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Document 61988CJ0030

Acórdão do Tribunal de 14 de Novembro de 1989.
República Helénica contra Comissão das Comunidades Europeias.
Projectos de financiamento no âmbito da ajuda especial à Turquia.
Processo 30/88.

Colectânea de Jurisprudência 1989 -03711

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1989:422

61988J0030

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 14 DE NOVEMBRO DE 1989. - REPUBLICA HELENICA CONTRA COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - PROJECTOS DE FINANCIAMENTO NO AMBITO DA AJUDA ESPECIAL A TURQUIA. - PROCESSO 30/88.

Colectânea da Jurisprudência 1989 página 03711


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

Acordos internacionais - Acordo de associação CEE-Turquia - Ajuda especial à Turquia no âmbito da associação - Modalidades de aplicação - Fixação por decisão do conselho de associação - Definição das modalidades de utilização da ajuda e aprovação de projectos concretos - Competência exclusiva da Comissão no respeito dos critérios indicados pela delegação da Comunidade no conselho de associação - Recurso a consultas - Legalidade

(Acordo de associação CEE-Turquia, artigos 7.° e 22.°)

Sumário


A Decisão n.° 2/80 do conselho de associação definiu com rigor as condições de execução da ajuda especial à Turquia concedida pela Comunidade no âmbito do acordo de associação CEE-Turquia, não necessitando a execução da dita decisão da adopção de medidas complementares a nível comunitário.

Da Decisão n.° 2/80, já citada, resulta que, com base nos critérios indicados pela delegação da Comunidade no conselho de associação, a Comissão tem exclusiva competência para definir as modalidades de utilização da ajuda e aprovar projectos concretos. Esta competência implica a possibilidade de instituir processos especiais para exame de projectos específicos. A Comissão pode, pois, solicitar, tanto ao Conselho como aos Estados-membros, os pareceres necessários à gestão da ajuda, consultar peritos e recorrer aos processos estabelecidos em sectores similares.

Partes


No processo 30/88,

República Helénica, representada por G. Kranidiotis, sécretaire spécial no Ministério dos Negócios Estrangeiros, assistido por S. Perrakis, professor universitário, S. Zisimopoulos, especialista no Serviço das Comunidades Europeias no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e C. Samonis, membro do Serviço do Contencioso das Comunidades Europeias no Ministério dos Negócios Estrangeiros, com domicílio escolhido na embaixada da República Helénica, 117, Val Sainte-Croix, no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por P. J. Kuiper, membro do seu Serviço Jurídico, assistido por S. Afendras, advogado de Atenas, com domicílio escolhido no gabinete de G. Kremlis, membro do Serviço Jurídico da Comissão, Centro Wagner, Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto a anulação de três decisões em que a Comissão aprovou, a 17 de Novembro e 10 de Dezembro de 1987, projectos de financiamento no âmbito da ajuda especial à Turquia,

O TRIBUNAL,

constituído pelos Srs. O. Due, presidente, Sir Gordon Slynn, C. N. Kakouris, F. A. Schockweiler e M. Zuleeg, presidentes de Secção, T. Koopmans, G. F. Mancini, R. Joliet, T. F. O' Higgins, J. C. Moitinho de Almeida, G. C. Rodríguez Iglesias, F. Grévisse e Díez de Velasco, juízes,

advogado-geral: G. Tesauro

secretário:J. -G. Giraud

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 25 de Abril de 1989,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 4 de Julho de 1989,

profere o presente,

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal em 27 de Janeiro de 1988, a República Helénica interpôs, nos termos do artigo 173.°, n.° 1, do Tratado CEE, recurso de anulação de três decisões da Comissão de 17 de Novembro e 10 de Dezembro de 1987, relativas a projectos de financiamento nos termos de uma ajuda especial à Turquia.

2 Resulta do processo que, em 1979, a Comunidade se declarou disposta a considerar uma acção específica a favor da Turquia - sob a forma de donativos num montante de 75 milhões de ecus em dois anos - destinada a financiar acções de cooperação. O conselho de associação CEE-Turquia tomou conhecimento da concessão por parte da Comunidade de uma ajuda excepcional de 75 milhões de ecus à Turquia e definiu as condições de execução dessa ajuda (Decisão n.° 2/80 do conselho de associação). A decisão tem a seguinte redacção:

"1) Para a aplicação da ajuda excepcional de 75 milhões de unidades de conta europeias postas à disposição da Turquia pela Comunidade, a Turquia e a Comunidade cooperarão no comité de associação.

2) Para a apresentação de projectos específicos a Turquia dirigir-se-á directamente à Comissão, que procede ao seu exame à luz dos critérios indicados pela delegação da Comunidade no conselho de associação para a utilização da ajuda excepcional.

3) A Comunidade informará a Turquia da sequência dada aos seus pedidos.

4) O conselho de associação acompanhará a aplicação da ajuda. Para esse efeito reunir-se-á a pedido de qualquer das partes.

5) A presente decisão entra em vigor em 1 de Julho de 1980."

3 Nos termos de uma "declaração do Conselho quanto à execução no plano interno da Decisão n.° 2/80", que consta da acta da sessão de 30 de Junho de 1980, "o Conselho acordou, no que respeita ao

processo de aprovação dos projectos, aplicar a da execução dos protocolos financeiros celebrados com os países do Mediterrâneo". Este "processo ad hoc" prevê que apenas os projectos de financiamento transmitidos pela Comissão e pelo Banco Europeu de Investimento, que obtiveram a unanimidade favorável no grupo ad hoc criado nessa altura, podem ser tomados em consideração. Três projectos a título de ajuda especial foram instruídos pela Comissão e aprovados, em Julho de 1981, segundo o processo ad hoc.

4 Face à evolução da política interna na Turquia, a Comunidade decidiu, no fim de 1981, congelar as suas relações com este país, sobretudo na área da cooperação financeira. A ajuda especial foi suspensa quando já existiam compromissos de 46 milhões de eCUs. Permaneciam, portanto, disponíveis 29 milhões.

5 Após o reatamento das relações entre a Comunidade e a Turquia em 1986, a Comissão convidou este Estado a submeter-lhe projectos susceptíveis de obterem financiamento através de novos créditos nos termos da ajuda especial. Quando a Turquia respondeu a este convite, a Comissão entendeu que o processo ad hoc para aprovação de projectos apresentados para a aplicação de protocolos financeiros com países mediterrânicos já não estava em vigor dado que, entretanto, o Conselho tinha adoptado o Regulamento n.° 3973/86, de 22 de Dezembro de 1986, relativo à aplicação dos protocolos sobre a cooperação financeira e técnica celebrados pela Comunidade com a Argélia, Marrocos, Tunísia, Egipto, Líbano, Jordânia, Síria, Malta e Chipre (JO L 370, p. 5).

6 Aquando da adopção deste último regulamento, o Conselho e a Comissão declararam, de facto, que este "não pode em caso algum constituir um precedente para a aplicação de outros protocolos financeiros que não os considerados pelo regulamento" e que "o processo para aplicação de outros protocolos será aprovado em função dos méritos próprios de cada um". A Comissão, contudo, entendeu que era conveniente aproveitar a experiência dos Estados-membros na área de projectos de desenvolvimento nos países do Mediterrâneo e, por conseguinte, decidiu consultá-los na qualidade de "membros" do "comité do artigo 6.°" do Regulamento n.° 3673/86, sem para tanto aplicar os processos deste comité.

7 A Comissão inscreveu três projectos de ajuda a favor da Turquia na ordem de trabalhos do "comité do artigo 6.°", a saber, um projecto Business-week CEE-Turquia, um programa de luta contra o paludismo na região costeira do Mediterrâneo oriental na Turquia e um relativo à exploração de energia geotérmica na Anatólia ocidental. Apesar das objecções formuladas pela delegação grega quanto à ilegalidade do processo adoptado, os projectos foram objecto de pareceres favoráveis, por parte dos membros do comité, por maioria qualificada. Por decisões de 17 de Novembro e 10 de Dezembro de 1987, a Comissão aprovou o financiamento desses projectos, a título de ajuda especial.

8 Para mais ampla exposição dos factos, tramitação processual e fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação do Tribunal.

9 A República Helénica invoca quatro fundamentos em apoio do seu recurso, a saber, falta de fundamento legal, violação do direito comunitário, violação de formalidades essenciais, uso indevido de processo e incompetência da Comissão para os actos impugnados.

Quanto à invocação da falta de fundamento legal

10 O Governo helénico sustenta resultar da conjugação do artigo 2.°, n.° 1, do Acordo 64/737/CEE, relativo às medidas a adoptar e aos processos a seguir na aplicação do acordo que criou uma associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia (JO 1964, 217, p. 3703, a seguir "acordo intergovernamental") com os artigos 7.° e 22.° do Acordo de Associação CEE-Turquia (JO 1964, 217, p. 3685), que as decisões do conselho de associação devem, para efeitos de aplicação, ser objecto de actos adoptados, por unanimidade, pelo Conselho, após consulta da Comissão. Não existindo, no caso vertente, esse acto de aplicação, a Comissão não tinha qualquer fundamento legal para financiar os projectos na Turquia. Na opinião do Governo helénico, o artigo 2.°, n.° 1, do acordo intergovernamental é claro e preciso a este propósito, não deixando aos órgãos comunitários competentes qualquer possibilidade de derrogação.

11 A Comissão alega que o objectivo do artigo 2.°, n.° 1, não é obrigar o Conselho a transpor cada decisão do conselho de associação que releva da competência comunitária. A exigência de um acordo unânime no Conselho "com vista à aplicação" das decisões do conselho de associação deve ser entendida como significando "se for necessário para a sua aplicação na Comunidade" e não "porque é necessária ou indispensável à sua aplicação na Comunidade". A prática do Conselho neste domínio está aliás largamente de acordo com esta interpretação. A Comissão considera que a Decisão n.° 2/80 constitui o fundamento legal da dotação orçamental 9632, relativa à ajuda especial à Turquia, na medida em que contém os elementos essenciais à aplicação de créditos correspondentes, assim inscritos no orçamento das Comunidades.

12 A título preliminar, recorde-se que, segundo jurisprudência constante do Tribunal (ver, por último, o acórdão de 30 de Setembro de 1987, Demirel, n.° 7, 12/86, Colect., p. 3719), as disposições de um acordo concluído pelo Conselho em conformidade com os artigos 228.° e 238.° do Tratado fazem parte integrante, desde a sua entrada em vigor, da ordem jurídica comunitária.

13 Para a realização dos objectivos fixados no acordo de associação CEE-Turquia e nos casos nele previstos, o artigo 22.° deste acordo atribui poderes de decisão ao conselho de associação. Tratando-se da Decisão n.° 2/80, o Tribunal decidiu já no acórdão de 27 de Setembro de 1988, República Helénica/Conselho, n.° 20 (204/86, Colect., p. 5323) que, ao criar uma cooperação "para a aplicação da ajuda... posta à disposição da Turquia", o conselho de associação colocou esta no âmbito institucional da associação. Devido à sua ligação directa ao acordo de associação, a Decisão n.° 2/80 é assim parte integrante, a partir da sua entrada em vigor, da ordem jurídica comunitária.

14 É com base nestas considerações que cabe seguidamente examinar os argumentos da República Helénica, segundo os quais as decisões do conselho de associação devem, para poderem ser aplicadas, ser objecto de um acordo unânime no Conselho.

15 Segundo o artigo 7.° do acordo de associação, os contraentes tomarão todas as medidas gerais ou particulares adequadas para assegurar a execução das obrigações dele decorrentes e abster-se-ão de todas as medidas susceptíveis de fazer perigar a realização dos seus objectivos. O artigo 22.° desse mesmo acordo prevê que cada parte está obrigada a tomar as medidas de execução das decisões tomadas pelo conselho de associação.

16 No caso vertente, a Decisão n.° 2/80 do conselho da associação definiu com rigor as condições de execução da ajuda especial à Turquia. Com efeito, fixou os seus elementos essenciais, como o montante, modalidades de apresentação dos projectos pela Turquia e seu exame pela Comissão. Indicou, além disso, que o comité da associação acompanharia a execução da ajuda. Os próprios termos das disposições da Decisão n.°2/80 permitiam, portanto, a sua execução, sem necessidade de prévia adopção de medidas complementares. Assim sendo, não há que aplicar o artigo 2.° do acordo intergovernamental.

17 Deve, pois, ser considerado improcedente o primeiro fundamento apresentado pela República Helénica.

Quanto aos fundamentos de violação de formalidades essenciais, uso indevido de processo e incompetência da Comissão

18 Ao invocar estes fundamentos, o Governo helénico acusa a Comissão de ter adoptado um processo ilegal para aprovar os três projectos de financiamento na Turquia. Alega, a este respeito, que a aprovação da ajuda especial é da competência do Conselho, que, com base num gentlemen' s agreement de 1980, reservou o poder exclusivo de adoptar os actos jurídicos necessários à sua aplicação, segundo um processo ad hoc. No âmbito deste, a Comissão deveria ter obtido o acordo unânime dos Estados-membros para estar autorizada a comprometer fundos a título de ajuda especial.

19 O Governo helénico sublinha, além disso, que o já citado Regulamento n.° 3973/86 apenas substitui o processo ad hoc para os países a que diz respeito, mantendo-se "provisoriamente" em vigor para todos os outros que, como a Turquia, se não integram no seu âmbito de aplicação nem foram objecto de regulamento financeiro específico, cuja adopção, aliás, é da exclusiva competência do Conselho.

20 A Comissão entende que o processo "seguido para a aplicação dos protocolos financeiros celebrados com os países do Mediterrâneo", tal como resulta da declaração do Conselho feita aquando da adopção da Decisão n.° 2/80 do conselho de associação corresponde à posta em prática pelo novo Regulamento n.° 3973/86, na medida que o processo ad hoc previamente aplicável caducou. A Comissão declara, todavia, estar consciente do facto de que não cabe aplicar o Regulamento n.° 3973/86 enquanto tal, devido à limitação estrita do seu âmbito de aplicação aos países indicados no texto. Daí ter optado, portanto, por uma aplicação analógica do Regulamento n.° 3973/86, limitando esta a uma consulta aos membros do "comité do artigo 6.°", "por analogia".

21 A Comissão sublinha, além disso, que não se impunha um regulamento específico para aplicação da ajuda especial à Turquia, constando todos os elementos necessários à sua aplicação já da Decisão n.° 2/80 do conselho de associação e, nomeadamente, do seu n.° 2. Além do mais, todas as regras técnicas para o desembolso de fundos constam do Regulamento Financeiro de 21 de Dezembro de 1977 (JO L 356, p. 1; EE 01 F2 p. 90). A Comissão acrescenta que, com o objectivo de assegurar uma base económica e política mais sólida para as decisões relativas a projectos de financiamento solicitou o parecer dos membros do "comité do artigo 6.°", sem a tanto estar juridicamente obrigada.

22 Deve, antes de mais, dizer-se que a Decisão n.° 2/80 estabelece, no n.° 2, que "para a apresentação de projectos específicos a Turquia dirigir-se-á directamente à Comissão que procederá ao seu exame à luz dos critérios indicados pela delegação da Comunidade no conselho de associação para a utilização dessa ajuda excepcional". Resulta desta disposição que, com base nos critérios indicados pela delegação da Comunidade no conselho de associação, a Comissão tem exclusiva competência para definir as modalidades de utilização da ajuda e aprovar projectos concretos. Esta competência implica a faculdade de instituir processos especiais para exame de projectos específicos. A Comissão pode, pois, solicitar, tanto ao Conselho como aos Estados-membros, os pareceres necessários à gestão da ajuda, consultar peritos e recorrer aos processos estabelecidos em sectores similares.

23 No caso vertente, a Comissão consultou os membros do "comité do artigo 6.°" do Regulamento n.° 3973/86 para poder aproveitar a sua experiência em matéria de projectos de desenvolvimento nos países do Mediterrâneo. Nenhum elemento dos autos permite concluir que a Comissão agiu de forma contrária às disposições da Decisão n.° 2/80, designadamente afastando-se de critérios propostos pela delegação da Comunidade no conselho da associação, para efeitos de utilização da ajuda. A tese da República Helénica não pode ser acolhida.

24 Do que precede resulta que os segundo, terceiro e quarto fundamentos invocados pela República Helénica devem ser considerados improcedentes.

25 Deve assim ser negado provimento ao recurso.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

26 Nos termos do n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento Processual, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL

decide:

1) É negado provimento ao recurso.

2) A República Helénica é condenada nas despesas.

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