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Document 61992TJ0032

Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Quarta Secção) de 6 de Julho de 1993.
Lars Bo Rasmussen contra Comissão das Comunidades Europeias.
Funcionários - Nomeação no âmbito de um procedimento de rotação - Inexistência de vaga de lugar - Obrigações da instituição.
Processo T-32/92.

Colectânea de Jurisprudência 1993 II-00765

ECLI identifier: ECLI:EU:T:1993:59

61992A0032

ACORDAO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTANCIA (QUARTA SECCAO) DE 6 DE JULHO DE 1993. - LARS BO RASMUSSEN CONTRA COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - FUNCIONARIO - NOMEACAO NO AMBITO DE UM PROCESSO DE ROTACAO - INEXISTENCIA DE VAGA - OBRIGACOES DA INSTITUICAO. - PROCESSO T-32/92.

Colectânea da Jurisprudência 1993 página II-00765


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Funcionários ° Colocação ° Mudança de colocação no âmbito de um procedimento de rotação do pessoal ° Diferença do provimento de um lugar vago ° Obrigações da administração de respeitar o princípio da igualdade de tratamento e da protecção da confiança legítima

(Estatuto dos Funcionários, artigos 4. , 29. e 45. )

2. Funcionários ° Colocação ° Mudança de colocação no âmbito de um procedimento de rotação do pessoal ° Obrigação da administração de escolher um dos funcionários que se candidataram ° Inexistência

Sumário


1. A existência de um lugar vago, na acepção dos artigos 4. e 29. do Estatuto, pressupõe que um lugar não se encontra preenchido entre o número total de lugares permanentes compreendidos no quadro de efectivos anexo à secção do orçamento referente à instituição em causa e que fixa, para cada uma das categorias e quadros, o número de lugares por grau, em cada carreira, tal como dispõe o artigo 6. do Estatuto. Um procedimento destinado a assegurar no interior de uma instituição a rotação do pessoal e nos termos do qual os funcionários são recolocados com transferência do seu lugar não constitui um procedimento de provimento de um lugar vago. Daqui resulta que o disposto nos artigos 4. , 29. e 45. do Estatuto não é aplicável a esse procedimento.

Todavia, a organização da função pública comunitária é regida por determinados princípios gerais de direito, nomeadamente os da igualdade de tratamento e da protecção da confiança legítima, que não podem ser ignorados no âmbito de um procedimento, como o da rotação do pessoal, não expressamente previsto no Estatuto. A aplicação destes princípios implica, por um lado, que a administração está obrigada a efectuar uma análise comparativa correcta dos méritos dos candidatos e, por outro, que, uma vez que tenha decidido prover uma função determinada por intermédio deste procedimento, deverá conduzi-lo até ao fim de modo correcto, respeitando os termos do aviso que publicou, antes de fazer apelo a candidaturas externas no quadro de um procedimento de natureza diversa.

2. A decisão de encerrar um procedimento de rotação do pessoal sem prover uma função determinada através da nomeação de um candidato interno depende da margem de apreciação de que goza nesta matéria a autoridade investida do poder de nomeação. Com efeito, se a administração não está obrigada a dar seguimento a um processo de recrutamento iniciado em aplicação do artigo 29. do Estatuto para prover um lugar vago, este mesmo princípio deve, a fortiori, aplicar-se por analogia à hipótese de a administração recorrer a candidaturas internas no âmbito de um procedimento de rotação do pessoal.

Partes


No processo T-32/92,

Lars Bo Rasmussen, funcionário da Comissão das Comunidades Europeias, residente em Dalheim (Luxemburgo), representado por Jean-Noël Louis, advogado no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo nos escritórios da fiduciaire Myson SARL, 1, rue Glesener,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Joseph Griesmar, consultor jurídico, e Ana Maria Alves Vieira, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Nicola Annechino, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrido,

que tem por objecto a anulação da decisão da Comissão de não aceitar a candidatura apresentada pelo recorrente na sequência da publicação do "aviso de vaga n. 587" e de fazer apelo a candidaturas externas no quadro de um lugar temporário do grau A 3,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: C. W. Bellamy, presidente, H. Kirschner e C. P. Briët, juízes,

secretário: H. Jung

vistos os autos e após a audiência de 18 de Março de 1993,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


Factos na origem do recurso

1 O recorrente é funcionário de grau A 5 na Comissão. Resulta do seu processo individual, entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, em conformidade com o último parágrafo do artigo 26. do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir "Estatuto"), que foi recrutado pela Comissão e colocado no Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias no Luxemburgo em 1975, como administrador de grau A6, tendo sido encarregado da organização dos sumários do Jornal Oficial das Comunidades Europeias. Depois de ter estado destacado no Serviço de Estatística de 1981 a 1983, ocupou posteriormente, sempre na qualidade de administrador (e, a partir de 1989, de administrador principal), funções ligadas a questões linguísticas na direcção de tradução; actualmente, desde 1 de Março de 1991, encontra-se colocado no comité consultivo para a segurança, higiene e protecção da saúde no local de trabalho na Direcção-Geral do Emprego, Relações Industriais e Assuntos Sociais, sempre na Comissão no Luxemburgo.

2 Para os seus serviços de imprensa e informação nos Estados-membros da Comunidade, a Comissão instituiu um sistema de rotação do pessoal. As disposições que regem este sistema, adoptadas em 24 de Novembro de 1976 (a seguir "disposições de 24 de Novembro de 1976"), prevêem nomeadamente que;

"A rotação deve ser feita, em princípio, através de um movimento geral, incidindo de cada vez sobre uma parte dos funcionários do quadro, de modo a garantir a continuidade do serviço.

...

No âmbito deste movimento geral, os funcionários são colocados com transferência do seu lugar previsto no orçamento."

Os funcionários abrangidos pelo sistema são designados por um comité (a seguir "comité de rotação") composto por quatro directores-gerais.

3 Em 11 de Novembro de 1990, a administração da Comissão publicou um aviso, intitulado "Aviso de vaga n. 587" (a seguir "aviso n. 587"), informando o pessoal de que a Direcção-Geral Informação, Comunicação e Cultura (DG X) procurava, no quadro de um procedimento de rotação, um funcionário de grau A 3/A 4/A 5 para assumir as funções de chefe de serviço em Lisboa. O candidato devia possuir, designadamente:

° conhecimento aprofundado dos problemas políticos, económicos e sociais de Portugal;

° muito boa experiência dos diferentes meios de informação e dos media em Portugal; e

° excelente conhecimento da língua portuguesa.

4 O recorrente apresentou a sua candidatura em 28 de Novembro de 1990.

5 Em 20 de Dezembro de 1990, por recomendação de um dos seus membros, o comité de rotação concluiu que nenhuma das duas candidaturas apresentadas reunia o conjunto das qualificações que eram exigidas. Em 21 de Janeiro de 1991, a autoridade investida do poder de nomeação (a seguir "AIPN") decidiu "tomar em conta o parecer do comité de rotação, registar as candidaturas internas e proceder ao encerramento do procedimento de rotação; atribuir um lugar temporário de grau A 3 ao serviço da Comunidade em Portugal (Lisboa); abrir o processo de selecção externa utilizado pela Comissão para os agentes temporários" (v. o documento PERS(91) 24, apresentado pela Comissão a pedido do Tribunal).

6 Em Fevereiro de 1991, a Comissão publicou na imprensa um anúncio para recrutamento de um agente temporário altamente qualificado para exercer, no grau A 3, as funções de director de serviço em Lisboa. As qualificações exigidas assemelhavam-se às enunciadas no aviso n. 587, ainda que apresentando algumas diferenças. O anúncio especificava que as candidaturas dos funcionários das Comunmidades Europeias não seriam aceites.

7 Em 21 de Fevereiro de 1991, após a publicação daquele anúncio, o recorrente enviou à AIPN um pedido de esclarecimento para saber qual o seguimento dado à sua candidatura e a data em que o comité consultivo havia tomado a decisão de prover o lugar vago no nível A 3, e para saber se o procedimento de provimento de lugares vagos, previsto no artigo 29. do Estatuto, tinha sido respeitado.

8 Em 29 de Abril de 1991, o director-geral do pessoal e administração respondeu a esse pedido, resumindo o teor das decisões de 21 de Janeiro de 1991 e esclarecendo que o parecer emitido pelo comité de rotação "se baseava, entre outros aspectos, na conclusão de que V. Exa. não preenchia as condições relativas ao conhecimento dos problemas políticos, económicos e sociais de Portugal e à experiência nos domínios da informação e dos media".

9 Em 22 de Julho de 1991, o recorrente apresentou uma reclamação ao abrigo do artigo 90. do Estatuto, na qual sustentava que as decisões de não aceitar a sua candidatura na sequência do aviso n. 587 e de atribuir um lugar temporário de grau A 3 à função de chefe de serviço em Portugal estavam inquinadas de irregularidade, ilegalidade e vícios formais e materiais.

10 Por decisão de 9 de Janeiro de 1992, comunicada ao recorrente por carta de 15 de Janeiro de 1992, a Comissão indeferiu a reclamação.

Tramitação processual

11 Foi nestas condições que, através de petição apresentada em 30 de Abril de 1992 na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, o recorrente interpôs o presente recurso.

12 Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução prévia, mas dirigindo algumas perguntas às partes e convidando a Comissão a apresentar determinados documentos.

13 A audiência realizou-se em 18 de Março de 1993. Os representantes das partes foram ouvidos em alegações e em resposta às perguntas formuladas pelo Tribunal.

Pedidos das partes

14 O recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

° anular a decisão de não aceitar a sua candidatura ao aviso n. 587, publicado em 11 de Novembro de 1990;

° anular a decisão da administração de prover o lugar vago fazendo apelo a candidaturas externas no quadro de um lugar temporário do grau A 3;

° condenar a recorrida nas despesas do processo.

15 A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:

° negar provimento ao recurso por improcedente;

° decidir sobre as despesas nos termos de direito.

Fundamentos e argumentos das partes

16 Em apoio dos seus pedidos, o recorrente invoca dois fundamentos baseados, o primeiro, na violação dos artigos 4. e 29. do Estatuto, na medida em que impõem o provimento de um lugar vago prioritariamente através de promoção ou mutação, e, o segundo, na violação do artigo 45. do Estatuto, na medida em que impõe uma análise comparativa regular das candidaturas à promoção ou mutação.

Argumentos das partes quanto ao primeiro fundamento

17 O recorrente sustenta que o procedimento em causa, iniciado pelo aviso n. 587, é um procedimento de promoção/mutação sujeito, enquanto tal, ao disposto nos artigos 4. e 29. do Estatuto. A AIPN deveria ter respeitado a ordem de prioridade estabelecida por estas disposições antes de fazer apelo a candidaturas externas. Mais precisamente, a decisão de proceder a um tal apelo teria sido adoptada em violação da ordem de prioridade imposta pelo artigo 29. , n. 1 do Estatuto (v. acordão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Fevereiro de 1992, Volger/Parlamento, T-52/90, Colect., p. II-121, n. 19). Tendo em conta as importantes modificações introduzidas, no respeitante às qualificações exigidas, aquando do recurso a candidaturas externas, este último não constituiria de modo algum uma continuação do procedimento iniciado pelo aviso n. 587.

18 No entender da recorrida, o procedimento em causa é um procedimento de rotação, por força do qual os funcionários são colocados com o seu lugar e que não pressupõe, diferentemente de um processo de mutação, a existência de um lugar vago na acepção dos artigos 4. e 29. do Estatuto (v. acordãos do Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 1981, Carbognani e Coda Zabetta/Comissão, 161/80 e 162/80, Recueil p. 543, n. 19, e de 17 de Dezembro de 1981, Demont//Comissão, 791/79, Recueil, p. 3105). A título subsidiário, a Comissão acrescenta que, mesmo que tivesse existido uma vaga de lugar, a AIPN não estaria obrigada a continuar um procedimento iniciado nos termos do artigo 29. do Estatuto para a prover (v., por último, o acordão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Fevereiro de 1990, Hochbaum/Comissão, T-38/89, Colect., p. II-43).

19 Em resposta, o recorrente admite que uma simples rotação não implica a existência de uma vaga de lugar e que o procedimento previsto nos artigos 4. e 29. do Estatuto não é aplicável à recolocação de um funcionário com transferência do seu lugar, uma vez que esta não origina a abertura de uma vaga. Sustenta, contudo, que o sistema de rotação implica um movimento geral e que o comité de rotação foi criado para fiscalizar esse movimento geral e não para proceder ao recrutamento de novos funcionários e/ou agentes. No caso em apreço, não teria havido movimento geral de rotação e o aviso n. 587 respeitaria ao provimento de um lugar vago. Daí resultaria que a jurisprudência citada pela recorrida não seria aplicável a este caso. O recorrente, invocando o acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Fevereiro de 1984, Kohler/Tribunal de Contas (316/82 e 40/83, Recueil, p. 641, n. 22), alega que a Comissão estava obrigada a justificar por que desistira do procedimento iniciado nos termos do artigo 29. do Estatuto, mas não o fez.

Argumentos das partes quanto ao segundo fundamento

20 A recorrida invoca a inadmissibilidade do segundo fundamento, baseado na violação do artigo 45. do Estatuto, pelo facto de este não ter sido suscitado na fase pré-contenciosa.

21 Na réplica, o recorrente contrapõe que, ao referir-se, na sua reclamação, ao sistema de provimento de lugares de enquadramento intermediário, regulamentado pela decisão da Comissão de 19 de Julho de 1988, invocara efectivamente a violação do procedimento instituído pelo artigo 45. do Estatuto, mesmo não tendo citado expressamente o número do artigo. Além disso, faz notar que, na decisão de indeferimento da sua reclamação, a Comissão acentua que dispõe de um amplo poder de apreciação na comparação dos méritos dos candidatos. Ora, a decisão de 19 de Julho de 1988 e a comparação dos méritos dos candidatos a uma vaga de lugar dependem ambas da aplicação do artigo 45. do Estatuto.

22 Quanto ao mérito, o recorrente invocou o já referido acordão Volger/Parlamento, segundo o qual a análise das candidaturas para mutação ou promoção deve efectuar-se em conformidade com o disposto no artigo 45. do Estatuto, que prevê expressamente uma análise comparativa dos méritos dos funcionários susceptíveis de serem promovidos, bem como dos relatórios de que tiverem sido objecto.

23 No caso vertente, não só o recorrente não teria sido ouvido antes da não aceitação da sua candidatura e da decisão de fazer apelo a candidaturas externas, como não teria sido consultado o seu processo individual, que contém os relatórios que são referidos pela decisão de indeferimento da sua reclamação para justificar a não realização de uma entrevista.

24 Além disso, o recorrente realça que a decisão impugnada foi tomada no fim de um procedimento irregular, enfermando, nomeadamente, de um manifesto erro de apreciação. A este respeito, cita o seu relatório de classificação de 9 de Outubro de 1992, relativo ao período de 1 de Julho de 1989 a 30 de Junho de 1991, do qual resultaria que estava familiarizado com os diferentes meios de informação e os media portugueses, pelo que possuía as qualificações exigidas pelo aviso de vaga n. 587.

25 A recorrida alegou na contestação que a referência ao acordão Volger/Parlamento, já referido, é irrelevante, uma vez que os relatórios do recorrente foram efectivamente consultados e os seus méritos devidamente apreciados à luz das condições exigidas pelo aviso de vaga n. 587. A recorrida alega igualmente que a AIPN não está obrigada a efectuar automaticamente entrevistas com os candidatos a uma função determinada. Possuindo os relatórios respeitantes ao recorrente e o seu formulário de candidatura detalhado, o comité de rotação encontrava-se em condições de avaliar os seus méritos.

26 Além disso, a recorrida contesta a relevância do último relatório invocado pelo recorrente. Por um lado, dizia respeito a um período de referência ainda em curso no momento do procedimento em causa e, por outro, dele não resultava que o recorrente possuísse nem uma muito boa experiência dos media portugueses, nem um conhecimento aprofundado dos problemas políticos, económicos e sociais desse país ° duas qualificações exigidas no aviso n. 587.

27 Quanto à consulta do seu processo individual, o recorrente observou na réplica, e sublinhou na audiência, que resulta dos documentos apresentados pela própria recorrida que a referida consulta se efectou onze meses antes da publicação do aviso em causa, o que provaria que a AIPN não estava em condições de avaliar os seus méritos. A Comissão, na tréplica e na audiência, limitou-se a alegar que o processo individual do recorrente estava "à disposição" dos membros do comité de rotação e que estes tiveram "a possibilidade" de o consultar.

Apreciação do Tribunal

Quanto à admissibilidade

28 Quanto à questão prévia de admissibilidade suscitada pela Comissão relativamente ao segundo fundamento do recorrente (v. supra, n.os 20 e 21), o Tribunal recorda que os princípios relevantes foram expostos, mais recentemente, nos acordãos do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Março de 1993, Vardakas/Comissão (T-4/92, Colect., p. II-357, n. 16), e de 16 de Julho de 1992, Della Pietra/Comissão (T-1/91, Colect., p. II-2145, n. 24). O Tribunal considera que o recorrente, ao alegar na sua reclamação que a AIPN não estava de posse de nenhum elemento objectivo que lhe permitisse apreciar se ele possuía as qualificações exigidas, com excepção do parecer do comité de rotação, "o qual não procedeu à verificação dessas indicações", bem como pelas numerosas referências que faz aos artigos 4. e 29. do Estatuto, censurou implicitamente a Comissão por não ter procedido a uma correcta análise comparativa das candidaturas, como exige o artigo 45. do Estatuto, mesmo não tendo mencionado expressamente este artigo.

29 Nestas condições, o Tribunal considera que o requerimento não extravasa do quadro já definido pela reclamação e que o segundo fundamento é, portanto, admissível.

30 Tendo em conta as conclusões a que chegou o Tribunal relativamente ao mérito da causa (v. infra), não é necessário examinar mais detalhadamente as demais questões que a admissibilidade do recurso também poderia suscitar.

Quanto ao mérito

31 O Tribunal considera que se deve, antes de mais, qualificar juridicamente o procedimento em questão no caso vertente e, nomeadamente, determinar se o disposto nos artigos 4. , 29. e 45. do Estatuto é aplicável no quadro de um tal procedimento.

Quanto à natureza jurídica do procedimento em causa

32 Nos termos do artigo 4. do Estatuto, uma nomeação ou promoção só pode ter por objecto o provimento de um "lugar vago", que deve ser levado ao conhecimento do pessoal. No caso de um tal "lugar vago", o artigo 29. , n. 1, do Estatuto prevê que a AIPN deve examinar, primeiramente, as possibilidades de promoção ou mutação no interior da instituição, em seguida a possibilidade de organização de concursos internos e, por fim, de transferência dos funcionários de outras instituições, antes de dar início ao processo de concurso. Segundo o artigo 45. , n. 1, do Estatuto, a promoção faz-se exclusivamente por escolha, após análise comparativa dos méritos dos funcionários susceptíveis de serem promovidos, assim como dos relatórios de que tiverem sido objecto.

33 O Tribunal observa ° e é pacífico entre as partes ° que o disposto nos artigos 4. e 29. do Estatuto só se aplica no caso de um "lugar vago", na acepção destes artigos. Em consequência, a recolocação de um funcionário não existindo tal "lugar vago" não constitui uma promoção ou uma mutação na acepção dos referidos artigos 4. e 29. Do mesmo modo, o artigo 45. do Estatuto só se aplica às promoções na acepção daqueles artigos. O Tribunal deve, portanto, determinar se o procedimento em causa no presente processo respeita a um "lugar vago", na acepção estatutária da expressão.

34 O Tribunal considera que a existência de um lugar vago, na acepção dos artigos 4. e 29. do Estatuto, pressupõe que um lugar não se encontra preenchido entre o número total de lugares permanentes (os "lugares orçamentais" a que aludem as disposições de 24 de Novembro de 1976) compreendidos no quadro de efectivos anexo à secção do orçamento referente à instituição em causa, e que fixa, para cada uma das categorias e quadros, o número de lugares por grau, em cada carreira, tal como dispõe o artigo 6. do Estatuto.

35 No caso vertente, resulta do aviso n. 587 e dos documentos e explicações fornecidos pela Comissão que o procedimento em causa se inscreve no quadro do sistema de rotação estabelecido pelas disposições de 24 de Novembro de 1976. Estas disposições prevêem, em princípio, um movimento geral, mas o sistema deve necessariamente aplicar-se a casos individuais, como os que resultam de falecimentos, demissões ou recolocações pontuais no interesse do serviço. Nesses casos individuais, assim como na hipótese de um movimento geral, o sistema de rotação baseia-se no princípio de que o funcionário em causa é colocado com transferência do seu lugar.

36 A Comissão alegou, sem que o recorrente o contestasse, que o anterior chefe do serviço de imprensa em Lisboa tinha sido recolocado em Tóquio com transferência do seu lugar e que, com a publicação do aviso n. 587, procurava um funcionário que pudesse ser recolocado em Lisboa com transferência do seu lugar.

37 Uma vez que o procedimento iniciado pelo aviso n. 587 tinha a finalidade de encontrar um funcionário cuja colocação seria acompanhada da transferência do seu lugar, e que aquele aviso especificava que era publicado "no âmbito do sistema de rotação estabelecido para os serviços na Comunidade", não se podia tratar do provimento de uma vaga na acepção dos artigos 4. e 29. do Estatuto.

38 Esta conclusão não é prejudicada pelo argumento do recorrente segundo o qual a existência de um lugar vago se pode inferir, no presente caso, da existência da função, com carácter permanente, de chefe de serviços em Lisboa, e da nomeação ulterior de um agente temporário do grau A 3 para a função em questão.

39 A questão da existência de determinada "função", por oposição a um "lugar", é da competência da instituição em matéria de organização dos serviços, enquanto a existência de um lugar vago se determina pela questão de saber se, entre o número total de lugares permanentes previstos no orçamento, há um lugar não provido. Na medida em que o orçamento não define as funções pelas quais esse número total de lugares deve ser repartido, a existência em Lisboa de um lugar vago, na acepção do Estatuto, não se pode deduzir do simples facto de as funções de chefe de serviços em Lisboa terem ficado provisoriamente sem titular na sequência da recolocação, acompanhada da transferência do lugar, do precedente chefe de serviços.

40 No que respeita ao posterior recrutamento de um agente temporário, resulta das informações fornecidas ao Tribunal pela Comissão que o referido agente temporário foi nomeado com base no artigo 2. , alínea a), do regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias (a seguir "ROA"), isto é, para ocupar um lugar pertencente ao quadro de efectivos anexo à secção do orçamento correspondente a cada instituição e ao qual as autoridades orçamentais conferiram carácter temporário. Não é, pois, possível inferir da nomeação de um agente temporário com base no artigo 2. , alínea a), do ROA ° diferentemente do que sucederia com a nomeação ao abrigo do artigo 2. , alínea b), do ROA, que respeita aos agentes contratados com vista a ocuparem, a título temporário, um lugar permanente ° a existência prévia de um lugar permanente.

41 Por fim, o Tribunal acentua que, ainda que a terminologia utilizada pela Comissão no caso em apreço, em particular o termo "lugar" utilizado no aviso n. 587 e no formulário entregue ao recorrente, informando-o de que a AIPN "não pôde aceitar a sua candidatura ao lugar a prover", possa ter-se prestadao a confusão, a utilização pelas partes de uma terminologia inadequada às circunstâncias não é susceptível de afectar a análise jurídica do Tribunal.

Quanto às consequências que resultam no presente caso da natureza jurídica do procedimento em causa

42 Decorre da análise antecedente que o disposto nos artigos 4. , 29. e 45. do Estatuto não se aplica ao procedimento em questão no presente caso e, em consequência, os argumentos do recorrente não podem ser acolhidos, na medida em que se baseiam nas referidas disposições.

43 Contudo, o Tribunal relembra que a organização da função pública comunitária é regida por determinados princípios gerais de direito, nomeadamente os da igualdade de tratamento e da protecção da confiança legítima. Resulta implicitamente do sistema de protecção jurídica dos funcionários, tal como é instituído pelo Estatuto, que estes princípios não podem ser ignorados no âmbito de um procedimento não expressamente previsto no Estatuto, como o procedimento de rotação em causa. O Tribunal considera que a aplicação destes princípios a um procedimento desta natureza implica, por um lado, que a administração está obrigada a efectuar uma análise comparativa correcta dos méritos dos candidatos e, por outro, que, uma vez que tenha decidido prover uma função determinada por intermédio deste procedimento, deverá conduzi-lo até ao fim de modo correcto, respeitando os termos do aviso que publicou, antes de fazer apelo a candidaturas externas no quadro de um procedimento de natureza diversa.

44 É à luz destas considerações que se devem examinar as acusações que estão na origem dos dois fundamentos do recorrente.

Quanto à análise comparativa dos méritos dos candidatos

45 Resulta dos documentos apresentados pela recorrida que foram recebidas duas candidaturas, entre as quais a do recorrente, que foram examinadas por um dos membros do comité de rotação, tendo concluído que nenhuma das duas reunia o conjunto das qualificações exigidas pelo aviso n. 587, conclusão esta que veio a ser confirmada pelo referido comité no seu parecer. A decisão da AIPN de 21 de Janeiro de 1991 foi tomada com base neste parecer.

46 O Tribunal observa igualmente que o acto de candidatura do recorrente continha, para além do resumo das funções que exercera na Comissão (v. supra, n. 1), uma descrição dos seus estudos superiores e dos cargos que ocupara antes do seu recrutamento pela Comissão. Resulta destes elementos que o recorrente efectuou estudos superiores no domínio das ciências económicas e políticas na Dinamarca, nos Estados Unidos, no Reino Unido, na Suíça e em França e que, antes da sua entrada para os serviços da Comissão, adquiriu experiência profissional na Dinamarca, no ensino científico e em funções de gestão de empresas. Com excepção de uma cruz feita no quadro relativo aos conhecimentos linguísticos, na coluna "muito bom" no respeitante à língua portuguesa, o acto de candidatura do recorrente não continha qualquer referência a conhecimentos ou experiência relacionados com Portugal e com as suas especificidades. Destas constatações se infere que aquele documento não continha nenhum elemento que permitisse à AIPN concluir que o recorrente podia satisfazer as exigências impostas pelo aviso n. 587.

47 Nestas condições, e tendo em consideração o amplo poder de apreciação de que goza a AIPN nesta matéria, a sua decisão de não aceitar a candidatura do recorrente, pelo facto de não reunir as condições relativas ao conhecimento dos problemas políticos, económicos e sociais de Portugal e experiência nos domínios da informação e dos media, corresponde ao conteúdo do referido acto de candidatura.

48 No âmbito de um aviso convidando à apresentação de candidaturas para uma função específica, a prover segundo um sistema de rotação como o do caso vertente, o Tribunal considera que não compete à administração conceder automaticamente, a um candidato que não indica no seu acto de candidatura que reúne as condições exigidas no aviso em questão, uma segunda possibilidade de provar que satisfaz efectivamente essas condições. A conclusão do comité de rotação expressa após análise do seu acto de candidatura, segundo a qual o recorrente não apresentava o conjunto das qualificações exigidas, não pode, pois, ser considerada como estando ferida de irregularidade.

49 No respeitante à alegação do recorrente segundo a qual o seu processo individual não foi consultado, o Tribunal verifica que a afirmação da recorrida em resposta à reclamação do recorrente e, de novo, na sua contestação, de que o processo havia sido consultado no momento da análise da candidatura do recorrente, parece ser posta em causa pelas indicações existentes no registo de pedidos do referido processo, apresentado pela própria recorrida.

50 Contudo, perante um acto de candidatura que não indicava que o recorrente possuía qualquer das qualificações exigidas pelo aviso n. 587, a consulta do seu processo individual não se impunha.

51 O Tribunal assinala, além disso, que o referido processo não contém nenhum elemento que, na época, pudesse esclarecer a administração sobre a existência de conhecimentos adequados do recorrente relativos às condições exigidas pelo aviso n. 587. De qualquer modo, não está provado, pois, que tenha havido erro de apreciação manifesto por parte da AIPN.

52 Pode acrescentar-se, por fim, que o relatório de classificação do recorrente de 9 de Outubro de 1992, redigido posteriormente aos factos considerados, não é relevante para a avaliação da decisão do comité de rotação de 20 de Dezembro de 1990. Nestas condições, o facto de este relatório não ter sido consultado não vicia a regularidade do procedimento em causa.

53 Daqui resulta que o recorrente não demonstrou a existência de uma irregularidade na análise comparativa dos méritos que devia ser efectuada no âmbito do procedimento de rotação em causa.

Quanto à tomada em consideração das candidaturas internas antes de se fazer apelo a candidaturas externas

54 Resulta do que antecede que, pela publicação do aviso n. 587, a AIPN recorreu a candidaturas internas no âmbito de um procedimento de rotação e que este foi encerrado em condições regulares, após uma análise comparativa válida dos méritos dos candidatos, através da decisão da AIPN de 21 de Janeiro de 1991. As candidaturas internas foram, portanto, consideradas com prioridade em relação às candidaturas externas.

55 A decisão de encerrar um procedimento de rotação sem prover a função em questão através da nomeação de um candidato interno depende da margem de apreciação de que goza nesta matéria a AIPN. Com efeito, se, segundo jurisprudência constante, a AIPN não está obrigada a dar seguimento a um processo de recrutamento iniciado em aplicação do artigo 29. do Estatuto (v., nomeadamente, o já referido acordão Hochbaum/Comissão, n. 15), este mesmo princípio deve, "a fortiori", aplicar-se por analogia ao caso em apreço.

56 No que respeita à fundamentação da decisão de não prover a função no âmbito do procedimento de rotação, resulta claramente da nota de 29 de Abril de 1991, enviada ao recorrente em resposta ao seu pedido de esclarecimento de 21 de Fevereiro de 1991, que a AIPN tomou esta decisão com base no parecer do comité de rotação, segundo o qual "nenhum dos candidatos reunia o conjunto das qualificações exigidas". O recorrente teve, pois, conhecimento atempado das razões de relevo que estiveram na base desta decisão. A fundamentação utilizada é, além disso, confirmada pelo conjunto de documentos relativos à tomada da referida decisão e apresentados pela recorrida a pedido do Tribunal. O já referido acordão Kohler/Tribunal de Contas, que respeita à situação de um candidato aprovado em concurso, não é, de qualquer modo, relevante para o presente caso.

57 Daqui resulta que nem a decisão de encerrar o processo de rotação sem prover a função em questão através da nomeação de um candidato interno, nem a de fazer apelo a candidaturas externas, se encontram viciadas de irregularidade.

58 Resulta do exposto que deve ser negado provimento ao recurso na totalidade.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

59 Por força do n. 2 do artigo 87. do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas se tal tiver sido requerido. Todavia, nos termos do artigo 88. do mesmo regulamento, as despesas efectuadas pelas instituições ficam a seu cargo nos recursos entre as Comunidades e os seus agentes.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1) É negado provimento ao recurso

2) Cada uma das partes suportará as respectivas despesas.

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