanto, o Parlamento encontra-se a partir dessa data, ainda a determinar e nos termos do artigo 6.° 3., último parágrafo, do contrato-quadro, exonerado da obrigação de pagamento de juros intercalares.