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Document 61997CC0108

    Conclusões do advogado-geral Cosmas apresentadas em 5 de Maio de 1998.
    Windsurfing Chiemsee Produktions- und Vertriebs GmbH (WSC) contra Boots- und Segelzubehör Walter Huber e Franz Attenberger.
    Pedidos de decisão prejudicial: Landgericht München I - Alemanha.
    Directiva 89/104/CEE - Marcas - Indicações de proveniência geográfica.
    Processos apensos C-108/97 e C-109/97.

    Colectânea de Jurisprudência 1999 I-02779

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1998:198

    CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

    GEORGES COSMAS

    apresentadas em 5 de Maio de 1998 ( *1 )

    I — Introdução

    1.

    Com as questões prejudiciais que submeteu ao Tribunal de Justiça, a primeira secção comercial do Landgericht München I solicita a interpretação do artigo 3.°, n.os 1, alínea c), e 3, primeira frase, e do artigo 6.°, n.° 1, alìnea b), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas ( 1 ) (a seguir «directiva»).

    2.

    Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe, por um lado, a sociedade Windsurfing Chiemsee Produktionsund Vertriebs GmbH (WSC), demandante no processo principal (a seguir «demandante»), e, por outro, a), no processo C-108/97, a empresa Boots- und Segelzubehör Walter Huber (a seguir «primeira demandada») e, b), no processo C-109/97, a empresa Franz Attenberger (a seguir «segunda demandada»), litigio este que resulta do facto de estas últimas terem utilizado, para distinguir os seus produtos, a marca «Chiemsee», que tinha sido registada pela primeira.

    II — Directiva 89/104

    3.

    O artigo 2.° da directiva está redigido do seguinte modo:

    «Podem constituir marcas todos os sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente as palavras, incluindo os nomes de pessoas, desenhos, letras, números, a forma do produto ou da respectiva embalagem, na condição de que tais sinais sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.»

    4.

    O artigo 3.°, que define os motivos de recusa ou de nulidade dc uma marca, está redigido do seguinte modo:

    «1.   Será recusado o registo ou ficarão sujeitos a declaração de nulidade, uma vez efectuados, os registos relativos:

    a)

    ...

    b)

    ...

    c)

    Às marcas constituídas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos;

    d)

    ...

    ...

    h)

    ...

    2.   ...

    3.   Não será recusado o registo de uma marca ou este não será declarado nulo nos termos do n.° 1, alíneas b), c) ou d), se, antes da data do pedido de registo e após o uso que dele foi feito, a marca adquiriu um carácter distintivo. Os Estados-Membros podem prever, por outro lado, que o disposto no primeiro período se aplicará também no caso cm que o carácter distintivo tiver sido adquirido, após o pedido de registo ou o registo.

    ...»

    5.

    O artigo 5.°, relativo aos direitos conferidos pela marca, está redigido do seguinte modo:

    «1.   A marca registada confere ao seu titular um direito exclusivo. O titular fica habilitado a proibir que um terceiro, sem o seu consentimento, faça uso na vida comercial:

    a)

    De qualquer sinal idêntico à marca para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada;

    b)

    De um sinal relativamente ao qual, devido à sua identidade ou semelhança com a marca e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços a que a marca e o sinal se destinam, exista, no espírito do público, um risco de confusão que compreenda o risco de associação entre o sinal e a marca.

    2.   ...

    ...

    5.   ...».

    6.

    Além disso, o artigo 6.°, relativo à limitação dos efeitos da marca, está redigido do seguinte modo:

    «1.   O direito conferido pela marca não permite ao seu titular proibir a terceiros o uso, na vida comercial:

    a)

    ...

    b)

    De indicações relativas à espécie, à qualidade, à quantidade, ao destino, ao valor, à proveniência geográfica, à época de produção do produto ou da prestação do serviço ou a outras características dos produtos ou serviços;

    c)

    ...

    desde que esse uso seja feito em conformidade com práticas honestas em matéria industrial ou comercial.»

    III — Enquadramento jurídico nacional

    7.

    Como resulta do despacho de reenvio, antes da transposição da directiva e até 31 de Dezembro de 1994, a Ici que se aplicava na República Federal da Alemanha era a Warenzcichcngcsetz (lei sobre as marcas, a seguir «WZG»), cujo artigo 4.°, n.° 2, primeiro parágrafo, excluía o registo de marcas «desprovidas de caracter distintivo ou constituídas exclusivamente por... termos que contenham indicações sobre a espécie, a época c o lugar do fabrico, a qualidade, o destino... dos produtos».

    8.

    Todavia, mesmo as marcas desprovidas de caracter distintivo, na acepção da disposição supracitada, eram protegidas, por força do artigo 4.°, n.° 3, da WZG, se «estivessem implantadas no comércio».

    9.

    Além disso, a WZG reconheceu, no artigo 25.° («Ausstattungsschutz»; «Protecção da apresentação»), a possibilidade dc aquisição de um direito sobre uma marca cm razão não do seu registo, mas do seu uso c da incidência desse uso sobre o comércio. Segundo o despacho de reenvio, a disposição em questão tinha utilizado, para definir o requisito exigido, o termo «notoriedade» («Vcrkchrsgcl-tung»).

    10.

    A directiva foi transposta para o direito alemão pela Markengesetz (lei sobre as marcas, a seguir «MarkenG»), que entrou cm vigor cm 1 de Janeiro de 1995 ( 2 ).

    11.

    O artigo 8.°, n.° 2, desta lei, que corresponde ao artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva, determina que será recusado o registo, designadamente, às marcas «constituídas exclusivamente por indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica... ou outras características do produto».

    12.

    Por força do artigo 8.°, n.° 3, da MarkenG, uma marca não susceptível de protecção, por cair sob a alçada do disposto no artigo 8.°, n.° 2, desta mesma lei ( 3 ), pode, no entanto, ser registada «se, antes da data da decisão relativa ao registo, a marca se tiver implantado nos meios interessados cm consequência do seu uso no que toca às mercadorias... para as quais foi registada».

    13.

    Ademais, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, desta mesma lei (que substituiu o artigo 25.° da lei anterior), pode-se adquirir um direito sobre uma marca em razão do seu uso e da notoriedade que ela adquiriu no comércio.

    14.

    Segundo a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais alemães, a noção de «implantação» («Verkehrsdurchsetzung») é mais extensa e mais fundamental do que a de «notoriedade» («Verkehrsgeltung»). Assim, o facto de o registo de uma marca ser aceite por ela se ter implantado no comércio significa necessariamente que ela adquiriu uma certa notoriedade — mas o inverso não é verdadeiro. Para determinar se há notoriedade ou implantação, deve distinguir-se entre os elementos verbais e morfológicos de uma marca que têm «por natureza» um carácter distintivo e aqueles que dele carecem (tais como as denominações descritivas, nomeadamente as que designam a proveniência geográfica). Os primeiros justificam, de uma maneira geral, o registo e a protecção da marca, enquanto os segundos devem ter sido aceites, através do uso, pelos meios comerciais interessados. A percentagem de aceitação, no caso da notoriedade//implantação, situa-se aproximadamente entre 16% e 70%. Para comprovar essa percentagem, recorre-se principalmente a sondagens. Todavia, a jurisprudência e a doutrina alemãs aceitam dificilmente o reconhecimento e a protecção de indicações que devem manter-se «à disposição de todos», isto é, se bem compreendo, que aceitam dificilmente que uma empresa tenha o monopólio de indicações que outras empresas também têm interesse em utilizar.

    IV — Os factos

    15.

    Com os seus 80 km2 de superfície, o Chiemsee é o maior lago da Baviera. E um pólo de atracção turística. Pratica-se, designadamente, o surf. Na região circundante, chamada «Chiemgau», predominam as actividades agrícolas.

    16.

    A demandante tem sede em Grabenstätt, nas imediações do Chiemsee. Comercializa roupas e calçado de desporto, bem como outros artigos de desporto que estejam na moda («fashion sport»), que são desenhados por uma sociedade irmã, também instalada perto do Chiemsee, e são fabricados noutra região. Desde 1990, a demandante utiliza o nome do lago para designar os seus produtos. Além disso, entre 1992 e 1995, a demandante registou a mesma denominação como marca dos seus produtos, sob a forma de diferentes representações gráficas, acompanhadas por vezes de imagens (em especial, a de um desportista a mergulhar, se o estou a interpretar correctamente) e de indicações verbais suplementares, tais como «Chiemsee Jeans»,«Windsurfing — Chiemsee — Active Wear», «By Windsurfing Chiemsee», etc. Estas marcas, tais como reproduzidas no despacho de reenvio, são, por ordem cronológica, as seguintes:

     

    Número de registo/Marca

    Data de registo

    A.

    2009617

    17.2.1992

    Image

    B.

    2009618

    17.2.1992

    Image

    C.

    2014831

    1.6.1992

    Image

    D.

    2043643

    31.8.1993

    Image

    E.

    2043644

    31.8.1993

    Image

    F.

    2086304

    30.11.1994

    Image

    G.

    2901054

    31.1.1995

    Image

    17.

    Como o órgão jurisdicional de reenvio observou, as autoridades alemãs competentes, administrativas e judiciais, consideram, desde sempre, que o termo «Chiemsee» designa uma proveniência geográfica e que, por conseguinte, não é, em si mesmo, susceptível de registo como marca. No entanto, admitem o seu registo exclusivamente em virtude da sua representação gráfica, sempre diferente, e dos elementos que a acompanham.

    18.

    A demandada no processo C-108/97, com sede numa região próxima do Chiemsee, comercializa, apenas a partir dc 1995, designadamente, roupas de desporto (tais como camisetas, camisolas, etc.). Estes produtos contêm a indicação distintiva «Chiemsee», que não foi registada como marca c que se apresenta sob a forma gráfica seguinte:

    (a)

    Image

    19.

    Por seu turno, a demandada no processo C-109/97 comercializa, nos arredores do Chiemsee, produtos análogos aos da empresa anterior, os quais contêm, além da indicação distintiva reproduzida imediatamente a seguir, as seguintes indicações, que também não foram registadas:

    (b)

    Image

    (c)

    Image

    20.

    No processo principal, a demandante opôs-se à utilização pelas demandadas da denominação «Chiemsee», alegando que, apesar das diferenças de representação gràfica, havia risco de confusão com a denominação que ela própria utiliza desde 1990, que registou como marca e que é conhecida no comércio.

    21.

    Em contrapartida, as demandadas defenderam que o termo «Chiemsee» não é susceptível de protecção, dado tratar-se de uma indicação de proveniência geográfica, que deve continuar à disposição de todos e que, por conseguinte, o seu uso, sob outra forma gráfica, não pode criar qualquer risco de confusão.

    22.

    Sendo assim, o órgão jurisdicional nacional considerou indispensável submeter as seguintes questões ao Tribunal de Justiça:

    «1)

    Questões relativas ao artigo 3.°, n.° 1, alínea c):

    Deve o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), ser entendido no sentido de ser suficiente que exista a possibilidade de utilizar uma indicação relativa à determinação da proveniência geográfica, ou tal possibilidade tem de ser concretamente precisada (no sentido de que já outras empresas similares se servem dessa palavra para indicar a proveniência geográfica dos seus produtos do mesmo tipo ou, pelo menos, existem indícios concretos de que tal sucederá num futuro previsível), ou deve mesmo existir a necessidade de utilizar essa designação para indicar a proveniência geográfica dos produtos em questão, ou deve, além disso, existir ainda uma necessidade qualificada de utilização dessa indicação de proveniência em virtude de, por exemplo, mercadorias do mesmo tipo, produzidas nessa região, gozarem de uma especial reputação?

    Tem importância, para uma interpretação lata ou estrita do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), relativamente às indicações de proveniência geográfica, a circunstância de os efeitos da marca serem limitados, na acepção do artigo 6.°, n.° 1, alínea b)?

    Nas indicações de proveniência geográfica do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), incluem-se apenas aquelas que dizem respeito ao fabrico do produto naquele local, ou é suficiente o comércio de tais produtos nesse local ou a partir desse local, ou é suficiente, no caso de produção de têxteis, que sejam projectados na região indicada, embora, por razões ligadas ao processo produtivo, sejam produzidos noutro lugar?

    2)

    Questões relativas ao artigo 3.°, n.° 3, primeira frase:

    Que exigências resultam deste preceito no que respeita à possibilidade de registo de uma indicação descritiva nos termos do artigo 3.°, n.° 1, alínea c)?

    Em especial: as exigências são iguais cm todos os casos ou devem ser distintas consoante o grau de necessidade do livre uso da indicação (“Freihaltebedürfnis”)?

    Em especial, é compatível com esta disposição a jurisprudência alemã, tal como definida até hoje, segundo a qual, quanto às indicações descritivas cujo livre uso seja necessário, se exige a comprovação de uma implantação (“Verkehrsdurchsetzung”) no mercado superior a 50% dos sectores em causa?

    Desta disposição resultam exigências sobre a forma como o carácter distintivo obtido pela utilização deve ser determinado?»

    V — Quanto ao mérito

    A — Primeira questão

    23.

    Com as primeira c terceira partes da primeira questão prejudicial, que devem ser examinadas cm conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, cm suma, se c cm que condições é que uma designação geográfica pode constituir uma marca c, cm caso de resposta positiva, em que medida č que tal marca está protegida relativamente a terceiros.

    24.

    Para responder a esta questão, é, antes de mais, necessário recordar qual é o objectivo da directiva, bem como a razão que justifica a protecção de uma marca.

    25.

    Como resulta dos seus primeiro e terceiro considerandos, a directiva tem em vista uma primeira aproximação das legislações divergentes dos Estados-Membros em matéria de marcas, dado que as disparidades existentes são susceptíveis de entravar a livre circulação dos produtos e a livre prestação de serviços e de falsear as condições de concorrência no mercado comum.

    26.

    Com esta finalidade, a directiva estabelece, sobretudo, regras comuns relativas ao registo e à eventual declaração posterior de nulidade da marca e determina o conteúdo e os limites da protecção do direito à marca, deixando aos Estados-Membros o encargo de regulamentarem os pormenores, nomeadamente aqueles que dizem respeito aos procedimentos.

    27.

    O objectivo central do sistema aprovado pelo legislador comunitário é a defesa e a protecção da função essencial da marca. Esta função, como resulta nomeadamente do sétimo considerando e dos artigos 2°, 3.°, n.os 1, alínea b), e 3, 5.°, n.° 5, e 10.°, n.° 2, alínea a), da directiva, consiste, por um lado, na individualização dos produtos de uma empresa e na sua distinção relativamente a outros produtos semelhantes (função distintiva da marca) e, por outro, na sua ligação a uma empresa determinada (garantia de proveniência).

    Com efeito, como o Tribunal de Justiça salientou por diversas vezes, «a função essencial da marca... é a de garantir ao consumidor ou ao utente final a identidade originária do produto marcado, permitindo-lhe distinguir, sem confusão possível, tal produto de outros com diversa proveniência» ( 4 ).

    28.

    Em meu entender, é, precisamente, tendo em conta esta função da marca que o artigo 3.°, n.° 1, da directiva considera a falta de carácter distintivo um fundamento autónomo de recusa do registo ou de nulidade da marca [caso b)], mas também um fundamento mais específico de nulidade ou de recusa das marcas que ou são constituídas exclusivamente por indicações descritivas [caso c)], ou se tornaram usuais na linguagem corrente ou no comércio [caso d)].

    29.

    Com efeito, se bem que, no texto da directiva, os casos c) e d) sejam, do ponto de vista formal, distintos do caso b), trata-se, em suma, de casos mais particularizados ou mais específicos ou simplesmente mais característicos de falta de caracter distintivo da marca que explicam e esclarecem a noção geral de falta de carácter distintivo, sem introduzirem noções de outro tipo ou fundamentalmente diferentes desta ( 5 ). Também sou levado a esta conclusão, se interpretar paralelamente o número supracitado e o n.° 3 do artigo 3.°, por força do qual não pode ser recusado o registo de uma marca nem este declarado nulo nos termos do n.° 1, alínea b), c) ou d), se esta tiver adquirido posteriormente um carácter distintivo, devido ao uso que dela foi feito. Por outras palavras, nesses casos, que são tratados conjuntamente no artigo 3.°, n.° 3, a marca adquire posteriormente a qualidade que lhe faltava inicialmente e cuja falta obstava ao seu registo ou tornava possível o seu cancelamento, ou seja, o carácter distintivo. Por conseguinte, deve considerar-se que os casos não especificamente visados no artigo 3.°, n.° 1, alíneas c) ou d), cabem no âmbito do artigo 3.°, n.° 1, alínea b) ( 6 ).

    30.

    Dcbrucemo-nos, agora, sobre a disposição controvertida do artigo 3.°, n.° 1, alínea c). Resulta da própria formulação desta disposição que devem ser preenchidos três requisitos para que uma marca constituída por uma indicação geográfica caia sob a alçada desta disposição: a) a marca deve ser constituída exclusivamente por uma indicação de natureza geográfica; b) a indicação deve poder servir, no comércio, para designar a proveniência geográfica; c) a proveniência geográfica deve constituir uma característica do produto. Mais especificamente:

    a) Exclusividade

    31.

    Convém observar, antes de mais, que só cabem no âmbito desta disposição as marcas constituídas «exclusivamente» por sinais ou por indicações de conteúdo puramente descritivo. Por conseguinte, as marcas compostas que, além das indicações cm causa, contenham uma ou várias palavras, imagens, representações, etc, que, isoladamente ou cm combinação com a indicação descritiva, conferem um carácter distintivo à marca, não estão abrangidas. Deste ponto de vista, marcas como as da demandante na processo principal acima designadas por A), B), C), D) e E) ou a da segunda demandada acima designada por c) não cabem, em meu entender, no âmbito da disposição controvertida ( 7 ).

    32.

    Por conseguinte, o problema põe-se, em casos como o da causa principal, em relação a marcas constituídas exclusivamente por uma indicação geográfica, como as marcas da demandante acima designadas por F) e G), e as das demandadas acima designadas por a) e b).

    b) Proveniência geográfica

    33.

    Como já indiquei, resulta do despacho de reenvio que as autoridades alemãs consideram que uma indicação geográfica como «Chiem-see» é descritiva e, por conseguinte, não é susceptível, em si mesma, de registo. Aceitam-na, porém, exclusivamente, porque a sua representação gráfica é diferente de cada vez. Quanto a este aspecto, o órgão jurisdicional de reenvio menciona as marcas da demandante acima designadas por F) e G), que só diferem pela representação gráfica específica da palavra «Chiemsee», de que são constituídas.

    34.

    Considero que esta concepção é errada. Sempre que o único ou o principal elemento constitutivo de uma marca for um termo geográfico, a questão de saber se esse termo serve para designar a proveniência geográfica, na acepção da disposição controvertida, deve ser apreciada segundo critérios objectivos, tendo em conta o significado que o termo tem considerado em si mesmo. O único ou o principal elemento constitutivo de marcas como as designadas acima por F) e G), bem como por a) e b), é o elemento verbal, isto é, a impressão sonora produzida pela percepção do termo «Chiemsee» no ouvido ou na imaginação do ouvinte ou do espectador. A impressão visual provocada por cada uma dessas marcas tem uma amplitude limitada e desempenha um papel inteiramente secundário na percepção da marca, porque se limita à apresentação gráfica diferente do mesmo termo [na marca acima designada por b), o termo «Chiemsee» está simplesmente colocado no interior de uma elipse de cor mais escura], sem que intervenham outros termos ou imagens que reforcem a marca ou a ponham em evidência. Isto tem como resultado provocar a confusão quanto à relação entre as marcas, porque se dá a impressão de se tratar simplesmente de variantes da mesma marca e, por extensão, de produtos provenientes de uma mesma empresa comercial à qual a marca pertence. Em conclusão, a representação gráfica diferente de cada vez do mesmo termo não constitui um elemento distintivo ou suplementar que acresça, pretensamente, ao termo geográfico, de modo a criar de cada vez uma marca «composta», como o órgão jurisdicional dc reenvio supõe sem razão. Trata-se de marcas simples que são ou idênticas ou semelhantes [como as marcas acima designadas por F) e por a)], de tal modo que dão a impressão que se trata de variantes da mesma marca.

    A tese contrária teria como resultado a multiplicação até ao infinito das marcas constituídas pelo mesmo termo, dado que os modos como um termo pode ser representado graficamente são cm número infinito. Isto criaria, todavia, uma confusão total no mercado c multiplicaria os conflitos entre marcas, o que o legislador comunitário não pode ter querido ( 8 ).

    35.

    Convém observar, cm seguida, que a disposição litigiosa não pode excluir cm bloco todos os termos geográficos.

    Assim, é evidente que as denominações geográficas imaginárias, míticas ou inexistentes (por exemplo, «Thulé», «Utopia», «No Man's Land», «Atlântida», etc.) não cabem no âmbito desta disposição, dado ser impossível que designem qualquer proveniência geográfica.

    Do mesmo modo, os nomes de cidades, de lugares ou de regiões que desapareceram ou mudaram de nome ao longo dos séculos (por exemplo, «Bizâncio», «Dácia», «Lutécia», «Babilónia», etc.).

    Além disso, as denominações geográficas que não é lógico ou verosímil designarem a proveniência geográfica do produto cm causa não podem caber no âmbito desta disposição. Citam-se habitualmente, a este propósito, as marcas «Mont Blanc», para as canetas (porque ninguém pode logicamente supor que este produto provenha da montanha cm questão), «Pólo Norte», para as bananas (porque o clima reinante nesta latitude não permite a cultura de bananas), etc.

    Do mesmo modo, não se podem tomar em consideração os termos geográficos completamente desconhecidos, isto é, termos que se referem a lugares desconhecidos do grande público, quer se situem no interior quer no exterior do Estado-Mcmbro no qual se suscita a questão da protecção da marca, dado que, cm todo o caso, o público não está cm condições de relacionar o produto cm causa com os lugares designados pelos termos geográficos cm questão.

    36.

    Em todos os casos supracitados, o termo geográfico não designa a proveniência geográfica do produto, quer cm virtude da sua natureza, quer cm razão das circunstâncias, c, por conseguinte, pode legitimamente ser utilizado como marca. Isto é assim porque a ligação entre o significante (a denominação) e o significado (aquilo que é designado pela denominação) é arbitrária ( 9 ), ou seja, é de tal modo original e inesperada que permite individualizar o produto e distingui-lo dos produtos correspondentes de outras empresas. Portanto, nestes casos, a marca cumpre, em princípio, a sua função distintiva.

    37.

    Resulta do que antecede que a distinção controvertida não obsta à utilização de todos os termos geográficos em geral, mas somente de alguns deles. Estes termos são, em nosso entender, os termos geográficos que, no momento da apresentação da marca, ainda não estavam consolidados, mas podiam constituir «indicações de proveniência» ou «denominações de origem», no sentido específico que estes termos jurídicos tinham no direito comunitário no momento da adopção da directiva.

    Com efeito, se o legislador comunitário queria excluir as indicações que designam simplesmente a proveniência geográfica, faria referência aos sinais que designam esta proveniência, e isto porque, tanto na linguagem corrente como no comércio, essa é a função primordial das indicações geográficas. O facto de a directiva utilizar a perifrase «que possam servir, no comércio, para designar...» significa, cm meu entender, que essas indicações têm o significado específico que acima defini.

    38.

    Os termos «indicações de proveniência» e «denominações de origem» tinham um significado preciso em direito comunitário muito antes de o legislador comunitário os definir, no que diz respeito, pelo menos, ao sector dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios, no Regulamento (CEE) n.° 2081/92 ( 10 ).

    39.

    Na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça esclareceu o conteúdo destes termos, sobretudo no quadro da interpretação do artigo 36.° do Tratado CE. Tratava-se de processos em que se'suscitava a questão de saber se restrições impostas por medidas nacionais à livre circulação de mercadorias se podiam justificar pela protecção de direitos que constituíam o objecto específico da propriedade industrial e comercial e, em especial, de «indicações de proveniência» e «denominações de origem».

    40.

    Assim, no acórdão de 20 de Fevereiro de 1975, Comissão/Alemanha ( 11 ), o Tribunal de Justiça decidiu que «as denominações de origem c as indicações de proveniência mencionadas na referida directiva, sejam quais forem os elementos que as possam distinguir, designam, pelo menos, em todos os casos, um produto proveniente duma zona geográfica determinada; que, na medida cm que essas denominações são juridicamente protegidas, devem corresponder aos objectivos desta protecção, nomeadamente à necessidade de assegurar não apenas a salvaguarda dos interesses dos produtores em causa contra a concorrência desleal, mas também a dos consumidores contra indicações susceptíveis de os induzir em erro;

    que essas denominações só cumprem a sua função específica se o produto que designam possuir efectivamente as qualidades e características atribuídas à localização geográfica da sua proveniência;

    que, especialmente quando se trata de indicação de proveniência, a localização geográfica de origem de um produto deve imprimir a este uma qualidade c características específicas susceptíveis de o individualizar» (n.° 7).

    41.

    Aliás, no acórdão de11 de Março de 1984, Prantl ( 12 ), que foi precisado pelo acórdão de 10 de Novembro de 1992, Exportur ( 13 ), o Tribunal de Justiça reconheceu que a garrafa que contém um produto podia constituir uma «designação indirecta de proveniência geográfica» (tratava-se da garrafa «Bocksbeutel», utilizada pelos produtores de vinho da Francónia e de Baden para a apresentação dos seus vinhos). Como resulta do acórdão, esta indicação é susceptível de protecção se for utilizada desde há muito tempo pelos produtores de uma determinada região para distinguir os seus produtos, mas os artigos 30.° c 36.° do Tratado obstam a uma medida nacional que reserve exclusivamente aos produtores nacionais o direito de utilizarem essas garrafas se produtores de outros Estados-Mcmbros utilizem também tradicionalmente c desde há muito tempo garrafas similares para comercializar os seus vinhos.

    42.

    No processo Exportur, a que acabo de fazer referência, suscitava-sc a questão de saber se sociedades francesas tinham o direito de produzir e de vender em França produtos de confeitaria para as quais utilizavam as denominações «Alicante» c «Jijona» (nomes de cidades espanholas), que eram usados por uma empresa espanhola desde há muito tempo para qualificar produtos similares do seu fabrico ( 14 ). No acórdão que proferiu neste processo, o Tribunal de Justiça estabeleceu a seguinte distinção entre as noções de «indicação de proveniência» e de «denominação de origem»:

    «as indicações de proveniência destinam-se a informar o consumidor de que o produto sobre o qual são apostas provém de um lugar, de uma região ou de um país determinado. Esta proveniência geográfica pode estar associada a uma maior ou menor reputação» (n.° 11).

    Em contrapartida, «a denominação de origem, por seu lado, garante, além da proveniência geográfica do produto, o facto de a mercadoria ter sido fabricada de acordo com normas de qualidade e de fabrico aprovadas por um acto de autoridade pública e por esta controladas e, portanto, a existência de determinadas características próprias» (mesmo número).

    43.

    A protecção, pelo direito comunitário, das denominações de origem ou das indicações de proveniência geográfica constitui um objectivo de interesse geral. Assim, um produtor de vinho não está autorizado a utilizar, nas menções relativas ao método de elaboração do vinho, indicações geográficas que não correspondam à proveniência efectiva do vinho ( 15 ).

    44.

    No termo do longo percurso que conduziu a uma definição do conteúdo dos dois termos controvertidos, segundo o caminho traçado, principalmente, pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, o artigo 2° do Regulamento n.° 2081/92, já referido ( 16 ), dá as seguintes definições comunitárias:

    «2.   Na acepção do presente regulamento, entende-se por:

    a)

    “Denominação de origem”, o nome de uma região, de um local determinado ou, em casos excepcionais, de um país, que serve para designar um produto agrícola ou um género alimentício:

    originário dessa região, desse local determinado ou desse país e

    cuja qualidade ou características se devem essencial ou exclusivamente ao meio geográfico, incluindo os factores naturais e humanos, c cuja produção, transformação c elaboração ocorrem na área geográfica delimitada;

    b)

    “Indicação geográfica”, o nome de uma região, de um local determinado ou, cm casos excepcionais, de um país, que serve para designar um produto agrícola ou um género alimentício:

    originário dessa região, desse local determinado ou desse país

    e

    cuja reputação, determinada qualidade ou outra característica podem ser atribuídas a essa origem geográfica e cuja produção c/ou transformação e/ou elaboração ocorrem na área geográfica delimitada» ( 17 ).

    45.

    Das considerações precedentes resulta que, em direito comunitário, e sobretudo no domínio dos sinais distintivos, entre os quais se contam as marcas, a noção de «indicação de proveniência geográfica» é uma noção jurídica precisa c visa o nexo causal, directo c necessário, entre um produto e o lugar donde ele provém. Este nexo causal resulta do facto de o produto possuir determinadas particularidades, características ou qualidades, que estão ligadas à sua origem. Estas características específicas podem resultar de factores naturais (por exemplo, as matérias-primas, o solo, o clima da região), do método de fabrico ou de tratamento do produto (por exemplo, o método de fabrico tradicional) ou de factores humanos (por exemplo, a concentração de empresas similares na mesma região, a especialização no fabrico de certos produtos c a manutenção da qualidade a determinados níveis). Quando os produtos cm questão se tornam conhecidos de modo mais amplo, o lugar onde são fabricados também adquire uma reputação, de tal modo que, posteriormente, nos meios interessados, a menção do nome do lugar remete para o produto ou para o tipo de produto que aí é fabricado (por exemplo, «Limoges» ou «Meissen», quanto à porcelana, «Bordéus», para os vinhos, etc.) ( 18 ). Além disso, se o nexo causal, acima descrito, entre o lugar c o produto se tiver consolidado, o nome do lugar torna-se o bem comum dos produtores estabelecidos na região, o que lhes confere o direito exclusivo de utilizar esse nome. Este direito é, em regra, reconhecido a nível nacional c também é protegido a nível comunitário.

    46.

    Assim sendo, como a demandante defende com razão, o artigo 3.°, n.° 1, alinea c), da directiva significa que uma indicação geográfica tem um poder distintivo e pode constituir legítimamente urna marca que designa os produtos de urna determinada empresa, desde que a escolha desta indicação seja «arbitrária», na acepção que acima dei a este termo, ou seja, desde que ela não constitua nem possa constituir uma indicação de proveniência nem uma denominação de origem. A razão disto reside no facto de, neste caso, a percepção do termo geográfico não provocar nenhuma associação especial na imaginação do público, mas ter o mesmo resultado que teria se se tivesse escolhido qualquer outro termo ou nome de pura invenção.

    Pelo contrário, se a indicação geográfica já for conhecida por estar ligada a certos produtos, isto é, se já se tiver criado um vínculo directo e necessário entre a indicação geográfica e esses produtos, uma única empresa não se pode apropriar por si só do respectivo monopólio para dele fazer uma marca. Basta para tal que, no momento da apresentação da marca cujo reconhecimento se requer (em certos casos, no momento da aprovação da decisão sobre esta questão), se satisfaçam os requisitos de facto a que está sujeita a protecção de uma indicação geográfica como indicação de proveniência ou denominação de origem (fabrico nesse lugar de produtos que têm determinadas características), quer a indicação em causa já tenha sido legalmente registada quer não. Com efeito, segundo a letra da disposição controvertida, basta que a indicação ( 19 ) possa «servir, no comércio, para designar... a proveniência geográfica».

    47.

    Para refutar a tese acima descrita, as demandadas invocam as disposições nacionais e a jurisprudência alemã, segundo as quais, como já antes afirmei, uma indicação geográfica não é, em princípio, susceptível de ser aceite como marca, por ter carácter descritivo e dever continuar a estar disponível para todos. É, aliás, esta tese que o órgão jurisdicional de reenvio parece, de facto, adoptar.

    48.

    A este respeito, deve notar-se, antes de mais, que, segundo jurisprudência constante, «ao aplicar o direito nacional, quer se trate de disposições anteriores ou posteriores à directiva, o tribunal nacional chamado a interpretá-lo tem o dever de o fazer na medida do possível à luz do teor e da finalidade da directiva, de modo a atingir o resultado por esta prosseguido» ( 20 ). Isto vale por maioria de razão no presente caso, em que a directiva exclui expressamente a aplicação paralela das disposições nacionais do direito das marcas (sexto considerando).

    49.

    Em meu entender, a tese das demandadas está em conformidade com a tendência que era perfilhada por certos direitos nacionais (entre os quais o direito alemão) antes da adopção da directiva, no que diz respeito ao registo das indicações geográficas como marcas, tendência essa que deverá ser abandonada doravante. Com efeito, antes da adopção da directiva, os direitos dos Estados-Membros perfilhavam, grosso modo, duas tendências no que diz respeito ao problema ora em exame. Havia uma tendência flexível, que aceitava, cm princípio, o registo das indicações em questão, sob certas condições, fundamentalmente análogas às que propus acima (trata-se, cm especial, dos direitos francês, italiano c do Benelux); havia também uma tendência estrita, que recusava, cm princípio, o registo dessas indicações, por razões fundamentalmente análogas às que foram invocadas pelas demandadas (trata-se, cm especial, dos direitos britânico, alemão c escandinavos) ( 21 ).

    Um caso característico da segunda tendência é o do termo «York», no qual, cm 1982, a Câmara dos Lordes recusou, finalmente, uma marca de reboques com esse termo, com o fundamento, nomeadamente, de que «um nome geográfico não 6, à primeira vista, susceptível de registo», c confirmou a tese da autoridade administrativa, segundo a qual «parece perfeitamente razoável concluir que reboques ou semi-reboques... possam [isto é, cm York] ser produzidos no futuro, ou até desde já» ( 22 ).

    Do mesmo modo, na Alemanha, foi recusada a marca «Nola» proposta com vista a distinguir alimentos dietéticos e flocos de cereais em virtude da existência de uma cidade italiana com o mesmo nome c em cuja região se produziam cereais, se bem que esta circunstância não fosse do conhecimento do consumidor alemão médio. Quanto a esta questão, o órgão jurisdicional alemão julgou «não ser de todo inverosímil que o [nome] Nola seja, no futuro, utilizado como indicação de proveniência geográfica. Em especial, se se considerar o aumento do comércio entre a Alemanha c a Itália sob a égide do mercado comum, existe um interesse dos concorrentes cm que os nomes geográficos, mesmo os de menor importância, possam ser livremente utilizados por todos» ( 23 ).

    50.

    Se o órgão jurisdicional de reenvio e as demandadas concebem a «necessidade de a indicação geográfica continuar a estar à disposição de todos» na acepção acima descrita, esta concepção está errada c não é conforme à directiva.

    51.

    Antes dc mais, a única «disponibilidade» que a directiva reconhece é a necessidade dc a indicação ou o sinal sujeito a registo como marca esteja disponível, ou seja, que outra empresa dele se não tenha apropriado para qualificar produtos idênticos ou semelhantes, na data de referência, isto é, cm princípio, na data da apresentação da marca (artigo 4.°). Para este efeito, examina-sc a situação de facto, tal como realmente existe na data de referência, sem se tomarem em consideração situações hipotéticas que podem apresentar-se no futuro. Por conseguinte, se as outras condições estiverem igualmente preenchidas, ou não existe marca anterior, caso em que a nova marca deve ser aceite, ou então existe uma e, nesse caso, se essa existência for legal, a nova marca será recusada e, se essa existência for ilegal, a nova marca será aceite, salvo se houver disposição expressa em contrário da directiva.

    52.

    Isto aplica-se também, por analogia, nas situações em que, como no caso vertente, o titular de uma marca geográfica anterior solicita protecção contra a marca posterior. A nova marca só pode levar a melhor se a marca anterior não existir legalmente, no momento em que for tratado o recurso do titular desta última (por exemplo, porque era originariamente nula e não conseguiu impor-se nas transacções comerciais, ou porque era originariamente legal, mas foi posteriormente reduzida a uma denominação genérica, em virtude da inacção do seu titular ( 24 ), etc).

    53.

    Ademais, a concepção acima refutada implica uma incerteza no que respeita à questão de saber se uma indicação geográfica deve continuar «disponível», de modo a poder ser utilizada como marca, ou como indicação suplementar de outro tipo constante dos produtos. A razão disto está no facto de — se for a primeira hipótese a prevalecer — esta concepção estar viciada de uma grave contradição lógica. Com efeito, como é que se pode recusar boje, e, por maioria de razão, por razões de princípio, o direito de utilizar um termo geográfico a quem primeiro teve a ideia de o utilizar, para que esse termo continue a estar à disposição de prováveis concorrentes que apareçam no futuro}

    54.

    Se, pelo contrário, se entender por «disponibilidade» a necessidade de o termo geográfico continuar à disposição de qualquer interessado para todos os usos legítimos que não sejam o uso como marca, o problema está plenamente contemplado no artigo 6.°, n.° 1, alínea b), da directiva, como explicarei imediatamente a seguir ( 25 ). Neste caso, todavia, trata-se de uma limitação dos efeitos de um direito à marca já existente. Por outras palavras, a necessidade de o termo geográfico continuar à disposição dos concorrentes com vista a todo e qualquer uso que não seja o uso como marca não constitui de modo algum um fundamento para recusar ao titular esse direito à marca.

    c) Característica

    55.

    A interpretação acima proposta está em harmonia com a terceira exigência da disposição controvertida, segundo a qual a proveniencia geográfica deve constituir urna «característica» do produto. Este termo designa, cm meu entender, não apenas uma propriedade comum do produto, mas uma particularidade susceptível de o caracterizar e de o individualizar. No que respeita à origem de um produto, deve notar-se que todos os produtos têm uma origem, no sentido de que foram fabricados «algures». Nesta acepção, o facto de um produto ter sido fabricado «algures» é evidente e é indiferente cm si mesmo — do mesmo modo que é evidente e é, por conseguinte, também indiferente o facto de ele ter sido fabricado por «alguém», num dado «momento», de uma certa «maneira», etc. Por conseguinte, a circunstância de o produto ter sido produzido numa fábrica que se situa na localidade «A» ou na zona industrial da cidade «B» não constitui, em si mesma, uma «característica» do produto do ponto de vista que aqui nos interessa, ou seja, um elemento que possa individualizar o produto c permita distingui-lo de outros similares. O lugar, as condições, o momento deste fabrico ou a identidade do fabricante adquirem importância c «caracterizam» o produto quando já tiverem adquirido, de maneira autónoma, um significado no comércio, quando, por exemplo, já tiverem adquirido renome ou reputação. A razão disto reside no facto de, neste caso, como já expus, o produto, ligado a esses elementos, participar neste renome, nesta reputação ou simplesmente nesta qualidade a que fazem referência o lugar, as condições do fabrico ou o nome do fabricante.

    56.

    No presente caso, como é confirmado pelo órgão jurisdicional de reenvio, o Chiemsee é sobretudo conhecido como lugar de férias; na região circundante, a qual, deve recordar-se, se chama Chiemgau, são exercidas actividades turísticas c agrícolas, ao passo que a região não é conhecida pela produção de têxteis nem de roupas c, mais do que isso, de roupas de desporto. Ademais, na data do registo das marcas da demandante, não existiam, nesta região, outras sociedades que utilizassem legalmente esta marca para produtos similares ( 26 ).

    Nestas condições, penso que a escolha da indicação «Chiemsec» pela demandante para caracterizar os seus produtos era lícita nos termos do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da directiva. Com efeito, este termo geográfico não parece designar, no presente caso, a proveniência geográfica, mas somente valorizar os sentimentos positivos c agradáveis que a imagem do lago no meio de um belo meio ambiente natural suscita na imaginação de quem a capta (tal como a recordação ou a perspectiva de uma vida natural, de férias ou de actividades desportivas) ( 27 ).

    57.

    Além disso, não parece que haja no presente caso outros motivos de recusa que não sejam os mencionados no artigo 3.°, n.° 1. Por conseguinte, a escolha pela demandante do termo geográfico supracitado deve ser considerada suficientemente original c «arbitrária», na acepção acima descrita, e conforme ao artigo 2.° Portanto, mesmo as marcas da demandante constituídas exclusivamente por esta denominação estão protegidas e conferem-lhe um direito de uso exclusivo. Em especial, conferem à demandante o direito de se opor ao uso das marcas a), b) e c) das demandadas, dado que estas últimas marcas são idênticas ou semelhantes às marcas anteriores da demandante e, além disso, são utilizadas para caracterizar produtos idênticos ou semelhantes, de modo que existe manifestamente um risco de confusão no espírito do público, o qual poderia considerar todos estes produtos como sendo provenientes da mesma empresa.

    58.

    Se as marcas da demandante não são contrárias ao artigo 3.°, n.° 1, não é necessário verificar se essas marcas adquiriram um carácter distintivo «pelo uso», nos termos do artigo 3.°, n.° 3, A razão disto reside no facto de um requisito de aplicação desta última disposição exigir que a marca tenha adquirido posteriormente, pelo uso, um poder distintivo que lhe faltava inicialmente, o que não acontece no presente caso.

    59.

    Além disso, dado que a indicação «Chi-emsee» não cai, nas circunstâncias do caso vertente, sob a alçada da proibição enunciada no artigo 3.°, n.° 1, alínea c), não há, em meu entender, qualquer razão para examinar o problema que a terceira parte da primeira questão prejudicial suscita, porque esta indagação pressupõe que as indicações em causa caem no âmbito da disposição em questão ( 28 ).

    60.

    Com a segunda parte da primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, para interpretar o artigo 3.°, n.° 1, alínea c), se deve ter em conta o disposto no artigo 6.°, n.° 1, alínea b), da directiva.

    61.

    Deve dar-se uma resposta negativa a esta questão.

    62.

    O artigo 6.° tem por objectivo limitar os efeitos do direito exclusivo à marca, consagrado no artigo 5.° da directiva. Isto significa que a marca já foi registada e está protegida. Por conseguinte, foi sujeita, com êxito, ao controlo com vista a verificar se estão satisfeitos os requisitos positivos e negativos enunciados para este efeito nos artigos 2.° e 3.°, n.° 1, da directiva, dentre os quais constam os requisitos formulados no artigo 3.°, n.° 1, alínea c). Por conseguinte, se a questão da aplicação do artigo 6.° só se pode suscitar posteriormente, o artigo em questão não tem incidência directa na interpretação da disposição ora em causa.

    63.

    É possível que o órgão jurisdicional de reenvio tente informar-se sobre a questão de saber quais são os limites impostos à protecção de uma marca legalmente constituída por uma indicação geográfica, relativamente aos terceiros que têm interesse cm utilizá-la no quadro das operações comerciais que efectuam.

    64.

    Se assim for, convém observar que os terceiros não têm, cm todo o caso, o direito de utilizar a indicação cm questão tal qual como marca, porque essa utilização seria contrária ao direito exclusivo do titular. Têm, no entanto, o direito de utilizar quer indicações indirectas (por exemplo, perifrases ou imagens) ( 29 ), que designem a mesma proveniência geográfica, quer, se necessário for, a própria indicação geográfica, como endereço, em documentos ou dados que não sejam a marca, que digam respeito às suas mercadorias ou à sua actividade comercial cm geral, conformando-se com as práticas honestas no sector de actividade económica cm causa. Assim, podem com toda a razão utilizar a indicação supracitada como termo geográfico (isto é, no sentido originário c literal) na correspondência comercial, nos anúncios publicitários insertos na imprensa ou na rotulagem do produto, etc ( 30 ).

    A este respeito, deve mencionar-se o que aconteceu com a denominação «Baccarat». Bacarat é uma aldeia da Lorena, que era pouco conhecida até ao momento em que, há várias décadas, aí se instalou uma cristalaria, que utilizava o nome da aldeia como marca dos seus produtos. Estes produtos adquiriram uma reputação mundial, de modo que, para o grande público, o termo «Baccarat» passou a designar os produtos cm causa e não a aldeia. Nesta aldeia e nos arredores, instalaram-se outras cristalarias, das quais uma, que tinha a sua sede social cm Baccarat, utilizava este nome na sua correspondência. Os órgãos jurisdicionais franceses consideraram, com razão, que a protecção da marca da sociedade titular não podia chegar ao ponto de proibir que a segunda empresa fizesse do termo cm questão o uso legítimo acima descrito ( 31 ).

    B — Segunda questão

    65.

    Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em suma, se um termo geográfico que não é, cm si mesmo, susceptível de ser registado como marca pode, no entanto, ser registado por se ter implantado nos meios comerciais cm virtude do seu uso c também por que meios esta implantação pode ser comprovada.

    66.

    Tendo cm conta os antecedentes do litigio, estamos, no caso vertente, em presença de um conflito entre as novas marcas das demandadas, cujo reconhecimento estas solicitam, e as marcas da demandante, que foram registadas anteriormente.

    67.

    Convém, antes de mais, observar que o disposto no n.° 3 do artigo 3.° constitui uma excepção ao que dispõem as alíneas b), c) e d), n.° 1, do mesmo artigo. Isto significa, em casos como o presente, que uma marca constituída por uma indicação geográfica, que não era susceptível de ser registada ou podia ser invalidada com o fundamento de não ter carácter distintivo e, mais especificamente, por cair sob a alçada da alínea c) do n.° 1, se tornava susceptível de registo e deixava de correr o risco de ser invalidada se adquirisse posteriormente um carácter distintivo em virtude do uso. Por conseguinte, um requisito de aplicação do n.° 3 é o de que a marca em causa caiba no âmbito do n.° 1, alínea c).

    68.

    Já expus o meu ponto de vista, segundo o qual as marcas da demandante tinham originariamente um carácter distintivo e, portanto, não cabem no âmbito da alínea c) do n.° 1. Se esta concepção estiver correcta, não estamos, no caso vertente, perante uma hipótese de aplicação do artigo 3.°, n.° 3, e, por conseguinte, não há necessidade de responder à segunda questão prejudicial. No entanto, para ser exaustivo, tratarei também, com brevidade, dos problemas que esta última questão suscita.

    69.

    Tanto as marcas que possuem por elas mesmas carácter distintivo como as que o adquiriram posteriormente pelo uso são susceptíveis de registo nos termos da directiva, porque desempenham, ainda que por meios diferentes, a função essencial da marca, que consiste em individualizar os produtos de uma empresa e em distingui-los dos produtos similares de outras empresas.

    70.

    A directiva não explica qual é o tipo de «uso» da marca que é necessário para que ela adquira carácter distintivo. Como, porém, este uso conduz à aquisição de um direito comunitário, ou seja, de um direito à marca cujo conteúdo e extensão são inteiramente definidos pela directiva, esta noção tem conteúdo comunitário e deve ser objecto de interpretação uniforme nos Estados-Membros. E essencialmente por este motivo que não se podem ter em conta as disposições pertinentes dos direitos nacionais dos Estados-Membros. Assim, como a demandante e a Comissão afirmam com razão nas suas observações escritas, não se pode tomar em consideração a tese dominante na jurisprudência alemã, segundo a qual é necessário que as indicações geográficas continuem à disposição de todos e que, aliás, como já indiquei, não é conforme à directiva. Do mesmo modo, não podem ser tomadas em consideração as distinções subtis feitas pelo direito alemão entre «notoriedade» e «implantação» nos meios comerciais.

    71.

    Em meu entender, o uso deve, em primeiro lugar, ter tido uma duração razoável, a qual é deixada à apreciação do órgão jurisdicional nacional. Isto permite verificar a solidez da marca e evitar a multiplicação das marcas de uso ocasional ou conjuntural c desprovidas de qualquer perspectiva séria de duração. Do mesmo modo, dá-se a quem tenha interesse legítimo para tal o tempo necessário para apresentar as suas eventuais reclamações c para se opor ao registo da marca.

    72.

    Em segundo lugar, é necessário que, no público comercial interessado, tenha nascido a convicção de que a marca caracteriza os produtos de uma empresa determinada. Este público é constituído essencialmente pelos consumidores do ramo cm causa. Compreende também, cm princípio, os comerciantes c os estabelecimentos que vendem produtos similares, bem como os produtores que fabricam esses produtos. Todavia, essas categorias, c principalmente a última, devem ser tratadas com circunspecção. A razão reside no facto de, sobretudo por razões de concorrência, essas categorias serem susceptíveis de ter um interesse específico no registo ou na recusa do registo da marca, casos cm que a posição que adoptam não é destituída de segundas intenções ( 32 ).

    No que diz respeito, cm especial, às percentagens mencionadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, a questão deve ser deixada, cm princípio, à apreciação do órgão jurisdicional nacional, que julgará caso a caso, cm função das circunstâncias. Todavia, dado que o artigo 3.°, n.° 3, é uma disposição derrogatória, deve ser objecto de interpretação estrita. Visto que o problema incide mais na extensão e na importância da receptividade da marca junto do público a que se destina do que na avaliação do seu valor, da sua qualidade e, de uma maneira geral, da sua substância, devem também ter-se seriamente em conta critérios quantitativos. A este respeito, considero que uma percentagem de 50%, pelo menos, é um limite razoável, aquém do qual se não pode falar de implantação da marca no mercado.

    73.

    Finalmente, no que diz respeito à importância da receptividade da marca, deve admitir-se que não basta que o público se tenha apercebido da existência de uma nova marca no mercado, sendo ainda necessário que se tenha instalado a convicção de que os produtos com a marca em causa estão ligados a uma empresa determinada ( 33 ).

    74.

    Os meios de prova específicos utilizáveis para demonstrar o carácter distintivo de uma marca são globalmente definidos pelas disposições processuais relativas à prova em vigor nos Estados-Membros, cabendo a avaliação desses meios aos órgãos jurisdicionais nacionais ( 34 ). É necessário, no entanto, admitir que a autonomia processual dos sistemas jurídicos nacionais não é ilimitada, quando o objecto da prova for a verificação de um requisito de facto a que está subordinada a aplicação de uma regra de direito comunitário. Por conseguinte, convém admitir que certas regras gerais, pelo menos, se deduzem da economia global da directiva.

    75.

    Antes de mais, os meios de prova devem ser adequados, ou seja, devem corresponder ao objecto da prova. No caso vertente, se o elemento a provar não for o sucesso comercial do produto no mercado, mas a receptividade da marca pelo público, isto é, a percepção da relação entre a marca e uma dada empresa, os meios de prova devem permitir a avaliação da amplitude e da intensidade desta receptividade. Por conseguinte, não se podem considerar adequados meios de prova como aqueles que são propostos pela demandante, por exemplo, o volume de negócios da marca, as despesas de publicidade ou os resumos publicados na imprensa, pois tais elementos respeitam mais à evolução financeira da empresa do que ao problema aqui em causa. Pelo contrário, devem considerar-se adequados meios como aqueles que são propostos pela Comissão, como, por exemplo, o parecer da câmara de comércio competente, das organizações profissionais ou das associações de peritos.

    76.

    Além disso, deve admitir-se que, se existem diversos meios de prova que são em princípio adequados, não é permitido limitá-los a priori na prática nem, por maioria de razão, através de disposições regulamentares. Assim, não se pode considerar conforme à directiva a tendência que transparece nas decisões dos órgãos jurisdicionais alemães e que consiste em tomar por base única ou principalmente as sondagens. Em conclusão, as partes devem ter a faculdade de apresentar todos os elementos aptos a fornecer a prova ou a contraprova de que dispõem. Cabe ao órgão jurisdicional nacional avaliar, quanto ao mérito, os elementos de prova que tenham sido apresentados e atribuir eventualmente maior peso a alguns deles.

    77.

    No que respeita, em especial, às sondagens, elas não podem ser consideradas inadequadas ( 35 ), antes se deve recorrer a elas com alguma parcimónia e prudência, sobretudo no que se refere à sua representatividade e objectividade.

    Para este efeito, o organismo que efectuar a sondagem deve dar garantias de seriedade e de exactidão, quer por força do enquadramento institucional em que opere (por exemplo, um instituto universitário), quer em virtude das suas competências profissionais especializadas (por exemplo, uma empresa de sondagens séria), quer pelo facto de ser, na realidade, o organismo mais apropriado nas circunstâncias concretas (por exemplo, um perito cuja designação todas as partes estejam de acordo).

    Além disso, tanto a amostra representativa da população que for interrogada como as questões colocadas devem satisfazer os critérios acima definidos; senão, a sondagem não pode ser tomada em consideração nem total nem parcialmente.

    VI — Conclusão

    78.

    Tendo em contas as considerações precedentes, proponho que se responda do seguinte modo às questões prejudiciais:

    «1)

    Uma marca constituída exclusivamente por um termo geográfico não é contrária ao artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas, se esse termo for imaginário ou desconhecido do grande público ou se não houver qualquer relação de proveniencia directa e necessária entre o produto que visa a marca e a região geográfica a que o termo se refere, relação resultante essencialmente do facto de essa região ser ou poder ser conhecida por aí se terem já fabricado produtos similares, que sejam apreciados pelos consumidores pela sua especificidade ou pela sua qualidade.

    2)

    Uma marca pode adquirir um carácter distintivo, na acepção do artigo 3.°, n.° 3, primeira frase, da Directiva 89/104, se, na opinião do órgão jurisdicional nacional, resultar dos dados apropriados que o seu uso, durante um período razoável antes da sua apresentação, tiver criado nos consumidores em causa a convicção de que o produto designado pela marca provém de uma empresa determinada.»


    ( *1 ) Língua original: grego.

    ( 1 ) JO L 40, p. 1

    ( 2 ) Por força do artigo 16.°, n.° 1, da directiva, os Estados-Membros deviam transpor as suas disposições para o direito interno o mais tardar em 28 de Dezembro de 1991. Todavia, ao adoptar, cm 19 de Dezembro de 1991, a Decisão 92/10/CEE (JO 1992, L 6, p. 35), o Conselho exerceu o poder que lhe foi conferido pelo artigo 16.°, n.° 2, da directiva c adiou para 31 de Dezembro de 1992 a data do termo do prazo da transposição da directiva para o direito interno.

    ( 3 ) Por exemplo, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, uma marca constituída exclusivamente por uma indicação que possa servir para designar a proveniência geográfica dos produtos.

    ( 4 ) V, designadamente, o acórdão de 11 de Novembro de 1997, Locndcrsloot (C-349/95, Colect., p. I-6227, n.° 24).

    ( 5 ) O facto de as indicações descritivas ou que se tornaram usuais constituírem subcategorias das indicações desprovidas de carácter distintivo resulta claramente da formulação do artigo 2.°, n.° I, da proposta da primeira directiva do Conselho de aproximação das legislações dos Estados-Mcmbros relativas às marcas, apresentada pela Comissão ao Conselho cm 25 de Novembro de 1980 (JO 1980, C 351, p. 1), alterada em 17 de Novembro de 1985 (JO 1985, C 351, p. 4). Segundo esta formulação inicial, podia ser recusado o registo ou declaradas inválidas, designadamente, as marcas «que, na data do respectivo registo... sejam desprovidas de caracter distintivo no referido Estado-Membro, nomeadamente:

    a)

    ... [aqui consta o texto do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), tal como está em vigor actualmente, com o seguinte acrescento, que corresponde ao texto actual do artigo 3.°, n.° 3: ] a menos que essas marcas tenham adquirido um carácter distintivo após o uso que delas foi feito,

    b)

    ... [texto que corresponde, cm suma, ao actual artigo 3.°, n.° 1, alínea d)» (sublinhado meu).

    Os casos supracitados também são tratados no mesmo passo pela Convenção de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial, de 20 de Março de 1883, tal como foi revista pela última vez cm Estocolmo cm 14 de Julho de 1967 ( Recueil des traités des Nations unies, t. 828, n.° 11851, p. 305), cujo artigo 6.° quinquies, B, 2, prevê que só poderá ser recusado ou anulado o registo das marcas de comercio ou de fábrica «2.° quando forem desprovidas de qualquer carácter distintivo ou então exclusivamente compostas por sinais ou indicações que possam servir no comércio para designar a espécie... o lugar de origem dos produtos ou a época da produção, ou que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais c constantes do comércio do país cm que a protecção è requerida».

    Assinalo, além disso, que a formulação do artigo 7.a, n.os 1 c 3, do Regulamento (CU) n.° 40/94 do Conselho, dc 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), é análoga à do artigo 3.°, n.os 1 c 3, da directiva.

    ( 6 ) V. Cornish, W. R.: Intellectual property: patents, copyright, trade marks and allied rights, 3. ed., Londres, 1996, p. 588.

    ( 7 ) Visto que as marcas constituídas «exclusivamente» por um termo geográfico caem sob a alçada da disposição controvertida, uma marca não pode caber parcialmente no âmbito desta disposição, isto é, somente no que diz respeito à parte que contém uma indicação de natureza geográfica. A razão disto está em que, enquanto marca composta, cia não cabe, por definição, no âmbito desta disposição. Além disso, de uma maneira mais geral, dado que o ponto de vista que deve ser tomado cm linna de conta é o da impressão de conjunto produzida pela marca (v. acórdão de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C-251/95, Colect., p. I-6191, n.° 23), não se devem considerar isoladamente os seus diversos elementos constitutivos.

    ( 8 ) V. o oitavo considerando da directiva, que salienta a necessidade de reduzir o número total de marcas e, por conseguinte, o número de conflitos que surgem entre elas, renunciando a proteger as marcas que não sejam efectivamente usadas.

    ( 9 ) No sentido da inexistência de uma relação causa! entre o significante e o significado, v. de Saussure, F.: Cours de linguistique générale (cd. T. de Mauro, Payot, Paris, 1987, p. 100).

    ( 10 ) Regulamento do Conselho, de 14 de Julho de 1992, relativo à protecção das indicações geográficas c denominações de origem dos produtos agrícolas c dos géneros alimentícios (JO L 208, p. 1).

    Disposições relativas às indicações geográficas c às denominações de origem constam também de outros textos comunitários, relativos sobretudo ao sector vitivinícola, tais como o artigo 2.°, n.° 3, alínea s), da Directiva 70/50/CEE da Comissão, de 22 de Dezembro de 1969, baseada no disposto no artigo 33.°, n.° 7, relativo à supressão, entre os Estados-Membros, das medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação não previstas noutras disposições aprovadas por força do Tratado CEE (JO 1970, L 13, p. 29), c o artigo 6.°, n.° 5, do Regulamento (CEE) n.° 2333/92 do Conselho, de 13 de Julho de 1992, que estabelece as regras gerais para a designação c a apresentação dos vinhos espumantes c dos vinhos espumosos (JO L 231, p. 9).

    ( 11 ) 12/74, Recueil, p. 181; Colect. 1975, p. 95. Neste acórdão, o Tribunal de Justiça decidiu, designadamente, que as medidas alemãs que limitavam o uso das denominações «Sekt» c «Weinbrand» aos vinhos produzidos na Alemanha a partir de uma determinada proporção de uvas alemães eram contrárias às disposições do direito comunitário, designadamente, ao artigo 2.°, n.° 3, alínea s), da Directiva 70/50 (já referida na nota 10), que indica que devem ser consideradas proibidas pelos artigos 30.° seguintes do Tratado as medidas que «reservam unicamente para os produtos nacionais denominações que não constituam denominações de origem ou indicações de proveniência».

    ( 12 ) 16/83, Recueil, p. 1299.

    ( 13 ) C-3/91, Colect., p. I-5529, n.os 31 a 34.

    ( 14 ) problema colocava-se porque, por força de uma disposição da convenção franco-cspanhola de 1973 sobre a protecção das denominações de origem, das indicações de proveniência c das denominações de certos produtos, as denominações supracitadas são reservadas, em França, exclusivamente aos produtos espanhóis c só podem ser utilizadas nas condições previstas na legislação espanhola.

    ( 15 ) Acórdão de 13 de Dezembro de 1994, Wintersekt (C-306/93, Colect., p. I-5555, n.° 25).

    ( 16 ) V. supra, n.° 38.

    ( 17 ) Penso que não è necessário salientar que, se bem que estas definições valem «na acepção do presente regulamento», elas têm um valor c uma utilidade gerais.

    ( 18 ) Nestes casos, o termo geográfico adquire, para além do seu significado literal inicial (designação de um lugar geográfico), um segundo significado, metafórico («a secondary meaning», segundo a terminologia inglesa). Pode acontecer que este segundo significado suplante ou substitua o primeiro, como ć o caso da denominação «Bacará», de que se tratará a seguir.

    ( 19 ) Falo da indicação geográfica brevitatis causa c porque é dela que se trata no caso vertente. As mesmas considerações valem igualmente, no entanto, para o «sinal», que, segundo a letra da disposição controvertida, pode designar a proveniência geográfica. Neste caso, o sinal constitui uma indicação indirecta da proveniência geográfica, como as garrafas «Bocks-bcutcl», de que já se falou (v. supra, n.° 41).

    ( 20 ) Acórdão de 20 de Março de 1997, Phytheron International (C-352/95, Colect., p. I-1729, n.° 18).

    ( 21 ) V., sobre esta questão, Gevers, F.: «Geographical Names and Signs used as Trade Marks», cm European Intellectual Property Review, 1990, t. 12, p. 285; Bonnet, G.: «La marque constituée par un nom géographique en droit français», em Semaine juridique, 1990, II, p. 782.

    ( 22 ) 1982, FSR 111; v. também Gevers, E: op. cit. (na nota 21, supra), p. 287.

    ( 23 ) BGH, 14.1.1963 (GRUR, 1963, p. 469). V., sobre esta questão, Rothschild, A.: Les limites à la protection du nom géographique en tant que marque, memorando de DESS, Estrasburgo, 1985, pp. 38 e 39.

    ( 24 ) Pode citar-se como exemplo a denominação «sherry», que é uma alteração inglesa do termo geográfico espanhol Jerez c designava inicialmente um vinho proveniente desta região de Espanha. Em virtude da inacção dos produtores, o termo foi, porém, largamente utilizado por outros produtores c tornou-se uma denominação genérica (v., sobre esta questão, as conclusões do advogado-geral J.-P. Warner no processo Comissão/Alemanha já referido supra, nota 11, p. 208).

    O mesmo já se não pode dizer no que toca à denominação dos produtos «champagne» c «cognac», fabricados nas regiões homónimas da França. Deve salientar-se que o uso desses termos foi proibido, a partir de 1919, aos produtores de vinho alemães pelos artigos 274.° c 275.° do Tratado de Versalhes. Esta protecção foi completada pela regulamentação comunitária [v., por exemplo, o artigo 6.° do Regulamento (CEE) n.° 3309/85 (JO L 320, p. 9), c agora pelo artigo 6.°, n.° 5, do Regulamento (CEE) n.° 2333/92 do Conselho, de 13 de Julho de 1992 (JO L 231, p. 9), que proíbe aos produtores de vinhos espumantes que não tenham o direito de utilizar a denominação «champagne» de fazer qualquer referencia, ainda que apenas indirecta, a esta denominação, falando, por exemplo, de «método champanhes» (v., quanto a este aspecto, o acórdão Wintcrscht, já referido supra, nota 15).

    ( 25 ) V. infra, n.os 60 c segs.

    ( 26 ) Nas suas observações escritas, a primeira demandada afirma que outras empresas estabelecidas na região do lago utilizam a denominação «Chiemsee» para caracterizar as roupas que produzem. Todavia, essas circunstâncias de facto não resultam do despacho de reenvio c não podem portanto ser validamente invocadas (v. o acórdão Phytheron International, já referido supra, nota 20, n.os II a 14).

    ( 27 ) V. o acórdão de 7 de Maio de 1997, Pistre c o. (C-321/94, C-322/94, C-323/94 c C-324/94, Colect., p. I-2343, n. 37 c 38).

    ( 28 ) Saliento simplesmente que, para decidir se uma indicação geográfica designa ou não a proveniência geográfica, na acepção que acima dei a este termo do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), deve ter-se presente o lugar onde são efectuadas, todas ou uma parte essencial das operações de produção, de elaboração ou de transformação do produto [v. a definição que consta do artigo 2.°, n.° 2, alínea b), do Regulamento n.° 2081/92].

    ( 29 ) Por exemplo, uma fotografia ou um vídeo do Chiemsee que sirva de pano de fundo à publicidade de determinados produtos, mesmo que sejam análogos aos da demandante.

    ( 30 ) Por exemplo, não vejo por que ć que se deveria proibir a venda, nas lojas de artigos turísticos situadas à beira do lago, camisas ou outras lembranças com a menção «Chicmscc», prática que está muito divulgada nas regiões turísticas. Diferente desta ć a questão de saber se esta venda deve satisfazer determinados requisitos (poderia, por exemplo, exigir-sc que o uso da indicação se limite àquilo que ć absolutamente necessário, que os produtos vendidos tenham uma marca legal, de maneira a não darem a impressão que a sua marca ć «Chicmscc», que os produtos cm causa não sejam colocados perto dos que usam legalmente esta última marca, que a menção desse termo seja feita com caracteres tipográficos que não causem confusão, etc).

    ( 31 ) V. Cour d'appel de Nancy, acórdão de 21 de Fevereiro de 1980 (PIBD, 1980, III, 227), e Cour de cassation (chambre commerciale), acórdão de 17 de Maio de 1982 (PIBD, 1982, n.° 312, III, 238). V., sobre esta questão, Bonnet, G., op. cit. (nota 21 supra), p. 786, c Rothschild, A., op. cit. (nota 23 supra), p. 33.

    ( 32 ) Por exemplo, uma sociedade que comercialize produtos similares tem eventualmente interesse em que a marca não seja registada, na esperança de que, enquanto a sociedade concorrente não impuser os seus produtos no mercado sob outra marca, ela própria venha a aproveitar uma parle da clientela. Também é provável que uma sociedade que seja parcialmente afectada pela nova marca favoreça, apesar disso, o seu registo, por isso causar um prejuízo comparativamente maior a uma concorrente mais importante.

    ( 33 ) Isto não significa, evidentemente, que esta convicção se tenha obrigatoriamente instalado apenas através da compra dos produtos.

    ( 34 ) V. o acórdão de 22 de Junho de 1994, II IT Internationale Heiztechnik e Danzinger (C-9/93, Colect., p. I-2789, n. os 18 a 20).

    ( 35 ) Acórdãos de 9 de Dezembro de 1965, Laminoirs de la Providence c o. (29/63, 31/63, 36/63, 39/63 a 47/63, 50/63 c 51/63, Recueil, p. 1123, Colect. 1965-1968, p. 247), de 29 de Fevereiro de 1984, Rewe-Zentral (37/83, Recueil, p. 1229), etc.

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