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Document 61996CC0368

Conclusões do advogado-geral Ruiz-Jarabo Colomer apresentadas em 22 de Janeiro de 1998.
The Queen contra The Licensing Authority established by the Medicines Act 1968 (representada por The Medecines Control Agency), ex parte Generics (UK) Ltd, The Wellcome Foundation Ltd e Glaxo Operations UK Ltd e o..
Pedido de decisão prejudicial: High Court of Justice, Queen's Bench Division - Reino Unido.
Medicamentos - Autorização de introdução no mercado - Processo abreviado - Produtos essencialmente similares.
Processo C-368/96.

Colectânea de Jurisprudência 1998 I-07967

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1998:21

61996C0368

Conclusões do advogado-geral Ruiz-Jarabo Colomer apresentadas em 22 de Janeiro de 1998. - The Queen contra The Licensing Authority established by the Medicines Act 1968 (representada por The Medecines Control Agency), ex parte Generics (UK) Ltd, The Wellcome Foundation Ltd e Glaxo Operations UK Ltd e o.. - Pedido de decisão prejudicial: High Court of Justice, Queen's Bench Division - Reino Unido. - Medicamentos - Autorização de introdução no mercado - Processo abreviado - Produtos essencialmente similares. - Processo C-368/96.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página I-07967


Conclusões do Advogado-Geral


1 Por despacho de 10 de Outubro de 1996, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 22 de Novembro de 1996, a High Court of Justice, Queen's Bench Division (a seguir «High Court») submeteu várias questões prejudiciais, relativas à interpretação e à validade da alínea a), iii) do ponto 8 do segundo parágrafo do artigo 4._ da Directiva 65/65/CEE (1), na redacção dada pela Directiva 87/21/CEE (2).

2 Estas questões referem-se à utilização do procedimento simplificado para obter uma autorização de comercialização de um medicamento genérico mediante referência à documentação apresentada pela empresa farmacêutica inovadora para conseguir a autorização do medicamento original. Concretamente, discute-se se a autorização do medicamento genérico deve estender-se a todas as indicações e posologia autorizadas para o medicamento original até esse momento ou se, pelo contrário, é necessário aplicar também o prazo de protecção de dez anos do medicamento original às indicações e à posologia do referido medicamento posteriormente autorizadas.

A regulamentação comunitária

3 Os medicamentos (3) destinados ao uso humano têm uma grande repercussão sobre a saúde pública e, por isso, é necessário um controlo rigoroso da sua comercialização por parte das autoridades. Com o objectivo de reduzir progressivamente os obstáculos à livre circulação de medicamentos na Comunidade, resultantes das divergências entre os sistemas nacionais de controlo, as instituições comunitárias adoptaram numerosas disposições para harmonizar os controlos da comercialização de medicamentos.

4 O principal mecanismo para controlar a adequação de um medicamento às exigências derivadas da protecção da saúde pública é a autorização de comercialização, de que existem dois tipos: a comunitária e a nacional.

Em 1 de Janeiro de 1995, entraram em vigor as normas que estabelecem a possibilidade de obter autorizações de comercialização comunitárias válidas no território de todos os Estados-Membros. Este tipo de autorização pode obter-se mediante um procedimento centralizado, regulado pelo Regulamento (CEE) n._ 2309/93 (4), que criou uma autorização comunitária de colocação no mercado concedida pela Comissão com base na intervenção da Agência Europeia para Avaliação dos Medicamentos, também ela instituída por este regulamento.

O âmbito de aplicação das autorizações comunitárias é limitado, já que são obrigatórias para os medicamentos tecnologicamente avançados e facultativas para os medicamentos que contenham princípios activos novos.

5 A maior parte dos medicamentos são comercializados após a obtenção de uma autorização nacional, concedida pela autoridade competente de um Estado-Membro e com validade nesse Estado (5). A harmonização das disposições nacionais relativas à concessão de autorizações para medicamentos teve início na Directiva 65/65, que, com as suas diversas alterações, continua sendo a pedra angular da regulamentação comunitária em matéria de medicamentos.

O artigo 3._ da Directiva 65/65 dispõe que nenhuma especialidade farmacêutica pode ser colocada no mercado de um Estado-Membro sem que uma autorização tenha sido previamente concedida pela autoridade competente deste Estado-Membro.

O artigo 4._ define as informações e os documentos necessários para obter a autorização de comercialização, cujo conteúdo foi harmonizado pela Directiva 75/318/CEE (6) e pela Directiva 75/319/CEE (7). Segundo este preceito, o requerente da autorização de uma especialidade farmacêutica para uso humano poderá recorrer a dois tipos de procedimentos: um procedimento normal e um procedimento simplificado. Em relação ao procedimento normal, para obter a autorização de comercialização, o requerente terá de apresentar os resultados de uma série de ensaios e provas farmacológicas, toxicológicas e clínicas, ao passo que estará dispensado do cumprimento dessa obrigação, se recorrer ao procedimento simplificado. Este último procedimento permite que o segundo requerente de uma autorização de colocação no mercado economize o tempo e dinheiro necessários para a recolha de dados clínicos e pré-clínicos detalhados.

6 A Directiva 87/21 alterou o artigo 4._ da Directiva 65/65 no que respeita à utilização do procedimento simplificado. O objectivo desta alteração é, de acordo com o segundo considerando da Directiva 87/21, precisar melhor os casos em que a autorização de uma especialidade farmacêutica, essencialmente similar a um produto autorizado, não requer a apresentação dos resultados dos ensaios farmacológicos, toxicológicos ou clínicos, embora zelando por que as firmas inovadoras não fiquem em desvantagem. O quarto considerando desta directiva indica que considerações de ordem pública se opõem a que os ensaios no homem ou no animal sejam repetidos sem que uma necessidade imperiosa o justifique. De acordo com estes objectivos, o teor literal do artigo 4._ da Directiva 65/65 é o seguinte:

«Tendo em vista a concessão da autorização de colocação no mercado prevista no artigo 3._, o responsável por essa colocação apresentará à autoridade competente do Estado-Membro o respectivo pedido.

8. Resultado dos ensaios:

- físico-químicos, biológicos ou microbiológicos,

- farmacológicos e toxicológicos,

- clínicos.

Todavia, e sem prejuízo do direito relativo à protecção da propriedade industrial e comercial:

a) O requerente não será obrigado a fornecer os resultados dos ensaios farmacológicos e toxicológicos ou os resultados dos ensaios clínicos se puder demonstrar:

i) Que a especialidade farmacêutica é essencialmente similar a um produto autorizado no país a que se refere o pedido e que a pessoa responsável pela colocação no mercado da especialidade original consentiu que se recorra, com vista à análise do presente pedido, à documentação farmacológica, toxicológica ou clínica que consta do processo da especialidade original;

ii) Ou, por referência pormenorizada à literatura científica publicada, apresentada nos termos do n._ 2 do artigo 1._ da Directiva 75/318/CEE, que o ou os componentes da especialidade farmacêutica se destinam a um uso médico bem determinado e apresentam uma eficácia reconhecida e um nível de segurança aceitável;

iii) Ou que a especialidade farmacêutica é essencialmente similar a um produto autorizado na Comunidade há pelo menos seis anos segundo as disposições comunitárias em vigor e comercializado no Estado-Membro a que o pedido se refere; esse período é aumentado para dez anos no caso de medicamentos de alta tecnologia, na acepção da lista que consta da parte A do anexo da Directiva 87/22/CEE, ou de medicamentos na acepção da lista que consta da parte B do anexo da referida directiva que tenham seguido o procedimento previsto no seu artigo 2._; além disso, um Estado-Membro pode igualmente alargar esse período para dez anos, através de uma decisão única que abranja todos os produtos comercializados no seu território, se considerar que exigências da saúde pública assim o exigem. Os Estados-Membros podem não aplicar o período de seis anos acima mencionado para além da data-limite da vigência de uma licença que proteja o produto original.

Todavia, nos casos em que a especialidade farmacêutica se destine a um uso terapêutico diferente, ou deva ser administrada por vias diferentes ou em dose diferente em relação aos outros medicamentos comercializados, devem ser fornecidos os resultados dos ensaios farmacológicos, toxicológicos e/ou clínicos adequados.»

7 Esta disposição, introduzida pela Directiva 87/21, entrou em vigor em 1 de Julho de 1987. Desde esta data, as empresas farmacêuticas podem utilizar o procedimento simplificado para obter uma autorização que lhes permita comercializar um medicamento nas três hipóteses contempladas na alínea a), do ponto 8, do segundo parágrafo, do artigo 4._ A primeira hipótese exige o consentimento da empresa inovadora titular da autorização relativa ao medicamento original, que a empresa produtora do medicamento essencialmente similar terá muitas dificuldades em conseguir. A segunda hipótese permite a obtenção de uma autorização de comercialização mediante referência detalhada à literatura científica publicada. Esta possibilidade foi utilizada de forma abusiva pelas autoridades nacionais (8), pelo que a Directiva 87/21 pretende restabelecer o seu carácter excepcional.

A terceira hipótese, que deu lugar ao litígio no presente processo, permite que um empresa, decorrido um período de seis ou dez anos, faça uso do procedimento simplificado para obter a autorização de comercialização de um medicamento genérico essencialmente similar a um medicamento provido de uma autorização emitida em favor da empresa inovadora que o desenvolveu. Trata-se, sem dúvida, de uma disposição de grande importância, já que constitui a via fundamental para conseguir a comercialização de medicamentos genéricos, mediante o vantajoso procedimento simplificado.

8 Com vista a proteger a propriedade industrial e comercial das empresas inovadoras, a alínea a), iii) do ponto 8 do segundo parágrafo do artigo 4._ da Directiva 65/65 não permite o recurso ao procedimento simplificado e a consequente utilização de documentação produzida pela empresa inovadora durante um período de seis ou dez anos, consoante cada Estado-Membro decida. O Reino Unido estabeleceu o prazo de dez anos desde a primeira autorização de comercialização do medicamento original num Estado-Membro da Comunidade.

Os antecedentes do litígio

9 O presente processo tem origem em três litígios conexos, pendentes na High Court, que se referem a três produtos farmacêuticos diferentes, a saber, o captopril, o aciclovir e a ranitidina. A seguir referir-me-ei a estes litígios designando-os por «processo captopril», «processo aciclovir» e «processo ranitidina».

10 A recorrida nos três processos é a Licensing Authority, organismo criado pelo Medicines Act 1968, a quem cabe adoptar as decisões relativas à comercialização de especialidades farmacêuticas no Reino Unido. Salvo nos casos de autorizações de comercialização concedidas para todo o âmbito comunitário, que não são objecto desses processos, a venda de qualquer medicamento no Reino Unido requer a concessão prévia da correspondente autorização pela Licensing Authority. A Medicine Control Agency (a seguir «MCA») é o organismo de execução que dá seguimento aos requerimentos de autorização em nome da Licensing Authority.

11 As recorrentes nos três processos são empresas farmacêuticas especializadas na venda de medicamentos genéricos ou sociedades farmacêuticas orientadas para a venda de especialidades farmacêuticas não genéricas, protegidas por uma marca comercial, obtidas após avultados investimentos em investigação.

12 O objecto dos três processos é similar, já que a controvérsia se centra na extensão da autorização de comercialização, requerida pelas empresas de produtos genéricos, através do procedimento simplificado previsto na alínea a) do ponto 8 do segundo parágrafo do artigo 4._ da Directiva 65/65.

Passo a expor mais pormenorizadamente o objecto de cada um dos três processos, que foi descrito pela High Court no anexo ao despacho de reenvio da questão prejudicial.

O processo captopril

13 O captopril é um medicamento obtido nos anos setenta pela Bristol-Myers Squibb (a seguir «BMS»), importante fabricante de produtos farmacêuticos dedicado à investigação. Trata-se de um composto do grupo de medicamentos chamados inibidores da enzima de conversão da angiotensina (inibidores ACE). Mediante um conjunto de efeitos (principalmente vasodilatadores), tais compostos produzem consequências benéficas sobre o sistema cardio-vascular entre outros. O captopril foi o primeiro deste tipo de compostos a ser apresentado como medicamento e a receber autorização de comercialização na Comunidade.

14 Em 27 de Março de 1981, foi concedida à Squibb & Sons Ltd (a seguir «Squibb»), filial britânica da BMS, autorização de comercialização no Reino Unido de uma especialidade farmacêutica sob a marca «Capoten», cujo princípio activo era o captopril. Inicialmente, era recomendado para o tratamento da hipertensão grave quando a terapia habitual com diuréticos se revelasse ineficaz. Foi comercializado em comprimidos de 25 mg, 50 mg e 100 mg. Depois de 1981, a BMS continuou as suas investigações sobre outras aplicações do captopril, em relação com doenças distintas da hipertensão grave, bem como sobre novas dosagens. Com base nos resultados obtidos, a MCA aprovou várias modificações à autorização de comercialização do Capoten no Reino Unido (9).

15 A França foi o primeiro Estado-Membro que concedeu autorização do captopril como tratamento posterior ao enfarte de miocárdio, em 1 de Junho de 1993. O Reino Unido foi o primeiro Estado-Membro a conceder autorização para o tratamento da nefropatia diabética, em 5 de Maio de 1994. A BMS levou a cabo ou patrocinou uma notável investigação clínica em milhares de pacientes, com o fim de fundamentar cada uma das indicações de tratamento posterior ao enfarte de miocárdio e de nefropatia diabética. Em ambos os casos, os custos ocasionados pela obtenção dos dados da investigação e das autorizações foram superiores a várias dezenas de milhões de dólares americanos. Todas as demais alterações acima referidas foram objecto de autorização em outros Estados-Membros desde há, pelo menos, dez anos. Só as últimas duas alterações nas indicações dos medicamentos e nos dados em que se baseiam são objecto do processo captopril.

16 Em 20 de Janeiro de 1993, a Generics (UK) Ltd (a seguir «Generics») (10) requereu autorização de comercialização do captopril em comprimidos de 12,5 mg, 25 mg e 50 mg. Tal requerimento foi feito ao abrigo da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65.

A MCA respondeu à Generics que não podia pronunciar-se sobre o seu requerimento sem primeiro analisar a disposição invocada e decidir qual a sua correcta interpretação. Em 18 de Julho de 1995, a Generics interpôs recurso, que acabou numa transacção entre as partes, que não afectava o direito de a Generics voltar a recorrer. A MCA consentiu em conceder à Generics autorização de comercialização para os comprimidos de captopril de 12,5 mg, 25 mg e 50 mg e para as indicações aprovadas no território da Comunidade há mais de dez anos. Todavia, negou-se a conceder autorização para todas as demais indicações do captopril não aprovadas no território da Comunidade há mais de dez anos, isto é, o tratamento posterior ao enfarte de miocárdio e à nefropatia diabética.

17 Em 29 de Setembro de 1995, a Generics interpôs segundo recurso da decisão da MCA, na medida em que lhe fora recusada autorização de comercialização para as indicações não aprovadas na Comunidade nos últimos dez anos.

18 Em 23 de Outubro de 1995, a Generics recebeu uma comunicação (11) da MCA, com data de 20 de Outubro de 1995, que expunha a interpretação dada pela MCA à alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65.

19 Posteriormente, a MCA informou a Generics de que algumas das indicações do captopril, acrescentadas ao longo dos dez anos anteriores, exigiam nova autorização por força do Anexo II do Regulamento (CE) n._ 541/95 (12) e que, portanto, estavam protegidas. Nesta situação estava a indicação adicional de «nefropatia diabética». Contudo, a MCA aceitava que a Generics se baseasse na alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 em relação à indicação relativa ao «enfarte de miocárdio» (indicação também acrescentada nos últimos dez anos), para a qual não era preciso novo requerimento de autorização por força do Anexo II do Regulamento n._ 541/95.

O processo aciclovir

20 A sociedade Wellcome Foundation Ltd (a seguir «Wellcome») (13) é titular das principais autorizações para comercialização no Reino Unido do medicamento antiviral aciclovir, também vendido sob a marca «Zovirax». Essas autorizações foram concedidas à Wellcome entre 1981 e 1994.

21 Durante esse período, a Wellcome produziu e recolheu novos dados a fim de ampliar as indicações terapêuticas permitidas a novas formas e vias de administração do produto. A despesa realizada pela Wellcome em investigação e desenvolvimento atingiu vários milhões de UKL ao ano: de 4 milhões de UKL em 1982/1983 a 8 milhões de UKL em 1991/1992. Neste período, a Wellcome ampliou significativamente as indicações e as dosagens de aciclovir (14).

22 O número de ensaios e provas necessários para uma nova indicação, via ou forma de administração não é necessariamente proporcional à importância aparente da alteração. Por exemplo, para alargar a indicação dos comprimidos de aciclovir de 200 mg e 400 mg (e posteriormente também os de 800 mg) por forma a abranger o tratamento das infecções de varicela, foram recolhidos dados que incluíam os resultados de cinco ensaios clínicos realizados em 1 241 pacientes, com um custo directo de 240 000 UKL. O montante total de despesas de investigação e desenvolvimento efectuadas para se obter a autorização para esta nova indicação foi estimado pela Wellcome em mais de 6 milhões de UKL.

23 A Wellcome teve conhecimento da concessão pela MCA de cinco autorizações de comercialização à sociedade A/S Gea Farmaceutisk Fabrik (a seguir «Gea») para diferentes indicações e formas de administração do aciclovir em comprimidos e injecções intravenosas. Estas autorizações tinham sido publicadas na London Gazette em 31 de Maio de 1996 e tinham a data de 29 de Fevereiro de 1996. Haviam sido concedidas para comprimidos de 200 mg, 400 mg e 800 mg e para injecções intravenosas de 250 mg e 500 mg, todas elas incluindo as principais indicações terapêuticas para as quais a Wellcome tinha, até à data, recebido autorização no Reino Unido.

24 Em 26 de Julho de 1996, a Wellcome interpôs recurso da decisão da MCA de conceder autorização de comercialização, em virtude do ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, a favor de segundos requerentes, sem prévio consentimento da Wellcome, relativamente às indicações terapêuticas, vias e formas de administração do aciclovir em comprimidos e em injecções intravenosas, que tinham sido aprovadas na Comunidade mediante autorizações anteriores, concedidas há menos de dez anos e baseadas em dados fornecidos pela Wellcome.

O processo ranitidina

25 A MCA concedeu, entre 1981 e 1995, à Glaxo Operations UK Ltd, à Glaxo Wellcome UK Ltd (antes Glaxo Pharmaceuticals UK Ltd), à Glaxo Research and Development Ltd (antes Glaxo Group Research Ltd) e à Glaxo Group Ltd (a seguir «Glaxo»), todas filiais da Glaxo Wellcome plc, várias autorizações de comercialização da substância antiulcerosa ranitidina, também vendida sob a marca «Zantac».

26 Durante este período, a Glaxo recolheu novos dados a fim de alargar as indicações clínicas iniciais e a posologia recomendada (15). As despesas da Glaxo em investigação e desenvolvimento para a ranitidina ascenderam a vários milhões de UKL por ano. Por exemplo, para alargar as indicações dos comprimidos de ranitidina ao tratamento das úlceras duodenais foram recolhidos resultados de ensaios clínicos realizados sobre mais de 2 200 pacientes, com uma despesa directa avaliada em 1 326 000 de UKL.

27 Em 31 de Julho de 1992, a Generics requereu autorização de comercialização para os comprimidos de ranitidina de 150 mg e 300 mg, apoiando-se na alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65. A MCA respondeu à Generics que não podia pronunciar-se sobre o pedido sem analisar primeiro o preceito invocado e decidir qual a sua correcta interpretação.

28 A Generics interpôs recurso (tal como para o captopril), que terminou por uma transacção com a MCA similar à conseguida em relação ao captopril.

Mediante comunicação de 7 de Abril de 1995, a recorrida enumerou do seguinte modo as indicações da ranitidina relativamente às quais ia conceder autorização de comercialização à Generics:

«Tratamento de úlcera duodenal, de úlcera gástrica benigna, de úlcera pós-operatória, de esofagite de refluxo, da síndroma Zollinger-Ellison e as seguintes situações em que resulta conveniente uma redução da secreção gástrica e da produção de ácidos: profilaxia da hemorragia intestinal por úlcera de tensão em pacientes gravemente doentes, profilaxia da hemorragia recorrente em pacientes com úlceras pépticas hemorrágicas e antes da aplicação de anestesia geral em pacientes que podem apresentar riscos de aspiração de ácidos (síndroma Mendelson), em particular pacientes de obstetrícia durante o parto.»

Estas indicações correspondiam às que figuravam na ficha de registo da ranitidina no Reino Unido desde 1984/1985 até 1988/1989.

29 Em 29 de Setembro de 1995, a Generics interpôs segundo recurso (tal como para o captopril) da decisão da MCA, na medida em que lhe negava autorização de comercialização para as indicações que não tinham sido aprovadas pela Comunidade durante os últimos dez anos.

A MCA confirmou à Generics que a posição expressa na sua carta de 21 de Outubro de 1995 significava que todas as indicações da ranitidina da Generics podiam ser examinadas ao abrigo da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65. Por consequência, a Generics alterou a petição de recurso, eliminando todas as referências à ranitidina.

30 Em 16 de Agosto de 1996, a Glaxo interpôs recurso da decisão da MCA que, em virtude do ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, concedia autorização a segundos requerentes, sem o seu consentimento, para a comercialização, com as indicações e posologia recomendadas, dos comprimidos de ranitidina que tinham sido aprovados na Comunidade mediante autorizações anteriores, concedidas há menos de dez anos e baseadas em dados fornecidos pela Glaxo.

31 Para resolver os três litígios que tem pendentes sobre o captopril, o aciclovir e a ranitidina, a High Court considerou necessário submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.) a) Qual é o significado da expressão `essencialmente similar' para efeitos do artigo 4._, ponto 8, alínea a), iii), da Directiva 65/65/CEE do Conselho (alterada)? Em especial, ao procurar determinar, para esse efeito, se um medicamento (produto B) é essencialmente similar a um medicamento que tenha sido autorizado na Comunidade 6/10 anos antes, de acordo com o direito comunitário em vigor (produto A), por referência a que características físicas ou outras ou a que propriedades dos medicamentos em questão deve esse significado ser determinado?

b) Tem a autoridade competente de um Estado-Membro algum poder discricionário na determinação dos critérios de acordo com os quais deve ser resolvida a questão de saber se o produto B é essencialmente similar ao produto A e, se assim for, em que medida?

2.) Pode o produto B ser autorizado nos termos do artigo 4._, ponto 8, alínea a), iii), da Directiva 65/65/CEE (alterada) em relação:

a) a todas as indicações para as quais o produto A está autorizado no Estado-Membro relevante à data do pedido feito pelo produto B; ou

b) apenas às indicações para as quais o produto A tenha sido autorizado na UE, de acordo com o direito comunitário em vigor, 6/10 anos antes; ou

c) apenas:

1) às indicações para as quais o produto A tenha sido autorizado na UE, de acordo com o direito comunitário em vigor, 6/10 anos antes; e

2) às indicações para as quais o produto A tenha sido autorizado menos tempo antes e que não exigiram um pedido para concessão de uma nova autorização de comercialização no mercado nos termos do Anexo II do Regulamento (CE) n._ 514/95 da Comissão, ou (eventualmente) não teriam exigido esse pedido se o regulamento estivesse em vigor à data em que a indicação em causa foi acrescentada por alteração de uma autorização já existente;

d) quaisquer outras indicações e, neste caso, quais?

3.) Pode o produto B ser autorizado nos termos do artigo 4._, ponto 8, alínea a), iii), da Directiva 65/65/CEE (alterada) em relação:

a) a todas as formas de dosagem e/ou doses e/ou posologias para as quais o produto A tenha sido autorizado no Estado-Membro relevante à data do pedido referente ao produto B; ou

b) apenas às formas de dosagem e/ou doses e/ou posologias para as quais o produto A tenha sido autorizado na UE, de acordo com o direito comunitário em vigor, 6/10 anos antes; ou

c) apenas:

1) às formas de dosagem e/ou doses e/ou posologias para os quais o produto A tenha sido autorizado na UE, de acordo com o direito comunitário em vigor, 6/10 anos antes; ou

2) às formas de dosagem e/ou doses e/ou posologias para as quais o produto A tenha sido autorizado menos tempo antes e que não exigem um pedido de concessão de uma autorização de colocação no mercado nos termos do disposto no Anexo II do Regulamento n._ 514/95 ou (eventualmente) não teriam exigido esse pedido se o regulamento estivesse em vigor à data em que a forma de dosagem e/ou a dose e/ou posologia em causa foram acrescentadas por alteração de uma autorização já existente; ou

d) qualquer outra categoria de formas de dosagem e/ou doses e/ou posologias e, neste caso, quais?

4.) Afecta de algum modo a resposta às questões 2 e/ou 3 o facto de os pedidos originais ou abreviados de colocação no mercado terem sido feitos antes de 16 de Março de 1995, data em que o Regulamento n._ 541/95 da Comissão entrou em vigor?

5.) À luz das respostas às questões 1 a 4 supra, é o artigo 4._, ponto 8, alínea a), iii), inválido por violar os princípios da protecção das inovações e/ou da não discriminação e/ou da proporcionalidade e/ou do direito de propriedade?»

A primeira questão

32 Com a sua primeira questão prejudicial, a High Court pretende que o Tribunal de Justiça estabeleça os critérios determinantes para decidir quando dois medicamentos são essencialmente similares, para efeitos da aplicação da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, e que esclareça se as autoridades nacionais competentes em matéria de concessão de autorizações de comercialização dispõem de uma margem de discricionariedade para fixar tais critérios.

33 A Glaxo e a Wellcome argumentam que um medicamento só é essencialmente similar a outro autorizado na Comunidade desde há dez anos se todas as características de ambos, incluindo as suas indicações terapêuticas e posologia, forem idênticas ou tão semelhantes que os resultados dos ensaios farmacológicos e toxicológicos e das experiências clínicas anteriores possam ser indistintamente aplicados a ambos os medicamentos. A Squibb entende que existe similitude essencial quando dois medicamentos possuem determinadas características, tais como as enunciadas no artigo 4._-A da Directiva 65/65, que permitem à autoridade nacional competente conceder a autorização de comercialização ao medicamento genérico mediante a extrapolação dos dados apresentados para a autorização do medicamento original.

34 A Generics, a Comissão e os Governos francês, dinamarquês e britânico consideram que os dois medicamentos são essencialmente similares quando têm a mesma composição qualitativa e quantitativa em termos de princípios activos, a mesma forma farmacêutica e se demonstrou, tal sendo o caso, a sua bioequivalência mediante estudos de biodisponibilidade apropriados.

35 É esta última interpretação do termo «essencialmente similares» que considero adequada, pelas razões que exponho a seguir.

36 A Directiva 65/65 não define a noção de medicamentos essencialmente similares. Contudo, é útil para interpretar este conceito recorrer à acta do Conselho de Dezembro de 1986, em cuja reunião se adoptou a Directiva 87/21, que contém a seguinte definição da expressão «essencialmente similares»:

«A mesma composição qualitativa e quantitativa em termos de princípios activos, a mesma forma farmacêutica e, tal sendo o caso, a bioequivalência em relação ao primeiro produto, estabelecida mediante estudos de biodisponobilidade apropriados».

37 Considero que a referida acta do Conselho contém uma enumeração adequada dos critérios utilizáveis para determinar a similitude essencial entre dois medicamentos. Estes critérios são os seguintes:

- A composição qualitativa e quantitativa em termos de princípios activos. A mencionada composição aparece claramente descrita no anexo da Directiva 75/318, na redacção dada pela Directiva 91/507/CEE (16). A similitude essencial entre dois medicamentos apenas depende dos seus princípios activos, não sendo relevantes os componentes do excipiente, nem os componentes do invólucro externo dos medicamentos.

- A forma farmacêutica, que está definida na lista de termos-padrão elaborada pelo Conselho da Europa sob os auspícios da Farmacopeia Europeia da seguinte maneira: «The farmaceutical form is the combination of the form in which a pharmaceutical product is presented by the manufacturer (form of presentation) and the form in which it is administered including the physical form (form of administration)» (17). Um medicamento é essencialmente similar a outro se tem a mesma forma de apresentação (cápsulas, gotas orais em solução, injecções, etc.) e a mesma forma de administração (via oral, via rectal, via nasal, via cutânea, etc.).

- A bioequivalência entre os dois medicamentos, demonstrada, tal sendo o caso, mediante estudos de biodisponibilidade apropriados (18). A secção E da parte 4 do anexo da Directiva 75/318, modificado pela Directiva 91/507, indica que a avaliação da biodisponibilidade deve efectuar-se caso seja necessária para demonstrar a bioequivalência dos medicamentos referidos no ponto 8, alínea a), i), ii) e iii), segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65. A prova da bioequivalência constitui a melhor maneira de estabelecer a equivalência terapêutica entre dois medicamentos com os mesmos princípios activos e a mesma forma farmacêutica, já que os excipientes e o método de fabrico podem incidir nos seus efeitos terapêuticos.

38 Estes três critérios são os que devem ser utilizados para se verificar se um medicamento é essencialmente similar a outro autorizado na Comunidade e se se pode conseguir, por isso, uma autorização de comercialização pela via do procedimento simplificado. A coincidência de indicações, vias de administração e posologia entre dois medicamentos não constitui elemento relevante para determinar se são essencialmente similares, porque tal coincidência converteria os medicamentos em idênticos e impediria a utilização do procedimento simplificado para a autorização de comercialização de medicamentos genéricos sempre que o medicamento inovador visse alteradas, ainda que de modo pouco significativo, as suas indicações, vias de administração e posologia.

39 A utilização das indicações, dosagem e posologia como critério para determinar a similitude essencial entre dois medicamentos não encontra apoio no artigo 1._, nem no artigo 4._-A da Directiva 65/65.

O n._ 2 do artigo 1._ define o termo medicamento da seguinte forma:

«Toda a substância ou composição apresentada como possuindo propriedades curativas ou preventivas relativas a doenças humanas ou animais.

A substância ou composição que possa ser administrada ao homem ou ao animal com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou a restaurar, corrigir ou modificar as funções orgânicas no homem ou no animal é igualmente considerada como medicamento.»

A jurisprudência do Tribunal de Justiça pôs em destaque que o critério da «apresentação», utilizado no primeiro parágrafo dessa disposição, tem em vista abranger não só os medicamentos que tenham efeito terapêutico e médico, mas também os produtos que não são suficientemente eficazes, ou que não produzem o efeito que a sua apresentação permitiria esperar (19). Donde se deduz não poder considerar-se que a expressão «apresentada», utilizada no artigo 1._, inclui as indicações como elemento constitutivo da noção de medicamento.

O artigo 4._-A da Directiva 65/65, aditado pela Directiva 83/570/CEE (20), estabelece o resumo das características dos medicamentos, de que constarão, entre outras informações, as indicações terapêuticas, o modo de administração e a posologia. A inclusão destes dados no resumo das características do medicamento não pressupõe que sejam elementos a tomar necessariamente em conta para se determinar a similitude essencial entre dois medicamentos, porque tal resumo serve para dar informações úteis sobre o medicamento, uma vez definido, às autoridades competentes dos Estados-Membros. Em caso algum faz esse resumo parte da definição do medicamento.

40 Tendo em conta as considerações precedentes, considero que dois medicamentos são essencialmente similares quando têm a mesma composição qualitativa e quantitativa em princípios activos, a sua forma farmacêutica é idêntica e se demonstrou, tal sendo o caso, a sua bioequivalência através de estudos apropriados de biodisponibilidade.

A utilização destes três critérios objectivos para determinar a similitude essencial entre dois medicamentos para efeitos da aplicação da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 permite uma aplicação uniforme em toda a Comunidade do procedimento simplificado para a obtenção das autorizações de comercialização de medicamentos genéricos.

Estes critérios limitam, ademais, a margem de discricionariedade das autoridades competentes dos Estados-Membros no momento de estabelecer a similitude essencial entre dois medicamentos para conceder a autorização ao medicamento genérico, baseando-se na documentação produzida a seu tempo para a comercialização do medicamento original. Neste sentido, deduz-se claramente da jurisprudência do Tribunal de Justiça (21) que as autoridades nacionais não dispõem de margem de discricionariedade para aplicar as excepções da alínea a), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, que permite a obtenção de autorizações mediante o procedimento simplificado.

O reconhecimento às autoridades competentes dos Estados-Membros de uma margem de discricionariedade para determinar a similitude essencial entre dois medicamentos dificultaria também a aplicação do procedimento de reconhecimento mútuo das autorizações de comercialização concedidas pelos Estados-Membros, procedimento estabelecido pela Directiva 93/39.

As segunda, terceira e quarta questões

41 Pelas segunda, terceira e quarta questões prejudiciais, a High Court solicita que o Tribunal de Justiça determine a extensão com que pode ser concedida a autorização de comercialização de um medicamento genérico essencialmente similar a um medicamento original autorizado na Comunidade ou num Estado-Membro desde há, pelo menos, dez anos.

Nas questões submetidas, a High Court acolhe, em parte, as teses defendidas pelas empresas farmacêuticas inovadoras, pelos fabricantes de medicamentos genéricos e pela MCA.

As empresas especializadas no fabrico de medicamentos inovadores consideram que a autorização de comercialização para um medicamento genérico essencialmente similar a um medicamento original autorizado na Comunidade ou num Estado-Membro só deve estender-se às indicações terapêuticas, vias de administração e posologia que tenham sido autorizadas há pelo menos dez anos. Em sua opinião, o período de protecção de dez anos deve aplicar-se também a todas as novas indicações do medicamento original introduzidas posteriormente à obtenção da autorização de comercialização e que não tenham esgotado o mencionado período de protecção.

As empresas produtoras de medicamentos genéricos entendem que a autorização de comercialização destes medicamentos engloba todas as indicações, vias de administração e posologia autorizadas para o medicamento original essencialmente similar até ao momento do requerimento de autorização para o medicamento genérico. Em seu entender, o prazo de dez anos não deve proteger cada uma das alterações posteriormente autorizadas ao medicamento original.

A MCA mantém uma posição intermédia e considera que a autorização de comercialização do medicamento genérico se alargará a todas as indicações terapêuticas autorizadas para o medicamento original essencialmente similar, tanto as iniciais como as introduzidas posteriormente e que não tenham esgotado o prazo de dez anos, salvo se estas últimas alterações constituírem uma inovação de grande importância terapêutica. Em sua opinião, uma inovação tem tal importância quando requer um novo pedido de autorização de comercialização em virtude do Anexo II do Regulamento n._ 541/95.

42 A Directiva 65/65, alterada pela Directiva 87/21, não contém uma resposta directa e evidente às questões formuladas pela High Court, o que tem dado lugar às diferentes interpretações antes mencionadas. A interpretação que se adoptar da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 terá, contudo, importantíssimas repercussões económicas na comercialização dos medicamentos na Comunidade e no desenvolvimento da indústria farmacêutica no seu conjunto.

43 Ambas as circunstâncias exigem, em meu entender, uma análise detalhada dos diferentes objectivos prosseguidos pela Directiva 65/65, na redacção dada pela Directiva 87/21 (22), que permita chegar posteriormente à interpretação do ponto 8, segundo parágrafo, do artigo 4._ que melhor reflicta um adequado equilíbrio entre tais objectivos.

Os objectivos do ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65

44 A alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ desta disposição, introduzida na Directiva 65/65 pela Directiva 87/21, estabeleceu uma terceira via para a obtenção de uma autorização de comercialização de medicamentos genéricos através do procedimento simplificado que permite ao segundo requerente economizar nas despesas de investigação que implica a apresentação dos resultados das provas farmacológicas, toxicológicas e clínicas, porque estes resultados foram anteriormente fornecidos para a autorização de comercialização do medicamento original essencialmente similar. Esta via converteu-se na mais utilizada para obter a autorização de comercialização de medicamentos genéricos, já que as outras duas alternativas (consentimento da empresa titular da autorização de comercialização do medicamento original e referência à literatura científica) apresentam maiores dificuldades.

45 No momento de aplicar a alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, há que ter em conta, basicamente, os seguintes interesses essenciais:

a) A protecção da saúde pública

46 A finalidade essencial que prossegue a Directiva 65/65, e todas as normas posteriores que a alteraram ou desenvolveram, é a protecção da saúde pública (23). Este objectivo atinge-se principalmente mediante o mecanismo do controlo das autorizações que as autoridades nacionais competentes devem emitir antes da comercialização de qualquer medicamento. Assim, o primeiro considerando da Directiva 87/21 estabelece o seguinte:

«... o ponto 8 do segundo parágrafo do artigo 4._ da Directiva 65/65/CEE ..., com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 83/570/CEE ..., prevê que possam ser fornecidos diversos meios de prova da inocuidade e da eficácia de uma especialidade farmacêutica num pedido de autorização de colocação no mercado, de acordo com a situação objectiva em que se encontra o medicamento em causa.»

47 A jurisprudência do Tribunal de Justiça (24) pôs em relevo que o procedimento simplificado de autorização de comercialização, previsto no ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, não afecta o objectivo de protecção da saúde pública, porque se limita a reduzir o período de preparação de um pedido de autorização, sem suavizar de modo algum as normas de segurança e de eficácia aplicáveis aos medicamentos.

48 A protecção da saúde pública explica, também, o último parágrafo da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, que obriga a empresa fabricante do medicamento genérico a apresentar os resultados dos ensaios farmacológicos, toxicológicos e clínicos quando requer a autorização de comercialização para indicações, vias de administração ou dosagem diferentes das autorizadas para o medicamento original essencialmente similar, comercializado desde há mais de seis ou dez anos na Comunidade.

49 Por último, referirei que a protecção da saúde pública é compatível com um alargamento da autorização de comercialização de medicamentos genéricos que inclua todas as indicações, vias de administração e posologia autorizadas para o medicamento original até ao momento da concessão da referida autorização.

b) A protecção da investigação e da inovação no âmbito farmacêutico

50 A importância da experiência como critério determinante na produção de inovações médicas foi salientada por muitos investigadores renascentistas (25), que puseram em destaque o papel desempenhado pelo tempo na descoberta não só de novos remédios, mas também de outras propriedades terapêuticas dos já existentes. A ideia de progresso é consubstancial aos avanços científicos relacionados com a saúde.

As empresas farmacêuticas inovadoras fazem avultados investimentos em investigação e desenvolvimento para fabricar novos medicamentos. Esta inovação é imprescindível para garantir uma indústria farmacêutica sólida na Comunidade. Por isso, o segundo considerando da Directiva 65/65 estabeleceu que a harmonização comunitária não podia travar o desenvolvimento da indústria farmacêutica. Da mesma forma, a Directiva 87/21, no seu segundo considerando, afirma que é conveniente precisar ainda melhor os casos em que é utilizável o procedimento simplificado «... embora zelando por que as firmas inovadoras não fiquem em desvantagem».

51 Nos trabalhos preparatórios (26) efectuados pela Comissão com vista à adopção da Directiva 87/21 foi evidenciado, com clareza, que um dos objectivos prosseguidos é a protecção da investigação e da inovação no âmbito farmacêutico. A Comissão sublinhou as despesas que as empresas inovadoras tinham de suportar para obter a autorização de comercialização inicial de um medicamento e afirmou que algumas autoridades nacionais permitiam a utilização, com demasiada facilidade, do procedimento simplificado, por referência à literatura científica, por parte das empresas produtoras de medicamentos genéricos. Esta prática prejudica, segundo a Comissão, as empresas inovadoras titulares da autorização de comercialização do medicamento original.

52 O período de protecção de seis ou dez anos da autorização de comercialização dos medicamentos originais está precisamente destinado a salvaguardar os interesses das empresas inovadoras e a potenciar a investigação no sector farmacêutico. Ademais, a Directiva 87/21 inclui textualmente no ponto 8 do segundo parágrafo do artigo 4._ da Directiva 65/65 o princípio segundo o qual o procedimento simplificado não pode ser utilizado quando se viole algum direito relativo à protecção da propriedade industrial e comercial.

53 A inovação no âmbito farmacêutico está garantida, também, por outras disposições comunitárias, nacionais e internacionais referentes à protecção da propriedade intelectual e, em especial, às patentes (27).

O n._ 4 do artigo 52._ da Convenção de Munique de 1973 sobre a Patente Europeia não considera invenções susceptíveis de patente os métodos de tratamento cirúrgico ou terapêutico do corpo humano ou animal, bem como os métodos de diagnóstico aplicados ao corpo humano ou animal. Não obstante, o n._ 5 do artigo 54._ permite as patentes das substâncias destinadas à elaboração de medicamentos, pelo que estes podem beneficiar do período de protecção de vinte anos previsto na convenção. Nos direitos internos dos Estados-Membros impôs-se uma tendência similar e os seus ordenamentos jurídicos reconhecem a possibilidade de conceder patentes aos medicamentos (28).

No âmbito do direito comunitário, foi criado o certificado de protecção complementar instituído pelo Regulamento (CEE) n._ 1765/92 (29) com o objectivo de compensar o tempo que decorre entre o requerimento da patente para um medicamento e a concessão da autorização de comercialização (30).

54 Em minha opinião, a protecção da inovação e da investigação farmacêutica aconselha a aplicação do prazo de protecção de seis ou dez anos a todas as novas indicações, de grande importância terapêutica, autorizadas para o medicamento original essencialmente similar a um medicamento genérico.

c) A não repetição dos ensaios no homem ou no animal

55 O quarto considerando da Directiva 87/21 refere que «... considerações de ordem pública se opõem a que os ensaios no homem ou no animal sejam repetidos sem que uma necessidade imperiosa o justifique». A limitação das repetições de ensaios no homem ou no animal, sempre que não sejam estritamente necessários, constitui uma regra bem estabelecida no direito comunitário (31), que tem reflexo lógico no procedimento simplificado de requerimento de autorizações de comercialização para os medicamentos genéricos. Se a empresa inovadora realizou os ensaios pertinentes para obter a autorização do medicamento original, não é necessário repetir esses mesmos ensaios para ser concedida autorização a um medicamento genérico essencialmente similar.

56 No que toca às indicações terapêuticas, vias de administração e novas posologias autorizadas para o medicamento original há menos de seis ou dez anos, a regra da não repetição de ensaios no homem ou no animal constitui um argumento em favor da concessão da máxima amplitude à autorização de comercialização do medicamento genérico, por forma a abarcar todas as indicações, vias de administração e posologia do medicamento original ainda que tenham sido autorizadas há menos de seis ou dez anos.

A extensão da autorização de comercialização dos medicamentos genéricos

57 Os diferentes objectivos que convergem na aplicação da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 são difíceis de harmonizar, porque cada um deles justifica uma leitura diferente deste preceito. Não obstante, considero que o melhor equilíbrio dos interesses que incidem sobre a utilização do procedimento simplificado para obter a autorização de comercialização dos medicamentos genéricos se consegue realizando a interpretação do mencionado preceito que a seguir proponho.

As autorizações de comercialização dos medicamentos genéricos, solicitadas em virtude deste preceito, alargar-se-ão a todas as indicações, vias de administração e posologia autorizadas até esse momento para o medicamento original essencial similar, comercializado na Comunidade desde há seis ou dez anos. Não obstante, as novas indicações do medicamento original autorizadas desde há menos de seis ou dez anos beneficiarão, também, do prazo de protecção de seis ou dez anos quando constituam inovações terapêuticas de grande importância. As novas vias de administração e posologia do medicamento original não constituem inovações terapêuticas relevantes e, por conseguinte, não beneficiam do referido prazo de protecção.

58 Esta interpretação da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65, que é também a que defende basicamente a Comissão, respeita a exigência da protecção da saúde pública, porque o alargamento da autorização de comercialização do medicamento genérico às novas indicações do medicamento original com escassa relevância terapêutica e às novas vias de administração e posologia é apoiada pela existência dos resultados pertinentes dos ensaios farmacológicos, toxicológicos e clínicos apresentados pela empresa inovadora. Além disso, os documentos e relatórios necessários para solicitar a autorização do medicamento genérico serão elaborados por peritos com as qualificações técnicas ou profissionais necessárias, segundo o disposto nas Directivas 75/318 e 75/319.

Por outro lado, é benéfico para a protecção da saúde pública que um medicamento genérico se comercialize fazendo referência a todas as indicações terapêuticas, vias de administração e posologia admitidas pelas autoridades competentes para o medicamento original essencialmente similar. Assim se consegue o máximo rendimento terapêutico do medicamento genérico.

Finalmente, a interpretação proposta impede que as empresas inovadoras que conseguem a autorização de comercialização de um medicamento original desenvolvam uma estratégia obstrucionista em relação aos medicamentos genéricos essencialmente similares. Tal estratégia pode consistir em solicitar escalonadamente a autorização de novas indicações terapêuticas, vias de administração e/ou posologia para alargar o seu período de protecção de seis ou dez anos e dificultar o lançamento no mercado dos medicamentos genéricos. Este tipo de práticas seria incompatível com a livre concorrência no sector farmacêutico, sem de forma alguma aumentar a protecção da saúde pública.

59 A interpretação sugerida está, também, em sintonia com a regra que impõem a não repetição de ensaios no homem ou no animal quando não sejam estritamente necessários. Com efeito, as novas indicações terapêuticas, vias de administração e/ou posologia autorizadas para um medicamento original contam com o apoio dos ensaios realizados pela empresa inovadora e não é aconselhável a sua repetição pela simples circunstância de não terem decorrido mais de seis ou dez anos desde o momento em que estas modificações foram autorizadas.

60 O fomento da inovação e da investigação farmacêuticas, bem como a protecção da propriedade industrial e comercial das empresas inovadoras, também ficam assegurados na sua justa medida com a interpretação que proponho da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65.

Quando a empresa titular da autorização de comercialização do medicamento original obtém autorizações para novas vias de administração ou posologia, não necessita de realizar investigações relevantes que mereçam uma protecção especial, porque a inovação que estas alterações comportam é pouco significativa. O mesmo raciocínio é válido para as novas indicações terapêuticas do medicamento original que se enquadram na linha das anteriormente autorizadas.

Em minha opinião, só se está na presença de uma inovação relevante quando a empresa titular da autorização de comercialização do medicamento original consiga uma autorização posterior para uma nova indicação com grande importância terapêutica. Neste caso, impõe-se a aplicação do prazo de protecção de seis ou dez anos para a nova indicação, com a finalidade de proteger a inovação realizada pela empresa farmacêutica, porque desta maneira se permite a amortização dos avultados investimentos normalmente requeridos para se alcançar uma inovação relevante. Uma nova indicação de grande importância terapêutica requer normalmente a realização de novos ensaios farmacológicos, toxicológicos e clínicos de um alcance similar aos necessários para se obter a autorização de comercialização de qualquer novo medicamento.

61 A aplicação desta interpretação da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 requer uma descrição dos critérios utilizáveis para determinar quais são as novas indicações do medicamento original que constituem uma inovação terapêutica de grande importância merecedora de protecção adicional.

62 Para esse efeito, a MCA inspirou-se no Regulamento n._ 541/95 para determinar quando uma nova indicação terapêutica é de grande importância. A Comissão, a Glaxo, a Wellcome, a Squibb, a Generics e os Governos sueco e dinamarquês consideram improcedente a utilização do mencionado regulamento.

Em minha opinião, do Regulamento n._ 541/95 não se podem extrair critérios para determinar se uma nova indicação de um medicamento original tem ou não grande importância terapêutica. Com efeito, este regulamento é uma norma de carácter processual que completa as disposições dos artigos 7._ e 7._-A da Directiva 65/65, alterados pela Directiva 93/39, referentes aos procedimentos de reconhecimento mútuo das autorizações de comercialização de medicamentos emitidas pelas autoridades competentes dos Estados-Membros. O Regulamento n._ 541/95 estende as disposições em matéria de reconhecimento mútuo às alterações dos termos das autorizações de comercialização de medicamentos. Este regulamento distingue entre alterações menores e alterações maiores. Estas últimas, enumeradas no Anexo II do regulamento, comportam uma alteração radical dos termos da autorização de comercialização, que carecem de novo pedido de autorização.

Não é possível considerar, como faz a MCA, que estas alterações maiores constituem as novas indicações com grande importância terapêutica, que requerem uma protecção adicional por virtude da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65. Em primeiro lugar, o Anexo II do Regulamento n._ 541/95 enuncia que «o presente anexo não prejudica o disposto no artigo 4._ da Directiva 65/65/CEE...». Em segundo lugar, a inovação terapêutica não constitui um factor relevante para qualificar as alterações como maiores ou menores. Por último, o mencionado regulamento tem carácter meramente formal, circunscrito à harmonização das práticas administrativas aplicáveis às alterações dos termos das autorizações de comercialização, que o torna inaplicável à determinação das condições de fundo que devem ser respeitadas na concessão da autorização mediante procedimento simplificado.

63 Em meu entender, cabe às autoridades nacionais competentes determinar em cada caso concreto se uma nova indicação de um medicamento original, autorizada há menos de seis ou dez anos, constitui ou não uma inovação terapêutica de grande importância, merecedora de protecção adicional face a um medicamento genérico essencialmente similar. Para efectuar esta apreciação, as autoridades competentes dos Estados-Membros, como refere a Comissão, devem ter em conta, entre outros, os seguintes critérios:

- A idoneidade da nova indicação para obter autorização de comercialização comunitária, por virtude do terceiro parágrafo, parte B, do Anexo do Regulamento n._ 2309/93, que exige a prova da importância do seu interesse terapêutico perante a Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos.

- A possibilidade de que a nova indicação terapêutica seja apta a obter uma patente (32) conforme à Convenção de Munique ou à legislação nacional de um Estado-Membro. As indicações terapêuticas iniciais de um medicamento original podem ser patenteadas e também é possível patentear indicações terapêuticas posteriores, sempre que constituam uma novidade, sejam fruto de uma actividade inventiva e susceptíveis de uma utilização terapêutica prática. A aptidão de uma nova indicação terapêutica de um medicamento original para ser objecto de protecção através de uma patente denota a inovação terapêutica que implica, pelo que constitui um indício a ter em conta para determinar se é merecedora ou não de uma protecção adicional face à comercialização de um medicamento genérico essencialmente similar.

- A importância dos ensaios farmacológicos, toxicológicos e clínicos realizados pela empresa inovadora para descobrir a nova indicação terapêutica do medicamento original.

64 Estes critérios permitem que as autoridades nacionais competentes efectuem a sua apreciação com um grau de objectividade suficiente.

A quinta questão

65 Esta questão suscita a possível nulidade da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 pela violação dos princípios de protecção da inovação, da não discriminação, da proporcionalidade e/ou de respeito do direito de propriedade.

66 No seu despacho de reenvio, a High Court não especifica os fundamentos que a induzem a submeter a possível nulidade da disposição em questão pela sua incompatibilidade com os referidos princípios gerais do direito comunitário. Pessoalmente, não vejo qualquer elemento na alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 que possa ser contrário a algum desses princípios gerais.

67 A protecção da inovação não foi formalmente reconhecida como princípio geral do direito pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. Trata-se de um objectivo da regulamentação comunitária relativa à comercialização de medicamentos que, como tal, aparece mencionado em diferentes normas comunitárias (33) Os princípios da não discriminação (34) e da proporcionalidade (35) aparecem de facto consagrados numa jurisprudência reiterada do Tribunal de Justiça.

A alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65 estabelece um procedimento simplificado de autorizações de comercialização de medicamentos genéricos essencialmente similares a medicamentos originais comercializados há, pelo menos, seis ou dez anos, na medida em que se utilizem os resultados dos ensaios farmacológicos, toxicológicos e clínicos apresentados pela empresa inovadora. Este procedimento ajusta-se às exigências do princípio de proporcionalidade, já que resulta adequado, para assegurar a protecção da saúde pública, a não repetição de ensaios no homem ou no animal e a protecção da inovação e da investigação farmacêutica (36). Por outro lado, não cria discriminação entre as empresas inovadoras e as que produzem medicamentos genéricos, já que aquelas beneficiam de um período de protecção das suas inovações de seis ou dez anos, que lhes permite amortizar os seus investimentos em investigação e desenvolvimento de medicamentos, e estas podem comercializar medicamentos genéricos essencialmente similares aos medicamentos originais mediante um procedimento simplificado e menos dispendioso, na medida em que aproveitam os resultados da investigação realizada pelas empresas inovadoras.

68 No que toca ao direito de propriedade, o Tribunal de Justiça considerou que constitui um direito garantido na ordem jurídica comunitária, mas que pode ser objecto de limitações que satisfaçam objectivos de interesse geral e não constituam, tendo em conta o objectivo prosseguido, uma intervenção desproporcionada e intolerável que lese a própria substância do referido direito (37). A utilização, decorrido o período de protecção de seis ou dez anos, por parte das empresas que fabricam medicamentos genéricos, dos resultados dos ensaios farmacológicos, toxicológicos e clínicos apresentados pelas empresas inovadoras para obter a autorização de comercialização do medicamento original não constitui uma limitação desproporcionada que atente contra o seu direito de propriedade sobre esses resultados.

69 Por conseguinte, não vejo qualquer elemento que afecte a validade da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65.

Conclusão

70 Tendo em conta as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais da seguinte forma:

«1) Dois medicamentos são essencialmente similares quando têm a mesma composição qualitativa e quantitativa em princípios activos, a sua forma farmacêutica é idêntica e se demonstrou, tal sendo o caso, a sua bioequivalência através de estudos adequados de biodisponibilidade.

2) As autoridades nacionais competentes não dispõem de margem de apreciação para determinar a similitude essencial entre dois medicamentos para efeitos da aplicação da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65/CEE do Conselho, de 26 de Janeiro de 1965, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas, respeitantes às especialidades farmacêuticas.

3) As autorizações de comercialização dos medicamentos genéricos estendem-se a todas as indicações, vias de administração e posologia autorizadas até esse momento para o medicamento original essencialmente similar comercializado na Comunidade há, pelo menos, seis ou dez anos. Não obstante, as novas indicações terapêuticas do medicamento original, autorizadas há menos de seis ou dez anos, beneficiem do prazo de protecção de seis ou dez anos quando constituam inovações terapêuticas de grande importância.

4) O Regulamento (CE) n._ 541/95 da Comissão, de 10 de Março de 1995, relativo à análise da alteração dos termos das autorizações de introdução no mercado de medicamentos concedidas pelas autoridades competentes dos Estados-Membros, carece de relevância para a aplicação da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65.

5) Nos presentes autos não se descortina qualquer elemento susceptível de afectar a validade da alínea a), iii), ponto 8, segundo parágrafo, artigo 4._ da Directiva 65/65.»

(1) - Directiva do Conselho, de 26 de Janeiro de 1965, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas, respeitantes às especialidades farmacêuticas (JO L 22, p. 369; EE 13 F1 P; 18).

(2) - Directiva do Conselho, de 22 de Dezembro de 1986, que altera a Directiva 65/65 (JO 1987, L 15, p. 36).

(3) - Utilizarei como equivalentes os termos «medicamento» e «especialidade farmacêutica», ainda que o conceito de medicamento seja mais amplo do que o de especialidade farmacêutica. O primeiro engloba não só os medicamentos fabricados industrialmente e, em particular, os medicamentos genéricos (isto é, os medicamentos similares a produtos existentes que já não estão protegidos por patentes), mas também as especialidades farmacêuticas (isto é, os medicamentos preparados e comercializados sob uma denominação especial e com um acondicionamento particular). A partir da Directiva 89/341/CEE do Conselho, de 3 de Maio de 1989, que altera as Directivas 65/65, 75/318/CEE (JO L 142, p. 11), o termo medicamento substitui o de especialidade farmacêutica no conjunto da regulamentação comunitária sobre medicamentos para uso humano.

(4) - Regulamento do Conselho, de 22 de Julho de 1993, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e fiscalização de medicamentos de uso humano e veterinário e institui uma Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos (JO L 214, p. 1).

(5) - O reconhecimento mútuo das autorizações de comercialização nacionais foi facilitado pela Directiva 93/39/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, que altera as Directivas 65/65, 75/318 e 75/319/CEE (JO L 214, p. 22).

(6) - Directiva do Conselho, de 20 de Maio de 1975, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às normas e protocolos analíticos, tóxico-farmacológicos e clínicos em matéria de ensaios de especialidades farmacêuticas (JO L 147, p. 1; EE 13 F4 p. 80).

(7) - Directiva do Conselho, de 20 de Maio de 1975, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes às especialidades farmacêuticas (JO L 147, p. 13; EE 13 F4 p. 92).

(8) - V. o acórdão de 5 de Outubro de 1995, Scotia Pharmaceuticals (C-440/93, Colect., p. I-2851).

(9) - Estas modificações foram as seguintes:

- Nova indicação para insuficiência cardíaca congestiva grave resistente ao tratamento (06.10.81)

- Introdução de um novo comprimido de 12,5 mg (12.10.83)

- Nova indicação para o tratamento da hipertensão ligeira a moderada, associada a um tratamento com tiazida, em pacientes que não tenham reagido ao tratamento somente com tiazida (23.10.85)

- Alteração da indicação a fim de permitir o tratamento inicial da hipertensão ligeira a moderada (01.06.90)

- Acréscimo de nova indicação referente ao tratamento posterior ao enfarte de miocárdio (23.12.93)

- Acréscimo de nova indicação referente ao tratamento da nefropatia diabética (05.05.94).

(10) - Trata-se da filial britânica do grupo de sociedades farmacêuticas Generics. Este grupo possui filiais na maior parte dos Estados-Membros da Comunidade e é propriedade em 63,25% da Merck Generics BV, sociedade holding de direito neerlandês. A Generics desenvolve a sua actividade no Reino Unido como fabricante e distribuidor de produtos farmacêuticos «genéricos», isto é, medicamentos que se vendem sob a sua denominação química, e não, como sucede no caso dos medicamentos não genéricos, sob uma marca comercial.

(11) - O teor desta comunicação era o seguinte:

«Como V. Ex.as sabem, debateu-se largamente a interpretação da alínea a), iii), ponto 8, artigo 4._ da Directiva 65/65/CEE, relativamente ao carácter exclusivo dos dados apresentados acerca dos resultados obtidos nos ensaios farmacêuticos e toxicológicos e nos ensaios clínicos por parte do primeiro titular.

Após cuidadoso exame, a MCA chegou à conclusão de que o Anexo II do Regulamento CEE n._ 541/95 da Comissão, relativo à análise da alteração dos termos das autorizações de comercialização, permite reconhecer com clareza em que circunstâncias podem gozar de exclusividade os dados que acompanham as alterações e autorizações já existentes.

Foi decidido que, quando o primeiro titular tenha apresentado nova indicação (durante os últimos dez anos) que não exija novo pedido, segundo o Anexo II do Regulamento CEE n._ 541/95 da Comissão, e quando tal modificação tenha sido objecto de nova autorização de comercialização ou de uma inclusão na autorização inicial, deverá conceder-se a protecção durante dez anos aos novos dados produzidos como fundamento da alteração. Daí se segue, portanto, que os segundos requerentes poderão referir-se aos dados do primeiro titular apoiados na alínea a), iii), ponto 8, artigo 4._, no que se refere às alterações que não satisfaçam os critérios acolhidos no Anexo II do Regulamento (CE) n._ 541/95 [...]».

(12) - Regulamento (CE) n._ 541/95 da Comissão, de 10 de Março de 1995, relativo à análise da alteração dos termos das autorizações de introdução no mercado de medicamentos concedidas pelas autoridades competentes dos Estados-Membros (JO L 55, p. 7).

(13) - A Wellcome é uma importante sociedade farmacêutica britânica dedicada à investigação. Actualmente, é filial da Glaxo Wellcome plc, constituída em 1995 quando a Glaxo plc (antes Glaxo Holdings plc) adquiriu a Wellcome plc. A Glaxo Wellcome plc é a maior empresa farmacêutica do mundo, com a maior quota do mercado mundial de medicamentos de receita médica obrigatória e com um dos maiores programas de investigação e desenvolvimento de produtos farmacêuticos.

(14) - A ampliação ao longo do tempo das indicações terapêuticas e doses autorizadas de aciclovir pode resumir-se em dois quadros, um para os comprimidos e outro para as injecções intravenosas.

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(15) - As autorizações significativas concedidas anteriormente à Glaxo para comercializar Ranitidina no Reino Unido são as seguintes:

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(16) - Directiva da Comissão, de 19 de Julho de 1991, que altera o anexo da Directiva 75/318 (JO L 270, p. 32).

(17) - Standard Terms, PharmaEuropa, edição especial, Outubro de 1996.

(18) - A nota explicativa para os requerentes de autorizações de comercialização de medicamentos de uso humano nos Estados-Membros da Comunidade Europeia, contida no volume II das Normas sobre medicamentos para uso humano nos Estados-Membros da Comunidade Europeia, versão de 1996, pp. 505 e 506, contém as definições de biodisponibilidade e bioequivalência. Por biodisponibilidade, entende-se «a rapidez e o grau de absorção de um princípio activo ou de uma fracção terapêutica a partir de uma forma farmacêutica e de mobilização sobre o local de acção. Na maior parte dos casos, as substâncias são destinadas a produzir um efeito terapêutico geral e é então possível dar uma definição mais concreta, tendo em conta o facto de haver trocas entre a substância presente na circulação geral e a substância presente no local de acção: por biodisponibilidade, entende-se a rapidez e o grau de difusão na circulação geral de uma substância ou da sua fracção terapêutica a partir de uma forma farmacêutica». No que respeita à bioequivalência, o mencionado documento assinala que «dois medicamentos são bioequivalentes se se tratar de produtos farmacêuticos equivalentes ou de substituição e se a sua (rapidez e grau de) biodisponibilidade após a administração, na mesma dose molar, são similares a tal ponto que os seus efeitos são essencialmente os mesmos, tanto no que diz respeito à eficácia como à inocuidade».

(19) - V. os acórdãos de 16 de Abril de 1991, Upjohn (C-112/89, Colect., p. I-1703, n._ 16), e de 30 de Novembro de 1983, Van Bennekom (227/82, Recueil, p. 3883, n._ 17).

(20) - Directiva do Conselho, de 26 de Outubro de 1983, que altera as Directivas 65/65, 75/318 e 75/319 (JO L 332, p. 1; EE 13 F14 p. 205).

(21) - Acórdãos Scotia Pharmaceuticals, já referido na nota 8, n._ 24, e de 12 de Novembro de 1996, Smith & Nephew e Primecrown (C-201/94, Colect., p. I-5819, n._ 30).

(22) - V. as conclusões do advogado-geral P. Leger no processo Scotia Pharmaceuticals, já referido, n.os 9 e segs.

(23) - Primeiro considerando da Directiva 65/65.

(24) - Acórdão Scotia Pharmaceuticals, já referido, n._ 17.

(25) - Monardes, N.: La Historia medicinal de las cosas que se traen de nuestras Indias Occidentales (1565/1574), Ministerio de Sanidad y Consumo, Madrid, 1989. Destaca, na introdução da sua obra, «as muitas coisas que há em diversas partes do mundo que não foram conhecidas até aos nossos tempos, que os antigos não conheceram e o tempo, que é descobridor de todas as coisas, no-las ensinou» (pp. 92 e 93). No capítulo dedicado ao «sangue-de-drago», utilizada para as doenças do ventre e para fortalecer as gengivas, refere-se aos «mil desatinos» invocados pelos «antigos, tanto gregos, como latinos e árabes», ultrapassados pelo que «o tempo, que é descobridor de todas as coisas, nos descobriu e ensinou» (pp. 218 e 219).

(26) - COM(84) 437 final, de 25 de Setembro de 1984, n.os 14 e 15.

(27) - V. Leardini, P.: «Brevets», Joly communautaire, Paris, Dezembro de 1997.

(28) - A situação actual foi descrita pelo advogado-geral N. Fennelly nas conclusões apresentadas nos processos Merck e Beecham (acórdão de 6 de Junho de 1996, C-267/95 e C-268/95, Colect., p. I-6285, n.os 75 a 87).

(29) - Regulamento do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativo à criação de um certificado complementar de protecção para os medicamentos (JO L 182, p. 1).

(30) - Este regulamento foi interpretado pelo Tribunal de Justiça, entre outros, nos acórdãos de 13 de Julho de 1995, Espanha/Conselho (C-350/92, Colect., p. I-1985); de 23 de Janeiro de 1997, Biogen (C-181/95, Colect., p. I-357), e de 12 de Junho de 1997, Yamanouchi Pharmaceutical (C-110/95, Colect., p. I-3251).

(31) - V. a Directiva 86/609/CEE do Conselho, de 24 de Novembro de 1986, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros respeitantes à protecção dos animais utilizados para fins experimentais e outros fins científicos (JO L 358, p. 1).

(32) - O Tribunal de Justiça abordou a relação entre as patentes e as autorizações de comercialização dos medicamentos sob outro ponto de vista no acórdão de 9 de Julho de 1997, Generics (C-316/95, Colect., p. I-3924).

(33) - V. n.os 51 a 55 supra.

(34) - Acórdãos de 20 de Setembro de 1988, Espanha/Conselho (203/86, Colect., p. 4563, n._ 14), e de 15 de Abril de 1997, The Irish Farmers Association e o. (C-22/94, Colect., p. I-1809, n._ 34).

(35) - Acórdãos de 29 de Fevereiro de 1996, França e Irlanda/Comissão (C-296/93 e C-307/93, Colect., p. I-795, n._ 30), de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho (C-280/93, Colect., p. I-4973, n._ 90), e de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o. (C-331/88, Colect., p. I-4023, n._ 14).

(36) - V. n.os 45 a 56 supra.

(37) - Acórdãos de 13 de Julho de 1989, Wachauf (5/88, Colect., p. 2609, n._ 15), de 10 de Janeiro de 1992, Kühn (C-177/90, Colect., p. I-35, n._ 16), e de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho, já referido na nota 35, n._ 78.

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