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Document 61992CJ0387

Acórdão do Tribunal de 15 de Março de 1994.
Banco de Crédito Industrial SA, actualmente Banco Exterior de España SA contra Ayuntamiento de Valencia.
Pedido de decisão prejudicial: Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana - Espanha.
Concorrência - Empresas públicas - Isenção fiscal - Abuso de posição dominante - Auxílio de Estado.
Processo C-387/92.

Colectânea de Jurisprudência 1994 I-00877

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:100

61992J0387

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 15 DE MARCO DE 1994. - BANCO DE CREDITO INDUSTRIAL SA, CONVERTIDO EM BANCO EXTERIOR DE ESPANA SA, CONTRA AYUNTAMIENTO DE VALENCIA. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: TRIBUNAL SUPERIOR DE JUSTICIA DE LA COMUNIDAD VALENCIANA - ESPANHA. - CONCORRENCIA - EMPRESAS PUBLICAS - ISENCAO FISCAL - ABUSO DE POSICAO DOMINANTE - AUXILIO DE ESTADO. - PROCESSO C-387/92.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-00877


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Auxílios concedidos pelos Estados - Conceito - Atribuição de isenção fiscal a certas empresas pelas autoridades públicas - Inclusão

(Tratado CEE, artigo 92. , n. 1)

2. Auxílios concedidos pelos Estados - Auxílios existentes e novos auxílios - Distinção também aplicável aos auxílios concedidos às empresas referidas no artigo 90. , n. 2, do Tratado - Consequência - Auxílio criado em Espanha antes da data de adesão - Qualificação como auxílio existente

(Tratado CEE, artigos 90. , n. 2, 92. e 93. )

Sumário


1. As medidas através das quais as autoridades públicas atribuem a certas empresas isenções fiscais que, não implicando embora transferência de recursos do Estado, colocam os beneficiários em situação financeira mais favorável que a dos outros contribuintes, constituem auxílios de Estado, na acepção do n. 1 do artigo 92. do Tratado.

2. A distinção traçada pelo artigo 93. do Tratado entre auxílios existentes e novos auxílios também é aplicável aos auxílios de Estado concedidos às empresas públicas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal, referidas no n. 2 do artigo 90. Daqui resulta que tal auxílio, quando se revestir da natureza de auxílio existente, pode, enquanto a Comissão não tiver declarado a sua incompatibilidade com o mercado comum, continuar a ser aplicado, independentemente de ser ou não susceptível de escapar à proibição do artigo 92. do Tratado, por força do n. 2 do artigo 90.

Deve ser aplicado o regime dos auxílios existentes a um auxílio criado em Espanha por uma lei anterior à adesão deste Estado-membro às Comunidades Europeias.

Partes


No processo C-387/92,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana (Espanha), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Banco de Crédito Industrial SA, actualmente Banco Exterior de España SA,

e

Ayuntamiento de Valencia,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 86. , 90. e 92. do Tratado CEE, bem como de certas disposições do Acto relativo às condições de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa e às adaptações dos Tratados, de 12 de Junho de 1985 (JO L 302, p. 23; Edição especial, 15 de Novembro de 1985),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: O. Due, presidente, G. F. Mancini, J. C. Moitinho de Almeida e M. Díez de Velasco, presidentes de secção, C. N. Kakouris, R. Joliet, F. A. Schockweiler (relator), G. C. Rodríguez Iglesias, M. Zuleeg, P. J. G. Kapteyn e J. L. Murray, juízes,

advogado-geral: C. O. Lenz

secretário: L. Hewlett, administradora

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação do Ayuntamiento de Valencia, por Arturo Monfort, advogado no foro de Valência,

- em representação do Governo espanhol, por Alberto José Navarro González, director-geral da Coordenação Jurídica e Institucional Comunitária, e Miguel Bravo-Ferrer Delgado, Abogado del Estado, do Serviço do Contencioso Comunitário, na qualidade de agentes,

- em representação do Governo helénico, por Vassilios Kontolaimos, consultor jurídico adjunto do Conselho Jurídico do Estado, e Ioannis Chalkias, mandatário judiciário do Conselho Jurídico do Estado, na qualidade de agentes,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Francisco Enrique González Diaz e Daniel Calleja Crespo, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações do Governo helénico, do Governo espanhol e da Comissão, na audiência de 12 de Outubro de 1993,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 11 de Janeiro de 1994,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 24 de Junho de 1991, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 29 de Outubro de 1992, o Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana (Espanha) submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, questões prejudiciais sobre a interpretação dos artigos 86. , 90. e 92. do Tratado CEE, bem como de certas disposições do Acto relativo às condições de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa e às adaptações dos Tratados, de 12 de Junho de 1985 (JO L 302, p. 23; Edição especial, 15 de Novembro de 1985, a seguir "Acto de Adesão").

2 Estas questões foram suscitadas no quadro de um litígio que opõe o Banco de Crédito Industrial SA, que se tornou, entretanto, Banco Exterior de España SA (a seguir "Banco de Crédito Industrial", ao Ayuntamiento de Valencia (a seguir "Ayuntamiento"), relativo a um aviso de liquidação do imposto municipal sobre estabelecimentos, para os exercícios fiscais de 1983 a 1986. Este imposto incidia sobre a utilização ou posse de instalações, de qualquer natureza, situadas na área do município, para fins industriais ou comerciais ou para o exercício de actividades profissionais.

3 O Banco de Crédito Industrial, que interpôs recurso para o Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana, alegou que aquele imposto era incompatível com o disposto no artigo 29. da Lei n. 13/71, de 19 de Junho de 1971, relativa à organização e ao regime do crédito público (BOE, de 21.6.1971, a seguir "Lei n. 13/71"), nos termos da qual "as instituições públicas de crédito ficarão isentas de qualquer tipo de imposto nacional, provincial ou municipal, ou criado em benefício de outro organismo ou instituição de direito público, sempre que se encontrem na situação de contribuintes dos mesmos".

4 Entendendo que a decisão do litígio dependia da interpretação de disposições de direito comunitário, o tribunal nacional decidiu submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

"Ao atribuir às instituições públicas de crédito a isenção de qualquer tipo de imposto nacional, provincial ou municipal, ou criado em benefício de outro organismo ou instituição de direito público, sempre que se encontrem na situação de contribuintes dos mesmos, o artigo 29. da Lei n. 13/71, de 19 de Junho de 1971, relativa à organização e ao regime do crédito público, está a pôr em causa o princípio da liberdade de concorrência, por conferir a uma ou várias empresas uma posição dominante abusiva no conjunto do mercado comum ou numa parte substancial deste?

Deve ser considerada incompatível com o Tratado qualquer forma de auxílio de Estado atribuído através de fundos públicos que falseie ou ameace falsear a liberdade de concorrência, ao favorecer certas empresas ou produções?

A isenção criada pelo artigo 29. da Lei n. 13/71, de 19 de Junho de 1971, relativa à organização e ao regime do crédito público, constitui uma violação do artigo 90. e, por conseguinte, dos artigos 7. e 85. a 94. do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia, celebrado em Roma em 25 de Março de 1957, e dos artigos 2. , 9. , 35. e 51. do Acto de Adesão, celebrado em Madrid e em Lisboa em 12 de Junho de 1985?"

5 Note-se, em primeiro lugar, antes de responder a estas questões, que resulta do texto do despacho do tribunal a quo que o Banco de Crédito Industrial é uma sociedade comercial anónima na qual o Estado tem uma participação indirecta através do Instituto de Crédito Oficial (ICO). Aquele tribunal entende que uma instituição oficial cujo capital pertence ao ICO e cujos regime jurídico e funções se encontram definidos, nomeadamente, nos artigos 6. e 87. da Ley General Presupuestaria (Lei de Bases Orçamentais), é uma empresa pública não submetida às regras de direito comercial nas matérias regulamentadas por aquela lei, pois, nos termos do n. 3 do respectivo artigo 6. , as instituições (e não as empresas) de direito público estão sujeitas ao direito público no que respeita ao seu programa anual de actividades, investimentos e financiamento.

6 Em segundo lugar, os artigos 35. e 51. do Acto de Adesão, integrados no capítulo relativo às medidas transitórias relativas à Espanha, no domínio da livre circulação de mercadorias, não têm qualquer relação com a fundamentação do despacho do tribunal nacional nem com os factos do litígio no processo principal.

7 Convém recordar, em terceiro lugar, que, nos termos dos artigos 2. e 9. do Acto de Adesão, as disposições dos Tratados originais e os actos adoptados pelas instituições comunitárias antes da adesão vinculam os novos Estados-membros e são aplicáveis nestes Estados desde a adesão, nas condições previstas naqueles Tratados e no próprio Acto (artigo 2. ), ressalvando as disposições derrogatórias previstas a título transitório pelo Acto (artigo 9. ).

8 Daí decorre, como foi acertadamente observado pelo Ayuntamiento, pelo Governo espanhol e pela Comissão, que as questões prejudiciais não são necessárias para apreciar a legalidade do aviso de liquidação impugnado no que respeita aos exercícios fiscais de 1983, 1984 e 1985, anteriores à adesão do Reino de Espanha às Comunidades Europeias.

9 Em quarto lugar, há que salientar que quer o quadro fáctico e regulamentar no qual se inserem as questões prejudiciais apresentadas, tal como definido no despacho de reenvio, quer as observações apresentadas pelas partes revelam que a situação objecto do litígio no processo principal se rege pelas normas do Tratado relativas aos auxílios atribuídos pelos Estados e não pelas relativas ao respeito das regras da concorrência pelas empresas.

10 Nestas condições, considera-se que as questões prejudiciais apresentadas visam essencialmente a questão de saber se o artigo 90. do Tratado, em conjugação com o artigo 92. , obsta à aplicação de legislação de um Estado-membro que atribua uma isenção fiscal a empresas públicas.

11 A este respeito, há que recordar que resulta do artigo 90. do Tratado que o artigo 92. abrange o conjunto das empresas, privadas ou públicas, e o conjunto das produções das referidas empresas, com ressalva apenas do disposto no n. 2 do artigo 90. (acórdão de 22 de Março de 1977, Steinike & Weinlig, 78/76, Recueil, p. 595, n. 18).

12 O artigo 92. do Tratado tem por objectivo evitar que as trocas comerciais entre os Estados-membros sejam afectadas por vantagens consentidas pelas autoridades públicas que, por diversas formas, falseiem ou ameacem falsear a concorrência, ao favorecer certas empresas ou certas produções (acórdão de 2 de Julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, Recueil, p. 709, n. 26).

13 Como já foi decidido pelo Tribunal de Justiça no âmbito do Tratado CECA (acórdão de 23 de Fevereiro de 1961, Steenkolenmijnen/Alta Autoridade, 30/59, Recueil, pp. 1, 39), o conceito de auxílio é mais lato do que o de subsídio, pois não se limita a abranger prestações positivas, como os próprios subsídios, compreendendo também intervenções que, de formas diversas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa, pelo que, não sendo subsídios na acepção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos.

14 Daqui decorre que as medidas através das quais as autoridades públicas atribuem a certas empresas isenções fiscais que, não implicando embora transferência de recursos do Estado, colocam os beneficiários numa situação financeira mais favorável que a dos outros contribuintes, constituem auxílios de Estado, na acepção do n. 1 do artigo 92. do Tratado.

15 Sendo estes auxílios susceptíveis de afectar as trocas comerciais entre os Estados-membros e de falsear a concorrência, são incompatíveis com o mercado comum, salvo derrogações previstas no Tratado.

16 Todavia, segundo jurisprudência constante (v., nomeadamente, o acórdão de 17 de Março de 1993, Sloman Neptun, C-72/91 e C-73/91, Colect., p. I-887, n. 11), o Tratado, ao organizar, no artigo 93. , o exame permanente e o controlo dos auxílios pela Comissão, entende que o reconhecimento da eventual incompatibilidade de determinado auxílio com o mercado comum resulta, sob controlo do Tribunal de Justiça, de um procedimento apropriado, cabendo à Comissão dar-lhe início.

17 Esta competência da Comissão também abrange os auxílios de Estado concedidos às empresas referidas no n. 2 do artigo 90. , nomeadamente aquelas que os Estados-membros encarregaram da gestão de serviços de interesse económico geral.

18 Daqui resulta que a distinção traçada pelo artigo 93. do Tratado entre auxílios existentes e novos auxílios também é aplicável aos auxílios de Estado concedidos às empresas referidas no n. 2 do artigo 90.

19 A este respeito, há que referir que o auxílio em questão no processo principal foi criado por uma lei anterior à adesão do Reino de Espanha às Comunidades Europeias. Constitui assim um auxílio já existente, do mesmo modo que os auxílios existentes nos Estados-membros iniciais à data da entrada em vigor do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia.

20 Ora, os auxílios existentes podem continuar a ser prestados, enquanto a Comissão não tenha declarado a sua incompatibilidade com o mercado comum (v. acórdão de 30 de Junho de 1992, Itália/Comissão, C-47/91, Colect., p. I-4145, n. 25).

21 Daqui resulta que, enquanto a Comissão não tiver declarado que o auxílio existente é incompatível com o mercado comum, não é necessário examinar se, e em que medida, este auxílio é susceptível de escapar à proibição do artigo 92. , por força do n. 2 do artigo 90.

22 Deve assim responder-se às questões colocadas que uma medida através da qual um Estado-membro atribui uma isenção fiscal a empresas públicas constitui um auxílio de Estado, na acepção do n. 1 do artigo 92. do Tratado; quando se tratar de um auxílio já existente, pode continuar a ser prestado, enquanto a Comissão não declarar a sua incompatibilidade com o mercado comum.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

23 As despesas efectuadas pelos Governos espanhol e helénico e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana, por despacho de 24 de Junho de 1991, declara:

Uma medida através da qual um Estado-membro atribui uma isenção fiscal a empresas públicas constitui um auxílio de Estado, na acepção do n. 1 do artigo 92. do Tratado CEE; quando se tratar de um auxílio já existente, pode continuar a ser prestado, enquanto a Comissão não declarar a sua incompatibilidade com o mercado comum.

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