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Document 61997CC0346

Conclusões do advogado-geral Fennelly apresentadas em 12 de Novembro de 1998.
Braathens Sverige AB contra Riksskatteverket.
Pedido de decisão prejudicial: Länsrätten i Dalarnas län - Suécia.
Directiva 92/81/CEE - Harmonização das estruturas dos impostos especiais de consumo sobre os óleos minerais - Óleos minerais fornecidos para utilização como carburante para a navegação aérea, com excepção da aviação de turismo privada - Isenção do imposto harmonizado.
Processo C-346/97.

Colectânea de Jurisprudência 1999 I-03419

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1998:538

61997C0346

Conclusões do advogado-geral Fennelly apresentadas em 12 de Novembro de 1998. - Braathens Sverige AB contra Riksskatteverket. - Pedido de decisão prejudicial: Länsrätten i Dalarnas län - Suécia. - Directiva 92/81/CEE - Harmonização das estruturas dos impostos especiais de consumo sobre os óleos minerais - Óleos minerais fornecidos para utilização como carburante para a navegação aérea, com excepção da aviação de turismo privada - Isenção do imposto harmonizado. - Processo C-346/97.

Colectânea da Jurisprudência 1999 página I-03419


Conclusões do Advogado-Geral


1 O presente pedido de decisão prejudicial que vos foi dirigido por um órgão jurisdicional sueco diz respeito à compatibilidade com o regime harmonizado dos impostos de consumo, e em especial com as regras relativas aos óleos minerais (ou seja, os produtos petrolíferos), de um imposto ecológico cobrado sobre o combustível utilizado no tráfego aéreo interno, atendendo à obrigação de isentar de impostos de consumo os óleos minerais utilizados como combustíveis na navegação aérea que não seja «aviação de recreio privada».

I - Enquadramento jurídico e factual

A - As disposições nacionais e os factos

2 Por força da 1988 års lag om miljöskatt på inrikes flygtrafik (1) (lei de 1988 que sujeita o tráfego aéreo interno a um imposto ecológico, a seguir «lei de 1988»), foi aplicado um imposto, qualificado no despacho de reenvio como «novo imposto especial de consumo», na Suécia desde 1 de Março de 1989 até 31 de Dezembro de 1996. Tal imposto incidiu apenas sobre a navegação aérea interna.

3 Foram enviados avisos de cobrança à Braathens Sverige Ab (anteriormente Transwede Airways Ab, a seguir «demandante») entre Janeiro de 1995 e Junho de 1996 ao abrigo da lei de 1988. No que respeita aos anos de 1995 e 1996, o imposto devido era calculado nos termos do artigo 6._ da lei de 1988, na sua redacção alterada por uma lei que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1991 e por um aumento geral das taxas dos impostos sobre o dióxido de carbono, resultante de uma outra alteração que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1993. Nos termos do artigo 6._, n._ 1, na sua redacção modificada, o cálculo devia ser efectuado, em princípio, de acordo com os dados fornecidos pela Luftfarstverket (administração nacional da aeronáutica civil) no que diz respeito ao consumo de combustível e à emissão de hidrocarbonetos e monóxido de azoto proveniente do tipo de aeronave utilizada num percurso aéreo médio. Nos termos do artigo 6._, n._ 2, da lei de 1988, na sua redacção modificada, o imposto era de facto cobrado, relativamente a cada voo, à razão de 1 SKR por quilograma de combustível consumido e de 12 SKR por quilograma de hidrocarbonetos e monóxido de azoto emitidos. Na falta de dados fiáveis sobre a emissão de hidrocarbonetos e de monóxido de azoto na acepção do artigo 6._, n._ 1, resultava aparentemente do artigo 7._ que o imposto cobrado, em qualquer caso no que respeita a estas emissões, devia ser calculado segundo um método baseado no peso máximo do avião em questão autorizado à descolagem. A lei de 1988 foi formalmente revogada, a partir de 1 de Janeiro de 1997, pela lei 1996:1407 (2). Depois desta data, a gasolina para aviões e o querosene estão isentos dos impostos sobre a energia e o dióxido de carbono ao abrigo da lag om skatt på energi (3) (lei relativa ao imposto sobre a energia) de 1994.

B - As disposições comunitárias

4 O artigo 1._, n._ 1, da Directiva 92/12/CEE do Conselho (4) descreve o seu objectivo como sendo o de «[estabelecer] o regime dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo e outros impostos indirectos que incidem directa ou indirectamente sobre o consumo desses produtos, com exclusão do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e dos impostos estabelecidos pela Comunidade Europeia». O artigo 1._, n._ 2, prevê que «as disposições especiais relativas às taxas e às estruturas dos impostos sobre produtos sujeitos a impostos especiais de consumo constam de directivas específicas». Nos termos do artigo 3._, n._ 1, a directiva geral aplica-se aos «óleos minerais», ao «álcool e bebidas alcoólicas» e aos «tabacos manufacturados».

Todavia, o artigo 3._, n._ 2, que é fundamental para o caso vertente, dispõe que estes produtos «podem ser sujeitos a outras imposições indirectas com finalidades específicas, desde que essas imposições respeitem as regras de tributação aplicáveis em matéria de impostos especiais de consumo ou de IVA para a determinação da base tributável, o cálculo, a exigibilidade e o controlo do imposto».

5 As «directivas específicas», visadas no artigo 1._, n._ 2, da directiva geral, que foram adoptadas a respeito dos óleos minerais são a Directiva 92/81/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, respeitante à harmonização das estruturas do imposto especial sobre o consumo de óleos minerais (5) (a seguir «directiva sobre os óleos minerais»), e a Directiva 92/82/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, respeitante à aproximação dos impostos especiais de consumo sobre os óleos minerais (6) (a seguir «directiva sobre os impostos»). Nos termos do artigo 1._ da directiva sobre os óleos minerais, compete aos Estados-Membros aplicar «aos óleos minerais um imposto especial de consumo harmonizado...». Os diversos óleos minerais visados encontram-se definidos em termos gerais no artigo 2._, n._ 1, desta directiva por referência a numerosos códigos da nomenclatura pautal combinada da Comunidade. Contudo, resulta do artigo 2._, n._ 2, que, salvo se um imposto específico se encontrar estabelecido na directiva sobre os impostos, os produtos petrolíferos estão sujeitos ao imposto especial de consumo quando destinados a utilização, colocação à venda ou consumo como combustível de aquecimento ou como carburante; nestes casos, a taxa do imposto especial de consumo é igual à taxa aplicável ao combustível ou carburante equivalente especificamente visado na directiva sobre os impostos. Está provado que no caso vertente os produtos petrolíferos em causa se destinavam a ser utilizados como carburante no quadro da aviação comercial; em princípio, tais produtos estão sujeitos ao regime comunitário dos impostos especiais sobre o consumo harmonizados.

6 O artigo 8._ da directiva sobre os óleos minerais prevê, nomeadamente, diversas isenções da obrigação supramencionada de aplicar impostos especiais de consumo. A disposição pertinente no caso concreto é o artigo 8._, n._ 1, alínea b), que dispõe o seguinte:

«1. Para além das disposições gerais da Directiva 92/12/CEE relativas às utilizações isentas de produtos sujeitos ao imposto especial de consumo (7) e sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentam os produtos a seguir referidos do imposto especial de consumo preconizado nas condições por eles fixadas tendo em vista assegurar a aplicação correcta e simples destas isenções, bem como impedir as fraudes, a evasão fiscal ou as utilizações indevidas:

...

b) Óleos minerais fornecidos para utilização como carburantes na navegação aérea, com excepção da aviação de recreio privada.

Para efeitos da presente directiva, por `aviação de recreio privada' entende-se a utilização de uma aeronave pelo seu proprietário ou por uma pessoa singular ou colectiva que a pode utilizar através de aluguer ou a outro título, para fins não comerciais e, em especial, para fins que não sejam o transporte de pessoas ou mercadorias ou a prestação de serviços a título oneroso ou no interesse das autoridades públicas.

Os Estados-Membros podem limitar o âmbito desta isenção aos fornecimentos de carborreactores (código NC 2710 00 51)».

II - O processo nacional

7 A reclamação formulada pela demandante contra os avisos de cobrança que lhe tinham sido dirigidos não produziu qualquer efeito. Seguidamente, a demandante desencadeou o presente processo. Perante a incerteza quanto à resolução deste último, o Länsrätten I Dalarnas län (a seguir «órgão jurisdicional nacional») suspendeu o pagamento do imposto litigioso.

8 A demandante alegou perante o órgão jurisdicional nacional que era manifesto que o imposto constituía no seu conjunto um imposto especial sobre o consumo de carburante para a aviação comercial. Sustentou que o Reino da Suécia já não tinha competência legislativa para manter em vigor tal imposto.

9 A Riksskatteverket (administração nacional dos impostos), demandada no processo principal, defendeu que devia distinguir-se entre os impostos sobre a energia e os impostos cobrados em razão da poluição do ambiente. O simples facto de o método de cálculo do imposto se referir à quantidade de carburante consumida não faz do imposto em questão um imposto especial sobre o consumo dos óleos minerais.

10 De acordo com o despacho de reenvio, a lei de 1988 foi introduzida para estimular o desenvolvimento de motores de avião menos poluentes. Todavia, ela só foi aplicada à aviação civil interna em virtude das obrigações do Reino da Suécia no âmbito, nomeadamente, da convenção de Chicago de 1944, por força da qual é proibida a tributação nacional distinta da navegação aérea internacional por parte dos respectivos signatários (8). Embora o órgão jurisdicional admita que a directiva sobre os óleos minerais obriga os Estados-Membros a isentar de imposto especial de consumo harmonizado o carburante para aviação, decidiu, atendendo aos diferentes pontos de vista que foram defendidos perante si acerca da verdadeira natureza da medida tributária litigiosa e à ausência de jurisprudência comunitária aplicável bem como às divergências entre as partes quer no que respeita ao efeito directo da directiva quer à divisibilidade do imposto em elementos compatíveis e incompatíveis com o direito comunitário, submeter as seguintes questões ao Tribunal de Justiça:

«1) As medidas tributárias descritas nos autos - adoptadas nos termos da lei (1988:1567) relativa ao imposto ecológico sobre o tráfego aéreo interno - são contrárias à Directiva 92/81/CEE do Conselho (directiva sobre os óleos minerais), em cujo artigo 8._, n._ 1, alínea b), se estabelece que os Estados-Membros isentarão do imposto especial de consumo harmonizado os óleos minerais fornecidos para utilização como carburantes na navegação aérea, com excepção da aviação de recreio privada?

2) No caso de a resposta à primeira questão ser afirmativa, é de considerar que o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais tem efeito directo, de forma que esta disposição pode ser invocada nos tribunais nacionais por um particular contra uma autoridade do Estado?

3) No caso de a directiva sobre os óleos minerais dever ser aplicada ao caso presente, podem as medidas fiscais em causa ser divididas em duas partes uma conforme com o direito comunitário e outra não conforme, devido ao facto de o imposto ecológico sueco ser calculado em parte sobre o consumo de carburante e em parte sobre a emissão de hidrocarbonetos e monóxido de azoto?»

III - Análise

11 Foram apresentadas observações escritas e orais pela demandante e pela Comissão; foram igualmente apresentadas observações orais pela Riksskatteverket.

12 É óbvio que a questão fundamental do presente processo consiste em saber se a aplicação de um medida tributária nacional como o «imposto ecológico» sueco litigioso é incompatível com o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais. Apenas no caso de se responder afirmativamente a esta questão é que as outras duas se colocam. Atendendo a que a terceira questão respeita essencialmente à possibilidade de dissociar os elementos compatíveis e incompatíveis do imposto litigioso, a mesma só deverá ser apreciada se se admitir a compatibilidade, pelo menos parcial, de um imposto como o «imposto ecológico».

A - O alcance da obrigação de isentar no que respeita ao carburante para aviação

i) A natureza do imposto litigioso

13 Das observações apresentadas quanto à primeira questão resulta que devem ser tidos em consideração dois aspectos. Em primeiro lugar, existe desacordo quanto à questão de saber se o imposto em causa de ecológico só tem o nome, como alega a demandante, a qual afirma que, na realidade, se trata de um imposto que incide directamente sobre o consumo de carburante para aviação ou se, como defende a Riksskatteverket, serve um verdadeiro interesse ecológico ao tributar as emissões dos motores de avião. Em segundo lugar, se o mesmo for um imposto sobre o consumo de carburante de avião, a questão da sua compatibilidade com o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais deve ser examinada à luz da competência dos Estados-Membros para aplicar outros impostos indirectos, que foi reconhecida no artigo 3._, n._ 2, da directiva geral.

14 Está provado que a protecção do ambiente pode constituir uma «finalidade específica» susceptível de justificar a aplicação de um imposto indirecto por parte dos Estados-Membros ao abrigo do artigo 3._, n._ 2, da directiva geral. Todavia, a Comissão apoia a demandante ao afirmar que, em virtude da relação inelutável entre a emissão de hidrocarbonetos e de monóxido de azoto e o consumo de carburante para aviação, é este último que é tributado no caso vertente. A Riksskatteverket declarou na audiência que a utilização de dados acerca do consumo de carburante e, em especial, de valores de consumo médio em voos especiais para calcular o nível das emissões não contrariava o objectivo ecológico do imposto. A revogação do imposto teve lugar não apenas em reacção à carta da Comissão de 21 de Fevereiro de 1996, mas também pela vontade de adoptar medidas de protecção do ambiente mais eficazes.

15 A questão de saber se o imposto prossegue a «finalidade específica» que reside na protecção do ambiente, como defende a Riksskatteverket, depende da questão de saber se a própria estrutura do imposto e, mais particularmente, o seu método de cálculo visam encorajar a utilização de motores de avião menos poluentes. O primeiro elemento do cálculo é um encargo correspondente a 1 SKR por quilograma de carburante para aviação consumido que se baseia, aparentemente (nos termos do artigo 6._, n._ 1, da lei de 1988), nos dados fornecidos pela Luftfarstverket relativos ao consumo de combustível num percurso aéreo médio. O segundo elemento, a taxa de 12 SKR por quilograma de hidrocarbonetos e monóxido de azoto emitidos, é calculada com base nos dados igualmente fornecidos pela Luftfarstverket acerca de tais emissões pelo tipo de aeronave em causa num percurso aéreo médio. Não dispondo o Tribunal de Justiça de informações acerca da natureza e da importância destes dados e, em especial, da medida em que os mesmos permitem estabelecer distinções relevantes entre motores mais ou menos poluentes, só o órgão jurisdicional nacional pode determinar se o imposto visa, efectivamente e de forma significativa, servir o objectivo ecológico de encorajar a utilização de aviões menos poluentes. Parece resultar do despacho de reenvio que o imposto litigioso foi calculado em aplicação do artigo 6._, n.os 1 e 2, da lei de 1988 e não em função do peso máximo do avião em questão autorizado à descolagem, como prevê o artigo 7._ Em nosso entender, cabe às autoridades nacionais determinar se o imposto tem um objectivo ecológico real.

16 Se a lei de 1988 não tributa de facto as emissões, mas antes o consumo de carburante, ela é a priori incompatível com a isenção prevista para o carburante destinado à aviação no artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais. Por conseguinte, há que resolver a questão de saber se o artigo 3._, n._ 2, da directiva geral autoriza os Estados-Membros a aplicar tal imposto bem como examinar o âmbito de aplicação do regime harmonizado e a noção de imposto especial de consumo.

ii) Análise do regime harmonizado

a) A noção de imposto especial de consumo

17 A directiva geral não define os impostos especiais de consumo, limitando-se, como resulta do artigo 1._, n._ 1, a estabelecer «o regime dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo e outros impostos indirectos...» (o sublinhado é nosso). Tal levou certos comentadores a descrever o método seguido como baseado numa nova noção de «harmonização geral e flexível» ou numa harmonização segundo o «mais pequeno denominador comum» (9). O enunciado do artigo 1._ da directiva geral inclui os «outros impostos indirectos» que incidem sobre os produtos cobertos pelo regime harmonizado. O direito de os Estados-Membros instituírem (ou manterem) esses impostos indirectos ou impostos especiais de consumo não harmonizados é regulado pelo artigo 3._, n._ 2, desta directiva. A primeira questão submetida respeita ao alcance e às limitações dessa competência.

18 Não existe uma definição comummente aceite da noção de «imposto especial de consumo». Os impostos especiais de consumo, cujo domínio foi, em todo o caso, fortemente reduzido ao longo dos últimos anos, são em geral impostos indirectos específicos sobre a produção, a venda ou o consumo de produtos, sendo estes últimos frequentemente produtos de luxo (10). Embora a distinção entre impostos especiais de consumo e impostos sobre o volume de negócios seja importante, uma vez que o artigo 33._ da Sexta Directiva IVA (11) proíbe os Estados-Membros de aplicar impostos nacionais sobre o volume de negócios, tal não parece ser o caso da distinção entre os impostos especiais de consumo e as outras formas de impostos indirectos (12). Diz-se acerca dos impostos especiais de consumo que os mesmos representam «uma das mais antigas formas de tributação, talvez em virtude da sua relativa facilidade de liquidação e cobrança [e que] foram cobradas no passado sobre uma grande variedade de produtos, mas os principais impostos especiais de consumo modernos são os que incidem sobre as bebidas alcoólicas, o tabaco, os combustíveis e os veículos motorizados» (13).

19 O órgão jurisdicional nacional qualificou o imposto litigioso de imposto especial de consumo. Atendendo à variedade de produtos que podem estar sujeitos a tais impostos e ainda às características do imposto em causa, não existem motivos para duvidar desta conclusão.

b) A compatibilidade do imposto com o direito comunitário

20 À primeira vista, parece existir conflito entre o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais e o artigo 3._, n._ 2, da directiva geral. Este último autoriza os Estados-Membros a aplicar impostos especiais de consumo não harmonizados que prossigam finalidades específicas, enquanto a primeira obriga-os a isentar o carburante para navegação aérea. Todavia, estamos convencidos que estas disposições são conciliáveis.

21 É interessante sublinhar que a proposta inicial da Comissão apontava no sentido de que os produtos visados por aquilo que iria ser a directiva geral só fossem «... sujeitos a imposto especial de consumo e ao imposto sobre o valor acrescentado» (14). O Conselho pretendeu deixar aos Estados-Membros uma competência residual para tributar, subordinada certamente à necessidade de respeitar «as regras de tributação aplicáveis em matéria de impostos especiais de consumo» (15). O cerne do presente processo reside em saber se deve considerar-se que as regras de tributação a que se refere o artigo 3._, n._ 2, da directiva geral incluem a isenção consagrada no artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais.

22 Resulta claramente do quinto considerando do preâmbulo da directiva sobre os óleos minerais que o Conselho pretendia «estabelecer determinadas isenções obrigatórias a nível comunitário», embora não seja fornecida qualquer justificação para tal. Apesar do artigo 2._, n._ 2, submeter os óleos minerais utilizados como carburantes ao imposto especial de consumo comunitário harmonizado fixado na directiva sobre os impostos, o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais prevê uma isenção para os óleos minerais utilizados como carburante na aviação comercial. Não entendemos que a limitação da obrigação dos Estados-Membros, prevista no artigo 8._, n._ 1, de isentar de «imposto especial de consumo harmonizado» os óleos minerais enumerados nas alíneas a) a c), igualmente inserida pelo Conselho, se destinasse a submeter os Estados-Membros a uma obrigação menos extensa do que a que tinha sido proposta pela Comissão (16). É possível que o Conselho tenha sido influenciado pela convenção de Chicago quando previu a isenção obrigatória do carburante para aviação. Optou, todavia, por aplicar a isenção à aviação comercial tanto internacional como interna, mas, no último parágrafo do artigo 8._, n._ 1, alínea b), permitiu explicitamente que os Estados-Membros «limitassem» o alcance da isenção relativa ao carburante para aviação a certos fornecimentos de carborreactores. A introdução desta excepção por parte do Conselho leva a que se pense, a contrario sensu, que não estava prevista qualquer outra isenção (17).

23 É certamente possível optar por uma concepção estrita das «regras de tributação» visadas no artigo 3._, n._ 2, da directiva geral, que devem ser respeitadas pelos Estados-Membros sempre que estes introduzam ou apliquem impostos indirectos aos produtos enumerados no artigo 3._, n._ 1. Tais regras versam sobre a «determinação da base tributável, o cálculo, a exigibilidade e o controlo do imposto». Todavia, o carácter derrogatório desta disposição milita a favor de um ponto de vista contrário. A directiva geral foi adoptada com base legal no artigo 99._ do Tratado CE para servir os interesses do mercado comum e no quadro de um regime que prevê a adopção de directivas específicas respeitantes às estruturas e às taxas dos impostos (artigo 1._, n._ 2) (18). A competência dos Estados-Membros para aplicar outros impostos indirectos está expressamente sujeita à dupla condição de que esses impostos prossigam um finalidade específica e «respeitem as regras de tributação» supramencionadas. Tal como já referimos, cabe ao Estado-Membro provar que tal imposto prossegue a «finalidade específica» invocada (19). Todas estas consideraçõe advogam a favor de uma interpretação restrita do artigo 3._, n._ 2, e, portanto, de uma interpretação lata da obrigação decorrente da expressão «regras de tributação aplicáveis em matéria de impostos especiais de consumo». Seja como for, é óbvio que esta obrigação se estende às regras que constam das directivas específicas, no caso vertente a directiva sobre os óleos minerais.

24 É verdade que a isenção prevista no artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais só se aplica, segundo os seus precisos termos, «ao imposto especial de consumo harmonizado» (o sublinhado é nosso), mas não cremos que o Conselho tenha pretendido por esse meio permitir que os Estados-Membros apliquem outras formas de impostos indirectos ou de impostos especiais de consumo. Resulta tanto do artigo 1._, n._ 1, como do artigo 3._, n._ 2, da directiva geral que esta visa simultaneamente os impostos especiais de consumo e os outros impostos indirectos. A utilização da expressão «imposto especial de consumo harmonizado», no artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais, é inteiramente oportuna no contexto uma vez que o artigo 1._, n._ 1, desta directiva menciona a aplicação «aos óleos minerais (de) um imposto especial de consumo harmonizado». Por outro lado, o teor do artigo 3._, n._ 2, da directiva geral submete todos os impostos nacionais indirectos que prossigam finalidades específicas às «regras de tributação aplicáveis em matéria de impostos especiais de consumo», ou seja, no caso vertente, ao artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais.

25 Por conseguinte, propomos que o Tribunal de Justiça declare que um imposto como o imposto litigioso no caso vertente deve ser considerado como um imposto especial sobre o consumo de carburante cuja aplicação ao carburante para aviação utilizado na aviação comercial é incompatível com o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais.

B - Efeito directo

26 No que respeita à segunda questão, não existem dúvidas, em nosso entender, de que o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais pode ser directamente invocado por um contribuinte que alegue ter sido tributado num imposto especial de consumo em violação daquela disposição. O Tribunal de Justiça já declarou reiteradamente que, sempre que as disposições de uma directiva são incondicionais e suficientemente precisas, podem ser invocadas pelos particulares perante os órgão jurisdicionais nacionais. Tal como sublinha a demandante, esta disposição impõe aos Estados-Membros a obrigação clara de não sujeitar o carburante para aviação utilizado na aviação comercial ao imposto especial de consumo harmonizado. Não partilhamos a opinião da Riksskatteverket segundo a qual o objectivo de harmonização fiscal da directiva sobre os óleos minerais restringe a sua capacidade para criar direitos a favor dos particulares. A decisão fundamental Becker (20), respeitante ao efeito directo da Sexta Directiva IVA, é aplicável tanto às directivas fiscais como às outras directivas comunitárias de harmonização. Além disso, o simples facto de os Estados-Membros estarem autorizados, ao aplicar a isenção, a estabelecer «condições» necessárias com vista a assegurar a sua «aplicação correcta e clara» de forma a evitar a «fraude, a evasão ou os abusos» não podia, tal como a Comissão salienta a justo título, impedir o artigo 8._, n._ 1, alínea b), de produzir efeitos directos. O Tribunal de Justiça tem repetidamente declarado, a propósito da redacção equivalente da frase introdutória do artigo 13._-A e B, da Sexta Directiva IVA, que o facto de se reservar tal competência aos Estados-Membros «não [afecta] de forma alguma a definição do conteúdo da isenção prevista»; não poderia, por conseguinte, ter como efeito privar o contribuinte do direito de invocar directamente as disposições de uma isenção fiscal que, além disso, são suficientemente claras e precisas (21).

27 Por conseguinte, propomos que o Tribunal de Justiça responda à segunda questão declarando que o artigo 8._, n._ 1, alínea b), da directiva sobre os óleos minerais pode ser oposto directamente às autoridades de Estado como a Riksskatteverket.

C - Divisibilidade

28 Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional nacional pergunta se, no caso da directiva sobre os óleos minerais ser aplicável ao imposto litigioso, este podia ser dividido numa parte compatível e noutra incompatível com o direito comunitário na medida em que era parcialmente calculado sobre a emissão de hidrocarbonetos e monóxido de azoto. Não nos parece que a terceira questão se coloque no caso vertente, uma vez que todos os elementos pertinentes do imposto são calculados com base em dados recolhidos e actualizados pela Luftfarstverket no que respeita ao consumo de combustível e às emissões num percurso aéreo médio.

IV - Conclusão

29 Face ao acima exposto, propomos que o Tribunal de Justiça responda da seguinte forma às questões que lhe foram submetidas pelo órgão jurisdicional nacional:

«1) Um imposto nacional que incida sobre a navegação aérea interna mediante a aplicação de um encargo fixo que se decompõe em duas partes e que é calculado em função, por um lado, de dados relativos ao consumo de carburante e, por outro, de dados relativos às emissões de hidrocarbonetos e de monóxido de azoto, num percurso aéreo médio do tipo de avião utilizado, constitui um imposto especial sobre o consumo de carburante para aviação que, aplicado à aviação que não seja de recreio privada, isto é, à aviação comercial, é contrário ao artigo 8._, n._ 1, alínea b), da Directiva 92/81/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, respeitante à harmonização das estruturas do imposto especial sobre o consumo de óleos minerais, salvo se se provar que esses cálculos garantem que a taxa serve efectivamente e de forma significativa um objectivo ecológico que consiste em encorajar a utilização de aviões menos poluentes.

2) O artigo 8._, n._ 1, alínea b), da Directiva 92/81 tem efeito directo, de tal forma que pode ser invocado por um particular perante um órgão jurisdicional nacional contra uma autoridade de Estado.»

(1) - Lei 1988:1567.

(2) - Segundo o despacho de reenvio, três razões explicam a abolição do imposto ecológico sobre o tráfego aéreo interno: o desejo do Governo sueco de substituir por «um sistema que implique uma melhor política do ambiente, por exemplo, uma distinção mais acentuada dos impostos de aterragem cobrados pela Luftfartsverket»; o facto de a desregulamentação da aviação civil interna ter tornado mais difícil a aplicação equitativa do imposto; o ponto de vista da direcção-geral da Comissão competente em matéria fiscal, a qual tinha indicado, numa carta de 21 de Fevereiro de 1996 dirigida ao Governo sueco, que o imposto em causa era incompatível com a directiva sobre os óleos minerais.

(3) - Lei 1994:1776.

(4) - Directiva de 25 de Fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais sobre o consumo (a seguir «directiva geral») (JO L 76, p. 1).

(5) - JO L 316, p. 12.

(6) - JO L 316, p. 19.

(7) - O título V da directiva geral, que compreende o artigo 23._, trata das «isenções». Prevê diversas isenções específicas do pagamento do imposto especial de consumo sempre que os produtos que, em princípio, lhe estão sujeitos são, por exemplo, «fornecidos no âmbito das relações diplomáticas ou consulares». Nenhuma destas isenções é, contudo, pertinente no caso vertente.

(8) - Convenção relativa à aviação civil internacional (a seguir «convenção de Chicago»), assinada em 7 de Dezembro de 1944; Nações Unidas - Colectânea dos Tratados, vol. 15., p. 296; v. artigo 24._, alínea a).

(9) - V. Terra & Wattel: European Tax Law (Deventer, 1993), p. 145, que cita os comentários de Stubbe: «Die Harmonisierung der besonderen Verbrauchssteuern in der Europäischen Gemeimnschaft» ZfZV 1993, p. 170.

(10) - Em teoria, impostos especiais sobre os serviços, como as representações teatrais ou de cinema [v. acórdão de 19 de Março de 1991, Giant (C-109/90, Colect., p. I-1385)], poderiam ser considerados como impostos especiais de consumo, mas a noção de imposto especial de consumo está tradicionalmente associada a impostos sobre produtos.

(11) - Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, em matéria de harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme (JO L 145, p. 1).

(12) - V. Easson: Taxation in the European Community (Londres, 1993), p. 144.

(13) - V. Farmer & Lyal: EC Tax Law (Oxford, 1994), p. 225 (tradução livre). A diversidade destes impostos, que vão desde impostos especiais sobre, nomeadamente, o café e as lâmpadas na Alemanha a impostos sobre o salmão na Dinamarca e sobre as bananas na Itália, encontra-se ilustrada por Sterdyniak e o.: Vers une Fiscalité Européenne (Paris, 1991), p. 238.

(14) - Proposta de directiva do Conselho relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais sobre o consumo, no artigo 3._, n._ 2 (JO 1990, C 322, p. 1).

(15) - V. artigo 3._, n._ 2, que é largamente citado no n._ 4 supra. O Conselho foi mais longe do que a alteração proposta pelo Parlamento Europeu, o qual sugeria que os Estados-Membros «... conservarão a faculdade de introduzir outro imposto que não o imposto sobre consumos específicos e o imposto sobre o valor acrescentado... desde que esses impostos não originem, nas trocas comerciais entre os Estados-Membros, nem tributações à entrada do território nacional, nem desagravamentos à saída do território nacional, nem controlos nas fronteiras» (o sublinhado é nosso) (JO 1991, C 183, p. 123).

(16) - O artigo 8._, n._ 1, da proposta, apresentada pela Comissão, de directiva do Conselho respeitante à harmonização das estruturas dos impostos especiais de consumo sobre os óleos minerais (JO 1990, C 322, p. 18), ao descrever a obrigação dos Estados-Membros de isentar os produtos em questão, não mencionava expressamente os impostos especiais de consumo visados.

(17) - Este ponto de vista é além disso corroborado pelo artigo 8._, n._ 4, da directiva sobre os óleos minerais. Este contém uma disposição geral nos termos da qual o Conselho pode autorizar os Estados-Membros a introduzir outras isenções além das que estão previstas no artigo 8._, n.os 1 a 3; v., em último lugar, a Decisão 96/418/CE do Conselho, de 27 de Junho de 1996, que autoriza um Estado-Membro, nos termos do artigo 8._, n._ 4 da Directiva 92/81, a introduzir ou continuar a aplicar isenções ou reduções de impostos especiais de consumo sobre certos óleos minerais utilizados para fins específicos (JO L 172, p. 22).

(18) - No acórdão de 11 de Novembro de 1997, Eurotunnel e o. (C-408/95, Colect., p. I-6315), o Tribunal de Justiça descreveu o «objectivo» da directiva geral como sendo o de «criar, a partir de 31 de Dezembro de 1992, as condições de circulação dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo no âmbito do mercado interno sem fronteiras fiscais» (n._ 7).

(19) - V. n._ 15 supra.

(20) - Acórdão de 19 de Janeiro de 1982 (8/81, Recueil, p. 53, n._ 25).

(21) - V. acórdão Becker, já referido, n.os 32 a 34. Para uma jurisprudência mais recente na mesma linha, v. os acórdãos de 30 de Outubro de 1993, Balocchi (C-10/92, Colect., p. I-5105, e de 6 de Julho de 1995, BP Soupergaz (C-62/93, Colect., p. I-1883).

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