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Document 61986CJ0104
Judgment of the Court of 24 March 1988. # Commission of the European Communities v Italian Republic. # National taxes contrary to Community law - Recovery of undue payment - Proof that taxes have not been passed on in the price of goods - Partial withdrawal after the close of the oral procedure. # Case 104/86.
Acórdão do Tribunal de 24 de Março de 1988.
Comissão das Comunidades Europeias contra República Italiana.
Impostos nacionais contrários ao direito comunitário - Repetição do indevido - Prova da não repercussão dos impostos no preço das mercadorias - Desistência parcial após o encerramento da audiência.
Processo 104/86.
Acórdão do Tribunal de 24 de Março de 1988.
Comissão das Comunidades Europeias contra República Italiana.
Impostos nacionais contrários ao direito comunitário - Repetição do indevido - Prova da não repercussão dos impostos no preço das mercadorias - Desistência parcial após o encerramento da audiência.
Processo 104/86.
Colectânea de Jurisprudência 1988 -01799
ECLI identifier: ECLI:EU:C:1988:171
ACORDAO DO TRIBUNAL DE JUSTICA DE 24 DE MARCO DE 1988. - COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS CONTRA REPUBLICA ITALIANA. - IMPOSTOS NACIONAIS CONTRARIOS AO DIREITO COMUNITARIO - REPETICAO DO INDEVIDO - PROVA DA NAO REPERCUSSAO DOS IMPOSTOS NO PRECO DAS MERCADORIAS - DESISTENCIA PARCIAL APOS O ENCERRAMENTO DA AUDIENCIA. - PROCESSO 104/86.
Colectânea da Jurisprudência 1988 página 01799
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
++++
1. Direito comunitário - Efeito directo - Impostos nacionais incompatíveis com o direito comunitário - Restituição - Modalidades - Aplicação do direito nacional - Tomada em consideração da eventual repercussão do imposto - Admissibilidade - Inadmissibilidade de certos meios de prova da não repercussão impostos ao contribuinte
2. Estados-membros - Obrigações - Incumprimento - Manutenção de uma disposição nacional incompatível com o direito comunitário
1. Na falta de regulamentação comunitária em matéria de restituição de impostos nacionais cobrados em violação do direito comunitário, cabe aos Estados-membros assegurar o reembolso desses impostos, nos termos das disposições do seu direito interno. Além disso, o direito comunitário não exige a restituição de impostos indevidamente cobrados em condições que implicariam um enriquecimento sem causa dos contribuintes; assim, não exclui que se tenha em conta o facto de a carga desses impostos poder ter sido repercutida sobre outros operadores económicos ou sobre os consumidores.
No entanto, são incompatíveis com o direito comunitário quaisquer meios de prova cujo efeito seja o de tornar impossível na prática ou excessivamente difícil a obtenção do reembolso dos impostos cobrados em violação do direito comunitário. É esse o caso, designadamente, de presunções ou de regras de prova que imponham ao contribuinte o ónus de provar que os impostos indevidamente pagos não foram repercutidos sobre outros sujeitos, ou de limitações específicas quanto aos meios de prova a apresentar, como a exclusão de qualquer meio de prova que não a documental.
2. O primado e o efeito directo das disposições do direito comunitário, que os órgãos jurisdicionais nacionais reconhecem, não dispensam os Estados-membros da obrigação de eliminar da sua ordem jurídica interna as disposições incompatíveis com o direito comunitário; com efeito, a sua manutenção provoca uma situação de facto ambígua, deixando os interessados num estado de incerteza quanto às suas possibilidades de recorrer ao direito comunitário.
No processo 104/86,
Comissão das Comunidades Europeias, representada pelo seu consultor jurídico Giuliano Marenco, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Georgeos Kremlis, membro do seu Serviço Jurídico, edifício Jean Monnet, Kirchberg,
demandante,
contra
República Italiana, representada por Luigi Ferrari Bravo, chefe do serviço do contencioso diplomático, na qualidade de agente, assistido por Franco Favara, avvocato dello stato, com domicílio escolhido no Luxemburgo na sua embaixada,
demandada,
que tem por objecto obter a declaração de que a República Italiana, ao tornar impossível na prática ou excessivamente difícil o reembolso de impostos nacionais cobrados em violação do direito comunitário e ao legislar em matéria de reembolso de direitos previstos pela regulamentação comunitária, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CEE,
O TRIBUNAL,
constituído pelos Srs. G. Bosco, presidente de secção, f. f. de presidente, T. Koopmans, U. Everling, K. Bahlmann, Y. Galmot, C. Kakouris, R. Joliet, T. F. O' Higgins e F. Schockweiler, juízes,
advogado-geral: Sir Gordon Slynn
secretário: B. Pastor, administradora
visto o relatório para audiência e após a realização desta em 25 de Junho de 1987,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência pública de 29 de Setembro de 1987,
profere o presente
Acórdão
1 Por requerimento entregue na Secretaria do Tribunal em 2 de Maio de 1986, a Comissão das Comunidades Europeias intentou, nos termos do artigo 169.° do Tratado CEE, uma acção para obter a declaração de que:
a) ao impor ao contribuinte o ónus de provar que direitos e impostos nacionais pagos indevidamente, por serem contrários aos artigos 9.° e seguintes e 95.° do Tratado, não foram repercutidos sobre outros sujeitos,
- ao admitir para esse efeito apenas a prova documental,
- ao atribuir a essas disposições efeito retroactivo,
a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 5.°, 9.° e seguintes e 95.° do Tratado;
b) ao legislar em matéria de reembolso de direitos fixados pela pauta aduaneira comum e de direitos de importação e de exportação fixados no quadro da política agrícola comum, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 5.° do Tratado e do Regulamento (CEE) n.° 1430/79 do Conselho, de 2 de Julho de 1979 (JO L 175, p. 1; EE 02 F6 p. 36).
2 Após o encerramento da audiência, a Comissão, por carta entregue na Secretaria do Tribunal em 8 de Fevereiro de 1988, declarou desistir da segunda parte do seu pedido. Todavia, esclareceu que mantinha todos os outros pedidos contidos no seu requerimento, incluindo a condenação da demandada nas despesas.
3 Convidada pelo Tribunal a apresentar observações sobre esta desistência parcial, a República Italiana, por telex de 18 de Fevereiro de 1988, declarou-se de acordo com a desistência parcial da Comissão e fez notar que, no que diz respeito à parte do litígio que não foi objecto da desistência, mantinha todos os argumentos aduzidos na tréplica, incluindo aqueles em relação aos quais a Comissão desistira parcialmente. Por conseguinte, resta apenas examinar a primeira das acusações contidas no requerimento.
4 No que diz respeito às disposições nacionais e comunitárias em causa, bem como aos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação do Tribunal.
5 A Comissão afirma que a disposição do artigo 19.° do Decreto-lei n.° 688, de 30 de Setembro de 1982 (GURI n.° 270, de 30.9.1982), convertido na lei n.° 873, de 27 de Novembro de 1982 (GURI n.° 328, de 29.11.1982), impõe ao contribuinte o ónus da prova da não repercussão sobre outros sujeitos dos impostos indevidamente pagos, e limita os meios de prova apenas à prova documental. Além disso, segundo a Comissão, a retroactividade da disposição em questão agravaria a situação dos contribuintes, relativamente ao período anterior à sua entrada em vigor. Ao impor assim exigências de prova praticamente impossíveis de satisfazer, essa disposição da legislação nacional seria contrária ao direito comunitário e, especialmente, aos artigos 9.° e seguintes e 95.° do Tratado.
6 Como o Tribunal já decidiu (ver acórdão de 27 de Fevereiro de 1980, Just, 68/79, Recueil, p. 501), na falta de regulamentação comunitária em matéria de restituição de impostos nacionais cobrados em violação do direito comunitário cabe aos Estados-membros assegurar o reembolso desses impostos, nos termos das disposições do seu direito interno. Além disso, o direito comunitário não exige a restituição de impostos indevidamente cobrados em condições que implicariam um enriquecimento sem causa dos contribuintes; assim, não exclui que se tenha em conta o facto de a carga desses impostos poder ter sido repercutida sobre outros operadores económicos ou sobre os consumidores.
7 Finalmente, convém lembrar, como o Tribunal declarou no acórdão de 9 de Novembro de 1983 (San Giorgio, 199/82, Recueil, p. 3595), proferido precisamente a propósito do artigo 19.° do decreto-lei em causa, que são incompatíveis com o direito comunitário quaisquer meios de prova cujo efeito seja o de tornar impossível na prática ou excessivamente difícil a obtenção do reembolso de impostos cobrados em violação do direito comunitário, e que é esse o caso, designadamente, de presunções ou regras de prova que imponham ao contribuinte o ónus de provar que os impostos indevidamente pagos não foram repercutidos sobre outros sujeitos, ou de limitações específicas quanto aos meios de prova a apresentar, como a exclusão de qualquer meio de prova que não a documental.
8 O Governo italiano não contesta os princípios atrás mencionados, tal como resultam da jurisprudência do Tribunal. Considera no entanto que as disposições do artigo 19.° do Decreto-lei italiano n.° 688 não impedem esses princípios de produzir os seus efeitos na ordem jurídica nacional.
9 Neste aspecto, o Governo italiano afirma que a disposição impugnada não pode ter efeitos contrários às regras do direito comunitário, devido a dois acórdãos recentes do Tribunal Constitucional italiano. No primeiro acórdão (n.° 170), de 8 de Junho de 1984, aquele órgão jurisdicional teria reconhecido que os juízes nacionais podem, devido ao primado e à aplicação directa do direito comunitário, considerar inaplicável uma lei interna contrária a uma norma de direito comunitário. No segundo acórdão (n.° 113), de 23 de Abril de 1985, proferido sobre um incidente de constitucionalidade cujo objecto era precisamente o artigo 19.° do decreto-lei em causa, o Tribunal Constitucional teria alargado esse princípio também às regras resultantes dos acórdãos interpretativos do Tribunal de Justiça. O Governo italiano sublinha que estes acórdãos trouxeram uma inovação radical à ordem jurídica italiana com a consequência, precisamente, de o artigo 19.° ter sido considerado inaplicável pelos órgãos jurisdicionais nacionais, entre os quais a Corte di Cassazione (Acórdão n.° 5129, de 18 de Outubro de 1985), com fundamento em que era incompatível com a legislação comunitária. Devido a essa inovação, uma lei nacional que modificasse o artigo 19.° nada poderia acrescentar e seria uma espécie de "recepção", inútil e contrária ao princípio da aplicabilidade directa do direito comunitário.
10 O Governo italiano observa também que a disposição em litígio estaria em conformidade com as regras do direito comunitário e com a jurisprudência do Tribunal no sentido de que a prova da efectiva repercussão da carga fiscal seria da responsabilidade da administração nacional. Os operadores interessados apenas teriam o ónus de provar as suas alegações quando afirmassem que a carga fiscal não fora repercutida, sendo essa prova possível através da documentação que todas as empresas devem necessariamente possuir.
11 A argumentação do Governo italiano não pode ser acolhida. A disposição em litígio da legislação italiana impõe aos operadores o ónus da prova de um facto negativo, na medida em que devem provar, contra simples afirmações da administração, a não repercussão sobre outros sujeitos da carga fiscal indevidamente paga, e isto unicamente através de provas documentais. Essa disposição é contrária às regras de direito comunitário, tal como resultam da jurisprudência do Tribunal.
12 Apesar dos acórdãos atrás mencionados invocados pelo Governo italiano, e embora seja de sublinhar que a evolução da jurisprudência constitucional italiana tem como resultado facilitar a aplicação dos princípios do efeito directo e do primado do direito comunitário na ordem jurídica interna, deve observar-se que a disposição em litígio ainda faz parte da legislação nacional. Como o Tribunal já declarou várias vezes, o primado e o efeito directo das disposições do direito comunitário não dispensam os Estados-membros da obrigação de eliminar da sua ordem jurídica interna as disposições incompatíveis com o direito comunitário; com efeito, a sua manutenção provoca uma situação de facto ambígua, deixando os interessados num estado de incerteza quanto às suas possibilidades de recorrer ao direito comunitário.
13 Atentas estas considerações, deve declarar-se que, ao impor ao contribuinte, através do disposto no artigo 19.° do Decreto-lei n.° 688, de 30 de Setembro de 1982, tornado Lei n.° 873, de 27 de Novembro de 1982, o ónus de provar, apenas por prova documental, que direitos e impostos nacionais cujo reembolso é requerido devido a terem sido indevidamente pagos por serem contrários aos artigos 9.° e seguintes e 95.° do Tratado CEE não foram repercutidos sobre outros sujeitos, e ao atribuir a essas disposições efeito retroactivo, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 5.°, 9.° e seguintes e 95.° do Tratado.
Quanto às despesas
14 Por força do disposto no n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento Processual, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a demandada sido vencida, há que condená-la nas despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL
decide:
1) Ao impor ao contribuinte, através do disposto no artigo 19.° do Decreto-lei n.° 688, de 30 de Setembro de 1982, tornado lei n.° 873, de 27 de Novembro de 1982, o ónus de provar, apenas por prova documental, que direitos e impostos nacionais cujo reembolso é requerido devido a terem sido indevidamente pagos por serem contrários aos artigos 9.° e seguintes e 95.° do Tratdo CEE não foram repercutidos sobre outros sujeitos, e ao atribuir a essas disposições efeito retroactivo, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 5.°, 9.° e seguintes e 95.° do Tratado.
2) A República Italiana é condenada nas despesas.