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Document 61994TJ0387

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Quarta Secção Alargada) de 18 de Setembro de 1996.
Asia Motor France SA, Jean-Michel Cesbron, Monin Automobiles SA, Europe Auto Service (EAS) SA e SA Somaco SARL contra Comissão das Comunidades Europeias.
Concorrência - Obrigações em matéria de instrução das denúncias - Legalidade dos fundamentos de rejeição - Erro de apreciação manifesto - Fundamentação.
Processo T-387/94.

Colectânea de Jurisprudência 1996 II-00961

ECLI identifier: ECLI:EU:T:1996:120

61994A0387

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Quarta Secção Alargada) de 18 de Setembro de 1996. - Asia Motor France SA, Jean-Michel Cesbron, Monin Automobiles SA, Europe Auto Service (EAS) SA e SA Somaco SARL contra Comissão das Comunidades Europeias. - Concorrência - Obrigações em matéria de instrução das denúncias - Legalidade dos fundamentos de rejeição - Erro de apreciação manifesto - Fundamentação. - Processo T-387/94.

Colectânea da Jurisprudência 1996 página II-00961


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Processo ° Acção de uma pessoa singular ou colectiva destinada a obter a condenação de pessoas singulares ou colectivas ° Incompetência do juiz comunitário

(Tratado CE, artigos 164. e segs.)

2. Acção por omissão ° Omissão ° Conceito ° Abstenção de agir ° Acção que não dá satisfação ° Exclusão

(Tratado CE, artigo 175. )

3. Recurso de anulação ° Acórdão de anulação ° Medidas de execução ° Recusa de adoptar medidas que ultrapassem a substituição do acto anulado ° Contestação relativa ao alcance da obrigação de execução ° Via processual ° Acção por omissão ° Contestação da legalidade do acto adoptado em substituição do acto anulado ° Via processual ° Recurso de anulação

(Tratado CE, artigos 173. , 175. e 176. )

4. Concorrência ° Procedimento administrativo ° Análises das denúncias ° Decisão de arquivamento ° Fiscalização jurisdicional

(Tratado CE, artigo 85. )

5. Concorrência ° Regras comunitárias ° Âmbito de aplicação material ° Comportamento imposto por medidas estatais ° Exclusão ° Condições

(Tratado CE, artigo 85. )

6. Actos das instituições ° Fundamentação ° Dever ° Alcance ° Decisão de aplicação das regras de concorrência

(Tratado CE, artigo 190. )

7. Processo ° Petição inicial ° Exigências de forma ° Identificação do objecto do litígio ° Exposição sumária dos fundamentos invocados ° Petição destinada à reparação dos danos causados por uma instituição comunitária

[Estatuto (CEE) do Tribunal de Justiça, artigo 19. ; Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 44. , n. 1, alínea c)

Sumário


1. O juiz comunitário não é competente para se pronunciar, no âmbito de um recurso directo, sobre a compatibilidade do comportamento de pessoas singulares ou colectivas com as disposições do Tratado.

2. O artigo 175. do Tratado refere-se à omissão por abstenção de decisão ou de tomada de posição e não à adopção de um acto diferente daquele que os interessados desejam ou consideram necessário. A este respeito, a Comissão, ao adoptar, para efeitos de execução de um acórdão de anulação solicitada por um queixoso, uma decisão destinada a substituir o acto anulado, tomou posição de modo claro e definitivo sobre o pedido desse queixoso.

3. A contestação relativa à conformidade do comportamento de uma instituição com as obrigações que lhe impõe o artigo 176. do Tratado numa situação em que um dos seus actos foi anulado releva da acção por omissão uma vez que o objecto da contestação é relativo à questão de saber se, para além da substituição do acto anulado, a instituição é obrigada a adoptar outras medidas relativas a outros actos que não foram contestados no âmbito do recurso de anulação inicial. Ora, quando se trata unicamente de impugnar a legalidade de um acto adoptado em substituição do acto anulado, tal impugnação deve ser suscitada no âmbito de um recurso de anulação nos termos do artigo 173. do Tratado.

4. Com excepção do caso em que o objecto da queixa é da competência exclusiva da Comissão, esta não tem qualquer obrigação de se pronunciar quanto à existência ou não de uma infracção ao artigo 85. denunciada numa queixa. Todavia, no caso de a Comissão rejeitar uma denúncia por não haver infracção às regras de concorrência do Tratado, é obrigada a expor, na sua decisão de rejeição, os factos e as considerações sobre os quais assenta essa conclusão. A fiscalização jurisdicional deve então consistir em verificar a exactidão material dos factos, a ausência de um erro manifesto de apreciação dos factos e de desvio de poder, bem como erros de direito.

5. Embora o comportamento de uma empresa possa escapar à aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, por falta, em relação a ela, de autonomia, daí não se conclui, todavia, que todo e qualquer comportamento pretendido ou dirigido pelas autoridades nacionais fique fora do âmbito de aplicação dessa disposição. Assim, se uma medida estatal retomar os elementos de um acordo a que tenham chegado os operadores económicos de um sector ou for adoptada após consulta e com o acordo dos operadores económicos em causa, esses operadores não poderão basear-se no carácter obrigatório da regulamentação para escapar à aplicação do referido artigo.

Em contrapartida, quando uma disposição regulamentar obrigatória susceptível de influenciar o jogo da concorrência no mercado comum e de afectar as trocas entre os Estados-Membros não tiver qualquer relação com um comportamento de empresas previsto no artigo 85. , n. 1, do Tratado, o simples cumprimento dessa disposição regulamentar escapa à aplicação do artigo 85. , n. 1. Com efeito, em semelhante hipótese, não existe a margem de autonomia dos operadores económicos que o artigo 85. , n. 1, do Tratado implica.

Na ausência de uma disposição regulamentar obrigatória impondo um comportamento anticoncorrencial, a Comissão só pode concluir a falta de autonomia dos operadores em causa se resultar, em razão de indícios objectivos, pertinentes e concordantes, que esse comportamento lhes foi unilateralmente imposto pelas autoridades nacionais através do exercício de pressões irresistíveis tais como, por exemplo, a ameaça da adopção de medidas estatais susceptíveis de lhes causar grandes prejuízos.

6. A fundamentação de uma decisão que afecte interesses deve permitir, por um lado, ao seu destinatário conhecer as justificações da medida tomada, a fim de poder defender os seus direitos, se for caso disso, e verificar se a decisão é ou não fundada, e, por outro lado, ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização.

A este respeito, a Comissão não está obrigada, na fundamentação das decisões que é levada a adoptar para garantir a aplicação das regras de concorrência, a tomar posição sobre todos os argumentos que os interessados invocam em apoio do seu pedido, mas basta-lhe que exponha os factos e as considerações jurídicas que revestem uma importância essencial na economia da decisão.

7. Por força do artigo 19. do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 44. , n. 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a petição deve indicar o objecto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Essa indicação deve ser suficientemente clara e precisa para que o demandante possa preparar a sua defesa e o Tribunal decidir a acção, eventualmente, sem mais informações em seu apoio. A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que a acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que assenta resultem, pelo menos sumariamente, mas de maneira coerente e compreensiva, do texto da própria petição.

Para preencher estas exigências, uma petição que vise a reparação de danos causados por uma instituição comunitária deve conter elementos que permitam identificar o comportamento que o recorrente reprova à instituição, as razões pelas quais considera que existe um nexo de causalidade entre o comportamento e o prejuízo que pretende ter sofrido, bem como a natureza e a extensão deste prejuízo

Partes


No processo T-387/94,

Asia Motor France SA, estabelecida em Livange (Luxemburgo),

Jean-Michel Cesbron, comerciante, titular da empresa JMC Automobiles, residente em Livange (Luxemburgo),

Monin Automobiles SA, estabelecida em Bourg-de-Péage (França),

Europe Auto Service (EAS) SA, estabelecida em Livange (Luxemburgo),

Somaco SARL, estabelecida em Fort-de-France (França),

representadas por Jean-Claude Forgoux, advogado no foro de Paris, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Pierrot Schiltz, 4, rue Béatrix de Bourbon,

recorrentes,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Berend Jan Drijber, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por Hervé Lehman, advogado no foro de Paris, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão de 13 de Outubro de 1994 que rejeitou as denúncias apresentadas pelas recorrentes relativas a acordos denunciados como contrários ao artigo 85. do Tratado CEE, e um pedido de indemnização do prejuízo que as recorrentes declaram ter sofrido devido ao modo como a Comissão tratou as suas denúncias,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção Alargada),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. García-Valdecasas, P. Lindh, J. Azizi e J. D. Cooke, juízes,

secretário: B. Pastor, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 20 de Março de 1996,

profere o presente

Acórdã

Fundamentação jurídica do acórdão


Factos na origem do litígio

1 As empresas recorrentes dedicam-se à importação e ao comércio em França de veículos de marcas japonesas que foram admitidos em livre prática em outros Estados-membros da Comunidade, como a Bélgica e o Luxemburgo.

2 Considerando-se vítima de um acordo ilícito celebrado entre cinco importadores de automóveis japoneses para França, ou seja, a Sidat Toyota France, a Mazda France Motors, a Honda France, a Mitsubishi Sonauto e a Richard Nissan SA, uma das empresas recorrentes, concretamente, Jean-Michel Cesbron, apresentou, em 18 de Novembro de 1985, uma denúncia à Comissão, por violação dos artigos 30. e 85. do Tratado CEE (a seguir "Tratado"). Esta denúncia foi seguida, em 29 de Novembro de 1988, por uma nova denúncia contra estes mesmos cinco importadores, apresentada, desta vez, por quatro das cinco recorrentes (J.-M. Cesbron, Asia Motor France SA, Monin Automobiles SA e EAS SA), com fundamento no artigo 85. do Tratado.

3 Nesta última denúncia, as empresas alegavam, em suma, que os cinco referidos importadores de automóveis de marcas japonesas tinham assumido, para com a administração francesa, o compromisso de não venderem, no mercado interno francês, um número de automóveis superior a 3% do número de matrículas de veículos automóveis registadas em todo o território francês durante o ano civil anterior. Os mesmos importadores entenderam-se para dividir entre si essa quota segundo regras preestabelecidas, excluindo qualquer outra empresa que pretendesse distribuir em França veículos de origem japonesa de outras marcas que não fossem as marcas distribuídas pelas partes no alegado acordo.

4 As recorrentes alegavam ainda na denúncia que, como contrapartida dessa autolimitação, a administração francesa tinha multiplicado os entraves à livre circulação de veículos de origem japonesa, de outras marcas que não fossem as cinco marcas distribuídas pelos importadores que eram partes no alegado acordo. Em primeiro lugar, teria sido instituído um processo de matrícula, em derrogação ao regime normal, para os veículos objecto de importações paralelas. Estes veículos eram considerados veículos usados e eram, por conseguinte, sujeitos a um duplo controlo técnico. Em segundo lugar, teriam sido dadas instruções à polícia nacional para que autuasse os adquirentes de veículos de origem japonesa que circulassem com matrícula estrangeira. Finalmente, mesmo quando se tratasse de veículos utilitários, para os quais se aplica uma taxa de imposto sobre o valor acrescentado mais baixa do que a que é aplicável aos veículos de turismo, estes veículos seriam tributados, no momento da sua importação para França, com uma taxa de IVA acrescida, que só mais tarde seria reduzida para a taxa normalmente aplicável, com as desvantagens que isso implica para o distribuidor relativamente ao comprador.

5 Com base no artigo 11. , n. 1, do Regulamento n. 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos 85. e 86. do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22, a seguir "Regulamento n. 17"), a Comissão, por ofício de 9 de Junho de 1989, pediu informações aos importadores postos em causa. Por carta de 20 de Julho de 1989, a Direcção-Geral da Indústria do Ministério da Indústria e do Ordenamento do Território francês deu instruções aos referidos importadores para não responderem a uma das perguntas formuladas pela Comissão, nos termos seguintes:

"V. Ex.as tiveram a amabilidade de me transmitir a título de informação um ofício da Comissão datado de 9 de Junho de 1989. Por meio desse ofício, a Comissão pede a V. Ex.as que lhe comunique informações relativas à política seguida pelos poderes públicos franceses em relação às importações de veículos japoneses. Não cabe a V. Ex.as responder-lhe em lugar destes."

6 Foi nestas condições que, por ofício de 16 de Outubro de 1989, os serviços da Comissão pediram informações às autoridades francesas. Em 28 de Novembro de 1989, as autoridades francesas, por intermédio da sua Representação Permanente junto das Comunidades Europeias, responderam a este pedido de informações alegando, no essencial, que "as interrogações relativas ao comportamento das empresas citadas no ofício da Comissão, na medida em que esse comportamento está ligado às modalidades da regulação pretendidas pelos poderes públicos, são... neste contexto, destituídas de pertinência: essas empresas não dispõem, com efeito, de qualquer autonomia na gestão dessa regulação".

7 Como a Comissão se manteve em silêncio a seu respeito, as quatro recorrentes em questão dirigiram-lhe, em 21 de Novembro de 1989, uma carta pedindo-lhe que tomasse posição quanto às denúncias apresentadas. Perante o silêncio persistente da Comissão, as quatro empresas interessadas intentaram, em 20 de Março de 1990, uma acção por omissão e de indemnização no Tribunal de Justiça. Por despacho de 23 de Maio de 1990, Asia Motor France e o./Comissão (C-72/90, Colect., p. I-2181), o Tribunal de Justiça julgou inadmissível a acção por omissão e de indemnização, na medida em que visava a omissão da Comissão relativamente à pretensa violação do artigo 30. do Tratado, e remeteu para o Tribunal de Primeira Instância a acção na medida em que esta dizia respeito à omissão da Comissão quanto à pretensa violação do artigo 85. do Tratado e à responsabilidade daí resultante.

8 Entretanto, por ofício de 8 de Maio de 1990, o director-geral da Direcção-Geral da Concorrência da Comissão informou as quatro partes interessadas, nos termos do artigo 6. do Regulamento n. 99/63/CEE da Comissão, de 25 de Julho de 1963, relativo às audições referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 19. do Regulamento n. 17 do Conselho (JO 1963, 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62), a seguir "Regulamento n. 99/63", de que esta não tencionava dar seguimento às suas denúncias e convidou-as a apresentar as suas observações eventuais a este respeito. Em 29 de Junho de 1990, estas partes fizeram chegar à Comissão as suas observações, nas quais reafirmaram a procedência das suas denúncias.

9 Foi nestas condições que, por acórdão de 18 de Setembro de 1992, Asia Motor France e o./Comissão (T-28/90, Colect., p. II-2285), o Tribunal de Primeira Instância julgou que não havia que decidir quanto aos pedidos apresentados na petição, na medida em que esta se baseava no artigo 175. do Tratado. Quanto ao mais, o Tribunal de Primeira Instância julgou inadmissíveis os pedidos de indemnização das demandantes.

10 Em 5 de Junho de 1990, a sociedade Somaco apresentou igualmente uma denúncia à Comissão, dirigida contra as práticas das sociedades CCIE, SIGAM, SAVA, SIDA e Auto GM, todas com sede em Lamentin (Martinica), respectivamente concessionárias das marcas Toyota, Nissan, Mazda, Honda e Mitsubishi, e importadoras destas marcas na ilha. Esta denúncia, baseada nos artigos 30. e 85. do Tratado, punha igualmente em causa as práticas da administração francesa, com o fundamento de que estas tinham por objectivo impedir as importações paralelas, pela denunciante, de veículos de determinadas marcas japonesas e da marca coreana Hyundai.

11 Por ofício de 9 de Agosto de 1990, que fazia referência ao seu ofício de 8 de Maio de 1990 dirigido às outras quatro recorrentes, a Comissão informou a sociedade Somaco de que não tinha a intenção de dar seguimento à sua denúncia e convidou-a, nos termos do disposto no artigo 6. do Regulamento n. 99/63, a apresentar as suas observações. Por carta de 28 de Setembro de 1990, a Somaco reafirmou a procedência da sua denúncia.

12 Por ofício de 5 de Dezembro de 1991, assinado pelo membro encarregado das questões de concorrência, a Comissão comunicou às cinco recorrentes uma decisão que rejeitava as denúncias apresentadas em 18 de Novembro de 1985, 29 de Novembro de 1988 e de 5 de Junho de 1990.

13 Esta rejeição foi baseada em dois fundamentos. Segundo o primeiro fundamento de rejeição, o comportamento dos cinco importadores colocado em causa fazia parte integrante da política dos poderes públicos franceses em matéria de importações de automóveis japoneses para França. No âmbito desta política, os poderes públicos não só fixavam as quantidades totais de veículos admitidas anualmente em França, mas determinavam também as modalidades de repartição dessas quantidades. Nos termos do segundo fundamento de rejeição, não havia relação entre o interesse das recorrentes e a alegada infracção em virtude do facto de a eventual aplicação do artigo 85. não ser susceptível de obviar à situação de que as recorrentes se consideravam vítimas. (O texto integral dos dois fundamentos de rejeição constantes da decisão de 5 de Dezembro de 1991 é repetido na decisão em litígio no caso em apreço, v. adiante n. 24).

14 A decisão de 5 de Dezembro de 1991 foi objecto de um recurso de anulação interposto na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Fevereiro de 1992.

15 Por acórdão de 29 de Junho de 1993, Asia Motor France e o./Comissão (T-7/92, Colect., p. II-669, a seguir "Asia Motor France II"), o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão de 5 de Dezembro de 1991, na parte em que diz respeito ao artigo 85. do Tratado, tendo em conta, por um lado, que o primeiro fundamento de rejeição se baseia numa apreciação inexacta tanto em matéria de facto como de direito, dos elementos submetidos à apreciação da Comissão e, por outro, que o segundo fundamento de rejeição está viciado por erro de direito.

16 Na sequência deste acórdão, a Comissão dirigiu, em 25 de Agosto de 1993, às autoridades francesas e aos concessionários da Martinica postos em causa na denúncia da sociedade Somaco de 5 de Junho de 1990, pedidos de informações nos termos do artigo 11. , n. 1, do Regulamento n. 17. Com esses pedidos, desejava, nomeadamente, obter uma justificação das aparentes contradições entre, por um lado, as informações prestadas pelas autoridades francesas e, por outro, os documentos apresentados pelas sociedades recorrentes e analisados pelo Tribunal no âmbito da sua apreciação do primeiro fundamento de rejeição da decisão de 5 de Dezembro de 1991.

17 Em 19 de Outubro de 1993, as recorrentes interpelaram a Comissão nos termos do artigo 175. do Tratado.

18 Os concessionários da Martinica responderam ao pedido de informações da Comissão durante o mês de Outubro de 1993. Quatro deles apresentaram, em apoio das suas explicações, cópias de documentos que demonstram, em sua opinião, que as quotas de importação aplicadas às suas marcas foram atribuídas pela administração e não resultavam de um acordo entre eles.

19 As autoridades francesas responderam ao pedido de informações por uma carta de 11 de Novembro de 1993.

20 Em 10 de Janeiro de 1994, a Comissão enviou às recorrentes uma comunicação nos termos do artigo 6. do Regulamento n. 99/63. Forneceu-lhes também cópia das respostas aos pedidos de informações e deu-lhes a possibilidade de examinarem as provas documentais que lhe tinham sido apresentadas.

21 Por carta de 9 de Março de 1994, as recorrentes apresentaram as suas observações relativas à comunicação que a Comissão lhes tinha enviado em 10 de Janeiro de 1994.

22 Por carta de 2 de Agosto de 1994, as recorrentes interpelaram novamente a Comissão.

23 Por carta de 13 de Outubro de 1994, assinada pelo membro encarregado das questões de concorrência, a Comissão comunicou às cinco recorrentes uma nova decisão com a qual rejeitava as denúncias (a seguir "decisão impugnada"). Esta decisão apenas retoma o primeiro fundamento de rejeição da decisão de 5 de Dezembro de 1991.

24 A decisão impugnada tem a seguinte redacção:

"Faço referência às seguintes denúncias:

1. Denúncias que foram apresentadas respectivamente em nome de J.-M. Cesbron (JMC Automobiles, Luxemburgo), Asia Motor France (Luxemburgo), Monin Automobiles (Bourg-de-Péage) e EAS (Luxemburgo):

° em 18 de Novembro de 1985, com referência ao artigo 30. do Tratado, contra práticas imputáveis à administração francesa;

° em 29 de Novembro de 1988, com referência ao artigo 85. do Tratado, contra práticas dos importadores franceses das cinco marcas japonesas Toyota, Honda, Nissan, Mazda, Mitsubishi, que punha igualmente em causa o Estado francês ao abrigo do artigo 30. ;

com o fundamento de que essas práticas se destinavam a impedir as importações paralelas para França, pelas empresas denunciantes, de veículos ° principalmente das marcas Isuzu, Daihatsu, Suzuki e Subaru ° admitidos em livre prática em outros Estados-Membros e nomeadamente na Bélgica e no Grão-Ducado do Luxemburgo.

2. Denúncia que foi apresentada em 5 de Junho de 1990 em nome da sociedade Somaco, de Lamentin, com referência simultânea aos artigos 30. e 36. e ao artigo 85. do Tratado, contra práticas das sociedades CCIE, SIGAM, SAVA, SIDA e Auto GM, todas com sede em Lamentin, respectivamente concessionárias das marcas japonesas Toyota, Nissan, Mazda, Honda e Mitsubishi e importadoras destas marcas para a ilha da Martinica, e que punha igualmente em causa práticas do Estado francês, com o fundamento de que estas práticas se destinavam a impedir as importações paralelas, pela denunciante, de veículos das mesmas marcas e da marca coreana Hyundai.

Pelas razões que serão expostas a seguir, e tendo em conta as observações contidas na vossa carta de 9 de Março de 1994, a Comissão decidiu manter a sua decisão de rejeição que vos foi comunicada por carta de 5 de Dezembro de 1991. Recordo-lhes que essa rejeição tinha por base as características da situação que prevalecia na altura dos factos expostos por V. Ex.as As características em questão, e as conclusões que daí retirava a Comissão, estavam resumidas do seguinte modo na decisão de rejeição:

' ° no que diz respeito à eventual aplicação do artigo 85. , as investigações efectuadas pelos serviços da Comissão demonstraram que os comportamentos dos cinco importadores postos em causa são parte integrante da política dos poderes públicos franceses em matéria de importação de automóveis japoneses para França. A este respeito, deve recordar-se que essas importações são objecto de uma regulação que é assegurada a nível nacional. No âmbito desta regulação, os poderes públicos franceses fixam não só as quantidades totais de veículos admitidas em cada ano em França, mas determinam também as modalidades de repartição dessas quantidades, nomeadamente reservando-as unicamente aos importadores visados. Foi neste sentido que as autoridades francesas informaram a Comissão, por nota de 28 de Novembro de 1989, em que se escrevia que o comportamento dos cinco importadores 'está ligado às modalidades da regulação pretendidas pelos poderes públicos' e que os importadores 'não dispõem... de qualquer autonomia na gestão dessa regulação' . Estes importadores não dispõem, por conseguinte, de qualquer margem de manobra neste caso.

À luz das verificações acima referidas, a Comissão entende que não há relação entre o interesse de V. Ex.a e a alegada infracção ao artigo 85. , em virtude do facto de a eventual aplicação do artigo 85. não ser susceptível de obviar à situação de que V. Ex.a se considera vítima. Com efeito, a fixação das quantidades totais pelos poderes públicos não cabe no âmbito do artigo 85. , e a aplicação desta disposição à repartição não seria susceptível de propiciar a homologação da sociedade de V. Ex.a como importadora. Por um lado, não se vê como V. Ex.a poderia ser admitida a participar numa repartição que V. Ex.a mesma qualificou de acordo ilícito. Por outro lado, como foi acima recordado, a regulação nacional não permite que os importadores que não sejam os cinco visados sejam incluídos no critério de repartição. Nestas circunstâncias, a verificação de uma infracção ao artigo 85. em nada modificaria a posição de V. Ex.a em relação aos importadores postos em causa.

O entrave às trocas comerciais entre Estados-Membros que resulte eventualmente da impossibilidade de importar para França automóveis coreanos da marca Hyundai deve ser considerado destituído de natureza sensível, em virtude da reduzida posição desta marca na Comunidade.

° No que diz respeito à eventual aplicação do artigo 30. , ela deve ser afastada por falta de interesse público comunitário, tendo em conta a política comercial comum.'

Por acórdão de 29 de Junho de 1993, o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão acima referida, na parte em que diz respeito ao artigo 85. do Tratado. O Tribunal colocou em dúvida as conclusões a que chegou a Comissão, principalmente com base nos documentos provenientes do departamento da Martinica. Estes, separados do seu contexto, podiam efectivamente parecer contradizer a tese acolhida pela Comissão quanto a um nível insuficiente de concertação, na acepção do artigo 85. , entre os importadores colocados em causa. Assim, foi com base nestes documentos e nessa aparente contradição que foram feitos novos pedidos de informações dirigidos, nos termos do artigo 11. do Regulamento n. 17, simultaneamente às autoridades francesas e aos importadores da Martinica, relativamente aos quais V. Ex.as puderam consultar as respostas nos serviços da Comissão. V. Ex.as puderam também apresentar as vossas observações escritas a essas respostas, bem como sobre as conclusões que a Comissão se propunha daí retirar nos termos da sua comunicação de 10 de Janeiro de 1994, feita em conformidade com o artigo 6. , do Regulamento n. 99:

' A sua análise confirma que as autoridades francesas tinham instaurado desde 1977 um regime estatal de importação para os veículos dos países terceiros, e isto em todo o território da República Francesa ° embora de um modo específico no departamento da Martinica ° no âmbito da política comercial em matéria de automóveis que era na altura conduzida a nível nacional. Foi nesse âmbito que o Ministério da Indústria em Paris homologou cinco importadores como representantes exclusivos respectivamente das cinco marcas Honda, Toyota, Mazda, Mitsubishi e Nissan. Cada um deles recebia anualmente a esse título uma comunicação do ministério quanto ao número total máximo de veículos da sua marca cuja importação era autorizada e o número total assim autorizado pelo Estado era limitado, para a França metropolitana, a 3% do mercado, e para o departamento da Martinica, a 15%. Os cinco importadores em questão foram encarregados, a partir de 1981, de comunicar anualmente ao representante da mesma marca na Martinica ° sendo este designado pelo construtor japonês em causa ° o número das vendas autorizadas para essa marca nesse departamento, e de lhe enviar o correspondente número exacto de documentos de matrícula. Resulta do processo que a taxa média de penetração na Martinica das cinco marcas em causa, cerca de 30% antes da implementação deste regime de importação, diminuiu progressivamente para cerca de 15% em 1984, e que foram vãs todas as tentativas de resistência desenvolvidas pelos interessados, que se consideraram lesados por essa imposta diminuição do seu volume de negócios.

Nesse contexto, realizou-se efectivamente uma reunião na Martinica em 19 de Outubro de 1987 que deu origem a uma acta acompanhada de um 'protocolo de acordo' , os quais foram apresentados ao Tribunal como respeitando ao mérito do processo aqui em causa. Mas, na realidade, essa reunião foi convocada pelo prefeito e tinha apenas por objecto a questão adjacente referente às modalidades da 'restituição' pela sociedade CCIE, representante local da Toyota, de 487 veículos por ela vendidos em excesso desde 1982 em relação ao número das importações que lhe foram atribuídas, restituição que lhe era exigida pela administração. Com efeito, até 1986 inclusive, a CCIE não tinha diminuído o número das suas vendas. Assim, foram as modalidades da referida restituição que deram origem à reunião e ao protocolo em questão, e não as modalidades de repartição do mercado local: na ocorrência, com efeito, uma restituição demasiado brutal desses 487 veículos pela CCIE podia levar a despedimentos nessa empresa.

Nestas condições, a acta dessa reunião de 19 de Outubro de 1987 e o 'protocolo de acordo' , fornecidos pelas denunciantes e citados pelo Tribunal, podem certamente prestar-se a confusão se forem retirados do seu contexto. Mas, colocados no seu contexto, não alteram a natureza exclusivamente estatal não apenas do regime de importação que está de facto no centro deste processo, mas também das modalidades que foram postas expressamente em causa pela denúncia da Asia Motor. O mesmo se pode dizer do ofício do Ministério da Indústria de 1 de Julho de 1987, bem como da sentença de 16 de Março de 1990 citados pelo Tribunal a título de corroboração:

° o primeiro apenas confirma 'a exclusividade de facto' efectivamente organizada por um regime estatal bem como a resistência dos interessados ° finalmente vencida sem apelo, como no caso da CCIE °, em todo o caso, a expressão 'o Ministério da Indústria não poderá aceder a tal pedido' não deixa margem para ambiguidades;

° a segunda, embora presuma a existência de um acordo proibido, não avança nesse sentido elementos de facto ou de direito probatórios ou mesmo pertinentes: nomeadamente, as suas apreciações são baseadas na situação da existência, diferentemente do processo aqui em causa, de um acordo anterior à intervenção dos poderes públicos: em todo o caso, é apenas uma decisão de suspensão da instância.

Por conseguinte, está suficientemente confirmado que os importadores postos em causa, e em especial os da Martinica, não dispunham de qualquer margem de manobra na implementação do regime de importação em questão. Em todo o caso, está também confirmado que a tese do acordo de repartição é infirmada por duas circunstâncias: por um lado, as vias da recepção por tipo estavam reservadas às cinco marcas referidas, não pela acção dos seus importadores, mas por falta de homologação oficial de outras marcas ou de outros importadores e, por outro, as sociedades postas em causa não podiam ter interesse num controlo das importações que amputou o seu mercado em 50%' .

As novas observações escritas de V. Ex.as que nos chegaram através da carta de V. Ex.as de 9 de Março de 1994 não são susceptíveis de modificar as conclusões da Comissão relativas ao carácter estatal do regime de importação em questão e à falta de margem de manobra dos importadores na repartição do mercado, que afastava os clientes de V. Ex.as do mercado francês. Em contrapartida, com a sua decisão n. 94-D-05 de 18 de Janeiro de 1994, o Conselho da Concorrência, de Paris, também concluiu, entretanto e no mesmo processo, pela existência de uma 'política de contingentação implementada pelos poderes públicos' . Designadamente, na segunda parte da sua decisão e relativamente às modalidades da repartição do mercado entre os importadores da Martinica, o Conselho da Concorrência refere o seguinte quanto ao protocolo de acordo assinado em 8 de Novembro de 1987 a que V. Ex.as fazem alusão:

' Apreciação:

Quanto às quotas de importação:

Considerando em especial que, embora o protocolo assinado em 8 de Novembro de 1987 entre os concessionários pudesse constituir o indício de um comportamento autónomo dessas empresas, esse acordo foi celebrado em aplicação de orientações dadas nomeadamente por um consultor técnico do gabinete do ministro dos Departamentos e Territórios Ultramarinos, pelo director dos assuntos económicos, sociais e culturais ultramarinos do Ministério dos Departamentos e Territórios Ultramarinos e pelo subdirector do serviço dos bens de equipamento do Ministério da Indústria aquando da reunião efectuada em 19 de Outubro de 1987 no Ministério dos Departamentos e Territórios Ultramarinos e não foi corroborado por qualquer elemento suficientemente probatório para estabelecer a existência de práticas implementadas por essas empresas independentemente das intervenções da prefeitura da Martinica.'

Nestas condições, a Comissão mantém, nos mesmos termos anteriormente recordados, a rejeição dos pedidos que lhe foram apresentados em 18 de Novembro de 1985 e em 29 de Novembro de 1988 pelas sociedades JMC Automobiles, Asia Motor, Monin Automobiles e EAS, e em 5 de Junho de 1990 pela sociedade Somaco, na medida em que esses pedidos se destinavam a obter a declaração da existência de um acordo proibido na acepção do artigo 85. "

Tramitação processual e pedidos das partes

25 Foi nestas circunstâncias que as recorrentes interpuseram o presente recurso por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 12 de Dezembro de 1994.

26 Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Quarta Secção Alargada) decidiu iniciar a fase oral e adoptar medidas de organização do processo nos termos do artigo 64. do Regulamento de Processo, solicitando à recorrida que apresentasse determinados documentos e respondesse a certas questões. A recorrida satisfez esses pedidos no prazo fixado.

27 As partes foram ouvidas em alegações e em resposta às perguntas orais do Tribunal na audiência de 20 de Março de 1996.

28 As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

° declarar que os acordos denunciados constituem uma infracção na acepção do artigo 85. do Tratado;

° declarar que os serviços da Comissão recusaram executar o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Junho de 1993 e que incorrem em abstenção na acepção do artigo 176. do Tratado;

° anular a decisão da Comissão de 13 de Outubro de 1994 nos termos do artigo 173. do Tratado;

° condenar a Comunidade Europeia, nos termos dos artigos 178. e 215. do Tratado, a indemnizar as denunciantes pelo prejuízo causado pelas instituições e, em consequência, fixar a indemnização no montante correspondente aos juros à taxa de 9,75% sobre a quantia em que é avaliado o prejuízo principal, contados desde a decisão de arquivamento de 5 de Dezembro de 1991 e até à prolação do acórdão;

° condenar a Comissão na totalidade das despesas, tanto do presente processo como do processo que deu origem ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Junho de 1993.

29 A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

° negar provimento ao recurso, à acção de indemnização e à acção por omissão intentadas pelas sociedades recorrentes;

° condenar as sociedades recorrentes nas despesas.

Quanto ao âmbito do recurso

30 A petição está formalmente dividida em três partes. Na primeira parte, intitulada "acção por omissão", as recorrentes desenvolveram um argumento relativo à execução do acórdão Asia Motor France II, nos termos do qual concluíram que a "atitude dos serviços da Comissão constitui um caso de abstenção na acepção do artigo 176. do Tratado, uma vez que a recusa em executar o acórdão do Tribunal de Primeira Instância é manifesta e injusta". A segunda parte da petição expõe os fundamentos e argumentos em apoio do recurso de anulação e a terceira parte expõe os argumentos em apoio da acção de indemnização.

31 Aquando da audiência, o advogado das recorrentes sublinhou, em resposta a uma questão precisa do Tribunal, que a primeira parte da petição devia ser considerada uma acção por omissão, "baseada nos artigos 175. e 176. do Tratado CE", e não um fundamento de anulação com base na violação do artigo 176. do Tratado.

32 No respeitante ao primeiro pedido das recorrentes, há que recordar que o juiz comunitário não é competente para se pronunciar, por iniciativa de um recorrente, sobre a compatibilidade do comportamento de pessoas singulares ou colectivas com as disposições do Tratado (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Janeiro de 1996, Koelman/Comissão, T-575/93, Colect., p. II-1, n. 30). Donde resulta que o pedido das recorrentes destinado a que o Tribunal declare "que os acordos denunciados constituem uma infracção na acepção do artigo 85. do Tratado" deve ser julgado inadmissível.

Quanto à acção por omissão

Argumentos das partes

33 As recorrentes recordam que, nos termos do artigo 176. do Tratado, a instituição de que emane o acto anulado pelo Tribunal é obrigada a tomar as medidas necessárias à execução do acórdão de anulação. Recordam também que esta obrigação implica que a instituição deve respeitar não apenas a parte decisória do acórdão de anulação, mas igualmente a fundamentação que conduziu a ela e que deve, em especial, quando adoptar um acto destinado a substituir o acto anulado, tomar as medidas necessárias para evitar uma repetição das ilegalidades identificadas nos fundamentos do acórdão de anulação (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1988, Asteris e o./Comissão, 97/86, 99/86, 193/86 e 215/86, Colect., p. 2181).

34 As recorrentes alegam que a decisão impugnada viola o artigo 176. do Tratado, na medida em que repete os erros de facto e de direito identificados pelo Tribunal no acórdão Asia Motor France II, e aduzem três argumentos em apoio desta conclusão. Em primeiro lugar, a Comissão teria recusado admitir o valor probatório dos documentos analisados pelo Tribunal nos n.os 39 a 53 do acórdão Asia Motor France II, já referido. Em segundo lugar, a Comissão não teria apresentado qualquer elemento novo susceptível de justificar a retomada do primeiro fundamento da decisão de 5 de Dezembro de 1991. Por último, a Comissão teria acordado uma força probatória não justificada à referida decisão do Conselho da Concorrência francês de 18 de Janeiro de 1994.

35 Na audiência, as recorrentes alegaram que resulta do acórdão Asteris e o./Comissão, já referido, que a acção por omissão constitui a via apropriada para pôr em causa uma violação do artigo 176. tal como é alegada no caso em apreço.

36 A Comissão responde, essencialmente, que tomou posição sobre a execução que pretende dar ao acórdão Asia Motor France II ao adoptar a decisão impugnada e que a decisão respeita as exigências do artigo 176. do Tratado.

Apreciação do Tribunal

37 Há que recordar em primeiro lugar que o Tribunal apenas pode analisar os argumentos das recorrentes dentro dos limites dos pedidos formulados na sua petição inicial. A este respeito, as recorrentes precisam que o pedido com o qual contestam a boa execução do acórdão Asia Motor France II deve ser compreendido como estando dirigido contra uma abstenção, na acepção do artigo 175. do Tratado.

38 O Tribunal recorda que o artigo 175. do Tratado se refere à omissão por abstenção de decisão ou de tomada de posição e não à adopção de um acto diferente daquele que os interessados desejam ou consideram necessário (acórdão do Tribunal de Justiça, de 15 de Dezembro de 1988, Irisch Cement/Comissão, 166/86 e 220/86, Colect., p. 6473, n. 17).

39 No caso em apreço, o Tribunal considera que, ao adoptar a decisão impugnada em substituição do acto anulado, a Comissão tomou posição, de modo claro e definitivo, sobre a execução que dá ao acórdão Asia Motor France II.

40 Convém sublinhar, perante o argumento desenvolvido pelas recorrentes, que resulta do acórdão Asteris e o./Comissão, já referido, que a acção por omissão constitui a via apropriada para suscitar uma impugnação que se prende com a questão de saber se, para além da substituição do acto anulado, a instituição estava igualmente obrigada a adoptar outras medidas relativas a outros actos que não foram contestados no âmbito do recurso de anulação inicial (n.os 22 a 24), e que tal não é o caso quando se trata unicamente de impugnar a legalidade do acto adoptado em substituição do acto anulado. Tal impugnação deve ser suscitada no âmbito de um recurso de anulação nos termos do artigo 173. do Tratado.

41 Resulta de tudo o que precede que a acção por omissão deve ser julgada inadmissível.

Quanto ao pedido de anulação

42 As recorrentes invocam dois fundamentos em apoio do seu pedido de anulação. Um tem por base um erro de apreciação manifesto, o outro a falta de fundamentação.

Observações preliminares

43 Há que salientar que as denúncias apresentadas por J.-M. Cesbron, Asia Motor France, Monin Automobiles e EAS articulavam, essencialmente, duas acusações. A primeira denunciava a existência de um acordo entre os importadores para França de viaturas de cinco marcas japonesas (Toyota, Honda, Mazda, Mitsubishi e Nissan) e a administração francesa tendo em vista limitar as suas importações para o mercado francês em contrapartida de um compromisso das autoridades francesas, segundo o qual o parque de viaturas de origem japonesa lhes seria exclusivamente reservado. A segunda acusação é relativa à existência de um acordo entre essas mesmas empresas tendo por objectivo a repartição entre elas da quota assim fixada. A queixa da Somaco, na medida em que se refere à aplicação do artigo 85. do Tratado, denunciava, por um lado, a existência de um acordo entre os concessionários na Martinica de viaturas das mesmas cinco marcas japonesas que teria por objectivo bloquear o acesso ao mercado dos concessionários de viaturas de outras marcas japonesas e coreanas, e, por outro, a existência de um acordo entre os concessionários das cinco marcas japonesas já referidas tendo por objectivo a repartição entre eles de uma quota de importação fixada pela administração francesa.

44 O Tribunal declara que, na decisão impugnada, a Comissão rejeitou as diferentes denúncias, essencialmente, devido aos importadores/concessionários em causa não terem disposto "de qualquer margem de manobra na implementação do regime de importação", posto em causa nas denúncias, regime que tinha uma "natureza exclusivamente estatal". Segundo a decisão impugnada, a tese do acordo de repartição é "também infirmada por duas circunstâncias: por um lado, as vias da recepção por tipo estavam reservadas às cinco marcas (de viaturas japonesas em questão), não pela acção dos seus importadores, mas por falta de homologação oficial de outras marcas ou de outros importadores; por outro lado, as sociedades postas em causa não podiam ter interesse num controlo das importações que amputou o seu mercado em 50%".

45 O Tribunal considera que, sendo assim, se pode concluir que a Comissão rejeitou as denúncias por não haver um acordo proibido na acepção do artigo 85. , n. 1, do Tratado devido ao facto de o comportamento denunciado ter sido imposto às empresas em causa pelas autoridades públicas e não reflectir o exercício de uma opção comercial.

46 Embora resulte de uma jurisprudência constante que, com excepção do caso em que o objecto da queixa é da competência exclusiva da Comissão, esta não tem qualquer obrigação de se pronunciar quanto à existência ou não de uma infracção ao artigo 85. do Tratado denunciada numa queixa (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Outubro de 1979, GEMA/Comissão, 125/78, Recueil, p. 3173, n. 17; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1992, Automec/Comissão, T-24/90, Colect., p. II-2223, n.os 75 e 76, de 18 de Novembro de 1992, Rendo e o./Comissão, T-16/91, Colect., p. II-2417, n. 98, de 27 de Junho de 1995, Guérin automobiles/Comissão, T-186/94, Colect., p. II-1753, n. 23, e Koelman/Comissão, já referido, n. 39), o Tribunal considera que, no caso de a Comissão rejeitar uma denúncia por não haver infracção às regras de concorrência do Tratado, é obrigada a expor, na sua decisão de rejeição, os factos e as considerações sobre os quais assenta essa conclusão. A fiscalização jurisdicional deve então consistir em verificar a exactidão material dos factos, a ausência de um erro manifesto de apreciação dos factos ou de desvio de poder e bem assim de erros de direito (acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Novembro de 1987, BAT e Reynolds/Comissão, 142/84 e 156/84, Colect., p. 4487, de 15 de Junho de 1993, Matra/Comissão, C-225/91, Colect., p. I-3203, n.os 23 e 25, e acórdão Asia Motor France II, já referido, n. 33).

47 É à luz destas considerações que há que analisar os dois fundamentos invocados pelas recorrentes em apoio do seu pedido de anulação.

Quando ao fundamento baseado num erro manifesto de apreciação

Argumentos das partes

48 As recorrentes consideram que a decisão impugnada está viciada do mesmo erro manifesto de apreciação de que enfermava a decisão de 5 de Dezembro de 1991. Alegam que o fundamento de rejeição da decisão impugnada não é mais do que a repetição do primeiro fundamento de rejeição da decisão de 5 de Dezembro de 1991. Recordam que o Tribunal decidiu, no acórdão Asia Motor France II, já referido, que esse primeiro fundamento de rejeição estava viciado de um erro manifesto de apreciação e alegam que a Comissão não apresentou qualquer elemento novo que permita concluir que também não é este o caso no presente processo.

49 As recorrentes consideram ainda que, para adoptar a decisão impugnada não obstante os termos claros do acórdão Asia Motor France II, a Comissão se viu obrigada a descaracterizar certos documentos analisados pelo Tribunal nesse acórdão, dando-lhes um sentido que não tinham.

50 A Comissão responde que a decisão impugnada não pode ser considerada como uma simples "repetição" da decisão de 5 de Dezembro de 1991, mas que constitui uma nova decisão adoptada em função dos elementos novos surgidos após a primeira decisão, entre os quais, nomeadamente, as respostas aos novos pedidos de informações. Considera que esta nova decisão é baseada nos factos, corroborados por novos elementos de prova, que os concessionários da Martinica lhe comunicaram em resposta aos pedidos de informações.

51 A Comissão considera que resulta das respostas aos novos pedidos de informações que a administração francesa criou na França metropolitana, em 1977, um sistema de limitação das importações de veículos japoneses no âmbito do qual informava anualmente os importadores postos em causa das quantidades precisas de veículos que estavam autorizados a importar. Embora a criação deste sistema não tenha por base um qualquer texto legislativo e tenha sido objecto de um processo puramente oral, a Comissão considera que a globalidade do quadro administrativo permite verificar que, de facto, os importadores não tiveram qualquer possibilidade de se furtarem às instruções da administração que consideraram como verdadeiras ordens. A este respeito, refere, nomeadamente, os meios de pressão de que a administração dispunha, na medida em que teria podido excluir os exportadores autorizados do benefício do regime de recepção por tipo em relação aos novos modelos ou mesmo pôr termo ao seu estatuto de importador homologado.

52 A Comissão considera que os documentos apresentados confirmam também que foi criado um sistema semelhante, mas não idêntico, na Martinica em 1982 a fim de moderar as importações para esse departamento. Como aconteceu na França metropolitana, as partes de mercado dos concessionários das cinco marcas em causa foram congeladas no momento da implementação do sistema. Considera que os documentos apresentados pelos concessionários confirmam que estes só obtiveram dos importadores o número de certificados de conformidade correspondente às quotas fixadas pela administração. Acrescenta, a este respeito, que os importadores homologados são os únicos competentes para emitir esses documentos cuja posse é um elemento essencial para a colocação em circulação de um veículo.

OS FUNDAMENTOS CONTINUAN NO NUM.DOC: 694A0387.1

53 No que diz respeito, mais especialmente, à acta de uma reunião interministerial e ao protocolo de acordo analisados pelo Tribunal de Primeira Instância nos n.os 39 a 44 do acórdão Asia Motor France II, a Comissão alega que resulta das respostas aos pedidos de informações e dos documentos apresentados em apoio dessas respostas que a reunião e o protocolo de acordo tiveram por objectivo, por um lado, distribuir pelos concorrentes da Toyota, na proporção das suas partes respectivas na repartição feita a partir de 1982, as quantidades correspondentes à ultrapassagem pela Toyota da sua quota e, por outro, numa perspectiva mais ampla, fixar as regras para o futuro, de modo a permitir à administração obter dos importadores compromissos escritos e formais. Além disso, alega que o acordo apenas reconduziu a tabela de repartição aplicada desde 1982 e que o único elemento novo reside nas modalidades destinadas a regularizar a ultrapassagem da sua quota de que se tornou culpado o concessionário da Toyota.

54 No que toca à ultrapassagem da quota pelo concessionário da Toyota, a Comissão sublinha que isso foi conseguido através da emissão de placas provisórias relativamente a veículos para os quais não podia esperar obter certificados de conformidade.

Apreciação do Tribunal

55 Convém recordar, em primeiro lugar, que a Comissão já tinha rejeitado as denúncias das recorrentes numa decisão de 5 de Dezembro de 1991, designadamente, com o fundamento da falta de autonomia dos operadores económicos colocados em causa nessas denúncias. No seu acórdão Asia Motor France II, já referido, o Tribunal declarou que a decisão, na medida em que assenta nesse fundamento de rejeição, "está viciada por erro manifesto de apreciação da matéria de facto" tendo levado a Comissão "a cometer um erro de direito quanto à aplicabilidade do artigo 85. do Tratado aos comportamentos dos operadores postos em causa" (n. 55). O Tribunal chegou a esta conclusão depois de ter examinado, em primeiro lugar, dois documentos relativos às importações para a Martinica de viaturas japonesas e que foram apresentados pelas denunciantes durante o processo administrativo na Comissão. Tratava-se de uma acta de uma reunião interministerial, de 19 de Outubro de 1987, e do "protocolo de acordo" anexo a essa acta. Após ter considerado, num primeiro momento, que esses elementos dos autos "constituem, à primeira vista, um indício sério da existência de uma real autonomia de comportamento" no que toca aos operadores económicos em causa (acórdão Asia Motor France II, n. 44), o Tribunal, numa segunda fase, analisou os fundamentos da decisão de 5 de Dezembro de 1991, na medida em que essa decisão rejeitava não apenas a denúncia de 5 de Junho de 1990 da Somaco quanto à existência de um acordo entre os concessionários da Martinica, mas igualmente as denúncias de 18 de Novembro de 1985 e de 29 de Novembro de 1988 das outras recorrentes quanto à existência de um acordo entre os importadores para a França metropolitana. Após ter analisado dois outros documentos, nomeadamente, uma carta de 1 de Julho de 1987 do Ministério da Indústria, Correios e Telecomunicações e Turismo e uma sentença do tribunal de commerce de Paris de 16 de Março de 1990, o Tribunal concluiu que os vários documentos dos autos não corroboravam a conclusão de que os operadores económicos da França metropolitana e da Martinica postos em causa nas diferentes denúncias não dispunham de qualquer autonomia ou "margem de manobra" (n. 55).

56 Após a anulação pelo Tribunal, no seu acórdão Asia Motor France II, da decisão de 5 de Dezembro de 1991, a Comissão prosseguiu a análise das denúncias, tomando medidas de instrução. A este respeito, a decisão impugnada refere que "o Tribunal colocou em dúvida as conclusões a que chegou a Comissão, principalmente com base nos documentos provenientes do departamento da Martinica... Assim, foi com base nestes documentos... que foram feitos novos pedidos de informações dirigidos, nos termos do artigo 11. do Regulamento n. 17, simultaneamente às autoridades francesas e aos importadores da Martinica".

57 Seguidamente, há que observar que, na decisão impugnada, a Comissão considerou que a análise das respostas aos pedidos de informações "confirma que as autoridades francesas tinham instaurado desde 1977 um regime estatal de importação para os veículos dos países terceiros, e isto em todo o território da República Francesa ° embora de um modo específico no departamento da Martinica ° no âmbito da política comercial em matéria de automóveis que era na altura conduzida a nível nacional" e concluiu que "está suficientemente confirmado que os importadores postos em causa, e em especial os da Martinica, não dispunham de qualquer margem de manobra na implementação do regime de importação em questão".

58 Para a fiscalização da legalidade deste fundamento de rejeição, o Tribunal examinará separadamente, por um lado, o comportamento denunciado nas queixas de 18 de Novembro de 1985 e 29 de Novembro de 1988, relativas às importações para a França metropolitana e, por outro, o comportamento denunciado na queixa de 5 de Junho de 1990, relativa às importações para a Martinica.

° As denúncias de J.-M. Cesbron de 18 de Novembro de 1985 e de J.-M. Cesbron, Asia Motor France, Monin Automobiles e EAS de 29 de Novembro de 1988, que põem em causa os importadores para a França metropolitana

59 As queixas em causa denunciam, por um lado, a existência de um acordo entre os importadores para a França de viaturas das marcas japonesas Toyota, Honda, Nissan, Mazda e Mitsubishi e a administração francesa, nos termos do qual os importadores para a França das referidas marcas teriam aceite limitar a 3% a sua parte cumulada no mercado interno francês de automóveis, em contrapartida de um compromisso das autoridades francesas, segundo o qual lhes seria exclusivamente reservado o parque das viaturas de origem japonesa e, por outro, a existência de um acordo entre as empresas em causa tendo por objectivo a repartição entre elas da sua parte cumulada do mercado.

60 Para efeitos da análise do mérito do fundamento de rejeição das denúncias segundo o qual os importadores "não dispunham de qualquer autonomia na implementação do regime de importação em questão", o Tribunal recorda que, embora o comportamento de uma empresa possa escapar à aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, por falta, em relação a ela, de autonomia (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73, 55/73, 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colect., p. 563, n.os 36 a 73), daí não se conclui, todavia, que todo e qualquer comportamento pretendido ou dirigido pelas autoridades nacionais fique fora do âmbito de aplicação dessa disposição. Assim, se uma medida estatal retomar os elementos de um acordo a que tenham chegado os operadores económicos de um sector ou for adoptada após consulta e com o acordo dos operadores económicos em causa, esses operadores não poderão basear-se no carácter obrigatório da regulamentação para escapar à aplicação do artigo 85. , n. 1 (v., nomeadamente, acórdãos do Tribunal de Justiça de 30 de Janeiro de 1985, Clair, 123/83, Recueil, p. 391, n.os 19 a 23, de 30 de Abril de 1986, Asjes e o., 209/84 a 213/84, Colect., p. 1425, n. 77, de 1 de Outubro de 1987, VVR, 311/85, Colect., p. 3801, n. 24).

61 Em contrapartida, quando uma disposição regulamentar obrigatória susceptível de influenciar o jogo da concorrência no mercado comum e de afectar as trocas entre os Estados-Membros não tiver qualquer relação com um comportamento de empresas previsto no artigo 85. , n. 1, do Tratado, o simples cumprimento pelas empresas dessa disposição regulamentar escapa à aplicação do artigo 85. , n. 1 (v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Novembro de 1993, Meng, C-2/91, Colect., p. I-5791, n. 22, e Ohra Schadeverzekeringen, C-245/91, Colect., p. I-5851, n. 15). Com efeito, em semelhante hipótese, não existe a margem de autonomia dos operadores económicos que o artigo 85. , n. 1, do Tratado implica.

62 No caso em apreço, o Tribunal observa que as autoridades francesas, na sua resposta de 11 de Novembro de 1993 ao pedido de informações da Comissão de 25 de Agosto de 1993, confirmaram que tinham decidido, em 1977, tomar medidas para limitar a penetração de veículos japoneses a 3% do mercado metropolitano e que, nesse contexto, tinham decidido repartir o volume das importações autorizadas entre os cinco importadores homologados então presentes no mercado, tendo em conta as partes de mercado que estes detinham nessa altura, e de não permitir qualquer nova homologação de importadores de marcas japonesas. As autoridades francesas afirmaram também que, para implementar esta política, informavam anualmente cada um dos importadores da quantidade precisa de veículos correspondente à sua quota, dando-lhes instruções de não importarem veículos para além dessas quantidades.

63 Tendo em conta os princípios acima enunciados nos n.os 60 e 61, há que examinar se a decisão impugnada apoia a conclusão de que as autoridades francesas impuseram esse regime de importação às empresas postas em causa nas denúncias de tal modo que retiraram a estas últimas qualquer margem de autonomia.

64 Em primeiro lugar, é forçoso constatar que as próprias autoridades francesas confirmaram que nenhuma disposição de direito francês impôs aos importadores de viaturas japonesas para a França metropolitana o comportamento denunciado nas queixas. Com efeito, essas autoridades afirmaram, na sua resposta ao pedido de informações de 25 de Agosto de 1993, que o "mecanismo de controlo das importações dos veículos japoneses criado pela França foi objecto de um processo puramente oral".

65 Na ausência de uma disposição regulamentar obrigatória impondo o comportamento denunciado, o Tribunal considera que a Comissão só pode rejeitar as denúncias por falta de autonomia das empresas postas em causa se resultar, em razão de indícios objectivos, pertinentes e concordantes, que esse comportamento lhes foi unilateralmente imposto pelas autoridades nacionais através do exercício de pressões irresistíveis tais como, por exemplo, a ameaça da adopção de medidas estatais susceptíveis de lhes causar grandes prejuízos.

66 Contudo, afigura-se que a Comissão baseou a decisão impugnada, na medida em que se refere às queixas que põem em causa as importações de viaturas japonesas para a França metropolitana, nos mesmos elementos que tinham sustentado a conclusão, na sua decisão anterior de 5 de Dezembro de 1991, que os operadores económicos postos em causa não dispunham de qualquer autonomia ou "margem de manobra". Assim, os elementos qualificados pela Comissão como "elementos novos" na sua contestação (n.os 12 a 17) e na sua tréplica (n.os 8 a 10) só respeitam à situação na Martinica. Além disso, as respostas das autoridades francesas ao novo pedido de informações limitam-se a descrever o funcionamento do sistema de limitação das importações em termos gerais e, em especial, não fornecem qualquer elemento susceptível de apoiar ou de esclarecer a afirmação de que não se poderia fazer qualquer censura aos importadores postos em causa, que se terão limitado a aplicar medidas resultantes das decisões dos poderes públicos, sem dispor de qualquer margem de manobra.

67 Ora, o Tribunal decidiu no seu acórdão Asia Motor France II (n. 55), a partir, por um lado, dos elementos que a Comissão recolheu durante o processo administrativo que conduziu à adopção da decisão de 5 de Dezembro de 1991 e, por outro lado, dos elementos que tinham sido apresentados pelas partes durante o processo no Tribunal, que a conclusão da Comissão de que os importadores de viaturas de marcas japonesas para a França metropolitana e para a Martinica não tinham disposto de qualquer margem de manobra na implementação do regime de importações estava viciada por erro manifesto de apreciação da matéria de facto

68 É certo que a Comissão afirmou perante o Tribunal que a administração francesa teria podido exercer pressões indirectas sobre os importadores, retirando-lhes a homologação ou recusando-lhes o benefício da recepção por tipo relativamente a novos modelos. Todavia, o Tribunal verifica que nenhum elemento dos autos permite concluir que essas pressões foram, de facto, exercidas sobre os importadores e que essa questão não foi objecto de qualquer verificação durante o processo administrativo junto das autoridades francesas ou dos importadores para a França metropolitana. Por conseguinte, na falta dessa instrução, a Comissão não pode concluir que essas pressões foram, de facto, exercidas pelas autoridades francesas.

69 Por outro lado, o Tribunal salienta que a Comissão precisou na audiência que a decisão da administração de apenas homologar as marcas japonesas dos cinco importadores em causa faz parte integrante do convénio implementado e pode ser considerada "a contrapartida" da aceitação pelos importadores da política pretendida pela administração, o que parece excluir, à primeira vista, a existência de pressões irresistíveis exercidas pelas autoridades francesas. Este aspecto é, aliás, confirmado pela carta do Ministério da Indústria, Correios e Telecomunicações e do Turismo de 1 de Julho de 1987 (anexo 27 à petição inicial), nos termos da qual as importações paralelas de veículos japoneses ameaçam prejudicar progressivamente a exclusividade de facto que foi reconhecida aos cinco importadores homologados para a França metropolitana "como contrapartida dos seus compromissos de autolimitação". Esta carta enuncia também que este "desenvolvimento... ameaça conduzir rapidamente a que os importadores homologados voltem a pôr em causa todo o sistema de autolimitação". Ora, a possibilidade que tinham os operadores económicos de pôr em causa o regime de importação de viaturas japonesas para a França metropolitana indica que esses operadores não estavam destituídos de toda e qualquer autonomia na implementação do regime de importação em questão.

70 Assim, há que concluir que, à luz da verificação feita pelo Tribunal no n. 55 do seu acórdão Asia Motor France II, a decisão impugnada não assenta, na falta de elementos novos sobre o regime de importação aplicável na França metropolitana, em indícios objectivos, pertinentes e concordantes, susceptíveis de demonstrar que as autoridades francesas exerceram unilateralmente pressões irresistíveis sobre as empresas em causa a fim de estas adoptarem o comportamento denunciado nas queixas.

71 Resulta de tudo o que precede que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação dos factos, considerando, vistos os elementos à sua disposição, que o comportamento dos importadores homologados para a França metropolitana era a tal ponto desprovido de autonomia que escapava, por esse facto, à aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado. Na falta de elementos que demonstrem a existência de pressões irresistíveis, como os descritos no n. 65 supra, que tivessem forçado os importadores a aceitar uma limitação das suas importações, o comportamento dos importadores que é conforme aos desejos da administração francesa, tendo em conta o conjunto dos riscos e vantagens pertinentes, deve ser considerado como correspondendo ao exercício de uma opção comercial.

72 Assim, a decisão impugnada deve ser anulada, na parte em que rejeita as denúncias de J.-M. Cesbron de 18 de Novembro de 1985 e de J.-M. Cesbron, Asia Motor France, Monin Automobiles e EAS de 29 de Novembro de 1988.

° Quanto à denúncia da Somaco de 5 de Junho de 1990, que põe em causa os concessionários na Martinica

73 Nos termos da denúncia, a Somaco foi constituída em Junho de 1988 para importar para a Martinica veículos japoneses e coreanos das marcas Daihatsu, Isuzu, Hyundai, Suzuki e Subaru. Na sua denúncia, a Somaco alega que é vítima de um acordo ilícito entre os concessionários das marcas japonesas Toyota, Honda, Mazda, Mitsubishi e Nissan, "coberto pela administração francesa, destinado a reservar o acesso das viaturas japonesas e coreanas ao mercado da Martinica a cinco marcas japonesas". Acrescenta que estes mesmos concessionários "partilham (o) mercado, fixado pela administração em 15% das matrículas, em prejuízo da sociedade Somaco, que foi excluída do mercado". Para sustentar a sua queixa, apresentou dois documentos, designadamente, a acta de uma reunião interministerial realizada em 19 de Outubro de 1987 e o "protocolo de acordo" anexo a essa acta.

74 Em primeiro lugar, há que salientar que as recorrentes não contestam a decisão impugnada na medida em que rejeita, por falta de interesse comunitário, a acusação relativa à pretensa impossibilidade de importar para a Martinica automóveis coreanos da marca Hyundai.

75 No respeitante às importações das viaturas japonesas para França, de que a Martinica constitui um departamento, o Tribunal observa que as autoridades francesas explicaram, na sua resposta de 11 de Novembro de 1993 ao pedido de informações da Comissão de 25 de Agosto de 1993, que apenas cinco importadores que representam as marcas Toyota, Honda, Mitsubishi, Mazda e Nissan foram homologados em França. Trata-se dos importadores, mencionados no n. 2 do presente acórdão, contra os quais foram dirigidas as denúncias de 18 de Novembro de 1985 e 29 de Novembro de 1988.

76 As recorrentes não contestam o facto de apenas esses cinco importadores que representam as cinco marcas referidas terem sido homologados pela administração francesa. Por outro lado, é matéria assente que esses importadores homologados são exclusivamente competentes, por um lado, para emitir os certificados de conformidade destinados aos concessionários na Martinica e, por outro, que a obtenção de um certificado de conformidade é uma condição necessária para a matrícula na Martinica de um veículo importado.

77 Assim, o sistema descrito nos n.os 74 e 75 do presente acórdão ° independentemente da questão de saber se foi imposto unilateralmente pelas autoridades francesas ou se assenta num acordo celebrado entre os cinco importadores homologados e as autoridades francesas ° impede o acesso ao mercado das sociedades que pretendam importar para a França (metropolitana e Martinica) viaturas japonesas diferentes das viaturas das marcas Toyota, Honda, Mazda, Mitsubishi e Nissan. Portanto, e em todo o caso, a impossibilidade de a sociedade Somaco comercializar na Martinica viaturas das marcas Daihatsu, Isuzu, Suzuki e Subaru não decorre da existência de um eventual acordo entre os concessionários da Martinica referidos na denúncia.

78 Seguidamente, há que observar que a Comissão, na decisão impugnada, examinou as acusações suscitadas na denúncia, embora resulte das considerações precedentes que a Comissão teria podido interrogar-se sobre o interesse da sociedade Somaco em obter a declaração da alegada infracção. Assim, após a anulação da decisão de 5 de Dezembro de 1991, a Comissão deu início a uma nova instrução (v. n. 16, supra). Após ter examinado as respostas aos pedidos de informações que tinha dirigido às autoridades francesas e aos concessionários na Martinica, bem como as observações das recorrentes sobre a comunicação da Comissão de 10 de Janeiro de 1994, feita nos termos do artigo 6. do Regulamento n. 99/63, a Comissão rejeitou essa queixa, invocando igualmente a falta de autonomia dos concessionários na implementação do regime de importação em questão.

79 O Tribunal recorda que no seu acórdão Asia Motor France II considerou que esse fundamento de rejeição estava viciado por erro manifesto de apreciação da matéria de facto (n. 55). Assim, há que examinar se os elementos novos que foram recolhidos durante a instrução efectuada após a anulação pelo Tribunal da decisão da Comissão de 5 de Dezembro de 1991 são de natureza a dar nova perspectiva aos documentos aos quais, numa primeira análise, o Tribunal reconheceu, no seu acórdão Asia Motor France II, um importante valor probatório quanto à verosímil existência de um concurso de vontades.

80 Para efeitos do exame do mérito do fundamento de rejeição da denúncia, o Tribunal verifica, em primeiro lugar, que nenhuma disposição regulamentar impôs aos concessionários de viaturas japonesas na Martinica o comportamento denunciado na queixa.

81 Seguidamente, há que examinar se resulta, em razão de indícios objectivos, pertinentes e concordantes, que as autoridades nacionais exerceram unilateralmente pressões irresistíveis sobre os concessionários em causa a fim de adoptarem o comportamento denunciado na queixa.

82 Na análise dos elementos qualificados pela Comissão de "elementos novos" na sua contestação (n.os 12 a 17) e na sua tréplica (n.os 8 a 10), o Tribunal salienta, em primeiro lugar, uma carta de 19 de Agosto de 1982 do secretário de Estado do ministro encarregado dos departamentos e territórios ultramarinos dirigida ao presidente do grupo dos importadores de veículos estrangeiros Antilhas-Guiana, que confirma que, a fim de moderar a taxa de penetração dos veículos de marcas japonesas no mercado dos departamentos ultramarinos, a administração francesa instituiu, em 1982, medidas semelhantes, embora não idênticas, às adoptadas na França metropolitana. O autor dessa carta explica que "tendo em conta a especificidade desses departamentos e os volumes de vendas elevados atingidos em 1980 e 1981, a parte das marcas japonesas deveria ser reduzida... numa primeira fase, no que toca a 1982, a 15%".

83 Além disso, resulta, no que diz respeito ao mercado da Martinica, que as importações de viaturas japonesas foram limitadas a 15% do número total de veículos matriculados nesse departamento, pelo menos até 1991. Convém citar, a título de exemplo, uma carta da prefeitura da Região da Martinica de 29 de Dezembro de 1987 (anexo 3.1 da tréplica) e uma carta da mesma autoridade ao concessionário da Mazda de Janeiro de 1991 (anexo 2.3 da tréplica) que fazem alusão a esse limite de 15%.

84 O Tribunal verifica, seguidamente, que resulta dos documentos dos autos, e em especial da carta de 19 de Agosto de 1982 do secretário de Estado do ministério encarregado dos departamentos e territórios ultramarinos, que a quota global de 15% dos veículos matriculados na Martinica foi unilateralmente imposta pelas autoridades francesas aos importadores locais. Este elemento não foi sequer contestado na denúncia da Somaco, que faz referência a uma quota fixada pela administração francesa em 15%. Por outro lado, a falta de autonomia dos concessionários é ainda corroborada pelo facto de a limitação das importações de viaturas japonesas a 15% do mercado da Martinica amputar os concessionários de 50% do seu mercado. Efectivamente, não é contestado que a taxa de penetração das viaturas japonesas na Martinica era de cerca de 30% antes da instauração do regime de importação denunciado.

85 Além disso, resulta dos documentos apresentados pela Comissão que as autoridades públicas repartiram durante o mesmo período a quota global de 15% entre as marcas representadas pelos cinco concessionários postos em causa na denúncia. Assim, os documentos citados nos n.os 13 a 16 da contestação e no n. 12 da tréplica sustentam a asserção da Comissão de que a repartição da quota global entre os concessionários da Martinica não foi fruto de uma concertação entre essas empresas, eventualmente com o apoio das autoridades francesas, mas que foi imposta unilateralmente aos concessionários por essas autoridades, nomeadamente, o Ministério da Indústria, Direcção das Indústrias Mecânicas (DIMME), sob proposta do prefeito da Região da Martinica. A fixação das quotas individuais de cada concessionário pelas autoridades públicas é ainda corroborada pela carta de 3 de Setembro de 1986 do concessionário das viaturas Nissan dirigida ao prefeito da Martinica (anexo 1.6 da tréplica), nos termos da qual esse concessionário se queixa do facto "de a quota que (lhe) foi atribuída ser demasiado pequena e não permitir à (sua) empresa desenvolver-se normalmente e isto tanto mais quanto está em constante diminuição". Com efeito, se os concessionários dividissem entre si o mercado da Martinica, o concessionário das viaturas Nissan ter-se-ia dirigido directamente aos outros concessionários para obter um aumento da sua quota e não às autoridades públicas.

86 O Tribunal verifica, seguidamente, que o carácter estanque do sistema assim criado pelas autoridades públicas foi assegurado pelo facto de os cinco importadores de viaturas japonesas homologados na França metropolitana, conformando-se com as instruções dadas pelas autoridades nacionais, só terem enviado ao concessionário da "sua" marca na Martinica o número de certificados de conformidade exactamente correspondente à quota que o DIMME fixou para esse concessionário. Aliás, este elemento é confirmado pela carta de 19 de Agosto de 1982 do secretário de Estado do ministério encarregado dos departamentos e territórios ultramarinos, nos termos da qual "os volumes de venda previstos para cada marca são notificados pelo Ministério da Investigação e da Indústria aos importadores metropolitanos que se comprometem a emitir o número correspondente de certificados destinados aos importadores locais que permitem a matrícula dos veículos".

87 Tendo em conta o facto de os importadores homologados das cinco marcas japonesas serem exclusivamente competentes para emitir os certificados de conformidade destinados aos concessionários na Martinica, por um lado, e de a obtenção de um certificado de conformidade ser uma condição necessária à matrícula na Martinica de um veículo importado, por outro, os concessionários da Martinica não tiveram outra alternativa senão aceitar as consequências do convénio celebrado entre os importadores homologados e as autoridades francesas.

88 Resulta das considerações precedentes que a conclusão da Comissão de que os concessionários na Martinica postos em causa na queixa da Somaco "não dispunham de qualquer margem de manobra na implementação do regime de importação em questão" assenta, à primeira vista, em indícios objectivos, pertinentes e concordantes.

89 Seguidamente, há que examinar se as recorrentes apresentaram elementos "discordantes", susceptíveis de demonstrar a existência de uma margem de autonomia dos concessionários de viaturas japonesas quanto à repartição da quota global fixada pelas autoridades francesas em 15% no que toca às importações de viaturas japonesas para a Martinica.

90 As recorrentes invocam, em primeiro lugar, a acta da reunião interministerial de 19 de Outubro de 1987 e o "protocolo de acordo" anexo a essa acta.

91 Há que recordar que os próprios termos utilizados nesses documentos tendem a fazer crer que os concessionários de viaturas japonesas postos em causa na queixa tinham celebrado um acordo ilícito para a repartição da quota de 15% fixada pela administração francesa. Baseando-se no teor desses documentos, o Tribunal concluiu, assim, no seu acórdão Asia Motor France II (n. 44), que esses documentos "constituem, à primeira vista, um indício sério da existência de uma real autonomia de comportamento" de que dispunham os operadores económicos em causa.

92 Na decisão impugnada, a Comissão explica, todavia, que, à luz dos novos elementos que foram levados ao seu conhecimento no âmbito da instrução que efectuou após a prolação do acórdão Asia Motor France II, a acta da reunião interministerial de 19 de Outubro de 1987 e o "protocolo de acordo" a ela anexo, recolocados no seu contexto, não alteram a natureza exclusivamente estatal do regime de importação. Para esse efeito, invoca que a reunião de 19 de Outubro de 1987, que se efectuou por convocação do prefeito, "tinha apenas por objectivo a questão adjacente referente às modalidades da 'restituição' pela sociedade CCIE, representante local da Toyota, de 487 veículos por ela vendidos em excesso desde 1982 em relação ao número das importações que lhe foram atribuídas, restituição que lhe era exigida pela administração".

93 O Tribunal observa que, entre 1982 e 1986, o concessionário na Martinica da marca Toyota ultrapassou consideravelmente a quota que lhe tinha sido atribuída (v. nomeadamente anexos 3.2 e 3.6 da tréplica). A ultrapassagem da quota não é, aliás, contestada pelas recorrentes. É igualmente matéria assente que esse concessionário pôde vender veículos em excesso da sua quota anual matriculando os veículos que excediam a sua quota recorrendo a placas provisórias (placas "WW").

94 Resulta também dos documentos dos autos que as autoridades francesas, após terem verificado os abusos do regime da matrícula provisória pelo concessionário da marca Toyota, decidiram, o mais tardar em Março de 1987, imputar de futuro a emissão de livretes provisórios de matrículas (WW) na quota atribuída a cada marca (v., nomeadamente, as cartas da prefeitura da Região da Martinica de 11 de Março de 1987, dirigidas, respectivamente, ao concessionário da marca Mitsubishi (extracto citado nas respostas da Comissão de 23 de Novembro de 1995 às questões do Tribunal) e ao concessionário da marca Mazda (anexo 2.2 da tréplica).

95 Seguidamente, no que toca ao apuramento da ultrapassagem da quota que o concessionário da marca Toyota pôde efectuar abusando do sistema da matrícula provisória, entre 1982 e 1986, o Tribunal considera que a Comissão pôde razoavelmente concluir que a reunião de 19 de Outubro de 1987, realizada por iniciativa do prefeito da Região da Martinica (anexo 3.7 da tréplica), constituía igualmente a manifestação pela autoridade pública da sua vontade de fazer cumprir o sistema de importação que tinha imposto unilateralmente. Sendo embora certo que o protocolo de acordo revela a existência de um limite de 15% e de uma tabela de repartição desses 15%, daí não resulta necessariamente que os concessionários tenham celebrado um acordo ilícito nos termos do artigo 85. , n. 1, do Tratado. Efectivamente, os documentos revelados aquando da nova instrução são de natureza a sustentar a tese segundo a qual os concessionários consideraram ser necessário "codificar" a política não escrita de importação imposta unilateralmente pelas autoridades públicas desde 1982, tendo em vista evitar futuramente problemas análogos àqueles que aconteceram com o concessionário da marca Toyota.

96 Donde resulta que as recorrentes, que se limitam a basear-se nos próprios termos da acta da reunião interministerial de 19 de Outubro de 1987 e do "protocolo de acordo" a ela anexo para demonstrar a existência de uma infracção ao artigo 85. , não provaram a existência de um erro manifesto de apreciação dos factos que tenha cometido a Comissão quando concluiu, na decisão impugnada, que esses documentos, recolocados no seu contexto, não alteram a natureza exclusivamente estatal do regime de importação.

97 Seguidamente, há que declarar que nenhum outro documento invocado pelas recorrentes é susceptível de abalar a tese da Comissão segundo a qual os concessionários na Martinica "não dispunham de qualquer margem de manobra na implementação do regime de importação em questão".

98 Assim, no respeitante, em primeiro lugar, à carta do Ministério da Indústria, Correios e Telecomunicações e do Turismo de 1 de Julho de 1987 (anexo 27 da petição), o Tribunal observa que este documento, que é na verdade pertinente para o exame das acusações suscitadas nas denúncias que põem em causa os importadores de viaturas japonesas para a França metropolitana, não contém, todavia, qualquer indicação sobre o regime de importação aplicável na Martinica.

99 Quanto aos outros documentos mencionados na petição, como a acta da reunião do conselho geral da Martinica de 27 de Janeiro de 1983 ou a declaração de 26 de Fevereiro de 1991 do director-geral da Sigam, concessionário da marca Nissan, o Tribunal verifica que certos extractos citados apenas dizem respeito às relações entre as autoridades públicas e os importadores para a França metropolitana. A carta dirigida em Janeiro de 1981 ao presidente da República Francesa pelo grupo dos importadores de veículos estrangeiros Antilhas-Guiana demonstra a inquietude dos importadores locais face à intenção das autoridades públicas de fixarem uma quota global de importação e não é, assim, susceptível de demonstrar a existência de um acordo ilícito entre os concessionários que se destinasse a repartir uma quota global, que não tinha sido ainda fixada nessa altura. Outros documentos, como a acta da reunião de 1 de Outubro de 1987 na prefeitura da Martinica e o telex de 22 de Setembro de 1987 do prefeito da Martinica, referem-se ao problema relativo à ultrapassagem pelo concessionário da marca Toyota da quota que lhe tinha sido atribuída. Embora seja verdade que este problema foi "debatido... com os concessionários" (telex de 22 de Setembro de 1987 do prefeito da Martinica), daí não resulta que esses concessionários tenham celebrado um acordo proibido nos termos do artigo 85. do Tratado. Com efeito, a proposta formulada na acta da reunião de 1 de Outubro de 1987 para resolver o problema da ultrapassagem da quota ° proposta que foi "objecto da aprovação de todos os concessionários" ° não foi retomada nem na acta da reunião de 19 de Outubro de 1987 nem no "protocolo de acordo" a ela referente. Este elemento conforta a tese de que foram as próprias autoridades públicas não só a fixar a quota global de 15% para a Martinica e a repartição dessa quota entre os concessionários, mas também a impor unilateralmente o sistema de apuramento do excesso da quota do concessionário da marca Toyota. O exercício de pressões irresistíveis pelas autoridades públicas é, aliás, também confirmado pelo extracto do telex enviado pelo concessionário da Mazda aos Srs. Géraud e Archambault (documento não apresentado e não datado, transcrito na p. 29 da petição). Com efeito, o extracto citado pelas recorrentes demonstra que o regime de importação aplicado na Martinica não assenta num acordo entre os concessionários, mas foi imposto unilateralmente pelos poderes públicos.

100 Resulta do que precede que o fundamento baseado num erro manifesto de apreciação dos factos não é procedente, na parte em que se refere à decisão da parte da Comissão de rejeitar a denúncia da Somaco de 5 de Junho de 1990.

Quanto ao fundamento relativo à falta de fundamentação

Argumentos das partes

101 As recorrentes alegam que a decisão impugnada está insuficientemente fundamentada na medida em que, por um lado, não justifica a repetição do primeiro fundamento de rejeição da decisão de 5 de Dezembro de 1991 não obstante o acórdão Asia Motor France II, e que, por outro, não responde aos argumentos que as recorrentes apresentaram em apoio das suas denúncias, em especial aos que tinham aduzido nas suas observações relativas à carta que a Comissão dirigiu às recorrentes em 10 de Janeiro de 1994 nos termos do artigo 6. do Regulamento n. 99/63.

102 A Comissão responde que a decisão impugnada identifica claramente as razões pelas quais concluiu pela rejeição das denúncias. Recorda que não é necessário que uma decisão de rejeição de uma denúncia aborde cada um dos argumentos suscitados pelas queixosas, mas que basta que exponha os factos e considerações que tenham importância essencial na sua economia (acórdão de BAT e Reynolds/Comissão, já referido).

Apreciação do Tribunal

103 Resulta de uma jurisprudência constante que a fundamentação de uma decisão que afecte interesses deve permitir, por um lado, ao seu destinatário conhecer as justificações da medida tomada, a fim de poder defender os seus direitos, se for caso disso, e verificar se a decisão é ou não fundada e, por outro, ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização (v., nomeadamente, acórdão Asia Motor France II, n. 30).

104 A este respeito, como o Tribunal recordou no acórdão Asia Motor France II (n. 31), a Comissão não está obrigada, na fundamentação das decisões que é levada a adoptar para garantir a aplicação das regras de concorrência, a tomar posição sobre todos os argumentos que os interessados invocam em apoio do seu pedido. Basta, com efeito, que a Comissão exponha os factos e as considerações jurídicas que revestem uma importância essencial na economia da decisão.

105 O Tribunal recorda que a decisão impugnada rejeita as denúncias devido aos importadores e concessionários visados pelas queixas não disporem "de qualquer margem de manobra na implementação do regime de importação", que tinha "natureza exclusivamente estatal". A decisão impugnada indica os elementos em que essa tomada de posição se baseia permitindo, assim, às recorrentes contestar a justeza da decisão e ao Tribunal exercer a sua fiscalização da legalidade. Daqui resulta que o fundamento relativo à falta de fundamentação não deve ser acolhido.

Quanto ao pedido de indemnização

106 O Tribunal salienta que, por força do artigo 19. do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 44. , n. 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a petição deve indicar o objecto do litígio e conter uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Essa indicação deve ser suficientemente clara e precisa para que o demandado possa preparar a sua defesa e o Tribunal decidir a acção, eventualmente, sem mais informações em seu apoio. A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que a acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que assenta resultem, pelo menos sumariamente, mas de maneira coerente e compreensível, do texto da própria petição (v., a título de exemplo, o despacho do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Novembro de 1993, Koelman/Comissão, T-56/92, Recueil, p. II-1267, n. 21).

107 Resulta da jurisprudência que, para preencher estas exigências, uma petição que vise a reparação de danos causados por uma instituição comunitária deve conter elementos que permitam identificar o comportamento que o recorrente reprova à instituição, as razões pelas quais considera que existe um nexo de causalidade entre o comportamento e o prejuízo que pretende ter sofrido, bem como a natureza e a extensão deste prejuízo (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Julho de 1990, Automec/Comissão, T-64/89, Colect., p. II-367, n. 73).

108 Resulta também da jurisprudência que uma petição que não tenha a precisão necessária deve ser julgada inadmissível e que uma violação do artigo 19. do Estatuto do Tribunal de Justiça e do artigo 44. , n. 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância integra uma das situações de falta de pressupostos processuais que o Tribunal pode oficiosamente conhecer, em qualquer momento, nos termos do artigo 113. do referido Regulamento de Processo (acórdão Automec/Comissão, já referido, n.os 73 e 74).

109 No caso em apreço, o Tribunal verifica que o argumento desenvolvido pelas recorrentes na sua petição em apoio do seu pedido de indemnização tem, integralmente, a seguinte redacção:

"As empresas denunciantes fazem uma distinção entre o prejuízo imputável à atitude das empresas que fazem parte do acordo e do Governo francês e o que implica directamente a responsabilidade da Comissão.

O prejuízo total sofrido pelas empresas em virtude do acordo ilícito pode ser avaliado actualmente em:

Asia Motor France: 259 552 000 ecus

J.-M. Cesbron: 244 292 000 ecus

Monin Automobiles: 82 231 000 ecus

EAS: 76 177 000 ecus

Somaco: 2 153 500 ecus.

O prejuízo, acrescido dos juros legais, pelos quais a Comissão é responsável, em virtude dos atrasos e das tomadas de decisões ilegais, pode ser razoavelmente avaliado no montante correspondente aos juros normalmente aplicados pela Comunidade (9,75%), contados para o período que medeia a decisão de arquivamento de 5 de Dezembro de 1991 e a data da prolação do acórdão."

OS FUNDAMENTOS CONTINUAN NO NUM.DOC: 694A0387.2

110 O Tribunal considera que nem a argumentação assim desenvolvida pelas recorrentes nem a petição, considerada na sua globalidade, permitem identificar, com o grau de clareza e de precisão exigidos, o comportamento faltoso imputado à Comissão ou a natureza do prejuízo pretensamente sofrido.

111 Donde resulta que o pedido de indemnização deve ser julgado inadmissível.

Conclusões

112 Resulta de tudo o que precede que há que anular a decisão impugnada na medida em que rejeita as queixas de J.-M. Cesbron de 18 de Novembro de 1985 e de J.-M. Cesbron, Asia Motor France, Monin Automobiles e EAS de 29 de Novembro de 1988 e, quanto ao mais, negar provimento ao recurso.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

113 As recorrentes pedem que o Tribunal condene a Comissão nas despesas tanto do presente processo como do processo que conduziu ao acórdão Asia Motor France II.

114 Resulta do artigo 87. , n. 1, do Regulamento de Processo, que prevê que o Tribunal decida sobre as despesas no acórdão ou despacho que ponha termo à instância, que o Tribunal só pode decidir, no presente acórdão, sobre as despesas referentes ao presente processo. Por conseguinte, há que negar provimento ao pedido das recorrentes destinado a obter a condenação da Comissão nas despesas do processo que conduziu ao acórdão Asia Motor France II.

115 Por força do disposto no artigo 87. , n. 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas se tal tiver sido requerido. Todavia, nos termos do n. 3 do mesmo artigo, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas se cada parte obtiver vencimento parcial. Tendo sido dado provimento parcial ao recurso e tendo ambas as partes requerido a condenação da outra nas despesas, o Tribunal considera proceder a uma justa apreciação das circunstâncias da causa, decidindo que a Comissão suportará as suas próprias despesas, bem como metade das despesas das recorrentes

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção Alargada)

decide:

1) O pedido destinado a que o Tribunal declare a existência de uma infracção é julgado inadmissível.

2) O pedido de declaração de omissão é julgado inadmissível.

3) A decisão impugnada é anulada, na parte em que rejeita as denúncias de J.-M. Cesbron de 18 de Novembro de 1985 e de J.-M. Cesbron, Asia Motor France, Monin Automobiles e EAS de 29 de Novembro de 1988.

4) É negado provimento ao pedido de anulação quanto ao restante.

5) O pedido de indemnização é julgado inadmissível.

6) É negado provimento ao pedido de condenação da Comissão nas despesas do processo que conduziu ao acórdão do Tribunal de 29 de Junho de 1993, Asia Motor France e o./Comissão (T-7/92, Colect., p. II-669).

7) A Comissão suportará as suas próprias despesas, bem como metade das despesas das recorrentes

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção Alargada)

decide:

1) O pedido destinado a que o Tribunal declare a existência de uma infracção é julgado inadmissível.

2) O pedido de declaração de omissão é julgado inadmissível.

3) A decisão impugnada é anulada, na parte em que rejeita as denúncias de J.-M. Cesbron de 18 de Novembro de 1985 e de J.-M. Cesbron, Asia Motor France, Monin Automobiles e EAS de 29 de Novembro de 1988.

4) É negado provimento ao pedido de anulação quanto ao restante.

5) O pedido de indemnização é julgado inadmissível.

6) É negado provimento ao pedido de condenação da Comissão nas despesas do processo que conduziu ao acórdão do Tribunal de 29 de Junho de 1993, Asia Motor France e o./Comissão (T-7/92, Colect., p. II-669).

7) A Comissão suportará as suas próprias despesas, bem como metade das despesas das recorrentes

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção Alargada)

decide:

1) O pedido destinado a que o Tribunal declare a existência de uma infracção é julgado inadmissível.

2) O pedido de declaração de omissão é julgado inadmissível.

3) A decisão impugnada é anulada, na parte em que rejeita as denúncias de J.-M. Cesbron de 18 de Novembro de 1985 e de J.-M. Cesbron, Asia Motor France, Monin Automobiles e EAS de 29 de Novembro de 1988.

4) É negado provimento ao pedido de anulação quanto ao restante.

5) O pedido de indemnização é julgado inadmissível.

6) É negado provimento ao pedido de condenação da Comissão nas despesas do processo que conduziu ao acórdão do Tribunal de 29 de Junho de 1993, Asia Motor France e o./Comissão (T-7/92, Colect., p. II-669).

7) A Comissão suportará as suas próprias despesas, bem como metade das despesas das recorrentes

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