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Document 61992CJ0320

Acórdão do Tribunal (Segunda Secção) de 15 de Dezembro de 1994.
Società Finanziaria Siderurgica Finsider SpA (in liquidazione) contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso CECA - Quota de aço que pode ser produzido e entregue no mercado comum - Ultrapassagem.
Processo C-320/92 P.

Colectânea de Jurisprudência 1994 I-05697

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:414

61992J0320

ACORDAO DO TRIBUNAL (SEGUNDA SECCAO) DE 15 DE DEZEMBRO DE 1994. - SOCIETA FINANZIARIA SIDERURGICA FINSIDER SPA (IN LIQUIDAZIONE) CONTRA COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - RECURSO CECA - QUOTA DE ACO QUE PODE SER PRODUZIDO E ENTREGUE NO MERCADO COMUM - ULTRAPASSAGEM. - PROCESSO C-320/92 P.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-05697


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Recurso de anulação ° Acórdão de anulação ° Alcance ° Anulação do artigo 5. da Decisão n. 194/88/CECA

(Tratado CECA, artigo 33. ; Decisão geral n. 194/88, artigo 5. )

2. CECA ° Produção ° Regime de quotas de produção e fornecimento de aço ° Ultrapassagem das quotas ° Recurso de plena jurisdição de decisão que aplica uma sanção pecuniária ° Possibilidade de o Tribunal impor à Comissão que, para cálculo da ultrapassagem, tenha em conta o prejuízo sofrido pela empresa em consequência do acto anulado ° Exclusão ° Reparação do prejuízo nos termos do processo previsto no artigo 34. do Tratado CECA

(Tratado CECA, artigos 34. e 36. )

3. CECA ° Produção ° Regime de quotas de produção e fornecimento de aço ° Ultrapassagem das quotas ° Pedido de antecipação de quotas do trimestre seguinte ° Fim do regime ° Pedido sem objecto

[Decisão geral n. 194/88, artigo 11. , n. 3, alínea e)]

4. Recurso ° Fundamentos ° Fundamentos de um acórdão que violam o direito comunitário ° Dispositivo baseado em outros fundamentos de direito ° Indeferimento

5. Recurso ° Competência do Tribunal de Justiça ° Apreciação efectuada pelo Tribunal sobre o montante de uma sanção pecuniária aplicada a uma empresa, posta em causa por razões de equidade ° Exclusão

Sumário


1. Do facto de o Tribunal de Justiça não ter anulado o artigo 5. da Decisão n. 194/88, que prorroga o sistema de vigilância e de quotas de produção de certos produtos para as empresas da indústria siderúrgica, enquanto conferia à Comissão o poder de fixar as quotas, mas apenas na medida em que não permitia fixar quotas de fornecimento numa base que a Comissão considerava equitativa para as empresas cuja relação entre a quota de produção e a quota de fornecimento fosse sensivelmente inferior à média comunitária, resulta que a Comissão dispunha de base jurídica para fixar as quotas para 1988 dentro do respeito pelo imperativo de equidade, e que essas quotas podiam ser utilizadas a fim de determinar se uma empresa excedeu a quantidade que lhe fora concedida.

2. No âmbito de um recurso de plena jurisdição, nos termos do artigo 36. do Tratado CECA, contra uma sanção pecuniária aplicada pela ultrapassagem de quotas de produção e de fornecimento de aço, o órgão jurisdicional comunitário não pode obrigar a Comissão a ter em consideração, no cálculo da ultrapassagem da quota imputada a uma empresa, os efeitos da anulação de um acto que causou prejuízo a essa empresa.

Efectivamente, as consequências da anulação desse acto enquadram-se no artigo 34. do Tratado CECA, nos termos do qual a Comissão deve tomar as medidas adequadas para reparação do prejuízo directo e específico eventualmente causado por um acto susceptível de acarretar a responsabilidade de Comunidade, só podendo a empresa propor uma acção de indemnização caso a Comissão não haja cumprido a obrigação que lhe incumbe nos termos de tal disposição.

3. Embora nos termos do artigo 11. , n. 3, alínea e), da Decisão n. 194/88, que prorroga o sistema de vigilância e de quotas de produção de certos produtos para as empresas da indústria siderúrgica, a Comissão pudesse, em princípio, conceder uma antecipação de quotas relativamente às quotas do trimestre seguinte, não podia, pelo contrário, ser a mesma concedida no decurso do segundo trimestre de 1988, dado que o sistema de quotas terminou em 30 de Junho de 1988. O artigo 11. , n. 3, alínea e), ficou assim esvaziado de conteúdo a partir do fim do primeiro trimestre, e a Comissão já não tinha competência para, no fim desse período, adoptar uma decisão autorizando ou recusando uma antecipação.

4. Embora os fundamentos de um acórdão do Tribunal de Primeira Instância mostrem uma violação do direito comunitário, se a sua parte decisória se mostrar fundada por diferentes razões jurídicas, deve ser negado provimento ao recurso dele interposto.

5. Não compete ao Tribunal de Justiça, quando se pronuncia sobre questões de direito no âmbito de um recurso, substituir-se, por razões de equidade, à apreciação do Tribunal de Primeira Instância e, no exercício da sua competência de plena jurisdição, decidir sobre o montante da multa aplicada a uma empresa por esta ter violado o direito comunitário.

Partes


No processo C-320/92 P,

Finanziaria Siderurgica Finsider SpA, em liquidação, com sede social em Roma, representada por G. Greco, advogado no foro de Milão, e N. Schaeffer, advogado no foro do Luxemburgo, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório deste último, 12, avenue de la Porte-Neuve,

recorrente,

que tem por objecto um recurso em que se pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Primeira Secção) de 5 de Junho de 1992, Finsider/Comissão (T-26/90, Colect., p. II-1789),

sendo recorrida:

Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. Aresu, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Georgios Kremlis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: F. A. Schockweiler, presidente de secção, G. F. Mancini e J. L. Murray (relator), juízes,

advogado-geral: M. Darmon

secretário: R. Grass

visto o relatório do juiz-relator,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 15 de Dezembro de 1993,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 28 de Julho de 1992, a Finanziaria Siderurgica Finsider SpA (a seguir "Finsider") interpôs, nos termos do artigo 49. do Estatuto CECA do Tribunal de Justiça, recurso do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Junho de 1992, Finsider/Comissão (T-26/90, Colect., p. II-1789), na medida em que este acórdão, por um lado, não anulou a decisão da Comissão de 21 de Março de 1990 que aplicou à recorrente uma multa pela ultrapassagem das quotas e, por outro, não reduziu o montante da referida multa.

2 Resulta do acórdão recorrido (n.os 1 e 9) que a Decisão n. 2794/80/CECA da Comissão, de 31 de Outubro de 1980 (JO L 291, p. 1), instituiu um regime de quotas de produção para determinados produtos siderúrgicos. Este regime foi prorrogado para os anos de 1986 e 1987 pela Decisão n. 3485/85/CECA da Comissão, de 27 de Novembro de 1985 (JO L 340, p. 5; EE 08 F3 p. 35) e, para os seis primeiros meses do ano de 1988, pela Decisão n. 194/88/CECA da Comissão, de 6 de Janeiro de 1988, que prorroga o sistema de vigilância e de quotas de produção de certos produtos para as empresa da indústria siderúrgica (JO L 25, p. 1, a seguir "Decisão n. 194/88"). Tal sistema terminou em 30 de Junho de 1988.

3 Em 9 de Junho de 1988, a Finsider pediu à Comissão autorização para produzir e entregar no mercado comum, durante o segundo trimestre de 1988, uma quantidade de aço superior à quota atribuída para esse período (n. 7 do acórdão recorrido).

4 O pedido era baseado no artigo 11. , n. 3, alínea e), da Decisão n. 194/88, que permite à Comissão, mediante determinadas condições, autorizar uma empresa a antecipar durante um trimestre uma parte das quotas previstas para o trimestre seguinte.

5 Com base no artigo 58. , n. 4, do Tratado CECA, a Comissão, por decisão de 21 de Março de 1990, declarou que a Finsider ultrapassou as quotas que lhe foram atribuídas para o segundo trimestre de 1988, sem para isso estar autorizada. Como penalidade, aplicou-lhe uma multa de 2 153 550 ecus (n. 31 do acórdão recorrido).

6 Em 18 de Maio de 1990, a Finsider interpôs no Tribunal de Primeira Instância um recurso tendo por objecto a anulação daquela decisão e, a título subsidiário, uma redução da multa. O Tribunal de Primeira Instância negou provimento ao pedido quanto a todos os seus fundamentos por acórdão de 5 de Junho de 1992, contra o qual a Finsider interpôs o presente recurso.

7 Em apoio do recurso, a Finsider, no essencial, alega que o Tribunal de Primeira Instância:

° ignorou o acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Junho de 1989, Hoogovens Groep e o./Comissão (218/87, 223/87, 72/88 e 92/88, Colect., p. 1711), pelo qual foram anulados os artigos 5. e 17. da Decisão n. 194/88;

° violou o princípio da confiança legítima;

° interpretou erradamente o artigo 11. , n. 3, alínea e), da Decisão n. 194/88;

° declarou que a decisão da Comissão estava suficientemente fundamentada;

° considerou que o pedido de antecipação de quotas podia ser indeferido tacitamente;

° considerou que a Comissão lhe comunicou dados suficientes para demonstrar a ultrapassagem das quotas e

° indeferiu o pedido de redução do montante da multa.

Quanto ao primeiro fundamento

8 No primeiro fundamento, a Finsider alega que o Tribunal de Primeira Instância ignorou o acórdão Hoogovens Groep e o./Comissão, já referido, pelo qual o Tribunal de Justiça anulou os artigos 5. e 17. da Decisão n. 194/88.

9 A primeira destas disposições tinha a seguinte redacção:

"1. A Comissão fixará trimestralmente, para cada empresa, as quotas de produção e a parte de tais quotas que pode ser entregue no mercado comum:

° com base nas produções e quantidades de referência mencionadas no n. 4 do artigo 4. e no artigo 6. ,

° aplicando a tais produções e quantidades de referência as taxas de redução referidas no artigo 8.

2. A Comissão pode proceder, se necessário, até ao limite fixado no n. 3 do artigo 4. , ao ajustamento das quotas fixadas nos termos do n. 1."

10 No entender da Finsider, esta disposição constitui a base legal que permite à Comissão fixar as quotas de aço para os dois primeiros trimestres de 1988. Uma vez que a mesma foi anulada pelo acórdão Hoogovens Groep e o./Comissão, já referido, as quotas fixadas para 1988 perderam toda a validade, tornando assim impossível a verificação de qualquer ultrapassagem.

11 A esse respeito, deve salientar-se, tal como o fez o Tribunal de Primeira Instância, que, no acórdão Hoogovens Groep e o./Comissão, já referido, n. 26, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 5. da Decisão n. 194/88 retomava o teor do artigo 5. da Decisão n. 3485/85, já referida, e, consequentemente, decidiu que o primeiro destes artigos devia ser anulado pelas mesmas razões que levaram à anulação do segundo pelo acórdão de 14 de Julho de 1988, Peine-Salzgitter e o./Comissão (33/86, 44/86, 110/86, 226/86 e 285/86, Colect., p. 4309).

12 Ora, por este último acórdão, o artigo 5. não foi anulado enquanto conferia à Comissão o poder de fixar as quotas, mas apenas na medida em que não permitia fixar quotas de fornecimento numa base que a Comissão considerava equitativa para as empresas cuja relação entre a quota de produção e a quota de fornecimento seja sensivelmente inferior à média comunitária.

13 Daqui resulta que a Comissão podia fixar as quotas para 1988 dentro do respeito pelo imperativo de equidade realçado pelo Tribunal de Justiça, que essas quotas podiam ser utilizadas a fim de determinar se a Finsider excedera a quantidade que lhe fora concedida e, por isso, que, ao contrário do que entende a Finsider, o Tribunal de Primeira Instância não ignorou o acórdão Hoogovens Groep e o./Comissão, já referido.

14 A segunda disposição a que a Finsider se refere no seu primeiro fundamento, ou seja, o artigo 17. da Decisão n. 194/88, igualmente anulado pelo acórdão Hoogovens Groep e o./Comissão, já referido, autorizava as empresas a converter em quotas de fornecimento uma parte da diferença entre as quotas de produção e de fornecimento que lhes estavam atribuídas:

"As empresas ficam autorizadas a converter, para cada trimestre, numa categoria de produtos que determinarão e na relação 1:0,85, uma parte da diferença entre a quota de produção resultante da produção de referência e a parte da quota resultante da quantidade de referência que pode ser fornecida dentro do mercado comum em quotas que podem ser fornecidas dentro do mercado comum."

15 No Tribunal de Primeira Instância, a Finsider afirmou que a aplicação desta disposição durante o período de Janeiro de 1987 a 30 de Junho de 1988 permitiu a determinadas empresas aumentarem os seus fornecimentos de aço e que o acréscimo de concorrência no mercado comum lhe tinha provocado uma importante quebra nos fornecimentos. Uma vez que o artigo 17. foi anulado pelo Tribunal de Justiça, a Comissão devia ter efectuado uma compensação entre a ultrapassagem de quotas imputada à Finsider e a perda de fornecimentos que sofreu.

16 Respondendo a esta argumentação, o Tribunal de Primeira Instância observou que a Comissão teve em conta as consequências da anulação do artigo 17. ao diminuir, durante esse período e relativamente às duas categorias de produtos referidos na decisão, as ultrapassagens inicialmente calculadas (n. 65 in fine do acórdão recorrido).

17 No âmbito do recurso, a Finsider alega que a Comissão deveria também ter tomado em consideração as reduções de fornecimentos originadas pela aplicação do artigo 17. durante outros períodos para além do segundo trimestre de 1988 e relativas a outras categorias não referidas na decisão. Ao negar provimento a este pedido, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito.

18 A este respeito, há que lembrar os termos do artigo 34. do Tratado CECA:

"Em caso de anulação, o Tribunal devolverá o processo à Alta Autoridade. A Alta Autoridade deve tomar as medidas necessárias à execução da decisão de anulação. Em caso de dano directo e especial sofrido por uma empresa ou grupo de empresas, causado por uma decisão ou recomendação que o Tribunal considere como envolvendo culpa susceptível de determinar a responsabilidade da Comunidade, a Alta Autoridade deve, no uso dos poderes que lhe são conferidos pelas disposições do presente Tratado, tomar as medidas adequadas para garantir uma reparação equitativa do dano directamente resultante da decisão ou da recomendação anulada e atribuir, quando necessário, uma justa indemnização.

Se a Alta Autoridade se abstiver de tomar, em prazo razoável, as medidas exigidas pela execução de uma decisão de anulação, pode ser apresentado ao Tribunal um pedido de indemnização."

19 Desta disposição resulta que a Comissão deve adoptar as medidas adequadas a reparar o prejuízo eventualmente causado por um acto susceptível de acarretar a responsabilidade da Comunidade.

20 Tal como o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão de 23 de Fevereiro de 1961, De Gezamenlijke Steenkolenmijnen in Limburg/Alta Autoridade (30/59, Recueil, p. 3), não lhe compete determinar à Alta Autoridade quais as decisões que um acórdão de anulação deve acarretar, devendo limitar-se a remeter o processo a esta última.

21 A redacção do artigo 34. indica também que, se a Comissão não der cumprimento à obrigação que lhe incumbe nos termos dessa disposição, a empresa pode propor uma acção de indemnização. Nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça, terá de demonstrar a existência da culpa, de um prejuízo e de um nexo de causalidade, não bastando a mera ilegalidade do acto anulado para acarretar a responsabilidade da Comunidade (v. acórdão de 30 de Janeiro de 1992, Finsider e o./Comissão, C-363/88 e C-364/88, Colect., p. I-359).

22 Destas considerações resulta que o órgão jurisdicional comunitário não pode obrigar a Comissão a ter em consideração, no cálculo da ultrapassagem da quota imputada a uma empresa, efeitos da anulação de um acto que causou prejuízo a essa empresa. A competência do mesmo órgão jurisdicional, quando tem que decidir numa acção de indemnização, limita-se a ser a de verificar se estão preenchidas as condições para obtenção da reparação, ou seja, a culpa, o prejuízo e o nexo de causalidade.

23 O Tribunal de Primeira Instância entendeu, assim, correctamente que "não compete ao Tribunal de Primeira Instância impor à Comissão... a forma como deverá tomar as medidas que a execução do acórdão de anulação do Tribunal de Justiça implica" no âmbito do artigo 34. do Tratado CECA (n. 65 do acórdão recorrido).

24 Daqui resulta que deve ser negado provimento ao primeiro fundamento.

Quanto ao segundo fundamento

25 Em segundo lugar, a Finsider alega que o Tribunal de Primeira Instância entendeu erradamente que a recorrente tinha conhecimento de que as antecipações seriam, em princípio, recusadas no caso de ulterior supressão das quotas e que, nestas condições, não podia legitimamente julgar-se autorizada a ultrapassar a quota que lhe tinha sido fixada. Ao adoptar esta posição, o Tribunal de Primeira Instância violou o princípio da confiança legítima.

26 A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância, no âmbito do seu poder de apreciação da matéria de facto, declarou que "a recorrente não (pode) pretender ter sido surpreendida pelo fim do regime de quotas visto que a Comissão tinha claramente afirmado nos considerandos da sua Decisão n. 194/88 que mantinha o regime de quotas durante dois trimestres suplementares para certos produtos, mas acompanhado de uma 'atenuação das quotas no segundo trimestre a título de preparação da liberalização (do mercado) a partir de 30 de Junho de 1988' " (n. 97). Esta declaração constitui uma base suficiente para se considerar que o princípio da confiança legítima não foi violado.

27 A Finsider alega ainda que "certamente foram concedidas a outras empresas antecipações deste tipo... com base em decisões formais da Comissão" e que "se trata de factos completamente ignorados pelo acórdão objecto do recurso".

28 A este respeito, há que realçar que em nenhum momento a Finsider apresentou qualquer elemento de facto susceptível de demonstrar o que alega e que, além disso, não compete ao Tribunal de Justiça, quando se pronuncia sobre questões de direito no âmbito de um recurso, decidir sobre a matéria de facto que lhe pode ser apresentada pelas partes.

29 Deve, por isso, ser negado provimento ao segundo fundamento.

Quanto aos terceiro, quarto e quinto fundamentos

30 Os terceiro, quarto e quinto fundamentos têm a ver com a decisão de 21 de Março de 1990 que aplicou à Finsider uma penalidade pela ultrapassagem das quotas, na medida em que esse acto constituiu uma "decisão" de indeferimento adoptada pela Comissão relativamente ao pedido de antecipação de quotas. No critério da Finsider, o Tribunal de Primeira Instância considerou erradamente que essa "decisão" era conforme ao artigo 11. , n. 3, alínea e), da Decisão n. 194/88, estava suficientemente fundamentada e podia ser adoptada tacitamente.

31 Quanto a este ponto, deve desde logo salientar-se que a decisão de 21 de Março de 1990 mais não faz, por um lado, que constatar, relativamente à Finsider, uma ultrapassagem das quotas contrária à Decisão n. 194/88 e, por outro, em consequência dessa ultrapassagem, aplicar uma penalidade a essa sociedade (v. artigos 1. e 2. da referida decisão).

32 Por outro lado, deve salientar-se que, nos termos do quarto considerando da Decisão n. 194/88, "um regresso imediato às regras de mercado envolveria o risco de provocar uma diminuição dos preços demasiado brusca" e "afigura-se por conseguinte justificado continuar a manter aqueles produtos ainda durante dois trimestres no sistema de quotas...". Deste modo, o sistema de quotas terminou em 30 de Junho de 1988.

33 Nos termos do artigo 11. , n. 3, alínea e), da mesma decisão, pode ser permitida uma antecipação sobre as quotas do trimestre seguinte. Isto pressupõe que a Comissão fixe quotas para esse trimestre ulterior. Esta interpretação impõe-se, aliás, face ao objectivo da disposição, que é o de introduzir uma certa flexibilidade no sistema de quotas sem com isso, sob pena de ofensa ao mesmo regime, permitir um aumento da quantidade de aço que pode ser produzida e/ou fornecida por determinada empresa.

34 Daqui resulta que, tendo o sistema de quotas terminado em 30 de Junho de 1988, não podia ser concedida qualquer antecipação durante o segundo trimestre de 1988. O artigo 11. , n. 3, alínea e), já referido, ficou assim esvaziado de conteúdo a partir do fim do primeiro trimestre, e a Comissão já não tinha competência para, no termo desse período, adoptar uma decisão autorizando ou recusando uma antecipação.

35 Em resposta ao pedido de antecipação apresentado pela Finsider, a Comissão não podia senão recordar a esta sociedade que o sistema de quotas terminava no final do segundo trimestre de 1988, sem que esse acto de informação possa ser considerado como "uma decisão" na acepção do artigo 14. do Tratado CECA. Foi, aliás, neste sentido que um chefe de divisão da Comissão enviou à Finsider, em 2 de Agosto de 1988, uma carta do seguinte teor:

"Desejamos informar que o referido artigo [11. , n. 3, alínea e), da Decisão n. 194/88] permite 'uma antecipação' de quotas: isso implica a condição de que sejam concedidas quotas para os trimestres seguintes. Uma vez que o sistema de quotas já não estará em vigor a partir do mês de Junho, o artigo 11. , n. 3, alínea e), já não é aplicável" (v. n. 11 do acórdão impugnado).

36 Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao considerar, no n. 71 do acórdão impugnado, que "a decisão em litígio, ao indicar a medida da ultrapassagem verificada e o montante da multa aplicada no âmbito do processo em questão, constitui uma decisão tácita mas inequívoca de indeferimento das antecipações pedidas pela recorrente".

37 Todavia, embora os fundamentos de um acórdão do Tribunal de Primeira Instância mostrem uma violação do direito comunitário, se a sua parte decisória se mostrar fundada, por diferentes razões jurídicas, deve ser negado provimento ao recurso dele interposto (acórdão de 9 de Junho de 1992, Lestelle/Comissão, C-30/91 P, Colect., p. I-3755, n. 28).

38 É o que sucede no caso presente, dado que, como o Tribunal de Justiça declarou que a Comissão não adoptou uma decisão sobre o pedido de antecipação, o que aliás nem podia fazer, os fundamentos invocados contra a decisão de 21 de Março de 1990, já referida, na parte em que, no entender da Finsider, implica o indeferimento do pedido de antecipação por si apresentado, carecem de objecto.

Quanto ao sexto fundamento

39 Em sexto lugar, a Finsider afirma que o Tribunal de Primeira Instância considerou erradamente que a Comissão lhe comunicou dados suficientes para demonstrar a ultrapassagem das quotas. No entender da recorrente, a Comissão devia também ter-lhe transmitido cópia dos cálculos efectuados, ou uma acta que reproduzisse os elementos de cálculo referidos durante a reunião bilateral onde foi discutida a ultrapassagem.

40 A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância considerou que "a Comissão, através da sua carta de 23 de Fevereiro de 1989... expôs os cálculos que a levaram a declarar uma ultrapassagem das quotas por parte da recorrente relativamente ao segundo trimestre do ano de 1988. Na sequência dessa carta, a recorrente pôde apresentar as suas observações nas reuniões de 3 de Março, de 24 de Maio de 1989 e de 24 de Janeiro de 1990 e nas suas cartas de 15 de Março, de 12 de Junho, de 14 de Julho, de 1 de Agosto e de 8 de Setembro de 1989 e de 7 de Fevereiro de 1990. Seguidamente, a Comissão tomou em conta no acto impugnado as observações da recorrente no que respeita à aplicação do artigo 7. da Decisão n. 194/88, do que a informou por carta de 5 de Junho de 1989. Pelo contrário, recusou, com razão, considerar as antecipações pedidas nos termos do artigo 11. , n. 3, alínea e), da referida decisão, o que resulta da acta da reunião de 24 de Maio de 1989. Da mesma forma, recusou, com razão, tomar em conta no âmbito do presente processo os efeitos do acórdão anulatório de 14 de Junho de 1989 na parte em que não dizem respeito ao segundo trimestre do ano de 1988 e às categorias de produtos em questão (Ia e Ib). Além disso, na audiência, as partes concordaram sobre o facto de a Comissão ter mostrado à recorrente, na reunião informal de 24 de Janeiro de 1990, os cálculos que tinha efectuado com vista a determinar a importância das quotas de que a recorrente tinha sido privada em virtude da aplicação do artigo 17. da Decisão n. 194/88, posteriormente anulado pelo Tribunal de Justiça, em particular no que diz respeito às categorias de produtos e ao trimestre em questão" (n. 108).

41 Desta matéria de facto, que lhe cabe apreciar (v., designadamente, o acórdão de 1 de Outubro de 1991, Vidrány/Comissão, C-283/90 P, Colect., p. I-4339, n. 12), o Tribunal de Primeira Instância deduziu correctamente que a Comissão "deu à recorrente a possibilidade de apresentar as suas observações quanto à alegada ultrapassagem" (n. 108).

42 Daqui resulta que deve ser negado provimento ao sexto fundamento.

Quanto à recusa ilegítima de reduzir o montante da multa

43 Por último, a Finsider salienta que o Tribunal indeferiu o pedido de redução da multa, por um lado, baseando-se em fundamentos diferentes dos avançados pela Comissão, apesar de a alteração de fundamentos ser contrária ao direito comunitário e, por outro, sem tomar em conta o argumento relativo à violação da confiança legítima.

44 A este respeito, basta observar que o Tribunal de Primeira Instância, no acórdão recorrido, respondeu aos argumentos apresentados pela Finsider em apoio do pedido de redução da multa e que, como tinha rejeitado a acusação de violação do princípio da confiança legítima, tomou em conta todos os elementos relevantes para a apreciação do montante da multa. Foi, por isso, correctamente que, no exercício deste poder de apreciação, considerou "que não deve ser reduzida a multa aplicada à recorrente" (n. 114 do acórdão impugnado).

45 A título subsidiário, a Finsider pede ao Tribunal de Justiça que reconsidere o montante da multa, tendo em conta os argumentos que lhe foram apresentados no âmbito do presente recurso, sem, para isso, anular o acórdão do Tribunal de Primeira Instância por erro de direito.

46 Porém, não compete ao Tribunal de Justiça, quando se pronuncia sobre questões de direito no âmbito de um recurso, interposto de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, substituir-se, por razões de equidade, à apreciação deste, e, no exercício da sua competência de plena jurisdição, decidir sobre o montante da multa aplicada a uma empresa por esta ter violado o direito comunitário.

47 Daqui resulta que devem ser rejeitados os argumentos apresentados pela Finsider em apoio da redução do montante da multa.

48 Face a estas considerações, deve ser negado provimento ao recurso na sua totalidade.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

49 Por força do disposto no artigo 69. , n. 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

decide:

1) É negado provimento ao recurso.

2) A recorrente é condenada nas despesas.

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