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Document 61993CJ0039
Judgment of the Court (Fifth Chamber) of 16 June 1994. # Syndicat Français de l'Express international, DHL International SA, Service Crie-LFAL SA and May Courier International SARL v Commission of the European Communities. # Appeal - Competition - Rules applicable to undertakings - Letter from the Commission to the complainant - Actionable decision. # Case C-39/93 P.
Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 16 de Junho de 1994.
Syndicat français de l'Express international, DHL International SA, Service Crie-LFAL SA e May Courier International SARL contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso - Concorrência - Regras aplicáveis às empresas - Carta de Comissão a um queixoso - Acto impugnável.
Processo C-39/93 P.
Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 16 de Junho de 1994.
Syndicat français de l'Express international, DHL International SA, Service Crie-LFAL SA e May Courier International SARL contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso - Concorrência - Regras aplicáveis às empresas - Carta de Comissão a um queixoso - Acto impugnável.
Processo C-39/93 P.
Colectânea de Jurisprudência 1994 I-02681
ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:253
ACORDAO DO TRIBUNAL (QUINTA SECCAO) DE 16 DE JUNHO DE 1994. - SYNDICAT FRANCAIS DE L'EXPRESS INTERNATIONAL, DHL INTERNATIONAL SA, SERVICE CRIE-LFAL SA E MAY COURIER INTERNATIONAL SARL CONTRA COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - RECURSO - CONCORRENCIA - REGRAS APLICAVEIS AS EMPRESAS - CARTA DA COMISSAO A UM QUEIXOSO - ACTO IMPUGNAVEL. - PROCESSO C-39/93 P.
Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-02681
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Parte decisória
++++
1. Recurso de anulação ° Actos susceptíveis de recurso ° Conceito ° Actos que produzem efeitos jurídicos obrigatórios ° Procedimento administrativo de aplicação das regras de concorrência ° Carta da Comissão que indica o arquivamento ° Admissibilidade do recurso do autor da denúncia
(Tratado CEE, artigo 173. ; Regulamento n. 17 do Conselho, artigo 3. , n. 2)
2. Recurso de anulação ° Actos susceptíveis de recurso ° Decisão de arquivamento de uma denúncia no âmbito da aplicação das regras de concorrência pela Comissão ° Decisão não fundamentada ° Inexistência de incidência
(Tratado CEE, artigo 173. ; Regulamento n. 17 do Conselho, artigo 3. , n. 2)
1. Uma instituição que é dotada do poder de declarar uma infracção e de a punir e a quem podem ser apresentadas queixas pelos particulares adopta necessariamente um acto que produz efeitos jurídicos quando põe termo a um inquérito que instaurou na sequência dessa queixa. Esse acto de arquivamento não pode ser qualificado de preliminar ou preparatório. Com efeito, diferentemente de uma comunicação das acusações, que se destina a dar às empresas atingidas a possibilidade de fazerem valer o seu ponto de vista e que não fixa definitivamente a posição da Comissão, o acto que manda arquivar uma queixa constitui a última fase do procedimento administrativo: não será seguido de qualquer outro acto susceptível de originar um recurso de anulação. Uma carta de arquivamento só pode entender-se como uma tomada de posição preliminar ou preparatória se a Comissão tiver indicado claramente que a sua conclusão apenas é válida sob reserva de observações complementares das partes.
2. Na fase da admissibilidade de um recurso contra uma carta de arquivamento na sequência de uma denúncia em matéria de concorrência, pouco importa que a carta controvertida proceda ou não a uma qualificação, à luz de um dos artigos do Tratado, dos comportamentos denunciados. Esta questão só tem pertinência para o efeito de verificar, no âmbito da apreciação de mérito, se a obrigação de fundamentação a que a Comissão está vinculada foi respeitada.
No processo C-39/93 P,
Syndicat français de l' Express international (SFEI), com sede em Roissy (França),
DHL International SA, sociedade de direito francês com sede em Roissy,
Service Crie-LFAL SA, sociedade de direito francês com sede em Paris,
May Courier International SARL, sociedade de direito francês com sede em Paris, representadas por Éric Morgan de Rivery, advogado no foro de Paris, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Alex Schmitt, 62, avenue Guillaume,
recorrentes,
que tem por objecto um recurso em que se pede a anulação do despacho proferido em 30 de Novembro de 1992 pelo Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias no processo T-36/92, que opõe o Syndicat français de l' Express international (SFEI), a DHL International SA, a Service Crie-LFAL SA e a May Courier International SARL à Comissão das Comunidades Europeias (Colect., p. II-2479),
sendo recorrida:
Comissão das Comunidades Europeias, representada por Giulano Marenco, consultor jurídico, e Francisco Enrique González-Díaz, membro do seu Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Georgios Kremlis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),
composto por: J. C. Moitinho de Almeida, presidente de secção, D. A. O. Edward, R. Joliet (relator), G. C. Rodríguez Iglesias e M. Zuleeg, juízes,
advogado-geral: C. O. Lenz
secretário: L. Hewlett, administradora
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações das partes na audiência de 25 de Novembro de 1993,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 10 de Fevereiro de 1994,
profere o presente
Acórdão
1 Através de petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 8 de Fevereiro de 1993, o Syndicat français de l' Express international (a seguir "SFEI"), a DHL International SA (a seguir "DHL"), a Service Crie-LFAL SA (a seguir "Service Crie") e a May Courier International SARL (a seguir "May Courier") interpuseram um recurso, nos termos do artigo 49. do Estatuto (CEE) do Tribunal de Justiça, do despacho do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Novembro de 1992, SFEI e o./Comissão (T-36/92, Colect., p. II-2479), que julgou inadmissível o recurso que haviam interposto da decisão contida na carta n. 000978 de 10 de Março de 1992 da Comissão que lhes comunicava não tencionar prosseguir um inquérito nos termos do artigo 86. do Tratado CEE.
2 Resulta dos factos verificados pelo Tribunal (n.os 1 a 3 do seu despacho) que, em 21 de Dezembro de 1990, o SFEI apresentou à Comissão uma queixa denunciando a assistência logística e comercial que os correios franceses teriam fornecido à société française de messagerie internationale (a seguir "SFMI"): colocação à sua disposição de todas as estações de correios, processo privilegiado de desalfandegamento, condições financeiras privilegiadas, operações de promoção e publicidade, efectuadas pelos correios franceses, a favor da SFMI.
3 É pacífico, por um lado, que a queixa apresentada em 21 de Dezembro de 1990 era, em todo o caso, dirigida contra o Estado francês e, a esse respeito, baseada nos artigos 92. e seguintes do Tratado CEE e, por outro lado, que, o mais tardar em 18 de Março de 1991, durante uma reunião da Comissão com os representantes do SFEI, foi evocada a questão duma eventual violação do artigo 86. pelos correios franceses, enquanto empresa. A Comissão prometeu então analisar as informações de que dispunha também na perspectiva dessa disposição.
4 Por carta de 15 de Novembro de 1991, o SFEI perguntou à Comissão se tinha a intenção de instaurar um inquérito com base nos factos que tinham sido expostos na queixa e, em caso afirmativo, com que fundamento jurídico entendia agir: os artigos 92. e seguintes ou os artigos 85. e 86. do Tratado.
5 Em 9 de Janeiro de 1992, o director-geral da DG IV respondeu a essa carta da forma seguinte:
"Iniciámos também a análise das informações disponíveis, com vista a adoptar uma posição de princípio quanto à aplicação do artigo 86.
Enquanto decorria o inquérito, os serviços do correio rápido dos correios foram afectados por um projecto de empresa comum entre a TNT, os próprios correios e quatro outras administrações postais. Procedemos a um inquérito a esses acordos ao abrigo das disposições do regulamento relativo às concentrações, tendo sido recentemente publicada a decisão da Comissão de 2 de Dezembro. É claro que o resultado desse inquérito influenciará a nossa análise da queixa do SFEI.
Em breve enviaremos a V. Ex.as uma carta mais completa com as nossas conclusões nessa matéria" (traduzido do inglês).
6 A empresa comum a que se referia o director-geral era uma empresa de correio rápido de serviços internacionais constituída pelos correios alemães, canadianos, franceses, neerlandeses e suecos, por um lado, e pela sociedade australiana TNT Ltd, por outro lado (a seguir "empresa comum"). A sua criação tinha sido notificada à Comissão em 28 de Outubro de 1991 em conformidade com o artigo 4. do Regulamento (CEE) n. 4064/89 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, relativo ao controlo das operações de concentração entre empresas (JO L 395, p. 1, e rectificação, JO 1990, L 257, p. 13, a seguir "regulamento relativo às concentrações"). Em 2 de Dezembro seguinte, a Comissão tinha considerado esta operação compatível com o mercado comum (Decisão 91/C322/14 da Comissão de não oposição, JO C 322, p. 19).
7 Em 10 de Março de 1992, a Comissão dirigiu duas cartas ao SFEI. A primeira, com o n. 06873, informava-o da decisão dos serviços competentes de encerrarem o processo "auxílios do Estado".
8 A segunda, com o n. 000978, relativa à aplicação do artigo 86. do Tratado (a seguir "carta controvertida"), informava de que tinha sido aberto um inquérito sobre a empresa comum, nos termos das disposições do regulamento relativo às concentrações e que o mesmo abrangia necessariamente os pontos mais importantes suscitados pelo SFEI quanto a uma eventual violação do artigo 86. pelos correios franceses (vantagens que a empresa comum poderia colher do acesso à infra-estrutura dos correios franceses, gozo dos privilégios destes...).
9 A parte final da carta estava redigida da forma seguinte:
"Sei que V. Ex.as esperavam que a Comissão completasse o processo de inquérito nos termos do artigo 86. Esse processo abrangeria apenas a situação relativamente à França. O inquérito realizado nos termos do regulamento relativo às concentrações incidiu todavia sobre alterações significativas no mercado comunitário mais amplo. As condições concorrenciais facilitadas pelas anteriores decisões da Comissão em matéria de correio rápido internacional foram presentemente alargadas de forma efectiva. Estou convencido de que os resultados obtidos constituem o melhor quadro actualmente possível para garantir que os membros do SFEI e os outros operadores disponham de todas as possibilidades de concorrerem entre si.
Nestas circunstância, embora não tencionemos prosseguir o inquérito para efeitos do artigo 86. , posso garantir a V. Ex.as que continuaremos a observar de perto a evolução deste mercado. Por carta separada, damos conta das conclusões da análise que efectuámos sobre o caso conexo apresentado em matéria de auxílios do Estado" (traduzido do inglês).
10 Por petição apresentada em 16 de Maio de 1992, o SFEI e três empresas membros do sindicato profissional, a DHL, a Service Crie e a May Courier interpuseram no Tribunal de Primeira Instância recurso de anulação da decisão contida na carta n. 06873 da Comissão, de 10 de Março de 1992, relativa ao processo "auxílios do Estado". Por carta de 9 de Julho de 1992, a Comissão informou os recorrentes de que tinha procedido à revogação dessa decisão.
11 Por petição apresentada também em 16 de Maio de 1992, o SFEI e as mesmas três empresas interpuseram no Tribunal de Primeira Instância outro recurso de anulação da decisão da Comissão contida na carta controvertida respeitante ao inquérito aberto nos termos do artigo 86. do Tratado.
12 Num memorando apresentado em 17 de Junho de 1992, a Comissão suscitou diversas questões prévias de inadmissibilidade deste segundo recurso.
13 Sustentou nomeadamente que a carta controvertida constituía apenas uma primeira reacção dos serviços da Comissão e se inscrevia por isso na fase preliminar de instrução das queixas, tal como foi analisada pelo Tribunal no acórdão de 10 de Julho de 1990, Automec/Comissão (T-64/89, Colect., p. II-367, a seguir "acórdão Automec I"). Em virtude da sua natureza preparatória, não é um acto impugnável.
14 Para apreciar a pertinência da questão prévia de inadmissibilidade suscitada pela Comissão, o Tribunal considerou que se devia, antes de mais, analisar se a queixa de 21 de Dezembro de 1990 se baseava no artigo 86. e, em segundo lugar, se o acto impugnado continha uma decisão susceptível de produzir efeitos jurídicos (n. 31).
15 No que diz respeito ao fundamento da queixa de 21 de Dezembro de 1990, o Tribunal observou que esta constava de três partes distintas: uma carta de acompanhamento dirigida ao director-geral da concorrência, um resumo da queixa e a queixa propriamente dita (n. 32). Observou que a queixa propriamente dita não fazia qualquer referência ao artigo 86. (n. 35). O Tribunal considerou que o facto de um documento exterior à queixa propriamente dita, ou seja, a carta de acompanhamento ao director-geral da concorrência, reservar expressamente a possibilidade de mais tarde ser apresentada uma queixa à Comissão nos termos dos artigos 85. e 86. apenas confirmava que a queixa feita à Comissão se referia inicialmente apenas ao artigo 92. (n. 37).
16 Quanto aos efeitos jurídicos da carta controvertida da Comissão, o Tribunal considerou que o documento se limitava a explicitar a decisão de compatibilidade tomada pela Comissão em 2 de Dezembro de 1991 nos termos do regulamento relativo às concentrações, e a conexão que existia entre os problemas encontrados no decurso da instrução conduzida em matéria de concentração e os evocados na queixa. O Tribunal declarou, além disso, que essa carta não continha qualquer qualificação dos factos alegados à luz do artigo 86. do Tratado e concluiu que a carta controvertida deveria ser considerada como um acto inserido num estado preliminar da instrução, que se limitava a exprimir uma primeira reacção dos serviços da Comissão e que era desprovido de efeitos jurídicos (n.os 42 e 43).
17 Ainda no que se refere aos efeitos jurídicos da carta controvertida da Comissão, o Tribunal recusou também o argumento que os recorrentes baseavam numa violação das resoluções tomadas pela Comissão na sequência do acórdão Automec I. No seu XX Relatório sobre a Política da Concorrência, a Comissão tinha afirmado:
"As cartas de comunicação de observações preliminares serão por isso redigidas de forma a que só possam ser consideradas pelos seus destinatários como uma primeira reacção dos serviços da Comissão, com base nas informações de que dispõem. Em todo o caso, os seus destinatários serão sempre convidados a apresentar as suas observações complementares à Comissão num prazo razoável expressamente fixado na carta, sem o que a queixa será considerada como arquivada" (XX Relatório Anual sobre a Concorrência, 1990, n. 165, p. 138).
18 Na opinião dos recorrentes, a última frase desta passagem significava que, se a Comissão não convidasse as partes a apresentarem observações, a queixa deveria ser considerada como definitivamente arquivada. Fazendo referência ao adágio "tu patere legem quam fecisti", concluíam que, não tendo o SFEI sido convidado a apresentar as suas observações complementares, a carta controvertida constituía uma rejeição definitiva da queixa.
19 O Tribunal considerou que este argumento assentava numa interpretação errada da última frase do relatório já referido. Na opinião do Tribunal, "esta significa apenas que um pedido apresentado com base no artigo 3. do Regulamento n. 17/62 (Regulamento n. 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962: primeiro regulamento de execução dos artigos 85. e 86. do Tratado CEE, JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22) será arquivado se as observações do queixoso não chegarem à Comissão no prazo fixado na comunicação provisória efectuada nos termos do artigo 6. do Regulamento n. 99/63" (da Comissão, de 25 de Julho de 1963, relativo às audições referidas nos n.os 1 e 2, do artigo 19. do Regulamento n. 17 do Conselho, JO 1963, 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62) (n. 45).
20 Por consequência, o Tribunal julgou o recurso inadmissível, em 30 de Novembro de 1992, e condenou os recorrentes na totalidade das despesas.
Quanto ao recurso para o Tribunal de Justiça
21 Em apoio do seu recurso, o SFEI, a DHL, a Service Crie e a May Courier invocam três fundamentos, o primeiro baseado na violação da noção jurídica de queixa, o segundo na violação da noção jurídica de acto impugnável e o terceiro na violação dos princípios da boa fé e da segurança jurídica.
Quanto ao primeiro fundamento, baseado na violação da noção jurídica de queixa
22 Na primeira parte, os recorrentes sustentam que, em direito comunitário, uma queixa é constituída pelo conjunto dos elementos de facto e de direito levados ao conhecimento da Comissão por um queixoso (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Outubro de 1983, Demo-Studio Schmidt/Comissão, 210/81, Recueil, p. 3045; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1992, Automec/Comissão, T-24/90, Colect., p. II-2223, recordando a jurisprudência do Tribunal de Justiça nessa matéria). Considerando a carta de acompanhamento ao director-geral da concorrência como exterior à queixa de 21 de Dezembro de 1990, o Tribunal restringiu indevidamente a extensão desta e, por esse facto, ignorou a noção jurídica de queixa. Na segunda parte, argumentam que o Tribunal não podia legalmente deduzir dos documentos do processo que a queixa não se baseava no artigo 86. Mais de metade da carta de acompanhamento era consagrada, com efeito, a demonstrar que os comportamentos anticoncorrenciais dos correios denunciados ao conselho francês da concorrência eram também contrários a essa disposição do Tratado. Na terceira parte, os recorrentes concluem pela existência duma contradição na apreciação que o Tribunal fez dos elementos constitutivos da queixa. Na opinião dos recorrentes, no n. 32 do despacho, o Tribunal considera que a carta de acompanhamento faz parte da queixa, enquanto no n. 37 considera que a queixa é constituída apenas pela exposição relativa à aplicação do artigo 92.
23 Tal como resulta dos n.os 16 e 17 do despacho, o Tribunal observou que a Comissão tinha finalmente considerado que lhe tinha sido apresentada uma queixa baseada no artigo 86. Por conseguinte, as considerações que fez quanto ao alcance original da queixa são inúteis. Uma vez que se dirige contra uma fundamentação desnecessária do despacho, o primeiro fundamento deve julgar-se improcedente, por ser ineficaz.
Quanto ao segundo fundamento, baseado na violação da noção de acto impugnável
24 Os recorrentes sustentam que, ao qualificar a carta controvertida como acto peparatório, o Tribunal ignorou a noção de acto impugnável. Esta carta contém, com efeito, uma análise dos comportamentos denunciados à luz do artigo 86. do Tratado, põe fim a um inquérito e impede os recorrentes de exigirem a sua reabertura, a não ser que forneçam novos elementos. Por isso, é uma verdadeira decisão de rejeição da queixa e, como tal, é susceptível de recurso de anulação.
25 A Comissão considera que este segundo fundamento é inadmissível. Apoiando-se nas circunstâncias em que foi redigida a carta controvertida, no seu conteúdo e na sua redacção, limita-se a suscitar questões de facto.
26 Esta argumentação não pode ser acolhida. Ao analisar a carta controvertida como um acto desprovido de efeitos jurídicos, o Tribunal não se limitou a apreciar os factos mas procedeu à sua qualificação. O Tribunal pode, por isso, analisar este fundamento.
27 Antes de mais, uma instituição que é dotada do poder de declarar uma infracção e de a punir e a quem podem ser submetidas queixas pelos particulares, como é o caso da Comissão em matéria de direito da concorrência, adopta necessariamente um acto que produz efeitos jurídicos, quando põe termo a um inquérito que instaurou na sequência dessa queixa (v. acórdão Demo-Studio Schmidt/Comissão, já referido; acórdão de 17 de Novembro de 1987, BAT e Reynolds/Comissão, 142/84 e 156/84, Colect., p. 4487).
28 Seguidamente, o acto que determina o arquivo duma queixa não pode ser qualificado como preliminar ou preparatório. Com efeito, diferentemente de uma comunicação, que se destina a dar às empresas atingidas a possibilidade de fazerem valer o seu ponto de vista quanto às acusações articuladas pela Comissão e que não fixa definitivamente a posição desta última (v. acórdão de 11 de Novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, Recueil, p. 2639), o acto que manda arquivar uma queixa constitui a última fase do processo: não será seguido de qualquer outro acto susceptível de originar um recurso de anulação (v. acórdão de 24 de Junho de 1986, AKZO Chemie/Comissão, 53/85, Colect., p. 1965).
29 A expressão "Sei que V. Ex.as esperavam (you had hoped) que a Comissão completasse (would follow) o processo de inquérito nos termos do artigo 86. " dá a entender que a Comissão tinha decidido pôr termo ao inquérito nos termos do artigo 86. Além disso, a Comissão expôs igualmente, na carta controvertida, os motivos pelos quais tinha decidido não continuar o inquérito. Em sua opinião, qualquer nova investigação era inútil porque os "resultados obtidos (no âmbito do processo da empresa comum) constituem o melhor quadro actualmente possível, com vista a garantir que os membros do SFEI e os outros operadores dispõem de todas as possibilidades de concorrerem entre si".
30 Nestas condições, uma carta que manda arquivar o processo só pode entender-se como uma tomada de posição preliminar ou preparatória se a Comissão tiver indicado claramente que a sua conclusão apenas é válida sob reserva de observações complementares das partes, o que não aconteceu no caso em análise.
31 Finalmente, contrariamente ao que decidiu o Tribunal de Primeira Instância (n.os 42 e 43 do despacho analisado no n. 16 supra), pouco importa que a carta controvertida proceda ou não a uma qualificação, à luz do artigo 86. do Tratado, dos comportamentos denunciados na queixa. Essa questão só se coloca na fase da admissibilidade do recurso e só tem pertinência para o efeito de verificar, no âmbito da apreciação de mérito, se a obrigação de fundamentação a que a Comissão está vinculada foi respeitada.
32 Resulta do exposto que o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao analisar a carta controvertida como um acto desprovido de efeitos jurídicos e ao julgar o recurso inadmissível.
33 O segundo fundamento é, por isso, procedente.
Quanto ao terceiro fundamento, baseado na violação dos princípios da boa fé e da segurança jurídica
34 Os recorrentes argumentam que não puderam deixar de considerar a carta controvertida como uma decisão de recusa da sua queixa, dado que, por um lado, essa carta não os convidava a reagir às observações da Comissão e, por outro lado, foi enviada no mesmo dia que a carta relativa aos auxílios do Estado, cujo carácter decisório a Comissão reconheceu.
35 Sendo este fundamento subsidiário em relação ao segundo fundamento, que foi declarado procedente, não há necessidade de continuar a sua análise.
36 Resulta das considerações precedentes que o despacho do Tribunal de Primeira Instância no processo SFEI e o./Comissão, que julgou inadmissível o recurso de anulação interposto pelo SFEI, pela DHL International, pela Service Crie e pela May Courier da decisão contida na carta n. 000978 de 10 de Março de 1992 da Comissão, deve ser anulado.
Quanto à remessa do processo ao Tribunal de Primeira Instância
37 Nos termos do artigo 54. , primeiro parágrafo, do Estatuto (CEE) do Tribunal de Justiça,
"Quando o recurso for procedente, o Tribunal de Justiça anulará a decisão do Tribunal de Primeira Instância. Pode, neste caso, julgar definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância, para julgamento."
38 Não estando o litígio em condições de ser julgado, visto que o Tribunal de Primeira Instância apenas decidiu sobre uma das questões prévias de inadmissibilidade suscitadas pela Comissão, deve ser-lhe remetido o processo.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)
decide:
1) O despacho do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Novembro de 1992, SFEI e o./Comissão (T-36/92), é anulado.
2) O processo é remetido ao Tribunal de Primeira Instância.
3) Reserva-se para final a decisão quanto às despesas.