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Document 61999CC0094

    Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 15 de Junho de 2000.
    ARGE Gewässerschutz contra Bundesministerium für Land- und Forstwirtschaft.
    Pedido de decisão prejudicial: Bundesvergabeamt - Áustria.
    Contratos públicos de serviços - Directiva 92/50/CEE - Processo de adjudicação de contratos públicos - Igualdade de tratamento dos concorrentes - Discriminação em razão da nacionalidade - Livre prestação de serviços.
    Processo C-94/99.

    Colectânea de Jurisprudência 2000 I-11037

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2000:330

    61999C0094

    Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 15 de Junho de 2000. - ARGE Gewässerschutz contra Bundesministerium für Land- und Forstwirtschaft. - Pedido de decisão prejudicial: Bundesvergabeamt - Áustria. - Contratos públicos de serviços - Directiva 92/50/CEE - Processo de adjudicação de contratos públicos - Igualdade de tratamento dos concorrentes - Discriminação em razão da nacionalidade - Livre prestação de serviços. - Processo C-94/99.

    Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-11037


    Conclusões do Advogado-Geral


    1 Diversas autoridades administrativas austríacas organizaram um processo de adjudicação de contratos públicos de serviços para proceder ao levantamento e análise de amostras de água provenientes de lagos e rios austríacos, em aplicação da legislação nacional sobre a qualidade da água.

    2 A participação no processo de adjudicação de entidades que beneficiam de subsídios, ao lado de concorrentes puramente privados, está na origem de um litígio que levou o órgão jurisdicional austríaco a que foi submetido o processo principal a apresentar ao Tribunal de Justiça diversas questões prejudiciais.

    Em substância, estas dizem respeito à regularidade, à luz do direito comunitário, de um processo de adjudicação de contratos públicos de serviços no qual foram autorizados a participar organismos subsidiados que, além disso, têm todos a nacionalidade do Estado-Membro adjudicante e a sua sede no território desse Estado-Membro.

    3 As questões suscitadas pelo anúncio de concurso em litígio dizem respeito ao princípio da igualdade, sob um duplo ponto de vista.

    Trata-se de saber se a admissão de entidades subsidiadas é susceptível de violar o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade ou de, pelo menos, constituir um entrave à liberdade de circulação de serviços, uma vez que todos esses organismos são austríacos.

    Mesmo supondo que não se possa verificar nenhuma restrição às trocas, importa saber se a vantagem relativamente aos outros concorrentes que essas entidades podem retirar dos financiamentos públicos que lhes são atribuídos é compatível com o objectivo de defesa da concorrência efectiva prosseguido pela Directiva 92/50/CEE (1).

    I - A directiva

    4 Esta visa coordenar os processos de adjudicação de contratos públicos de serviços. Por esse meio, contribui para a realização progressiva do mercado interno, definido como um espaço sem fronteiras internas no qual é assegurada a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais (2).

    5 Em especial, a directiva tende a dar resposta à preocupação de evitar entraves à livre circulação de serviços (3). É justificada pela necessidade de melhorar o acesso dos prestadores de serviços aos processos de adjudicação dos contratos, para eliminar práticas que restringem a concorrência, em geral, e, em particular, as que restringem a participação nos contratos de nacionais de outros Estados-Membros (4).

    6 Nos termos do artigo 3.°, n.os 1 e 2:

    «1. Na adjudicação dos seus contratos públicos de prestação de serviços, ou na organização de concursos para trabalhos de concepção, as entidades adjudicantes aplicarão procedimentos adaptados ao disposto na presente directiva.

    2. As entidades adjudicantes assegurarão que não se verifique qualquer discriminação entre os vários prestadores de serviços.»

    7 O artigo 6.° prevê uma excepção à aplicação da directiva. Dispõe que:

    «A presente directiva não é aplicável à celebração de contratos públicos de serviços atribuídos a uma entidade que seja ela própria uma entidade adjudicante na acepção da alínea b) do artigo 1.°, com base num direito exclusivo estabelecido por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas publicadas, desde que essas disposições sejam compatíveis com o Tratado.»

    8 O artigo 37.° da directiva enuncia certas obrigações que a entidade adjudicante deve cumprir quando pretender recusar propostas anormalmente baixas. O primeiro parágrafo do artigo 37.° tem a seguinte redacção:

    «Se em relação a um determinado contrato as propostas parecerem anormalmente baixas face à prestação em causa, a entidade adjudicante solicitará por escrito, antes de rejeitar essas propostas, esclarecimentos sobre os elementos constitutivos da proposta em questão que considere relevantes e verificará esses elementos constitutivos tendo em conta as explicações recebidas.»

    II - A matéria de facto e o processo principal

    9 Agindo a título das atribuições que lhes são próprias, no âmbito da administração federal indirecta, os Ämter der Landesregierungen (serviços dos governos) dos Länder de Salzburgo, Baixa Áustria, Alta Áustria, Estíria, Caríntia, Tirol e Burgenland bem como o Landeswasserbauamt (serviço hidrológico federal) do Land de Voralberg organizaram um concurso público de adjudicação para a recolha de amostras e análise de água para os anos de observação de 1998/1999 e 1999/2000, em execução do Wassergüte-Erhebungsverordnung (5) (regulamento da análise da qualidade da água).

    10 A ARGE Gewässerschutz (6), uma associação de empresas, de técnicos civis e de outras entidades, entre as quais o Österreichische Forschungszentrum Seibersdorf GmbH (7) e o Österreichische Forschungs- und Prüfungszentrum Arsenal GmbH (8), apresentaram as suas candidaturas.

    11 Entendendo que os subsídios de que beneficiam estes últimos concorrentes lhes conferem vantagens concorrenciais e criam um entrave às trocas entre os Estados-Membros, a ARGE obteve a abertura de um processo de conciliação na Bundes-vergabekontrollkommission (comissão federal de controlo das adjudicações), em aplicação da Bundesvergabegesetz (lei federal sobre a adjudicação de contratos públicos).

    12 A comissão federal de controlo das adjudicações considerou que a lei federal não se opunha à participação num processo de adjudicação, em simultâneo com concorrentes puramente privados, de organismos suportados por fundos públicos ou por instituições de direito público, tais como institutos de investigação ou institutos universitários.

    13 A ARGE interpôs então recurso perante o Bundesvergabeamt.

    III - As questões prejudiciais

    14 Entendendo que a solução do litígio principal depende da interpretação do direito comunitário, o Bundesvergabeamt decidiu submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1) A decisão de uma entidade adjudicante de aceitar a participação num concurso público de organismos que recebem, dela mesma ou de outras entidades públicas adjudicantes, subvenções, de qualquer natureza, que lhes permitam fazer propostas, com preços sensivelmente inferiores aos dos concorrentes com actividade comercial, é contrária ao princípio da igualdade de tratamento de todos os candidatos e proponentes?

    2) A decisão de uma entidade adjudicante de aceitar a participação daqueles organismos num concurso público constitui uma discriminação dissimulada quando os organismos que beneficiam daquelas subvenções têm, sem excepção, a nacionalidade do Estado-Membro ou a sua sede no Estado-Membro da sede da entidade adjudicante?

    3) Mesmo admitindo que não seja discriminatória quanto aos restantes candidatos e proponentes, a decisão de uma entidade adjudicante que admita aqueles organismos a participarem num concurso público constitui uma restrição à livre circulação de serviços incompatível com as disposições do Tratado CE, em especial com os seus artigos 59.° e seguintes?

    4) A entidade adjudicante pode celebrar contratos de adjudicação com organismos que pertencem exclusivamente ou, pelo menos, a título principal aos poderes públicos e que executam as respectivas prestações exclusivamente ou, no mínimo, principalmente para a entidade adjudicante ou outros organismos do Estado sem abrir concurso para prestação nos termos da Directiva 92/50/CEE, em concorrência com candidatos com actividade comercial?»

    IV - Observações preliminares

    15 As três primeiras questões prejudiciais dizem respeito, já o dissemos, ao princípio da igualdade, sob o duplo aspecto das discriminações em razão da nacionalidade (segunda e terceira questões) e das discriminações entre os concorrentes subsidiados e os outros (primeira questão).

    16 A quarta questão diz respeito ao âmbito de aplicação pessoal da directiva. Trata-se de saber se esta é aplicável aos contratos de prestação de serviços celebrados entre uma entidade adjudicante e um prestador colocado na dependência estreita de uma autoridade pública, devido ao facto de esta ser a proprietária principal e a principal destinatária dos serviços que ele fornece.

    17 Antes de mais, há que analisar em conjunto a segunda e a terceira questões, na medida em que ambas se referem a disposições do Tratado, a saber, o artigo 59.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 49.° CE) e os artigos seguintes, relativas ao princípio da livre circulação de serviços.

    18 Pronunciar-nos-emos, em seguida, sobre a quarta questão prejudicial, relativa ao âmbito de aplicação da directiva, e depois sobre a primeira, consagrada ao princípio da igualdade de tratamento entre os concorrentes, tal como é referido nesse último texto.

    V - Quanto à existência de restrições à livre circulação de serviços (segunda e terceira questões prejudiciais)

    19 Com estas questões, o Bundesvergabeamt pergunta se os artigos 59.° e seguintes do Tratado devem ser interpretados no sentido de que se opõem à decisão tomada por uma entidade adjudicante de admitir a participação num concurso de adjudicação de contratos públicos de entidades que beneficiam de subsídios de origem pública que lhes permitem apresentar propostas a preços significativamente inferiores aos preços oferecidos pelos outros concorrentes, quando essas entidades têm todas a nacionalidade do Estado-Membro em que a entidade adjudicante tem a sua sede e sede no território desse Estado-Membro (9).

    20 O primeiro parágrafo do artigo 59.° do Tratado prevê que «... as restrições à livre prestação de serviços na Comunidade serão progressivamente suprimidas, durante o período de transição, em relação aos nacionais dos Estados-Membros estabelecidos num país da Comunidade que não seja o do destinatário da prestação.»

    21 Os imperativos do artigo 59.°, que impõem a livre prestação de serviços, implicam a eliminação de todas as discriminações contra o prestador em razão da sua nacionalidade (10) ou da circunstância de ele estar estabelecido num Estado-Membro que não seja aquele onde a prestação deve ser efectuada (11).

    22 Esta regra é reafirmada no terceiro parágrafo do artigo 60.° do Tratado CE (actual artigo 50.°, terceiro parágrafo, CE). Aplicando o princípio do tratamento nacional à livre circulação de serviços, este dispõe que: «... o prestador de serviços pode, para a execução da prestação, exercer, a título temporário, a sua actividade no Estado onde a prestação é realizada, nas mesmas condições que esse Estado impõe aos seus próprios nacionais.»

    23 A medida controversa é a admissão de organismos tais como o centro Seibersdorf e o instituto Arsenal, que são acusados de beneficiar de uma vantagem concorrencial indevida por receberem subsídios, ao concurso de adjudicação do contrato. Ambos têm uma ligação estreita com o Estado-Membro da entidade adjudicante porque têm sede no território austríaco e são de direito austríaco (12).

    24 Para afastar qualquer ambiguidade susceptível de afectar a interpretação das questões apresentadas, precisamos que o critério discriminatório visado na segunda questão prejudicial não diz respeito ao facto de as entidades subsidiadas terem sido admitidas a participar no concurso. Este ponto é objecto da primeira questão, que será tratada em seguida. Já o dissemos, a dificuldade refere-se à circunstância de as entidades auxiliadas serem todas austríacas, o que levaria a pensar que os operadores subsidiados provenientes de outros Estados-Membros não estariam autorizados a concorrer.

    25 O Bundesvergabeamt refere, a este respeito, a hipótese de uma discriminação disfarçada.

    26 Sabemos que o princípio da igualdade de tratamento, de que o artigo 59.° é uma expressão particular, proíbe não apenas as discriminações ostensivas, em razão da nacionalidade, mas também todas as formas dissimuladas de discriminação que, por aplicação doutros critérios de distinção, conduzam de facto ao mesmo resultado (13).

    27 Esta referência feita pelo órgão jurisdicional de reenvio à eventualidade de uma discriminação disfarçada indica-nos que este não parece ter dúvidas quanto ao facto de a medida controversa não comportar discriminações ostensivas, no sentido de que não exige condições de nacionalidade ou relativas ao local do estabelecimento dessas entidades, quer sejam ou não subsidiadas.

    Na falta de uma condição de nacionalidade ou de estabelecimento de que dependa o direito de responder ao anúncio do concurso, as entidades austríacas ou as localizadas em território austríaco seriam favorecidas, em contrapartida, se a medida controversa operasse uma diferença de tratamento entre os concorrentes, pela aplicação de uma condição de admissão apenas das entidades subsidiadas pelas autoridades austríacas no concurso de adjudicação do contrato.

    28 Como indicou justamente o Governo austríaco (14), a regra nacional que reservasse apenas às entidades nacionais subsidiadas pelas autoridades austríacas o direito de participar nos concursos públicos poderia constituir uma restrição à livre circulação de serviços. Nesse caso, este critério dissimularia uma diferença de tratamento entre as entidades estabelecidas, mesmo a título secundário, em território austríaco, as únicas que poderiam pretender obter auxílios das autoridades públicas, e as outras. Os operadores estrangeiros que beneficiam de subsídios não se podem servir dessa vantagem para concorrer com os operadores austríacos colocados na mesma situação e multiplicar as suas oportunidades de obter os contratos junto da entidade adjudicante austríaca.

    29 Em qualquer caso, quer a medida controversa seja analisada sob o ponto de vista de uma discriminação directa ou simplesmente de uma discriminação disfarçada, a mesma resposta impõe-se.

    30 Não nos parece justificado deduzir do facto de todas as entidades subsidiadas que participam num processo de adjudicação de contratos públicos terem a mesma nacionalidade que a entidade adjudicante a ideia de que a regularidade do processo em causa é necessariamente afectada pela aplicação de condições discriminatórias.

    31 O princípio da não discriminação não impõe, com efeito, em qualquer circunstância, que esteja representada uma multiplicidade de operadores de nacionalidades diferentes. Esse princípio exige apenas que não se obste ao exercício da liberdade de circulação desses operadores económicos, independentemente da sua origem no seio da Comunidade.

    32 Consideramos, assim, que a decisão de admitir a participação de entidades subsidiadas de nacionalidade austríaca não basta para revelar uma discriminação em razão da nacionalidade, do local de estabelecimento dos concorrentes ou da origem dos subsídios por eles recebidos.

    33 Para isso, haveria que demonstrar que o processo de adjudicação do contrato comporta, de direito ou de facto, uma regra que subordina a uma condição de nacionalidade ou de localização da sede social no território austríaco o direito de os operadores económicos participarem nesse concurso.

    34 Do mesmo modo, deveria estabelecer-se que a admissão a concurso é condicionada pelo facto de as entidades subsidiadas receberem subsídios das autoridades austríacas.

    35 Ora, mesmo que nunca se faça referência à participação de um concorrente de outra nacionalidade, com sede no território de outro Estado-Membro ou que beneficie de auxílios da parte de autoridades que não sejam as autoridades austríacas, não parece que o concurso em causa estabeleça condições que permitam afastar esse tipo de operadores.

    36 Em especial, não detectámos nenhum elemento que deixasse supor que a medida controversa implica uma condição relativa à atribuição dos auxílios recebidos apenas da parte das autoridades austríacas. Sob reserva da confirmação deste ponto pelo Bundesvergabeamt (15), a presença exclusiva de entidades austríacas subsidiadas deve ser atribuída a circunstâncias estranhas ao direito e à prática aplicáveis.

    37 É claro que, se o órgão jurisdicional de reenvio verificar a existência de uma disposição dessa natureza, deverá retirar daí as consequências quanto à regularidade do concurso e afastar essa regra contrária ao direito comunitário.

    38 Acrescentamos que, na falta de uma discriminação que afecte a medida controversa, é difícil ver na decisão de admissão uma restrição à livre circulação de serviços, porque, em qualquer hipótese, o nacional de outro Estado-Membro subsidiado por este pode concorrer ao mesmo título que os outros operadores.

    39 Portanto, há que concluir que os artigos 59.° e seguintes do Tratado devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma medida como a decisão em causa no processo principal, pela qual uma entidade adjudicante admitiu a participação no concurso de adjudicação de um contrato público de entidades que beneficiam de subsídios de origem pública que lhes permitem apresentar propostas a preços significativamente inferiores aos preços propostos pelos outros concorrentes, mesmo que essas entidades tenham todas a nacionalidade do Estado-Membro em que a entidade adjudicante tem sede e que tenham a sua sede no território desse Estado-Membro, quando não foi fixada nenhuma condição relativa à nacionalidade desses operadores, ao local do seu estabelecimento ou à origem dos subsídios de que, se for caso disso, beneficiam.

    VI - Quanto ao âmbito de aplicação da directiva: os contratos públicos de serviços celebrados entre uma entidade adjudicante e um prestador dependente de entidades adjudicantes (quarta questão prejudicial)

    40 Com a quarta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a directiva deve ser interpretada no sentido de que abrange um contrato de prestação de serviços celebrado entre uma entidade adjudicante e um prestador de serviços, quando, por um lado, este último pertence principalmente a uma entidade adjudicante e, por outro lado, os serviços que presta são principalmente destinados a entidades adjudicantes, entre as quais aquela a que pertence.

    41 O Bundesvergabeamt refere a possibilidade de não submeter às exigências da directiva as relações contratuais que vinculam uma entidade adjudicante a organismos que lhe pertencem na totalidade e que lhe consagram integralmente a sua actividade. No entanto, o Bundesvergabeamt considera que essas condições são demasiado restritivas e que, de um ponto de vista funcional, uma entidade adjudicante e um prestador de serviços podem ser assimilados um ao outro, mesmo que a entidade adjudicante não tenha a propriedade exclusiva do prestador e que a actividade deste último não lhe seja dedicada na totalidade. Também nesse caso, a proximidade entre a entidade adjudicante e essa entidade justifica que as suas relações contratuais escapem à directiva.

    A - Quanto à admissibilidade

    42 Tal como deixaram entender a ARGE e o Governo austríaco nas suas observações escritas, a admissibilidade desta questão pode prestar-se a discussão. Com efeito, não resulta do pedido de decisão prejudicial que a aplicabilidade da directiva ao concurso de adjudicação do contrato tenha voltado a ser posta em causa perante o órgão jurisdicional austríaco.

    43 Todavia, compete apenas ao órgão jurisdicional nacional a que está submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade da decisão jurisdicional a tomar apreciar, à luz das particularidades de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder emitir o seu juízo como a pertinência das questões que apresenta ao Tribunal de Justiça. Este só pode rejeitar um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional quando se revele manifesto que a interpretação de uma regra comunitária, solicitada por aquele órgão jurisdicional, não tem qualquer relação com a realidade ou com o objecto do processo principal, ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispõe dos elementos de facto ou de direito necessários para responder utilmente às questões que lhe são colocadas (16).

    44 Ora, não pode pretender-se que o âmbito de aplicação da directiva não tem relação com o processo principal. Se for demonstrado que, pelas suas características, as entidades concorrentes subsidiadas escapam ao âmbito de aplicação da directiva, nada permite excluir a priori que o órgão jurisdicional de reenvio, nos termos e nos limites do processo nacional aplicável, não possa retirar daí consequências susceptíveis de contribuir para a solução do litígio, por exemplo, substituindo oficiosamente outras regras à que emana da directiva.

    45 Aliás, tal como veremos, os elementos dos autos são suficientemente precisos para permitir definir os princípios em que o órgão jurisdicional de reenvio poderá inspirar-se em vista da solução do litígio no processo principal.

    46 É por isso que entendemos ser necessário responder à questão apresentada, com base nesses elementos, apesar de, segundo os autos, nenhum argumento parecer susceptível de voltar a pôr em causa o quadro legal inicialmente existente para a escolha de um prestador de serviços pela entidade adjudicante.

    47 Por conseguinte, há que determinar se a directiva é aplicável ao caso em apreço.

    B - Quanto ao fundo

    48 Segundo o oitavo considerando da directiva, «... a prestação de serviços apenas é abrangida pela presente directiva na medida em que essa prestação tenha uma base contratual...» Resulta da alínea a) do seu artigo 1.° que, para efeitos da directiva e à excepção de certos contratos, os contratos públicos de serviços são contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um prestador de serviços e uma entidade adjudicante.

    49 A relação jurídica de tipo contratual que liga o prestador e o destinatário do serviço pressupõe que sejam colocadas em presença duas pessoas jurídicas com capacidade para se comprometerem por uma manifestação de vontade livre. Por conseguinte, o prestador de serviços deve apresentar certas características que demonstrem que, no exercício da sua actividade económica, age de modo suficientemente autónomo em relação à autoridade pública que o solicita.

    Por outras palavras, tal como recordou claramente o advogado-geral G. Cosmas nas suas conclusões no processo Teckal (17), é necessário que o co-contratante da entidade adjudicante tenha efectivamente a qualidade de terceiro relativamente a esta entidade, ou seja, deve tratar-se de uma pessoa distinta desta. O direito comunitário, acrescenta ele, a propósito dos contratos públicos de fornecimentos (18), «... não obriga as entidades adjudicantes a respeitar o processo que assegura uma concorrência efectiva entre os interessados no caso de as entidades em questão pretenderem encarregar-se elas próprias do fornecimento dos produtos de que necessitam.»

    50 Daí resulta que as prestações qualificadas como «in house», que designam as prestações fornecidas a uma autoridade pública pelos seus próprios serviços ou por serviços em posição de dependência, embora sendo organismos distintos, não entram no âmbito de aplicação da directiva (19).

    51 No acórdão Teckal, já referido, o Tribunal de Justiça era chamado a declarar se o facto de uma autarquia local confiar o fornecimento de produtos a um agrupamento em que participa deve dar lugar a um processo de anúncio do concurso previsto pela Directiva 93/36.

    52 Além da análise de certas condições legais que determinam a aplicabilidade desse texto, tais como a qualificação da autarquia local como entidade adjudicante ou a existência de um contrato celebrado a título oneroso, o Tribunal de Justiça procedeu à análise das relações entre a entidade adjudicante e o seu co-contratante.

    53 Como a presente directiva, a Directiva 93/36 aplica-se quando uma entidade adjudicante visa celebrar uma convenção com um operador económico. Ao analisar a questão de saber se houve uma convenção entre duas pessoas efectivamente distintas, o Tribunal de Justiça precisou que «...basta, em princípio, que o contrato tenha sido celebrado entre, por um lado, uma autarquia local ou regional e, por outro lado, uma pessoa dela juridicamente distinta» (20). No entanto, o Tribunal de Justiça precisou que «Só pode ser de outro modo na hipótese de, simultaneamente, a autarquia exercer sobre a pessoa em causa um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços e de essa pessoa realizar o essencial da sua actividade com a ou as autarquias que a compõem» (21).

    54 Os critérios fundamentais assim deduzidos são fundados na ideia de uma autonomia efectiva da entidade com a qual a entidade adjudicante celebra o contrato. Resulta do acórdão Teckal, já referido, que elas devem ser distintas no plano formal e autónomas em relação uma à outra no plano decisório, para que a directiva seja aplicável (22).

    55 Poder-se-á lamentar a falta de precisão de que enfermam estes critérios. A existência de uma entidade distinta é fácil de conceber e identificar, porque basta verificar que o operador económico é constituído sob uma forma jurídica diferente da entidade adjudicante. A medida do grau de autonomia de que a entidade dispõe, em contrapartida, não é simples de determinar. A natureza do controlo exercido por uma colectividade sobre um organismo juridicamente distinto ou o nível a partir do qual se pode considerar que este realiza o essencial da sua actividade com a autoridade pública de que depende, em especial, podem suscitar sérias hesitações.

    56 Existe um grande número de parâmetros que permitem determinar o carácter efectivamente autónomo de uma entidade. Ora, na medida em que o órgão jurisdicional nacional é o único a dispor do conjunto dos elementos de facto e de direito úteis para a solução do litígio que lhe é submetido e em que lhe compete aplicar o direito comunitário nesse litígio, é o que está mais bem colocado para se pronunciar com toda a precisão desejada sobre a liberdade de acção de que dispõe determinado operador em relação à entidade adjudicante.

    57 Em qualquer caso, as estreitas relações que unem o centro Seibersdorf e o instituto Arsenal às autoridades públicas austríacas devem ser analisadas à luz desses princípios. Assim, é possível estabelecer se elas traduzem uma situação de dependência que justifique que as prestações de serviços de recolha de amostras e de análise da qualidade da água lhes sejam confiadas sem ser necessário observar as prescrições da directiva.

    1. Quanto ao controlo da entidade adjudicante

    58 Já o dissemos, para que um contrato escape ao regime da directiva, há que estabelecer que a autarquia local exerce sobre a pessoa em causa um controlo análogo ao que ela exerce sobre os seus próprios serviços (23).

    59 Uma vez que a entidade adjudicante goza, relativamente a um operador, de um poder de controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços, as missões que ela pode confiar-lhe apenas serão tratadas de modo diferente se tiverem sido simplesmente delegadas no seu seio. A capacidade da colectividade pesar no funcionamento do prestador e a falta de autonomia que daí decorre para este último negam a realidade do contrato celebrado entre a colectividade e o prestador de serviços.

    60 Segundo o Bundesvergabeamt, os organismos de investigação em causa são detidos maioritariamente pelo Estado austríaco ou por um Land. Os seus órgãos directivos são designados pela entidade pública que é sua proprietária ou sujeitos ao controlo de uma dessas entidades (24). A ARGE, em contrapartida, não mencionou a propriedade de um Land. Indicou que o centro Seibersdorf é detido pela República da Áustria até 50,5% das participações sociais, pertencendo as restantes 49,5% a empresas privadas. Quanto ao instituto Arsenal, a República da Áustria é sua proprietária a 100% (25).

    Compete ao órgão jurisdicional de reenvio analisar precisamente os elementos de prova de que dispõe. Pela nossa parte, colocamo-nos na hipótese comum, segundo a qual o Estado é, no mínimo, proprietário maioritário, tendo em conta os dados suplementares apresentados pela ARGE.

    61 No caso do instituto Arsenal, retomamos por nossa conta, para a transpor para o presente caso, a análise do advogado-geral S. Alber nas suas conclusões no processo RI.SAN., já referido, segundo a qual «A participação a 100% do Estado italiano nessa sociedade permite ... concluir, mesmo sem conhecer todos os detalhes relativos à organização interna [desta], que a sociedade em causa é, a este respeito, parte do Estado italiano» (26).

    62 A situação do centro Seibersdorf não é tão clara. Importa avaliar o grau de autonomia que esse organismo, apesar de uma participação pública maioritária, pode conservar relativamente ao Estado.

    63 Para esse efeito, o órgão jurisdicional de reenvio apreciará o fundamento da declaração da ARGE segundo a qual, apesar da participação maioritária da autoridade pública, a acção desse operador é determinada pelos seus proprietários privados (27). Compete-lhe, com efeito, verificar o número e a natureza dos postos detidos pelos representantes de operadores privados nos órgãos de decisão desse organismo e declarar em que medida os poderes assim repartidos têm, segundo o direito nacional aplicável, incidência sobre as orientações económicas tomadas pelo centro.

    64 Mesmo isto apenas será necessário se, em aplicação do direito nacional, o órgão jurisdicional de reenvio considerar que a circunstância de esses «... organismos ... [pertencerem] exclusivamente ou, pelo menos, a título principal aos poderes públicos» (28), segundo os seus próprios termos, não basta para garantir o carácter efectivo do controlo exercido pelas entidades públicas sobre as entidades que detêm.

    65 Em qualquer caso, a demonstração da origem pública das entidades não pode bastar. Com efeito, é determinante, para dar uma resposta útil ao Bundesvergabeamt, assegurar-se de que a autoridade pública que exerce o controlo sobre os organismos de investigação no processo principal e a entidade adjudicante são uma única e mesma pessoa.

    66 A reserva manifestada no processo Teckal, já referido, é fundada no princípio segundo o qual a falta de autonomia de uma entidade económica em relação à colectividade que detém a sua propriedade torna impossível ou ilusória a existência de um contrato entre essas duas pessoas, embora juridicamente distintas. A hipótese de uma relação jurídica que escape ao âmbito de aplicação da directiva supõe, portanto, que a entidade adjudicante que solicita do operador a realização de diferentes serviços seja precisamente a colectividade que exerce sobre ele um controlo estreito e não outra autoridade.

    67 Pelo contrário, uma relação contratual entre uma autoridade pública e um prestador de serviços sem vínculo de subordinação a seu respeito, mesmo que este seja propriedade de outra colectividade pública, entra no âmbito de aplicação da directiva.

    68 À luz dos elementos dos autos, parece que o proprietário maioritário dos dois organismos de investigação é a República da Áustria, ao passo que a entidade adjudicante é composta de Länder e de uma administração local especializada (o Landeswasserbauamt do Land de Voralberg).

    Nestas condições, compete ao Bundesvergabeamt declarar se, apesar dessas colectividades públicas serem distintas, o centro Seibersdorf e o instituto Arsenal não podem, no entanto, ser submetidos, da parte das colectividades que compõem a entidade adjudicante, em virtude do direito nacional, a um controlo análogo ao que estas últimas exercem sobre os seus próprios serviços.

    69 A directiva é aplicável se o órgão jurisdicional de reenvio concluir que as relações entre os organismos de investigação e a entidade adjudicante não cabem no exercício de nenhum poder de controlo desta última, no sentido do acórdão Teckal, já referido.

    70 Se se verificar que a entidade adjudicante exerce um controlo efectivo, devem ser efectuadas outras verificações. É que a qualificação de prestações «in house» que pode ser conferida à actividade das entidades em causa não é unicamente condicionada por esse elemento. Apenas a verificação de uma dependência estrutural relativamente à colectividade pública que decide adjudicar um contrato público não basta para considerar os serviços que elas prestam prestações comparáveis àquelas de que essas autoridades disporiam se recorressem aos seus recursos internos.

    71 É por isso que há que tomar igualmente em consideração o destinatário da actividade económica exercida por essas entidades, de acordo com o acórdão Teckal, já referido.

    2. Quanto ao destinatário da actividade do prestador de serviços

    72 Resulta do acórdão Teckal, já referido, que uma convenção não pode ser considerada como tendo sido celebrada entre duas pessoas distintas quando o operador realiza o essencial da sua actividade com a ou as autarquias que a compõem (29).

    73 Já dissemos que o princípio enunciado nesse acórdão é fundado no critério da autonomia do operador. Uma entidade não é necessariamente privada de liberdade de acção apenas pelo facto de as decisões que lhe dizem respeito serem tomadas pela colectividade que a detém, se ela ainda puder exercer uma parte importante da sua actividade económica junto de outros operadores.

    74 Em contrapartida, deve ser considerada como totalmente vinculada à sua autoridade de tutela quando a relação orgânica que a une a ela se reveste de uma quase exclusividade, em benefício desta última, dos serviços que presta. Esta situação demonstra uma vontade da colectividade não apenas de utilizar as prestações para fins públicos, mas igualmente de as destinar principalmente ao seu proveito.

    75 É apenas nessa hipótese que se pode defender a ideia de um prolongamento administrativo da colectividade pública, que a dispensa de cumprir as regras de concorrência prescritas pela directiva na medida em que escolhe realizar ela mesma as operações económicas de que necessita.

    76 Quando um organismo age essencialmente junto da autoridade pública que o controla, a relação de propriedade que liga as duas entidades legitima as prestações de serviços que uma fornece à outra, à imagem de um serviço interno que age para a sua instituição. Por isso, parece justificado que ele escape aos limites da directiva, sendo estes ditados pela preocupação de preservar uma concorrência que, nesse caso, não tem razão de ser.

    77 É menos compreensível, em contrapartida, que esse organismo, provido de um auxílio público, proponha serviços a outros operadores ou colectividades sem ficar sujeito às normas do direito dos contratos públicos, quando age em condições comparáveis às de um operador económico tradicional. A sua origem e a sua natureza públicas não bastam para o distinguir de outros prestadores de serviços, uma vez que propõe o mesmo tipo de serviços numa perspectiva comercial comparável.

    78 A diversificação de actividades desse operador económico demonstra a singularidade do seu estatuto em relação aos serviços internos da sua colectividade de origem, estatuto esse que não se resume a uma simples especificidade orgânica.

    79 Portanto, os motivos de protecção da concorrência que justificam as regras comunitárias de adjudicação dos contratos públicos valem tanto a seu respeito como a respeito dos outros prestadores de serviços.

    80 Do mesmo modo, um prestador de serviços que queira contratar junto de uma colectividade que não seja a sua não se distingue de outro operador, tanto do ponto de vista dos seus concorrentes como da colectividade pública que está na origem do contrato. Uma vez que esse organismo não constitui, por hipótese, um desmembramento da entidade adjudicante, as prestações que lhe propõe são para esta as de um terceiro.

    81 Como se vê, se o controlo do prestador de serviços pela autoridade pública que visa celebrar um contrato é uma condição necessária para que as suas prestações se considerem efectuadas «in house», essa condição está longe de ser suficiente. A actividade do prestador deve ser, em grande parte, consagrada à sua colectividade de origem. Por conseguinte, se o prestador exercer actividades comerciais, a directiva volta a ser aplicável, excepto se estas forem marginais relativamente ao conjunto das suas actividades.

    82 No caso em apreço, segundo a ARGE, o centro Seibersdorf tal como o instituto Arsenal exercem no mercado um grande número de actividades comerciais (30).

    83 Para decidir sobre a aplicabilidade da directiva, o órgão jurisdicional de reenvio deverá verificar esse ponto, mesmo que lhe pareça um dado adquirido que a actividade dos organismos litigiosos é exclusivamente ou, no mínimo, principalmente exercida junto de colectividades públicas, tal como decorre da formulação da quarta questão. O órgão jurisdicional de reenvio deverá sobretudo determinar se os organismos em causa exercem a maior parte da sua actividade com a entidade adjudicante, a cujo controlo, na hipótese em que nos colocámos (31), eles estão sujeitos.

    84 Se se concluir pela aplicabilidade da directiva no processo principal, haverá ainda que verificar se o concurso em causa não está abrangido pela excepção do seu artigo 6.°

    3. Quanto à aplicação do artigo 6.° da directiva

    85 Recordemos que o artigo 6.° exclui do seu âmbito de aplicação os contratos atribuídos a uma entidade que é ela própria uma entidade adjudicante com base num direito exclusivo de que beneficia em virtude de uma regulamentação nacional regularmente publicada, na condição de esta ser compatível com o Tratado.

    86 Esta disposição reflecte o décimo oitavo considerando da directiva, nos termos do qual «... os contratos com um prestador único designado podem, em determinadas condições, ser total ou parcialmente isentos da aplicação da presente directiva».

    87 Ao excepcionar este tipo de contratos, a directiva tem em conta os serviços que podem ser prestados às autoridades públicas, em certos Estados-Membros, apenas por certos e determinados organismos públicos, excluindo qualquer outro prestador. A exclusão das outras entidades é operada independentemente da sua nacionalidade (32).

    88 A aplicação da directiva depende portanto, em primeiro lugar, do tipo de prestadores de serviços em questão. No caso em apreço, pode desde já afirmar-se que os organismos subvencionados preenchem os três critérios fixados pela directiva para definir os «organismos de direito público», expressão utilizada para designar as entidades adjudicantes que não sejam o Estado, as autarquias locais ou regionais e as associações formadas por uma ou várias dessas colectividades (33).

    89 É incontroverso que estes organismos foram criados para satisfazer necessidades de interesse geral de carácter não industrial ou comercial, que são dotados de personalidade jurídica e dirigidos, controlados ou financiados maioritariamente por outra entidade adjudicante (34).

    90 Sendo, assim, eles próprios entidades adjudicantes, resta demonstrar que ambos beneficiavam de um direito exclusivo, na acepção do artigo 6.° da directiva, em virtude de disposições legislativas, regulamentares ou administrativas publicadas.

    91 Nenhum dos elementos referidos pelo órgão jurisdicional de reenvio ou pelas partes intervenientes permite supor que um dos dois organismos de investigação detinha, no momento do anúncio do concurso, um direito que lhe reservasse a exclusividade da prestação de serviços do tipo dos que eram objecto deste processo. O artigo 6.° e a lógica de exclusividade que lhe subjaz nem sequer são mencionados no pedido de decisão prejudicial, o que confirma a ideia de que os dois concorrentes postos em causa pela ARGE não dispunham de nenhum direito exclusivo.

    92 Mesmo que fosse esse o caso, não se vê por que razão teria sido organizado um processo de adjudicação em virtude da directiva, cujo artigo 6.° prevê precisamente que esse contrato pode escapar às suas disposições.

    93 Concluímos, portanto, que a directiva é aplicável quando uma entidade adjudicante visa celebrar um contrato com uma entidade distinta dela no plano formal e esta pertence principalmente a colectividades que não sejam as que compõem a entidade adjudicante.

    Se a entidade, embora distinta da entidade adjudicante no plano formal, pertence principalmente à entidade adjudicante, a directiva é aplicável quando essa entidade exerce essencialmente a sua actividade com outros operadores ou com colectividades que não façam parte dessa entidade adjudicante.

    Em ambos os casos, a directiva não é aplicável quando o contrato entra no âmbito de aplicação do artigo 6.° da directiva.

    VII - Quanto à existência de discriminações no decurso do processo de adjudicação dos contratos públicos de serviços (primeira questão)

    94 Na primeira questão prejudicial, o Bundesvergabeamt pergunta se o n.° 2 do artigo 3.° da directiva deve ser interpretado no sentido de que se opõe à decisão de uma entidade adjudicante de admitir a participação num processo de adjudicação de um contrato público de entidades que recebem subsídios de entidades adjudicantes que lhes permitem apresentar propostas a preços significativamente mais baixos que os propostos pelos outros concorrentes.

    95 O princípio da igualdade de tratamento dos concorrentes referido nesse texto não é apenas destinado a proibir as discriminações que poderiam ser praticadas contra os operadores económicos nacionais de outros Estados-Membros. Tal como outras disposições da mesma directiva ou de outras directivas relativas a outros tipos de contratos públicos, não contém nenhuma condição de nacionalidade (35).

    96 A violação da directiva não está, portanto, necessariamente ligada a uma ruptura da igualdade entre concorrentes de Estados-Membros diferentes.

    97 A mesma filosofia inspira, aliás, a legislação nacional pertinente. O n.° 1 do artigo 16.° da Bundesvergabegesetz dispõe, assim, que «Os contratos relativos a prestações efectuadas segundo um processo previsto na presente lei federal, ... de acordo com os princípios da concorrência livre e leal e da igualdade de tratamento de todos os candidatos e concorrentes, devem ser atribuídos a empresas habilitadas, eficientes e fiáveis - o que é apreciado o mais tardar na data da abertura do anúncio do concurso - a preços razoáveis.»

    98 A circunstância de os operadores que beneficiam de subsídios serem todos, no caso em apreço, entidades austríacas não é, portanto, relevante para responder à presente questão prejudicial.

    99 Antes de mais, há que estabelecer se o próprio princípio do pagamento de subsídios em proveito de operadores económicos proíbe a estes últimos concorrer a concursos públicos, antes de analisar a questão de saber, na negativa, se esta resposta vale igualmente quando os subsídios em causa são ilegais.

    100 O Bundesvergabeamt indica que os subsídios pagos aos concorrentes constituem auxílios na acepção do artigo 92.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87.° CE) ou «vantagens especiais em termos de custos» (36). O Bundesvergabeamt precisa que «a vantagem concorrencial sob a forma de custos menores...» de que beneficiam «... é o resultado de subsídios comparáveis a auxílios que podem consistir seja no pagamento directo de fundos seja na disponibilização de pessoal, de locais ou de equipamentos técnicos, ou ainda na conjugação dessas duas possibilidades». O órgão jurisdicional de reenvio acrescenta que o subsídio é prestado pela colectividade à qual pertence o organismo em questão, seja o Estado seja um Land (37).

    101 Recordamos que «o conceito de auxílio abrange... não apenas prestações positivas como os próprios subsídios, mas também intervenções que, sob diversas formas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa, pelo que, não sendo subsídios na acepção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos» (38). Na medida em que a disponibilização de pessoas ou de bens por parte das colectividades públicas austríacas é efectuada sem contrapartida ou em condições preferenciais (39), há que considerar que as vantagens assim conferidas constituem um auxílio de Estado no sentido do artigo 92.° do Tratado.

    102 Todavia, sabemos que a proibição de princípio dos auxílios de Estado não é absoluta nem incondicional porque não só certos auxílios são compatíveis de pleno direito com o mercado comum, em conformidade com o n.° 2 do artigo 92.°, como o n.° 3 do artigo 92.° concede à Comissão um largo poder de apreciação para aprovar auxílios em derrogação da proibição do n.° 1 (40).

    103 Se o direito comunitário admite a legalidade de certos auxílios de Estado, é porque, em nossa opinião, reconhece aos operadores que deles beneficiam o direito de exercer a sua actividade ao mesmo título que os outros. De que serviria, com efeito, que as empresas fossem licitamente auxiliadas se, simultaneamente, lhes fosse proibido o acesso a uma actividade económica normal ou simplesmente a certos contratos sob o pretexto que estes são regulamentados? Essa leitura seria, aliás, pouco compatível com a lógica de compensação que legitima certos auxílios, porque o auxílio constituído por um subsídio ou por uma assistência logística seria rapidamente eliminado pelas restrições suportadas relativamente a determinadas actividades.

    104 A possível legalidade dos auxílios estatais tem, portanto, a consequência de não obstar a que as entidades económicas que beneficiam de auxílios lícitos participem plenamente na vida do mercado. Como esta não é limitada às relações contratuais não regulamentadas mas compreende também os contratos públicos, não há razão para esses operadores serem excluídos dos concursos de adjudicação dos contratos públicos.

    105 Segundo a Comissão, que merece aprovação sobre esse ponto, um auxílio notificado e declarado compatível com o mercado comum não pode afectar a decisão da entidade adjudicante de admissão de um concorrente e a apreciação da proposta por ele apresentada.

    106 Acrescentamos que, como observam os Governos austríaco e francês (41), a exclusão do âmbito de aplicação da directiva de certos contratos celebrados entre duas entidades adjudicantes, de acordo com o seu artigo 6.°, quando o contrato público de serviços é atribuído com base num direito exclusivo, confirma a ideia de que a directiva pode aplicar-se a organismos que beneficiam de auxílios de Estado, na falta desse direito. A definição de entidade adjudicante dada pela directiva abrange, já o sabemos, os organismos de direito público, definidos como podendo ser maioritariamente financiados pelas autarquias locais ou regionais (42). Basta, portanto, que um prestador de serviços corresponda à definição de entidade adjudicante, o que demonstra geralmente a existência de um financiamento público, sem estar ligado por um direito exclusivo à entidade adjudicante a que presta os seus serviços, para que a directiva seja aplicável. O princípio da participação de um organismo subsidiado num processo de adjudicação de um contrato de serviços não é, por conseguinte, excluído pela directiva.

    107 Nestas condições, a directiva não obsta à participação de entidades como os organismos do processo principal no concurso de adjudicação do contrato público em litígio.

    108 A resposta à questão de saber que comportamento deve adoptar uma entidade adjudicante confrontada com um concorrente que beneficia de auxílios de Estado ilegais não é, em contrapartida, assim tão clara (43).

    109 É natural que os operadores excluídos ou cujas possibilidades de obter um contrato são reduzidas em razão da concorrência de entidades que dispõem de vantagens concorrenciais dessa natureza contestem o direito da entidade adjudicante de admitir a candidatura destas últimas ao concurso, sem ser obrigada a proceder a um controlo mínimo da regularidade dos auxílios.

    110 A ilegalidade de um auxílio deveria conduzir à proibição de qualquer participação de um operador subsidiado no processo de adjudicação de um contrato público, seja ele qual for. Mesmo que não seja directamente afectada a elementos, como o preço proposto aquando do anúncio do concurso, que têm um peso importante na orientação da decisão final da entidade adjudicante, o auxílio ilicitamente atribuído a um operador económico apenas pode aliviar os encargos que diminuem o seu nível de competitividade económica.

    111 Todavia, por muito fundada que seja, esta opinião não resolve o problema, de natureza essencialmente jurídica e processual, com que é confrontado o órgão jurisdicional de reenvio no processo principal. Com efeito, trata-se de saber se o princípio da igualdade de tratamento dos concorrentes, tal como é referido no n.° 2 do artigo 3.° da directiva, compreende o direito de a entidade adjudicante proibir a participação dos concorrentes ilegalmente subsidiados, ou mesmo de investigar se os subsídios que recebem podem ser declarados ilegais.

    112 No seu título VI, a directiva enuncia as características que devem apresentar os concorrentes, as propostas que apresentam e as justificações correspondentes, de que dependem a participação desses operadores no processo e a atribuição definitiva do contrato.

    113 Entre esses dados encontram-se os elementos que conferem à entidade adjudicante o direito de recusar a determinado prestador de serviços a participação no concurso. Várias disposições referem-se às obrigações legais que vinculam o prestador. Essas disposições autorizam a entidade adjudicante a afastar um concorrente em situação ilegal, por exemplo, do ponto de vista fiscal ou social (44).

    Todavia, a directiva é omissa quanto às consequências que poderia retirar da verificação da existência de auxílios não notificados, atingidos por uma suspeita de ilegalidade ou mesmo manifestamente ilegais.

    114 A Comissão referiu a história da directiva, sob esse aspecto. Recordou que, na sua proposta inicial (45), figurava uma disposição idêntica à do último parágrafo do n.° 5 do artigo 34.° da Directiva 93/38/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de celebração de contratos nos sectores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações (46). Nos termos desse texto, «As entidades adjudicantes apenas podem rejeitar as propostas que são anormalmente baixas devido à obtenção de um auxílio estatal se tiverem consultado o proponente e se este não estiver em condições de demonstrar que esse auxílio foi notificado à Comissão nos termos do n.° 3 do artigo 93.° do Tratado ou foi autorizado pela Comissão. As entidades adjudicantes que recusarem uma proposta nestas circunstâncias informarão desse facto a Comissão.»

    115 Segundo a Comissão, o Conselho retirou esta disposição da sua proposta de directiva no decurso do processo legislativo (47). Em resposta, a Comissão emitiu uma declaração na sua comunicação ao Parlamento Europeu segundo a qual, ao alterar deste modo a proposta de directiva, o Conselho expressava «... a sua preocupação de evitar qualquer discriminação entre proponentes privados e públicos». Na mesma declaração, a Comissão recordava «... que o Tratado lhe confere o poder de impedir o recurso abusivo aos auxílios estatais susceptíveis de falsear a concorrência [de modo que podia] aceitar essas alterações».

    116 Esta evolução do texto é instrutiva em dois aspectos.

    117 Antes de mais, verifica-se que o legislador não ignorava, no momento da adopção da directiva, a dificuldade ligada à existência de operadores económicos favorecidos pela percepção de auxílios estatais nos concursos públicos. A escolha da Comissão de limitar o enquadramento legal desse tipo de situações apenas aos auxílios não notificados ou não autorizados confirma, assim, que foi admitido o princípio da participação nos processos de adjudicação de contratos públicos de entidades que beneficiam de auxílios estatais legalmente atribuídos. Os desenvolvimentos anteriormente consagrados a esse aspecto da questão encontram aqui uma confirmação, fundada na intenção do legislador comunitário (48).

    118 Outro ensinamento é que o legislador comunitário tomou igualmente posição de modo inequívoco quanto à extensão do poder de acção reconhecido à entidade adjudicante em matéria de contratos públicos de serviços. Na sua versão definitiva, o primeiro parágrafo do artigo 37.° da directiva diz nomeadamente respeito ao direito da entidade adjudicante de rejeitar as propostas manifestamente baixas relativamente à prestação. Essa disposição prevê a obrigação de a entidade adjudicante solicitar previamente os detalhes sobre a composição da proposta, bem como de verificar a sua veracidade com base nas provas fornecidas, antes de a rejeitar.

    Todavia, na falta de uma disposição precisa comparável à do artigo 34.° da Directiva 93/38, a directiva não confere à entidade adjudicante o direito de rejeitar uma proposta apresentada por um proponente auxiliado ilegalmente ou que beneficia de um auxílio não notificado à Comissão. Pode lamentar-se esta escolha, tanto mais que a razão de uma diferença de regime jurídico entre a Directiva 93/38 e a Directiva 92/50 não é clara.

    119 O silêncio da directiva sobre este ponto tem uma origem que há que ter em conta na interpretação desse texto.

    120 A alteração efectuada pelo Conselho à proposta da Comissão, como aliás a declaração emitida pela Comissão para expressar a sua aprovação, revelam a concepção do legislador comunitário sobre o mecanismo de controlo dos auxílios estatais ilegais, que cabe principalmente à Comissão.

    121 Segundo o Governo francês e a Comissão, o silêncio da directiva sobre a faculdade da entidade adjudicante de rejeitar a proposta de um proponente subsidiado ilegalmente não significa necessariamente que a entidade adjudicante não possa retirar consequências da existência desse tipo de auxílio.

    122 O Governo francês considera que a directiva não obriga nem permite expressamente à entidade adjudicante afastar uma proposta de um organismo subsidiado. Mas salienta a existência do risco que lhe faz correr a atribuição de um contrato a um proponente que beneficie de um auxílio ilegal. O Governo francês sustenta que, se uma entidade adjudicante verificar que uma proposta anormalmente baixa é financiada por meio de um auxílio ilegal, poderia rejeitá-la. O proponente correria o risco de ter de reembolsar o auxílio indevidamente recebido e de não realizar completamente o contrato.

    123 A Comissão entende que a consideração de um auxílio ilegal pode ter lugar na fase da selecção das empresas, ou seja, no momento em que a entidade adjudicante faz uma apreciação sobre a capacidade financeira e económica do prestador de serviços. Como o Governo francês, a Comissão argumenta que, em aplicação da jurisprudência do Tribunal de Justiça, os auxílios estatais incompatíveis com o mercado comum, ou simplesmente não notificados, podem ser objecto de recuperação. A Comissão sustenta que não se pode censurar uma entidade adjudicante por se proteger contra o risco de celebrar um contrato com um operador económico que beneficia de auxílios cuja legalidade seria duvidosa, afastando-o na altura da verificação da sua capacidade financeira e económica. A Comissão propõe que se declare, por conseguinte, que o direito comunitário não se opõe a que uma entidade adjudicante, em conformidade com o seu direito nacional, tome em consideração, na fase da selecção, o facto de um proponente ter recebido um auxílio ilegal, susceptível de ser recuperado, para determinar a sua capacidade financeira.

    124 Sejam quais forem os méritos destes argumentos, eles apenas devem ser analisados, em nossa opinião, na medida em que contribuam para a solução do litígio no processo principal. Ora, já o dissemos, tal como está formulada e deve ser interpretada, à luz do pedido de decisão prejudicial, a primeira questão diz respeito à regularidade da decisão da entidade adjudicante que admitiu a participação de entidades subsidiadas num concurso de adjudicação do contrato.

    125 Portanto, não se trata, no caso em apreço, de esclarecer o órgão jurisdicional de reenvio sobre a existência do direito de uma entidade adjudicante excluir um proponente ou rejeitar a sua proposta por motivos referentes à legalidade do auxílio. Pelo contrário, é necessário informá-lo da existência de uma obrigação a cargo da entidade adjudicante de proceder dessa maneira em presença de um auxílio estatal, sendo caso disso, se este for ilegal.

    No estado actual do direito comunitário, devemos considerar que uma entidade adjudicante tem o direito de não retirar nenhuma consequência, quanto à participação de uma entidade subsidiada, da existência de auxílios não notificados ou ilegais. Acrescentamos que não seria diferente se o texto inicial do artigo 37.° não tivesse sido alterado. O artigo 37.° apenas confere, em proveito da entidade adjudicante, uma simples faculdade de rejeitar a proposta anormalmente baixa devido à obtenção de um auxílio indevidamente recebido ou não notificado.

    126 O Governo austríaco, por fim, invoca as disposições vinculativas do Tratado em matéria de concorrência e a aplicação do artigo 37.° da directiva, quando se verifica que uma proposta é anormalmente baixa relativamente à prestação. Em aplicação deste artigo, o Governo austríaco preconiza a análise aprofundada dos diferentes custos que compõem a proposta litigiosa. Se a recomposição dos custos revelar que a proposta é contrária à concorrência, devido a subsídios não autorizados, o Governo austríaco sugere que a proposta seja imperativamente rejeitada.

    127 A tese defendida pelo Governo austríaco é fundada tanto no processo actualmente previsto pela directiva em caso de propostas anormalmente baixas como no direito comunitário da concorrência. Ainda aqui, sem necessidade de analisar a sua fundamentação, basta salientar que, pela sua argumentação, a República da Áustria se coloca na hipótese, posterior à decisão de admissão litigiosa, de a entidade adjudicante, verificando o nível anormalmente baixo da proposta, manifestar a intenção de a rejeitar. Ela excede, portanto, pelo seu conteúdo, o objecto da primeira questão prejudicial, limitado ao processo de admissão.

    128 À luz das considerações precedentes, concluímos que o princípio da igualdade de tratamento dos proponentes previsto no n.° 2 do artigo 3.° da directiva não se opõe à decisão pela qual uma entidade adjudicante autoriza a participação num concurso de adjudicação de um contrato público de entidades que recebem auxílios de entidades adjudicantes que lhes permitem apresentar propostas a preços significativamente inferiores aos propostos pelos outros proponente.

    Conclusão

    129 À luz destas considerações, propomos responder do seguinte modo às questões prejudiciais apresentadas pelo Bundesvergabeamt:

    «1) O artigo 59.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 49.° CE) e os artigos seguintes devem ser interpretados no sentido de que não obstam a uma medida como a descrita na decisão em causa no processo principal, pela qual uma entidade adjudicante admite a participação num concurso de adjudicação de um contrato público de entidades que beneficiam de subsídios de origem pública que lhes permitem apresentar propostas a preços significativamente inferiores aos propostos pelos outros proponentes, mesmo que essas entidades tenham todas a nacionalidade do Estado-Membro no qual a entidade adjudicante tem a sua sede e tenham sede no território desse Estado-Membro, quando a decisão não é subordinada a nenhuma condição relativa à nacionalidade dos operadores, ao lugar do seu estabelecimento ou à origem dos subsídios de que, sendo caso disso, beneficiam.

    2) A Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços, é aplicável quando uma entidade adjudicante visa concluir um contrato com uma entidade dela distinta no plano formal e pertencente principalmente a colectividades que não sejam as que compõem a entidade adjudicante.

    Se a entidade, embora distinta da entidade adjudicante no plano formal, lhe pertencer principalmente, a Directiva 92/50 é aplicável quando essa entidade exerça o essencial da sua actividade com outros operadores ou colectividades que não sejam as que compõem a entidade adjudicante.

    Em ambos os casos, a Directiva 92/50 não é aplicável se o contrato entrar no âmbito de aplicação do seu artigo 6.°

    3) O princípio da igualdade de tratamento dos proponentes previsto no n.° 2 do artigo 3.° da Directiva 92/50 não obsta à decisão pela qual uma entidade adjudicante autoriza a participação num concurso de adjudicação de um contrato público de entidades que recebem auxílios da parte de entidades adjudicantes que lhes permitem apresentar propostas a preços significativamente inferiores aos propostos pelos outros proponentes.»

    (1) - Directiva do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1, a seguir «directiva»).

    (2) - Primeiro e segundo considerandos.

    (3) - Sexto considerando.

    (4) - Vigésimo considerando.

    (5) - BGBl. 1991, p. 338.

    (6) - A seguir «ARGE».

    (7) - Centro de investigação Seibersdorf, a seguir «centro Seibersdorf».

    (8) - Instituto de investigação Arsenal, a seguir «instituto Arsenal».

    (9) - Apesar de a segunda questão se referir aos organismos que têm a nacionalidade do Estado-Membro ou que têm a sua sede no Estado-Membro em que a entidade adjudicante tem ela própria a sua sede, os fundamentos do pedido de decisão prejudicial demonstram que essas características são, no caso em apreço, cumulativas e não alternativas (p. 13 da tradução francesa do pedido de decisão prejudicial).

    (10) - A atribuição de uma «nacionalidade» às pessoas colectivas, que torna possível a eventualidade da sua discriminação em razão da nacionalidade, resulta do Tratado. Por força do primeiro parágrafo do artigo 58.° do Tratado (actual artigo 48.°, primeiro parágrafo, CE), aplicável aos serviços em conformidade com o artigo 66.° do Tratado CE (actual artigo 55.° CE), «As sociedades constituídas em conformidade com a legislação de um Estado-Membro e que tenham a sua sede social, administração central ou estabelecimento principal na Comunidade são, para efeitos do disposto no presente capítulo, equiparadas às pessoas singulares nacionais dos Estados-Membros.» A localização da sua sede social, da sua administração central ou do seu estabelecimento principal serve para determinar, à semelhança da nacionalidade das pessoas singulares, a sua conexão com a ordem jurídica de um Estado-Membro (v., nomeadamente, o acórdão de 9 de Março de 1999, Centros, C-212/97, Colect., p. I-1459, n.° 20).

    (11) - Acórdão de 18 de Janeiro de 1979, Van Wesemael e o. (110/78 e 111/78, Colect., p. 27, n.° 27).

    (12) - Página 13 da tradução francesa do pedido de decisão prejudicial.

    (13) - V., por exemplo, o acórdão de 3 de Junho de 1992, Comissão/Itália (C-360/89, Colect., p. I-3401, n.° 11).

    (14) - Página 14 da tradução francesa das suas observações escritas.

    (15) - Salientamos que, segundo o Bundesvergabeamt, «Embora se possa perfeitamente conceber que existem entidades noutros Estados-Membros, beneficiárias de auxílios idênticos por parte do seu Estado-Membro, que podem concorrer ao presente concurso...» (p. 17 da tradução francesa do pedido de decisão prejudicial). Esta eventualidade de uma participação de operadores estrangeiros igualmente subsidiados pelas autoridades competentes do seu Estado-Membro de origem não basta, todavia, aos olhos do órgão jurisdicional de reenvio, para afastar a hipótese de uma discriminação em razão da nacionalidade, do local de estabelecimento dos concorrentes ou da origem dos subsídios de que beneficiam. O Bundesvergabeamt explica assim, na mesma frase, que «...os prestadores de serviços de outros Estados-Membros não poderiam ou não deveriam contar com a participação no concurso de concorrentes austríacos que, através de auxílios prestados por organismos regionais austríacos, gozam, relativamente a si, de uma vantagem considerável em termos de custos e, nessa medida, possam propor preços mais baixos que os de mercado...» Ao fazê-lo, parece que o Bundesvergabeamt afasta um argumento adequado para estabelecer uma falta de restrição à livre circulação de serviços - a faculdade de as empresas estrangeiras subsidiadas responderem ao anúncio do concurso ao mesmo título que as empresas nacionais subsidiadas - recorrendo a fundamentos baseados em considerações estranhas a essa problemática - a violação do princípio da igualdade de tratamento entre operadores, independentemente da sua origem nacional, devido à participação de empresas subsidiadas. Analisaremos este argumento nos desenvolvimentos que consagraremos à primeira questão.

    (16) - Acórdão de 18 de Novembro de 1999, Unitron Scandinavia e 3-S (C-275/98, Colect., p. I-8291, n.° 18).

    (17) - Acórdão de 18 de Novembro de 1999 (C-107/98, Colect., p. I-8121, n.os 53 e segs.).

    (18) - Directiva 93/36/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos públicos de fornecimento (JO L 199, p. 1).

    (19) - V., igualmente, as conclusões do advogado-geral S. Alber no processo RI.SAN. (acórdão de 9 de Setembro de 1999, C-108/98, Colect., p. I-5219, n.os 46 e segs.).

    (20) - Acórdão Teckal, já referido, n.° 50.

    (21) - Ibidem, sublinhado nosso.

    (22) - Ibidem, n.° 51.

    (23) - Ibidem, n.° 50.

    (24) - Página 13 da tradução francesa do pedido de decisão prejudicial.

    (25) - Página 9 da tradução francesa das suas observações escritas.

    (26) - N.° 53.

    (27) - A ARGE afirma, com efeito, que, «Possuindo um número importante de postos no conselho de administração ou no conselho consultivo, são sempre as empresas privadas participantes que dominam» (p. 9 da tradução francesa das suas observações escritas).

    (28) - Quarta questão prejudicial.

    (29) - N.° 50.

    (30) - Páginas 9 e 10 da tradução francesa das observações escritas.

    (31) - V. n.° 70 das presentes conclusões.

    (32) - V. Flamme, P., Flamme, M.-A., «Les marchés publics de services et la coordination de leurs procédures de passation», Revue du marché commun et de l'Union européenne, n.° 365, Fevereiro de 1993, pp. 150 e segs., parágrafo 9, n.° 10.

    (33) - Nos termos da alínea b) do artigo 1.° da directiva, «[s]ão consideradas `entidades adjudicantes' o Estado, as autarquias locais ou regionais, os organismos de direito público, as associações formadas por uma ou mais autarquias locais ou organismos de direito público.

    Considera-se `organismo de direito público' qualquer organismo:

    - criado com o objectivo específico de satisfazer necessidades de interesse geral, sem carácter industrial ou comercial,

    e

    - dotado de personalidade jurídica,

    e

    - financiado maioritariamente pelo Estado, por autarquias locais ou regionais ou por outros organismos de direito público, ou submetido a um controlo de gestão por parte dessas entidades, ou que tenha um órgão de administração, de direcção ou de fiscalização cujos membros são, em mais de 50%, designados pelo Estado, por autarquias locais ou regionais ou por outros organismos de direito público».

    No acórdão de 15 de Janeiro de 1998, Mannesmann Anlagenbau Austria e o. (C-44/96, Colect., p. I-73, n.° 21), o Tribunal de Justiça interpretou essas condições, tal como estão previstas no segundo parágrafo da alínea b) do artigo 1.° da Directiva 93/37/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (JO L 199, p. 54), como tendo carácter cumulativo. Esta solução pode ser transposta para o presente artigo, em tudo idêntico a este último texto.

    (34) - Página 13 da tradução francesa do pedido de decisão prejudicial.

    (35) - O n.° 1 do artigo 3.° da directiva prevê, por exemplo, que para adjudicar os seus contratos públicos de serviços ou para organizar um concurso, as entidades adjudicantes apliquem processos adaptados às disposições dessa directiva. O Tribunal de Justiça salientou claramente, a propósito de um texto comparável - o n.° 1 do artigo 4.° da Directiva 90/531/CEE do Conselho, de 17 de Setembro de 1990, relativa aos procedimentos de celebração dos contratos de direito público nos sectores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações (JO L 297, p. 1), que prescreve a aplicação da Directiva 90/531 quando as entidades adjudicantes adjudicam os seus contratos de fornecimento, tem a mesma redacção -, que não existia nenhuma condição relativa à nacionalidade ou ao lugar da sede dos concorrentes (acórdão de 25 de Abril de 1996, Comissão/Bélgica, C-87/94, Colect., p. I-2043, n.° 32). Aliás, resulta do vigésimo considerando da directiva que a eliminação das práticas que restringem a concorrência não se limita às que perturbam a participação nos concursos de nacionais de outros Estados-Membros. Do mesmo modo, o Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 22 de Junho de 1993, Comissão/Dinamarca (C-243/89, Colect., p. I-3353, n.° 33), a propósito da Directiva 71/305/CEE do Conselho, de 26 de Julho de 1971, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (JO L 185, p. 5; EE 17 F3 p. 9), referiu que, embora esta directiva não faça expressamente referência ao princípio da igualdade de tratamento dos proponentes, o dever de respeitar esse princípio corresponde à própria essência da directiva, de acordo com um dos seus considerandos, relativo ao desenvolvimento de uma concorrência efectiva no domínio dos contratos públicos e aos critérios de selecção e de adjudicação dos contratos tendentes a garantir tal concorrência. Ora, o Tribunal de Justiça pronunciava-se sobre o fundamento da violação da Directiva 71/305 independentemente da nacionalidade do concorrente ao qual o contrato tinha sido atribuído. O objectivo de defesa da concorrência prosseguido pelas directivas sobre os contratos públicos deve ser atingido por uma aplicação do princípio da igualdade de tratamento que não seja sistematicamente reservada às discriminações em razão da nacionalidade. Em nossa opinião, existe uma autonomia do princípio da livre concorrência em relação ao da livre circulação de serviços, no qual é fundada a directiva, mesmo que as relações entre os dois princípios sejam estreitas, contribuindo o primeiro para a efectivação do segundo.

    (36) - Páginas 8 e 9 da tradução francesa do pedido de decisão prejudicial.

    (37) - Ibidem, p. 14.

    (38) - Acórdão de 11 de Julho de 1996, SFEI e o. (C-39/94, Colect., p. I-3547, n.° 58).

    (39) - Ibidem, n.° 59.

    (40) - Ibidem, n.° 36.

    (41) - Páginas 8 e 9 da tradução francesa das observações escritas do Governo austríaco e n.os 16 a 18 das observações escritas do Governo francês.

    (42) - V. nota n.° 33 das presentes conclusões.

    (43) - Precisamos que a questão do regime aplicável aos auxílios de Estado ilegais, embora tenha sido frequentemente objecto das observações escritas das partes intervenientes e aquando da audiência, é puramente hipotética no caso em apreço, uma vez que ninguém sugere que os auxílios de que beneficiam os organismos de investigação mereçam ser assim qualificados.

    (44) - Um prestador que não tenha cumprido as suas obrigações relativamente ao pagamento de impostos, de acordo com as disposições legais do país da entidade adjudicante, por exemplo, pode ser impedido, segundo a alínea f) do artigo 29.° da directiva, de participar num contrato.

    (45) - JO 1991, C 23, p. 1.

    (46) - JO L 199, p. 84.

    (47) - N.° 22 das observações escritas da Comissão.

    (48) - V. n.os 99 a 106 das presentes conclusões.

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