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Document 61988CC0297
Opinion of Mr Advocate General Darmon delivered on 3 July 1990. # Massam Dzodzi v Belgian State. # References for a preliminary ruling: Tribunal de première instance de Bruxelles and Cour d'appel de Bruxelles - Belgium. # Preliminary rulings - Jurisdiction of the Court - Reference in national legislation to provisions of Community law - Right of residence - Right to remain - Directive 64/221/EEC. # Joined cases C-297/88 and C-197/89.
Conclusões do advogado-geral Darmon apresentadas em 3 de Julho de 1990.
Massam Dzodzi contra Estado Belga.
Pedidos de decisão prejudicial: Tribunal de première instance de Bruxelles e Cour d'appel de Bruxelles - Bélgica.
Questões prejudiciais - Competência do Tribunal de Justiça - Remissão de uma legislação nacional para disposições comunitárias - Direito de residência - Direito de permanência - Directiva 64/221/CEE.
Processos apensos C-297/88 e C-197/89.
Conclusões do advogado-geral Darmon apresentadas em 3 de Julho de 1990.
Massam Dzodzi contra Estado Belga.
Pedidos de decisão prejudicial: Tribunal de première instance de Bruxelles e Cour d'appel de Bruxelles - Bélgica.
Questões prejudiciais - Competência do Tribunal de Justiça - Remissão de uma legislação nacional para disposições comunitárias - Direito de residência - Direito de permanência - Directiva 64/221/CEE.
Processos apensos C-297/88 e C-197/89.
Colectânea de Jurisprudência 1990 I-03763
ECLI identifier: ECLI:EU:C:1990:274
MARCO DARMON
apresentadas em 3 de Julho de 1990 ( *1 )
Senhor Presidente,
Senhores Juízes,
1. |
As questões prejudiciais que foram submetidas ao Tribunal pelo tribunal de première instance e pela cour d'appel de Bruxelles têm a sua origem em disposições legislativas belgas, sobre as quais é conveniente dar algumas explicações. |
2. |
Sem ser necessário recapitular exaustivamente a jurisprudência do Tribunal, recordemos que este decidiu que: «as disposições do Tratado e a regulamentação adoptada para sua execução, em matéria de livre circulação de trabalhadores, não podem ser aplicadas a situações que não têm qualquer relação com qualquer das situações previstas pelo direito comunitário. É esse certamente o caso de trabalhadores que nunca exerceram o direito de livre circulação no interior da Comunidade» ( 1 ). Nesse caso, o interessado não beneficia do direito comunitário e, por consequência, os seus ascendentes ou o seu cônjuge não podem invocar para si um direito «derivado» de permanência ou de residência. Tendo em conta estes princípios, o direito comunitário pode assegurar ao cidadão comunitário e à sua família uma situação mais favorável num Estado-membro do que a prevista pela legislação deste Estado relativamente aos seus próprios nacionais. Para designar este caso exemplar, usa-se frequentemente a expressão «discriminação ao invés». |
3. |
Aparentemente, o legislador belga entendeu prevenir essas circunstâncias ao prever, no artigo 40.o da lei de 15 de Dezembro de 1980, a equiparação dos cônjuges, ascendentes e descendentes de um nacional belga aos nacionais comunitários. E é precisamente essa equiparação a que procede o direito nacional que parece ter provocado as presentes questões prejudiciais, formuladas num litígio cujas grandes linhas recordaremos brevemente. |
4. |
M. Dzodzi, de nacionalidade togolesa, chegou em Fevereiro de 1987 à Bélgica, onde casou, em 14 de mesmo mês, com J. Herman, de nacionalidade belga. Cinco dias mais tarde, a interessada apresentou um pedido de estabelecimento de residência na administração comunal de Soumagnes. Os cônjuges partiram seguidamente para o Togo e M. Dzodzi foi eliminada dos registos da população da administração comunal em 17 de Março de 1987. No início de Julho de 1987, o casal regressou à Bélgica. O cônjuge marido faleceu em 28 de Julho. Em 28 de Agosto de 1987, M. Dzodzi pediu uma autorização de permanência na Bélgica. Foi-lhe concedida uma «declaração de chegada» válida por três meses e recebeu instruções para pedir uma autorização de permanência com base no direito comum, «visto que já não era beneficiária das directivas comunitárias». A administração rejeitou posteriormente os pedidos de M. Dzodzi apresentados com base na lei de 15 de Dezembro de 1980 e concedeu-lhe diversas declarações de chegada» destinadas a permitir-lhe a regularização da sucessão do seu marido. |
5. |
M. Dzodzi recorreu então ao presidente do tribunal de première instance de Bruxelles para que o Estado belga fosse condenado a dar-lhe uma autorização de estabelecimento de residência na qualidade de cônjuge de um nacional de um Estado-membro da Comunidade Económica Europeia. Foi no àmbito deste processo que foram submetidas ao Tribunal três questões prejudiciais. As duas primeiras referem-se ao direito de permanência e de residência de uma pessoa que se encontra na situação de M. Dzodzi. A terceira, subsidiária na medida em que é formulada para a hipótese de ser dada resposta negativa às precedentes em virtude da nacionalidade belga do cônjuge de M. Dzodzi, pede que o Tribunal se pronuncie sobre qual seria a solução se o falecido fosse nacional doutro Estado-membro. Tendo M. Dzodzi interposto recurso do despacho do primeiro juiz, que se tinha abstido de decidir a questão da admissibilidade do recurso e havia sobrestado na decisão sobre o pedido de emissão de um documento provisório de permanência, a cour d'appel de Bruxelles, por seu lado, dirigiu ao Tribunal duas questões prejudiciais. A primeira destina-se a saber se os beneficiários da Directiva 64/221/CEE do Conselho ( 2 ) podem ser impedidos de recorrer ao processo de medidas provisórias. A segunda refere-se à interpretação do artigo 9.o da directiva. Substancialmente, pede-se ao Tribunal que se pronuncie sobre se os interessados devem beneficiar de um recurso que lhes permita pedir a intervenção urgente de uma acção jurisdicional nacional antes da execução da medida contestada, com a finalidade de obter em tempo útil medidas de protecção dos direitos ameaçados. |
6. |
As duas primeiras questões do tribunal de Bruxelas não exigem longas observações. Resulta do processo comunicado pelo órgão jurisdicional nacional e das observações das partes formuladas no processo principal que a situação a que se refere o juiz a quo não tem qualquer conexão com o direito comunitário. É esse o caso, com efeito, porque o cônjuge da interessada nunca exerceu o direito de livre circulação na Comunidade ( 3 ). Não tendo nunca J. Herman usado o seu direito de livre circulação na Comunidade, a situação em questão é meramente interna. |
7. |
Mas o juiz a quo parece ter pressentido esta conclusão. Com efeito, no caso de ser essa a análise do Tribunal, formula uma questão subsidiária começando por recordar que a lei nacional procede à equiparação do cônjuge de um nacional belga a um nacional comunitário. E pede ao Tribunal que se pronuncie sobre se o interessado teria um direito de permanência ou de residência no caso de o seu cônjuge ser nacional de um Estado-membro diferente da Bélgica. |
8. |
Esta interpretação é pedida para permitir a aplicação da lei belga que estabelece a equiparação que evocámos anteriormente, resultando claramente este objectivo da própria formulação da questão. Ora, somos de opinião de que o Tribunal não é competente para dar a resposta que lhe é pedida. Entendemos, contudo, não invocar neste caso concreto os princípios estabelecidos nos acórdãos Foglia ( 4 ) quanto à exigência de um litígio efectivo — o que aliás no caso dos autos näo pode ser posto em causa — e também não convidaremos o Tribunal a pronunciar-se sobre a necessidade da questão ou sobre a sua pertinência, apreciações que competem exclusivamente ao órgão jurisdicional nacional. Mas deve-se recordar a função do mecanismo prejudicial: «Essencial para preservação da natureza comunitária do direito instituído pelo Tratado, o artigo 177.o tem por finalidade assegurar em todas as circunstâncias o mesmo efeito deste direito em todos os Estados da Comunidade» ( 5 ). Pela sua natureza, esta finalidade do reenvio prejudicial, de assegurar a uniformidade dos efeitos do direito comunitário, diz respeito evidentemente apenas ao âmbito de aplicação deste último tal como é definido por ele próprio e apenas por ele próprio. |
9. |
Ora, o reenvio estabelecido por uma legislação nacional não pode alargar o alcance do direito comunitário ratione matériáé e ratione personae. Trata-se dum mecanismo unilateral e autónomo que, ao referir-se a uma ou outra disposição material de origem comunitária, não acarreta qualquer influência quanto ao âmbito de aplicação do direito comunitário enquanto tal. Este último define ele próprio e apenas ele a conexão necessária à aplicação às disposições relativas à livre circulação de pessoas. |
10. |
Face a uma «remissão» semelhante à do direito belga no caso dos autos, os interessados apenas beneficiam do direito nacional. Nesse caso, a interpretação do Tribunal não é de forma alguma destinada a assegurar o mesmo efeito ao direito comunitário, ou seja, um conteúdo uniforme no seu âmbito de aplicação. Trata-se então de um mecanismo «sui generis» que visa ajudar o tribunal nacional a pôr em prática o direito nacional, fora do àmbito de aplicação do direito comunitário. |
11. |
Sublinhe-se: a unidade da ordem jurídica comunitária é indiferente às situações exteriores ao seu âmbito de aplicação, qualquer que seja o conteúdo material das normas que as regem. Não há direito comunitário fora do seu âmbito de aplicação: o que interessa, portanto, à sua correcta aplicação é a sua unidade no âmbito pessoal e material por ele definido. O facto de as noções que adopta neste âmbito poderem ser utilizadas unilateralmente para reger este ou aquele aspecto de uma legislação nacional não pode ter como efeito alargar o campo de aplicação do direito comunitário e, por consequência, a competência do Tribunal. |
12. |
Desejamos entretanto evocar brevemente algumas interrogações que neste caso suscita a extensão do mecanismo prejudicial:
Estas sérias interrogações deixam antever os graves inconvenientes que comportaria a perspectiva de o Tribunal se envolver numa colaboração de contornos indefinidos, fora do âmbito e dos objectivos precisos do reenvio prejudicial. Noutros termos, o papel do Tribunal consistiria então em emitir pareceres ou consultas do tipo das que um jurisconsulto qualificado é levado por vezes a fornecer ao juiz do foro quando este tem de aplicar a lei estrangeira. Não é essa a missão do Tribunal no quadro do reenvio prejudicial ( 6 ). |
13. |
Finalmente, convidamos o Tribunal, em resposta às duas questões da cour d'appel, a indicar a esta última que a Directiva 64/221 só pode ser invocada pelas pessoas que se encontram numa situação conexa com o direito comunitario. |
14. |
Esta resposta é tanto mais necessária quanto resulta dos fundamentos de reenvio que a cour d'appel se interroga sobre a questão de saber se o legislador belga podia, sem violar o direito comunitário, recusar a certos estrangeiros o direito de recorrerem ao juiz competente para ordenar medidas provisórias. |
15. |
Já dissemos que o reenvio feito pelo direito nacional para o direito comunitário não tem de maneira nenhuma como consequência alargar o respectivo âmbito de aplicação. Ora, seria precisamente esta consequência que se obteria se uma pessoa que se encontre numa situação puramente interna, sujeita apenas ao direito nacional, pudesse invocar o direito comunitário para afastar a legislação nacional que lhe é imposta em nome da remissão que esta última faz para as disposições comunitárias. |
16. |
Por consequência, propomos ao Tribunal:
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( *1 ) Lingua original: francês.
( 1 ) Acórdão de 27 de Outubro de 1982, Morson e Jhanjan, n.os 16 e 17 (35/82 e 36/82, Recueil, p. 3723).
( 2 ) De 25 de Fevereiro de 1964, para a coordenação de medidas especiais relativas aos estrangeiros em materia de deslocação e estada justificadas por razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública (JO 56 de 4.4.1964, p. 850).
( 3 ) 35/82 e 36/82, já citado.
( 4 ) 104/79, acórdão de 11 de Março de 1980, Recueil, p. 745; 244/80, acórdão de 16 de Dezembro de 1981, Recueil, p. 3045.
( 5 ) Acórdão de 16 de Janeiro de 1974, Rheinmühlen Düsseldorf, n.o 2, sublinhado nosso (166/73, Recueil, p. 33).
( 6 ) «A inovação verdadeiramente original dos tratados de Roma foi a de estabelecer, para aplicação do direito comunitário uma relação directa entre poderes judiciais sob a forma de uma relação que e muito mais que uma simples consulta: uma rclaçlo no plano das competencias e dos poderes», Pescatore, P.: Le droit de l'intégration, 1972, A. W. Sijthoff-Leiden, Institut universitaire des hautes études internationales, Genebra, sublinhado nosso.