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Document 61993CJ0316

    Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 3 de Março de 1994.
    Nicole Vaneetveld contra SA Le Foyer e SA Le Foyer contra Fédération des mutualités socialistes et syndicales de la province de Liège.
    Pedido de decisão prejudicial: Tribunal de commerce de Huy - Bélgica.
    Seguro - Directiva - Prazo de transposição - Efeito directo.
    Processo C-316/93.

    Colectânea de Jurisprudência 1994 I-00763

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:82

    61993J0316

    ACORDAO DO TRIBUNAL (SEGUNDA SECCAO) DE 3 DE MARCO DE 1994. - NICOLE VANEETVELD CONTRA SA LE FOYER E SA LE FOYER CONTRA FEDERATION DES MUTUALITES SOCIALISTES ET SYNDICALES DE LA PROVINCE DE LIEGE. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: TRIBUNAL DE COMMERCE DE HUY - BELGICA. - SEGURO - DIRECTIVA - PRAZO DE TRANSPOSICAO - EFEITO DIRECTO. - PROCESSO C-316/93.

    Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-00763


    Sumário
    Partes
    Fundamentação jurídica do acórdão
    Decisão sobre as despesas
    Parte decisória

    Palavras-chave


    ++++

    1. Questões prejudiciais - Competência do Tribunal de Justiça - Questão que não apresenta exaustivamente a situação de direito e de facto, mas que faz referência a problemas técnicos precisos - Existência de informações suficientes na posse do Tribunal de Justiça que lhe permitem efectuar uma interpretação útil - Questão susceptível de receber resposta

    (Tratado CEE, artigo 177. )

    2. Aproximação das legislações - Seguro de responsabilidade civil automóvel - Directiva 84/5 - Aplicação no tempo - Possibilidade de os particulares invocarem a directiva antes de expirar o prazo nesta fixado para a entrada em vigor das disposições nacionais de execução - Exclusão

    (Directiva 84/5, artigo 5. , n. 2)

    Sumário


    1. A necessidade de efectuar uma interpretação do direito comunitário que seja útil para o juiz nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que se inscrevem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões. Esta exigência é menos imperativa na hipótese de as questões se referirem a problemas técnicos bem precisos e permitirem ao Tribunal de Justiça dar uma resposta útil, mesmo que o juiz nacional não tenha procedido a uma apresentação exaustiva da situação de direito e de facto.

    Deve conhecer-se de uma questão prejudicial sempre que os autos enviados pelo órgão jurisdicional nacional e as observações escritas apresentadas pelas partes no processo principal tenham fornecido ao Tribunal informações suficientes para interpretar as regras de direito comunitário tendo em vista a situação que é objecto do litígio no processo principal.

    2. Resulta do artigo 5. da Directiva 84/5/CEE, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis, redigido em termos bastante claros, que, embora os Estados-membros tivessem a obrigação de alterar as disposições nacionais o mais tardar até 31 de Dezembro de 1987, só eram obrigados a aplicá-las em relação à cobertura pelo seguro dos sinistros ocorridos a partir de 31 de Dezembro de 1988.

    Dado que uma directiva só pode ser invocada pelos particulares perante os órgãos jurisdicionais nacionais após expirar o prazo fixado para a entrada em vigor das disposições nacionais que asseguram a sua transposição, antes da data de 31 de Dezembro de 1988, referida no n. 2 do seu artigo 5. , as disposições desta directiva não eram susceptíveis de criar na esfera dos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais tivessem a obrigação de tutelar.

    Partes


    No processo C-316/93,

    que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo tribunal de commerce de Huy (Bélgica), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

    Nicole Vaneetveld

    e

    Le Foyer SA

    e

    Le Foyer SA

    e

    Fédération des mutualités socialistes et syndicales de la province de Liège (FMSS),

    uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação da segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis (JO 1984, L 8, p. 17; EE 13 F15 p. 244),

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    composto por: G. F. Mancini, presidente de secção, F. A. Schockweiler (relator) e J. L. Murray, juízes,

    advogado-geral: F. G. Jacobs

    secretário: L. Hewlett, administradora

    vistas as observações escritas apresentadas:

    - em representação de N. Vaneetveld, por J.-L. Dessy, advogado no foro de Huy,

    - em representação de Le Foyer SA, por L. Simont, advogado no foro de Bruxelas, e O. W. Brouwer, advogado no foro de Amsterdão,

    - em representação do Governo francês, por H. Renie, secretário adjunto principal no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e C. de Salins, consultora no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

    - em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por T. Cusack, consultor jurídico, na qualidade de agente,

    visto o relatório do juiz-relator,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 27 de Janeiro de 1994,,

    profere o presente

    Acórdão

    Fundamentação jurídica do acórdão


    1 Por decisão de 9 de Junho de 1993, entrada no Tribunal de Justiça em 16 de Junho seguinte, o tribunal de commerce de Huy submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, três questões prejudiciais sobre a interpretação da segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis (JO 1984, L 8, p. 17; EE 13 F15 p. 244, a seguir "segunda directiva").

    2 Essas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe N. Vaneetveld à companhia de seguros Le Foyer SA (a seguir "Le Foyer") a propósito da indemnização dos prejuízos sofridos pela demandante no processo principal num acidente de viação ocorrido em 2 de Maio de 1988.

    3 Resulta dos autos enviados pelo órgão jurisdicional de reenvio e das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça que o responsável pelo acidente, J. Dubois, é o cônjuge separado mas não divorciado de N. Vaneetveld e está seguro pela companhia de seguros Le Foyer.

    4 A lei belga de 1 de Julho de 1956 relativa ao seguro de responsabilidade civil obrigatório em matéria de veículos automóveis (Moniteur belge de 15.7.1956, p. 4711) permite, no artigo 4. , afastar da protecção pelo seguro o cônjuge do segurado.

    5 O contrato de seguro celebrado entre J. Dubois e Le Foyer não abrangia a mulher do segurado.

    6 Tendo tomado conhecimento que N. Vaneetveld não estava divorciada mas apenas separada do seu segurado, Le Foyer recusou pagar à vítima qualquer indemnização.

    7 N. Vaneetveld intentou então uma acção contra Le Foyer no tribunal de commerce de Huy a fim de obter uma indemnização por todos os prejuízos sofridos. A companhia de seguros, por sua vez, intentou uma acção contra a Fédération des mutualités socialistes et syndicales de la province de Liège no mesmo tribunal para obter o reembolso das importâncias que já pagara à Fédération por conta de despesas médicas por esta feitas em benefício de N. Vaneetveld.

    8 A segunda directiva define, no seu artigo 3. , o âmbito de aplicação pessoal do seguro nos seguintes termos:

    "Os membros da família do tomador do seguro, do condutor ou de qualquer outra pessoa cuja responsabilidade civil decorrente de um sinistro se encontre coberta pelo seguro mencionado no n. 1 do artigo 4. não podem, por força desse parentesco, ser excluídos da garantia do seguro, relativamente aos danos corporais sofridos."

    9 A segunda directiva foi transposta para direito belga pela lei de 21 de Novembro de 1989 relativa ao seguro de responsabilidade civil obrigatório em matéria de veículos automóveis (Moniteur belge de 8.12.1989, p. 20122). O artigo 4. , n. 1, segundo parágrafo, desta lei proíbe que, em caso de lesões corporais, o cônjuge do segurado seja excluído do direito de indemnização. Segundo o artigo 30. da lei, a sua entrada em vigor "tem por efeito alterar automaticamente, nos limites fixados pelas suas disposições, as obrigações das seguradoras, tal como resultam das condições gerais e dos contratos em curso".

    10 Por força do decreto real de 13 de Fevereiro de 1991 (Moniteur belge de 6.4.1991, p. 7257), as disposições da lei de 21 de Novembro de 1989 passaram, a partir de 6 de Maio de 1991, a ser aplicáveis à globalidade dos contratos de seguro de responsabilidade civil automóvel em curso.

    11 Considerando que estes dois processos, que decidiu apensar, suscitavam um problema de interpretação da segunda directiva, o tribunal de commerce de Huy suspendeu a instância até que o Tribunal de Justiça se pronunciasse sobre as seguintes questões:

    "1) O disposto no artigo 5. da segunda directiva é imediatamente aplicável na ordem jurídica belga?

    2) Na afirmativa, terá esta disposição criado na esfera dos particulares direitos subjectivos que os órgãos jurisdicionais nacionais tenham obrigação de tutelar?

    3) Mais concretamente, terão esses direitos nascido com a entrada em vigor da directiva ou a partir de 31 de Dezembro de 1987, data-limite imposta aos Estados-membros para alterarem as disposições nacionais ou ainda a partir de 31 de Dezembro de 1988 por força do n. 2 do artigo 5. da referida directiva?"

    12 A título preliminar, importa analisar se o Tribunal se deve pronunciar sobre as questões prejudiciais ou se, como observa o Governo francês, elas devem ser julgadas inadmissíveis, com o fundamento de que órgão jurisdicional de reenvio não forneceu ao Tribunal de Justiça indicações sobre o contexto jurídico e factual das questões.

    13 É certo que o Tribunal de Justiça entende que a necessidade de efectuar uma interpretação do direito comunitário que seja útil para o juiz nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que se inscrevem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões (v. acórdão de 16 de Julho de 1992, Meilicke, C-83/91, Colect., p. I-4871; acórdão de 26 de Janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o., C-320/90, C-321/90 e C-322/90, Colect., p. I-393; despacho de 19 de Março de 1993, Banchero, C-157/92, Colect., p. I-1085; despacho de 26 de Abril de 1993, Monin Automobiles, C-368/92, Colect., p. I-2049). Não é menos certo que esta exigência é menos imperativa na hipótese de as questões se referirem a problemas técnicos bem precisos e permitirem ao Tribunal de Justiça dar uma resposta útil, mesmo que o juiz nacional não tenha procedido a uma apresentação exaustiva da situação de direito e de facto.

    14 A este propósito, importa assinalar que os autos enviados pelo órgão jurisdicional nacional bem como as observações escritas apresentadas pelas partes no processo principal forneceram ao Tribunal informações suficientes para interpretar as regras de direito comunitário tendo em vista a situação que é objecto do litígio no processo principal (v. acórdão Telemarsicabruzzo e o., já referido).

    15 Através das suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal a partir de que data a segunda directiva, na medida em que proíbe a exclusão do cônjuge do segurado do seguro obrigatório, em caso de lesões corporais, cria na esfera dos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais têm a obrigação de tutelar.

    16 Recorde-se, em primeiro lugar, que uma directiva só pode ser invocada pelos particulares perante os órgãos jurisdicionais nacionais após expirar o prazo fixado para a sua transposição para direito nacional.

    17 A este propósito, cabe sublinhar que o artigo 5. da segunda directiva dispõe que:

    "1. Os Estados-membros alterarão as suas disposições nacionais para darem cumprimento à presente directiva o mais tardar até 31 de Dezembro de 1987. Desse facto informarão imediatamente a Comissão.

    2. As disposições alteradas nos termos acima referidos serão aplicadas o mais tardar em 31 de Dezembro de 1988.

    ..."

    18 Resulta deste artigo, redigido em termos bastante claros, que, embora os Estados-membros tivessem a obrigação de alterar as disposições nacionais o mais tardar até 31 de Dezembro de 1987, só eram obrigados a aplicá-las em relação à cobertura pelo seguro dos sinistros ocorridos a partir de 31 de Dezembro de 1988.

    19 Por conseguinte, há que responder à terceira questão do órgão jurisdicional de reenvio que a segunda directiva deve ser interpretada no sentido de que antes da data de 31 de Dezembro de 1988, referida no n. 2 do artigo 5. , as disposições desta directiva não eram susceptíveis de criar na esfera dos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais tivessem a obrigação de tutelar.

    20 Tendo em conta esta resposta, não há necessidade de analisar as duas primeiras questões prejudiciais, através das quais se pretendia saber se a segunda directiva conferia efectivamente aos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais tivessem a obrigação de tutelar.

    Decisão sobre as despesas


    Quanto às despesas

    21 22 As despesas efectuadas pelo Governo francês e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

    Parte decisória


    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

    pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo tribunal de commerce de Huy (Bélgica), por decisão de 9 de Junho de 1993, declara:

    A segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis, deve ser interpretada no sentido de que antes da data de 31 de Dezembro de 1988, referida no n. 2 do artigo 5. , as disposições desta directiva não eram susceptíveis de criar na esfera dos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais tivessem a obrigação de tutelar.

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