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Document 61986CJ0081

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 29 de Setembro de 1987.
De Boer Buizen BV contra Conselho e Comissão das Comunidades Europeias.
Responsabilidade extracontratual - Regime de exportação de tubos de aço.
Processo 81/86.

Colectânea de Jurisprudência 1987 -03677

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1987:393

61986J0081

ACORDAO DO TRIBUNAL DE JUSTICA (SEXTA SECCAO) DE 29 DE SETEMBRO DE 1987. - DE BOER BUIZEN BV CONTRA CONSELHO E COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL - REGIME DE EXPORTACAO DE TUBOS DE ACO. - PROCESSO 81/86.

Colectânea da Jurisprudência 1987 página 03677
Edição especial sueca página 00165
Edição especial finlandesa página 00167


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Acção de indemnização - Carácter autónomo - Esgotamento dos meios contenciosos internos - Excepção - Impossibilidade de obtenção de reparação perante o órgão jurisdicional nacional

(Tratado CEE, artigo 178.° e segundo parágrafo do artigo 215.°)

2. Política comercial comum - Restrições à exportação - Convénio entre a Comunidade e os Estados Unidos da América relativo às trocas comerciais de tubos de aço - Regime de licenças de exportação - Concessão de licenças exclusivamente reservada aos produtores - Discriminação relativamente aos distribuidores - Inexistência

(Regulamento n.° 60/85 do Conselho, artigo 5.°; Regulamento n.° 61/85 da Comissão)

3. Política comercial comum - Restrições à exportação - Convénio entre a Comunidade e os Estados Udidos da América relativo às trocas comerciais de tubos de aço - Repartição do limite máximo comunitário entre os Estados-membros - Margem de apreciação do Conselho

(Regulamento n.° 60/85 do Conselho, anexo III)

Sumário


1. A acção de indemnização, nos termos do artigo 178.° e do segundo parágrafo do artigo 215.° do Tratado, foi instituída como via judicial autónoma, com uma função específica no âmbito do sistema de meios contenciosos, subordinada a condições de exercício estabelecidas em função do seu objecto. Embora seja verdade dever a acção de indemnização ser apreciada em função do sistema global de protecção jurisdicional dos particulares, podendo a sua admissibilidade, portanto, encontrar-se subordinada, em determinados casos, ao esgotamento dos meios jurisdicionais internos pelos quais se pode obter a anulação de uma decisão da autoridade nacional, necessário é, porém, para que assim seja, que essas vias jurisdicionais nacionais assegurem de forma eficaz a protecção dos particulares interessados e possam conduzir à reparação do prejuízo alegado. Não é esse o caso quando está em causa a recusa pelas autoridades nacionais, em cumprimento de um regulamento comunitário, da satisfação de um pedido de licença de exportação. Com efeito, nem a anulação dessa revisão pelo órgão jurisdicional nacional nem a declaração de invalidade das disposições regulamentares em causa, a que o órgão jurisdicional nacional poderia chegar através do processo previsto no artigo 177.° do Tratado, podem ter por consequência conferir ao operador económico em causa um direito à concessão de uma licença ou à reparação do prejuízo eventualmente sofrido.

2. Ao reservar exclusivamente aos produtores a concessão de licenças de exportação, o regime adoptado pelas instituições comunitárias para execução do convénio entre a Comunidade e os Estados Unidos da América relativo às trocas comerciais de tubos de aço não faz qualquer discriminação relativamente aos distribuidores destes produtos. Com efeito, os produtores comunitários são afectados pelo referido convénio, que apenas respeita aos produtos originários da Comunidade, de forma diversa dos distribuidores, que podem, por um lado, beneficiar da transferência de licença por parte de um produtor e, por outro, prosseguir as suas exportações de produtos originários de países terceiros. Contudo, caso se verificasse suportarem os distribuidores, enquanto categoria de operadores económicos, uma parte desproporcionada dos custos resultantes do convénio, competiria às instituições comunitárias solucionar essa situação através de medidas apropriadas.

3. O Conselho dispõe de uma margem de apreciação para proceder à repartição entre os Estados-membros do limite máximo comunitário de exportação fixado pelo convénio entre a Comunidade e os Estados Unidos da América relativo às trocas comerciais de tubos de aço, cabendo a quem conteste a repartição efectuada provar que essa margem de apreciação foi ultrapassada.

Partes


No processo 81/86,

De Boer Buizen BV, sociedade neerlandesa com sede em Heerhugowaard, representada por W. Alexander, advogado em Haia, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado E. Arendt,

demandante,

contra

Conselho das Comunidades Europeias, representado pelo seu conselheiro jurídico E. H. Stein, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no gabinete de J. Kaeser, Banco Europeu de Investimento, Luxemburgo,

e

Comissão das Comunidades Europeias, representada pelo membro do seu Serviço Jurídico A. Haagsma, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no gabinete de G. Kremlis, edifício Jean Monnet, Luxemburgo,

demandadas,

que visa obter, nos termos do artigo 215.° do Tratado CEE, a declaração de responsabilidade extracontratual da Comunidade pelo prejuízo sofrido pela demandante, decorrente da execução dada pelas instituições comunitárias ao convénio com os Estados Unidos da América relativo às trocas comerciais de tubos de aço (JO L 9, p. 1; EE 11 F21 p. 146),

O TRIBUNAL (Sexta Secção),

constituído pelos Srs. C. Kakouris, presidente da secção, T. Koopmans, O. Due, K. Bahlmann e J. C. Rodríguez Iglesias, juízes,

advogado-geral: G. F. Mancini

secretário: D. Louterman, administradora

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 3 de Fevereiro de 1987,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 11 de Junho de 1987,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 17 de Março de 1986, a sociedade De Boer Buizen BV, com sede em Heerhugowaard, PaísesBaixos, intentou, nos termos do artigo 178.° e do segundo parágrafo do artigo 215.° do Tratado CEE, uma acção que visa obter reparação do prejuízo que sofreu em consequência da execução dada pelo Conselho e pela Comissão ao convénio celebrado em Janeiro 1985 entre a Comunidade e os Estados Unidos da América relativo às trocas comerciais de tubos de aço (JO L 9, p. 2; EE 11 F21 p. 146) (adiante designado "convénio").

2 Na petição, a demandante pede que a Comunidade seja declarada responsável pelo prejuízo por ela sofrido em consequência de ter visto proibidas, a partir de 1 de Janeiro de 1985, as suas exportações de tubos de aço para os Estados Unidos, esclarecendo, porém, que as partes deveriam entender-se, em fase posterior, quanto ao montante do prejuízo sofrido, sendo evidente que, na falta de acordo, o processo no Tribunal deveria prosseguir. O Conselho e a Comissão basearam a sua defesa na questão de saber se aComunidade deve ser considerada responsável pelo prejuízo sofrido pela demandante, não deixando de manifestar as suas dúvidas quanto à realidade desse prejuízo.

3 Visto que o debate entre as partes incidiu basicamente sobre a admissibilidade da acção e eventual ilegalidade do comportamento de que as instituições vêm acusadas, dever-se-á, antes de mais, proceder ao exame destas questões.

4 Remete-se para o relatório para audiência no que se refere a uma mais ampla exposição do enquadramento jurídico do litígio, dos factos do processo e dos fundamentos e argumentos das partes. Estes elementos do processo apenas serão adiante reproduzidos na medida em que se revelam necessários à fundamentação da decisão do Tribunal.

Quanto à admissibilidade

5 As instituições demandadas sustentam não ser a acção admissível. Consideram não poder uma empresa recorrer à via processual consignada no artigo 178.° e no segundo parágrafo do artigo 215.° do Tratado CEE quando exista outra via judicial susceptível de garantir protecção eficaz. Assim sucederia no caso presente, uma vez que a demandante teria a faculdade de impugnar perante os órgãos jurisdicionais nacionais a decisão de recusa da concessão das licenças de exportação.

6 O Conselho sublinha que ao convénio foi dada execução basicamente através do Regulamento n.° 60/85 do Conselho, de 9 de Janeiro de 1985, relativo às restrições à exportação de tubos de aço para os Estados Unidos da América (JO L 9, p. 13; EE 11 F21 p. 156). Ora, este regulamento prevê expressamente, no n.° 1 do artigo 5.°, que as licenças de exportação são emitidas pelas instâncias competentes de cada Estado-membros dentro dos limites da quota que lhes foi atribuída. A repartição desta quota-parte entre as empresas nacionais seria, assim, da exclusiva responsabilidade das autoridades nacionais.

7 Para a Comissão, a demandante deveria ter-se dirigido ao órgão jurisdicional nacional competente para nele impugnar a recusa de concessão da licença de exportação, suscitando, nesse contexto, o problema da validade dos regulamentos comunitários sobre esta matéria. Caso esse processo viesse a conduzir à declaração de que a licença fora erradamente recusada, a demandante poderia basear-se nessa declaração para solicitar, no plano nacional, a reparação de eventuais prejuízos.

8 Deve anotar-se, a este respeito, que a demandante não põe em causa as medidas adoptadas pelas autoridades nacionais em execução dos regulamentos comunitários, mas os regulamentos em si mesmos, visto que acusa o Conselho e a Comissão de terem reservado exclusivamente aos produtores de tubos de aço a concessão, pelas autoridades nacionais, de licenças de exportação dessas mercadorias para os EstadosUnidos. Resulta, com efeito, do artigo 5.° do citado Regulamento n.° 60/85 do Conselho, bem como do artigo 3.° do Regulamento n.° 61/85 da Comissão, de 9 de Janeiro de 1985, relativo ao controlo comunitário das exportações de tubos de aço para os Estados Unidos da América (JO L 9, p. 19; EE 11 F21 p. 162), que as licenças de exportação apenas serão concedidas a empresas produtoras dessas mercadorias.

9 De acordo com a jurisprudência constante do Tribunal, a acção de indemnização, nos termos do artigo 178.° e do segundo parágrafo do artigo 215.°, foi instituída como via judicial autónoma, com uma função específica no âmbito do sistema de meios contenciosos, subordinada a condições de exercício estabelecidas em função do seu objecto. Embora seja verdade dever a acção de indemnização ser apreciada em função do sistema global de protecção jurisdicional dos particulares, e podendo a sua admissibilidade, portanto, encontrar-se subordinada, em determinados casos, ao esgotamento das vias jurisdicionais internas pelas quais se pode obter a anulação de uma decisão da autoridade nacional, necessário é, porém, para que assim seja, que essas vias jurisdicionais nacionais assegurem de forma eficaz a protecção dos particulares interessados e sejam susceptíveis de conduzir à reparação do prejuízo alegado.

10 Não existe, no caso vertente, uma situação deste tipo, em que a empresa interessada poderia obter a concessão da licença ou a reparação do prejuízo causado pela sua recusa. Com efeito, nos termos das citadas disposições dos regulamentos n.os 60 e 61/85, as autoridades nacionais apenas tinham a faculdade de conceder licenças de exportação às empresas produtoras de tubos, não podendo as distribuidoras beneficiar de uma licença desse tipo senão pela via da sua transferência por uma empresa produtora. A anulação por um órgão jurisdicional nacional da recusa de concessão de uma licença desse género a uma empresa distribuidora não pode, portanto, ter por consequência adquirir esta o direito de obter a licença ou a reparação do prejuízo eventualmente sofrido. O mesmo se deve dizer da declaração de invalidade das disposições regulamentares em causa a que o órgão jurisdicional nacional poderia chegar após ter colocado ao Tribunal, nos termos do artigo 177.° do Tratado, uma questão prejudicial sobre esta questão.

11 Resulta das considerações prececentes não se poder admitir a excepção de inadmissibilidade suscitada pelas instituições demandadas.

Quanto ao mérito

12 A demandante argumenta ser ilegal o regime instituído pela Comunidade para dar execução ao convénio. Esse regime conduziria, por um lado, a uma discriminação dos distribuidores em favor dos produtores, visto serem estes os únicos beneficiários da concessão de licenças de exportação de tubos de aço. Esse regime procederia, por outro lado, a uma injusta e discriminatória repartição entre os Estados-membros do limite máximo comunitário de exportação, por não terem sido tomadas em consideração as correntes comerciais tradicionais.

13 No que se refere à invocada discriminação dos distribuidores em favor dos produtores, a demandante reconhece que os regulamentos n.os 60 e 61/85 admitem a faculdade de transferência da licença de uma empresa produtora para uma empresa distribuidora. Esta possibilidade teria, contudo, um efeito prático muito restrito, visto que as licenças teriam sido integralmente utilizadas pelos próprios produtores ou pelas suas filiais. Os distribuidores ver-se-iam, assim, impedidos de continuar as exportações de tubos de aço para os Estados Unidos, quando teriam sido eles, mais do que os produtores, a obter a abertura do mercado americano aos produtos siderúrgicos da Comunidade.

14 Deve referir-se, a este respeito, que o convénio apenas se aplica às exportações da Comunidade para os Estados Unidos de tubos de aço originários da Comunidade ("steel pipes and tubes... originating in the Community", n.° 1, primeiro período). Daqui decorre que os produtores comunitários destes produtos foram directamente afectados pela limitação dasexportações, não sendo atingidas as exportações de produtos originários de países terceiros, ainda que efectuadas por empresas distribuidoras estabelecidas na Comunidade. Não foi objecto de contestação o facto de determinados países terceiros, como a Áustria, a Roménia e a Noruega, escoarem parte da sua produção de aço para os Estados Unidos por intermédio de empresas estabelecidas na Comunidade.

15 Logo, as empresas produtoras de aço da Comunidade não se encontram na mesma situação que as empresas distribuidoras no que se refere às restrições à exportação resultantes do convénio. Nestas condições, as instituições comunitárias não estavam obrigadas a instaurar, no âmbito da execução deste convénio, um regime que situasse em pé de igualdade os produtores e distribuidores comunitários.

16 Conclui-se, assim, não proceder o fundamento baseado na discriminação entre distribuidores e produtores. Esta conclusão não é alterada pelo facto de, em função das obrigações que assumiu, a demandante se fornecer habitualmente de tubos em determinados Estados-membros, particularmente na República Federal da Alemanha, e não em países terceiros.

17 As considerações precedentes não significam que, ao instituir o regime de licenças de exportação de tubos para um dos mais importantes mercados, as instituições comunitárias estivessem isentas de responsabilidade no que se refere à especial situação das empresas especializadas na distribuição desses produtos, como, aliás, o reconheceram ao criar a possibilidade de transferência dessas licenças para as empresas distribuidoras. Caso se verificasse que essas empresas, enquanto categoria, tinham de suportar uma parte desproporcionada dos encargos resultantes da restrição dos mercados de exportação, competiria às instituições comunitárias remediar essa situação através de medidas apropriadas. Não ressalta, contudo, do processo encontrarem-se reunidos esses presupostos no caso presente.

18 Quanto à alegada discriminação entre Estados-membros, deve observar-se que o convénio tem por objecto a exportação de tubos de aço a partir da Comunidade, enquanto tal, não estabelecendo qualquer distinção entre os diversos Estados-membros nem se referindo às correntes de exportação tradicionais originárias dos Estados-membros. O convénio fixa o limite máximo comunitário de exportação de tubos de aço em 7,6% do consumo aparente dos Estados Unidos; o Regulamento n.° 60/85 encarrega a Comissão do cálculo das quantidades resultantes desse limite e estabelece, no anexo III, arepartição dessas quantidades entre os Estados-membros, atribuindo a cada um uma percentagem da parte do consumo aparente dos Estados Unidos. Todavia, as autoridades competentes dos Estados-membros devem conceder as licenças de exportação tomando em consideração, entre outros factores, o "respeito das correntes tradicionais de exportação das empresas" e o "respeito das correntes de exportação para os Estados Unidos na sua distribuição tradicional ao longo do ano" (n.° 2 do artigo 5.° do Regulamento n.° 60/85).

19 Assim sendo, incumbia à demandante demonstrar por que razão o Conselho deveria ter respeitado, ao proceder à repartição do limite máximo comunitário entre os Estados-membros, as correntes tradicionais de exportação dos Estados-membros, bem como provar que ultrapassara, no caso presente, a margem de apreciação de que dispunha no âmbito dessa função. A demandante limitou-se, contudo, à tese geral - não concretizada e contestada pelas instituições demandadas - de que determinados Estados-membros, e designadamente os Países Baixos, teriam beneficiado de uma quota nacional demasiado elevada visto que não conforme com as correntes tradicionais de exportação.

20 Deve acrescentar-se, por outro lado, que os números fornecidos pelas partes não revelam a existência de diferença significativa entre, por um lado, as quotas dos diferentes Estados-membros na exportação para os Estados Unidos de tubos de aço no período anterior à entrada em vigor do regulamentoe, por outro, a repartição entre os Estados-membros do limite máximo comunitário de exportação, que consta do anexo III ao Regulamento n.° 60/85.

21 Logo, não pode também ser aceite o fundamento baseado na discriminação entre os Estados-membros.

22 Resulta do conjunto das considerações precedentes não se ter provado a ilegalidade do regime de licenças de exportação instituído pelos regulamentos n.os 60 e 61/85. Em consequência, não se revela necessário examinar se se encontram reunidas as outras condições exigidas para a determinação da responsabilidade da Comunidade.

23 A acção deve, portanto, ser julgada improcedente por falta de fundamento.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

24 Nos termos do n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento Processual, a parte vencida deve ser condenada nas despesas do processo. Tendo a demandante sido vencida em todos os seus fundamentos, deve ser condenada nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL (Sexta Secção)

decide:

1) A acção é julgada improcedente.

2) A demandante é condenada nas despesas do processo.

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