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Document 61993CJ0345

    Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 9 de Março de 1995.
    Fazenda Pública e Ministério Público contra Américo João Nunes Tadeu.
    Pedido de decisão prejudicial: Supremo Tribunal Administrativo - Portugal.
    Imposto automóvel - Imposição interna - Discriminação.
    Processo C-345/93.

    Colectânea de Jurisprudência 1995 I-00479

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1995:66

    61993J0345

    ACORDAO DO TRIBUNAL (QUINTA SECCAO) DE 9 DE MARCO DE 1995. - FAZENDA PUBLICA E MINISTERIO PUBLICO CONTRA AMERICO JOAO NUNES TADEU. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO - PORTUGAL. - IMPOSTO AUTOMOVEL - IMPOSICAO INTERNA - DISCRIMINACAO. - PROCESSO C-345/93.

    Colectânea da Jurisprudência 1995 página I-00479


    Sumário
    Partes
    Fundamentação jurídica do acórdão
    Decisão sobre as despesas
    Parte decisória

    Palavras-chave


    ++++

    1. Livre circulação de mercadorias ° Direitos aduaneiros ° Encargos de efeito equivalente ° Conceito ° Imposto automóvel que incide sem distinção sobre os veículos de produção nacional e sobre os importados ° Exclusão ° Qualificação como imposição interna

    (Tratado CEE, artigos 9. , 12. e 95. )

    2. Disposições fiscais ° Imposições internas ° Sistema de imposto de matrícula para os veículos usados ° Modalidades que implicam o excesso de tributação dos veículos importados em relação aos vendidos no mercado nacional ° Incompatibilidade com o artigo 95. do Tratado

    (Tratado CEE, artigo 95. )

    Sumário


    1. Um imposto automóvel que se aplica indistintamente aos veículos montados ou fabricados no Estado-Membro onde é cobrado e aos veículos importados, quer novos quer usados, não pode ser qualificado como direito aduaneiro ou encargo de efeito equivalente, na acepção dos artigos 9. e 12. do Tratado, uma vez que faz parte dum sistema geral de imposições internas que incidem sobre categorias de produtos segundo um critério objectivo. Um imposto desta natureza constitui, pelo contrário, uma imposição interna na acepção do artigo 95. do Tratado.

    2. A cobrança por um Estado-Membro de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-Membro é contrária ao artigo 95. do Tratado quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional, os quais, tendo sido tributados no momento dessa matrícula, já não o são quando vendidos no mercado de usados.

    Partes


    No processo C-345/93,

    que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pela Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

    Fazenda Pública,

    Ministério Público

    e

    Américo João Nunes Tadeu,

    uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 9. , 12. e 95. do Tratado CEE,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

    composto por: J. C. Moitinho de Almeida, juiz, exercendo funções de presidente da Quinta Secção, D. A. O. Edward e J.-P. Puissochet (relator), juízes,

    advogado-geral: F. G. Jacobs

    secretário: L. Hewlett, administradora

    vistas as observações escritas apresentadas:

    ° por Américo João Nunes Tadeu, advogado;

    ° em representação do Governo português, por Luís Fernandes, director do Serviço Jurídico da Direcção-Geral das Comunidades Europeias do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Maria Luísa Duarte, consultora jurídica na mesma direcção, na qualidade de agentes;

    ° em representação do Governo helénico, por Nikolaos Mavrikas, consultor jurídico adjunto no Conselho Jurídico do Estado, e Dimitrios Anastassopoulos, mandatário judicial do Conselho Jurídico do Estado, na qualidade de agentes;

    ° em representação do Governo neerlandês, por A. Bos, consultor jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente;

    ° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Enrico Traversa e Francisco de Sousa Fialho, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

    visto o relatório para audiência,

    ouvidas as alegações do Governo português, do Governo helénico, representado por Panagiotis Kamarineas, consultor jurídico adjunto no Conselho Jurídico de Estado, na qualidade de agente, e da Comissão, na audiência de 17 de Novembro de 1994,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 13 de Dezembro de 1994,

    profere o presente

    Acórdão

    Fundamentação jurídica do acórdão


    1 Por acórdão de 20 de Maio de 1993, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 6 de Julho seguinte, o Supremo Tribunal Administrativo submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, duas questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 9. , 12. e 95. do Tratado CEE.

    2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe Nunes Tadeu às autoridades fiscais portuguesas (Fazenda Pública), em que aquele reclama o reembolso do imposto automóvel que pagou na importação para Portugal de um automóvel usado proveniente de outro Estado-membro.

    3 Em 10 de Agosto de 1990, Nunes Tadeu comprou na Bélgica um veículo automóvel usado da marca Peugeot, modelo 205 XS, pelo montante de 200 000 BFR. A primeira matrícula do veículo foi feita na Bélgica em 11 de Fevereiro de 1987. Em 20 de Agosto de 1990, Nunes Tadeu entrou em Portugal com o seu veículo a coberto de uma matrícula de trânsito e procedeu às formalidades relativas à sua importação definitiva.

    4 Em Maio de 1991, a Alfândega do Porto exigiu a Nunes Tadeu o pagamento do montante de 271 665 ESC, correspondente ao montante do imposto automóvel calculado em conformidade com o artigo 1. do Decreto-Lei n. 152/89, de 10 Maio de 1989 (Diário da República, Série I, n. 107, de 10.5.1989, p. 1858, a seguir "decreto-lei"), que, na versão já alterada, dispunha, ao tempo dos factos:

    "1. O imposto automóvel (IA) é um imposto interno incidente sobre os veículos automóveis ligeiros de passageiros... importados, no estado de novos ou usados, ou montados ou fabricados em Portugal, e que sejam matriculados.

    2. ...

    3. O imposto é de natureza específica, monofásica e variável em função da cilindrada, conforme tabela anexa ao presente diploma, que dele faz parte integrante.

    4. O montante do imposto liquidado sobre automóveis usados importados, com mais de dois anos contados desde a atribuição da primeira matrícula, será objecto de uma redução de 10% sobre os valores resultantes da aplicação da tabela referida no número anterior."

    5 Nunes Tadeu pagou o imposto mas, em Dezembro de 1991, pediu o respectivo reembolso em impugnação apresentada no Tribunal Fiscal Aduaneiro do Porto. Alegou que o imposto era contrário aos artigos 5. , 85. e 95. do Tratado CEE, na medida em que se aplicava aos veículos usados importados. Tendo o Tribunal Fiscal Aduaneiro do Porto, por decisão de 3 de Abril de 1992, julgado procedente o pedido de Nunes Tadeu, as autoridades fiscais portuguesas (Fazenda Pública), apoiadas pelo Ministério Público português, interpuseram recurso dessa decisão para o Supremo Tribunal Administrativo, que submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    "1) Contraria o artigo 95. , primeiro e segundo parágrafos, do Tratado de Roma, a incidência do imposto automóvel, com as características acima enunciadas, sobre a importação, em Portugal, de veículos automóveis ligeiros usados provenientes da Bélgica, quando os demais veículos usados, quer importados novos quer montados ou fabricados em Portugal, não lhe estão sujeitos?

    2) A mesma imposição tributária pode ser considerada um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro sobre a importação, proibido pelos artigos 9. e 12. do mesmo Tratado?"

    6 Deve observar-se, a título preliminar, que o imposto em questão, que o Tribunal de Justiça já teve de apreciar no âmbito do seu acórdão de 16 de Julho de 1992, Lourenço Dias (C-343/90, Colect., p. I-4673, n.os 53 e 54), se aplica indistintamente aos veículos montados e fabricados em Portugal e aos importados, quer novos quer usados, e se integra num sistema geral de imposições internas que incidem sobre categorias de produtos segundo um critério objectivo, neste caso a cilindrada. Um imposto desta natureza constitui uma imposição interna na acepção do artigo 95. do Tratado CEE.

    7 Deve, pois, antes de mais, responder-se à segunda questão que um imposto automóvel que se aplica indistintamente aos veículos montados ou fabricados no Estado-membro onde é cobrado e aos veículos importados, quer novos quer usados, não pode ser qualificado como direito aduaneiro ou encargo de efeito equivalente, na acepção dos artigos 9. e 12. do Tratado.

    8 Através da primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta essencialmente se a cobrança por um Estado-Membro de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-Membro, quando nenhum imposto incide sobre os veículos usados comprados no território nacional, é compatível com o artigo 95. do Tratado.

    9 O recorrente no processo principal considera que esta diferença de tratamento é contrária ao artigo 95. do Tratado, em virtude de o imposto em litígio ter por efeito encarecer os veículos usados importados e, por conseguinte, favorecer o mercado nacional de veículos usados.

    10 Tal como se observou, o imposto controvertido incide sistematicamente, sem qualquer distinção e segundo critérios objectivos, sobre os veículos montados e fabricados em Portugal e sobre os importados, quer novos quer usados. O imposto automóvel não se aplica às transacções internas que tenham por objecto veículos usados porque é cobrado apenas uma vez, aquando da primeira matrícula do veículo em território nacional, e uma parte desse imposto se mantém incorporada no valor dos veículos usados já matriculados e comprados no mercado português.

    11 Deve acrescentar-se que, no seu estado actual, o direito comunitário não contém qualquer regra que impeça o Estado-Membro de estabelecer um regime geral de imposição interna que incida, segundo critérios objectivos, sobre uma categoria determinada de mercadorias, como a que se discute neste processo.

    12 Todavia, para efeitos de aplicação do artigo 95. e, em especial, para efeitos de comparação entre o regime de tributação dos veículos usados importados e o dos veículos usados comprados no mercado nacional, que constituem produtos similares ou concorrentes, deve tomar-se em consideração, tal como o Tribunal decidiu designadamente no seu acórdão de 11 de Dezembro de 1990, Comissão/Dinamarca (C-47/88, Colect., p. I-4509, n. 18), não apenas a taxa da imposição interna que incide directa ou indirectamente sobre os produtos nacionais e os produtos importados, mas também a matéria colectável e as modalidades do imposto em causa.

    13 A esse propósito, está assente que, no que respeita aos veículos usados importados, qualquer que seja a sua antiguidade ou o seu estado de utilização, o imposto cobrado nos termos do decreto-lei nunca pode ser inferior a 90% do imposto cobrado sobre um automóvel novo, enquanto a parte residual do imposto incorporado no valor do veículo usado, comprado no território nacional, pode ser inferior a esse montante, uma vez que o valor residual do imposto diminui proporcionalmente à depreciação do veículo.

    14 Daí resulta que a cobrança do imposto automóvel sobre os automóveis usados importados, cujo montante é pelo menos 90% do montante do imposto que incide sobre os veículos automóveis novos, constitui geralmente uma sobretributação manifesta destes veículos quando comparada com a parte residual do imposto nos veículos usados previamente matriculados, adquiridos no mercado português.

    15 Por conseguinte, deve declarar-se que uma norma, como a contida no artigo 1. , n. 4, do decreto-lei, que limita a redução do imposto a 10% do imposto cobrado sobre os veículos novos, sem tomar em consideração a depreciação efectiva do veículo, implica uma tributação discriminatória dos veículos usados importados.

    16 Esta conclusão não é afectada, como observa o Governo neerlandês, pelo facto de o imposto automóvel ser calculado não com base num valor tributável fixo, mas em função da cilindrada do veículo. Com efeito, continua a verificar-se que a parte residual do imposto incorporado no valor do veículo usado, comprado no território português, diminui automaticamente com a depreciação do veículo, ao contrário do montante do imposto cobrado sobre os veículos usados importados, que, como acima se referiu, nunca pode ser inferior a 90% do montante do imposto cobrado sobre os veículos novos.

    17 O Governo português argumenta que este regime fiscal visa apenas garantir uma igualdade tendencial entre o valor comercial dos automóveis usados nacionais e o dos automóveis usados importados. Segundo o Governo português, este imposto não pode ter um efeito discriminatório ou protector, na medida em que o preço de um veículo usado importado, mesmo com o acréscimo do imposto automóvel, é inferior ao preço de um veículo usado nacional equivalente.

    18 Esta argumentação não pode ser acolhida. Um regime fiscal nacional que tivesse por objectivo eliminar uma vantagem concorrencial dos produtos importados em relação aos produtos nacionais seria manifestamente contrário ao artigo 95. , que visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre produtos nacionais e produtos importados (v. acórdão Comissão/Dinamarca, já referido, n. 9).

    19 Finalmente, o Governo português invocou certas dificuldades práticas relacionadas com o cálculo do valor comercial efectivo dos veículos usados para efeitos de cálculo do imposto em litígio. Admitindo que a existência dessas dificuldades possa ser comprovada, elas não podem justificar a aplicação de imposições internas discriminatórias em relação aos produtos originários de outros Estados-Membros, contrárias ao artigo 95. do Tratado.

    20 Tendo em conta todas estas considerações, deve responder-se à primeira questão que a cobrança por um Estado-Membro de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-Membro é contrária ao artigo 95. do Tratado CEE quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional.

    Decisão sobre as despesas


    Quanto às despesas

    21 As despesas efectuadas pelos Governos português, helénico e neerlandês e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

    Parte decisória


    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

    pronunciando-se sobre as questões que lhe foram submetidas pela Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 20 de Maio de 1993, declara:

    1) Um imposto automóvel que se aplica indistintamente aos veículos montados ou fabricados no Estado-Membro em que é cobrado e aos veículos importados, quer novos quer usados, não pode ser qualificado como direito aduaneiro ou encargo de efeito equivalente, na acepção dos artigos 9. e 12. do Tratado CEE.

    2) A cobrança por um Estado-Membro de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-Membro é contrária ao artigo 95. do Tratado CEE quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional.

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