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Document 61984CJ0150

    Acórdão do Tribunal (Primeira Secção) de 23 de Abril de 1986.
    Giorgio Bernardi contra Parlamento Europeu.
    Funcionário - Cobertura dos riscos de acidente e doença profissional.
    Processo 150/84.

    Colectânea de Jurisprudência 1986 -01375

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1986:167

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL (Primeira Secção)

    23 de Abril de 1986 ( *1 )

    No processo 150/84,

    Giorgio Bernardi, funcionário aposentado do Parlamento Europeu, patrocinado por L. Fortuna, advogado do foro de Roma, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado H. Reiner, 15, rue F.-Clément,

    recorrente,

    contra

    Parlamento Europeu, representado pelo seu secretário-geral, H.-J. Opitz, na qualidade de agente, assistido por F. rierbert, advogado do foro de Bruxelas, e por B. Moutrier, advogado do foro do Luxemburgo, com domicílio escolhido no escritório deste, 16, avenue de la Porte-Neuve, B. P. 135,

    recorrida,

    que tem por objecto a anulação da nota n.o 521 do Parlamento Europeu, de 10 de Novembro de 1983, e das medidas anexas relativas à aplicação do artigo 73.o do estatuto dos funcionários e dos artigos 17.o a 23.o da Regulamentação relativa à Cobertura dos Riscos de Acidente e de Doença Profissional dos Funcionários das Comunidades Europeias,

    O TRIBUNAL (Primeira Secção),

    constituído pelos Srs. R. Joliét, presidente de secção, G. Bosco e T. F. O'Higgins, juízes,

    advogado-geral : M. Darmon

    secretária: D. Louterman

    ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 23 de Janeiro de 1986,

    profere o presente

    ACÓRDÃO

    (A parte relativa aos factos não é reproduzida)

    Fundamentos da decisão

    1

    Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal em 18 de Junho de 1984, Giorgio Bernardi, funcionário do Parlamento Europeu aposentado antecipadamente por invalidez, interpôs um recurso visando a anulação de uma decisão do Parlamento Europeu, de 4 de Outubro de 1983, que nega a existência de doença profissional no seu caso e, em consequência, recusa pagar-lhe o subsídio previsto no artigo 73.o do Estatuto dos funcionários para o caso de invalidez permanente de origem profissional, bem como a anulação de uma decisão do Parlamento Europeu, de 10 de Novembro de 1983, em que lhe é recusado o reembolso de diversas importâncias.

    2

    O recorrente, tradutor do grau LA 5 na Divisão de Tradução do Parlamento Europeu, foi objecto de dois processos de inquérito médico, entre 1979 e 1983.

    3

    O primeiro processo, baseado no artigo 59.o, n.o 1, quarto parágrafo, do estatuto dos funcionários (adiante designado por estatuto), foi de iniciativa oficiosa do Parlamento Europeu. Com efeito, as faltas por doença do recorrente, acumuladas, tinham excedido doze meses num período de três anos, e o Parlamento Europeu decidiu, em 8 de Outubro de 1979, submeter o caso à Comissão de Invalidez prevista na disposição acima referida. Em 1 de Dezembro de 1981, essa comissão concluiu pela existência, retivamente ao recorrente, de uma invalidez permanente total que o impossibilitava de exercer funções correspondentes a um lugar da sua carreira. Por decisão de 5 de Março de 1982, o Parlamento Europeu admitiu a aposentação do recorrente e atribuiu-lhe, com efeitos desde 1 de Março de 1982, uma pensão de invalidez no montante de 70 % do seu último vencimento-base. O recorrente não contesta a regularidade de tal processo.

    4

    Enquanto decorria o primeiro processo, o Parlamento Europeu ordenou que o recorrente se submetesse a dois exames médicos, um efectuado pelo dr. Cis, em 5 de Dezembro de 1979, e o outro efectuado pelo dr. Lieschke, em 23 de Abril de 1981. Segundo afirma o Parlamento Europeu, esses dois exames médicos enquadram-se no âmbito de um inquérito informal efectuado pela administração sobre o motivo das faltas repetidas do recorrente. Este afirma, pelo contrário, que os drs. Cis e Lieschke foram designados no âmbito do segundo processo, a que adiante se fará referência.

    5

    O segundo processo, baseado no artigo 73.o do estatuto e nos artigos 17.o a 23.o da Regulamentação relativa à Cobertura dos Riscos de Acidente e de Doença Profissional dos Funcionários das Comunidades Europeias (adiante designada por regulamentação), foi desencadeado por iniciativa do recorrente. Com data de 27 de Março de 1979, este dirigiu ao Parlamento Europeu a declaração de doença profissional referida no artigo 17.o, n.o 1, da regulamentação, com vista a obter o subsídio previsto no artigo 73.o, n.o 2, b), do estatuto. Esta disposição garante aos funcionários afectados por invalidez permanente total, devida a doença profissional, o pagamento de uma quantia ou de uma renda, para além da pensão de invalidez prevista no artigo 78.o do estatuto.

    6

    A concessão desse subsídio depende da verificação prévia da existência de doença profissional do funcionário. Tal verificação redundou, no caso vertente, numa conclusão médica negativa, e o subsídio foi recusado ao recorrente por decisão do Parlamento Europeu, de 4 de Outubro de 1983. Fundamentando o seu recurso, o recorrente contesta a regularidade do processo que culminou na conclusão médica com base na qual o Parlamento Europeu tomou a decisão.

    7

    A primeira fase do processo de verificação de doença profissional consiste no inquérito previsto no artigo 17.o, n.o 2, da regulamentação. Para os efeitos desse inquérito, o Parlamento Europeu nomeou o seu consultor médico, o dr. De Meersman, para proceder ao exame do recorrente. O dr. De Meersman solicitou um exame pelo dr. Stumper, especialista em otorrinolaringologia.

    8

    Depois de ter examinado o recorrente, em 22 de Fevereiro de 1980, o dr. De Meersman enviou ao Parlamento Europeu, em 14 de Março de 1980, um relatório provisório no qual explicita que, embora devidamente convocado pelo dr. Stumper, o recorrente não se apresentou a este para o exame, e conclui que «sem dispor de informações mais completas, é impossível conceder ao Sr. Bernardi o benefício do reconhecimento de doença profissional».

    9

    Em 10 de Junho de 1980, o chefe da Divisão dos Assuntos Sociais do Parlamento Europeu escreveu ao recorrente, informando-o de que o exame médico de 22 de Fevereiro de 1980 não permitia concluir pela existência de doença profissional, e que, caso discordasse dessa decisão, tinha a possibilidade de solicitar um parecer da junta médica, nos termos do artigo 21.o da regulamentação.

    10

    Por carta de 19 de Junho de 1980, o recorrente manifestou a sua discordância das conclusões do dr. De Meersman, e solicitou que fosse ouvida a junta médica. Nomeou o dr. Fidotti para o representar nessa junta e solicitou que fossem transmitidos a este último o relatório do dr. De Meersman, de 14 de Março de 1980, bem como o relatório do dr. Cis, de 22 de Novembro de 1979.

    11

    Em 28 de Julho de 1980, o chefe da Divisão dos Assuntos Sociais escreveu ao recorrente informando-o de que a junta médica só poderia reunir depois de obter o parecer definitivo do dr. De Meersman que, por sua vez, aguardava os resultados do exame que o dr. Stumper deveria efectuar. Assim, foi solicitado ao recorrente que se apresentasse o mais depressa possível ao dr. Stumper, que efectivamente o examinou em 16 de Setembro de 1980.

    12

    Em 24 de Fevereiro de 1981, o dr. De Meersman elaborou o seu relatório definitivo, em que confirmou a sua conclusão anterior quanto à inexistência de doença profissional.

    13

    Em 22 de Maio de 1981, o chefe da Divisão dos Assuntos Sociais informou o recorrente da conclusão do relatório definitivo do dr. De Meersman, esclarecendo que podia iniciar-se o processo de apreciação pela junta médica, conforme o recorrente solicitara na sua carta de 19 de Junho de 1980. Essa comunicação constituía o projecto de decisão do Parlamento Europeu, previsto no artigo 21.o, primeiro parágrafo, da regulamentação, e concluía a primeira fase do processo de verificação da existência de doença profissional.

    14

    Na sequência do pedido feito pelo recorrente em 19 de Junho de 1980, iniciou-se a segunda fase do processo de verificação de existência de doença profissional, que corre perante a junta médica. A junta era composta pelo dr. De Meersman, nomeado pelo Parlamento Europeu, pelo dr. Fidotti, nomeado pelo recorrente, e pelo dr. Van Den Eeckhaut, escolhido de comum acordo pelos outros dois médicos. A junta examinou o recorrente em 15 de Dezembro de 1981, na presença do dr. Castrica, que, não sendo membro dela, fora autorizado a assistir aos seus trabalhos, a pedido do recorrente. Terminado o exame, a junta médica encarregou o dr. Van Den Eeckhaut de elaborar um relatório provisório.

    15

    Em 29 de Dezembro de 1981, o dr. Van Den Eeckhaut dirigiu aos seus dois colegas um projecto de relatório que, em conclusão, considerava não existir qualquer doença, e sim uma simples deficiência de técnica vocal, reeducável desde que existissem no interessado motivação e boa vontade suficientes. Este projecto de relatório obteve a concordância do dr. De Meersman, mas não a do dr. Fidotti, que, por carta de 8 de Março de 1982, reservou a sua posição definitiva para depois de receber os relatórios médicos do dr. Cis, de 5 de Dezembro de 1979, e do dr. Lieschke, de 23 de Abril de 1981. Esses relatórios foram-lhe transmitidos em Abril de 1982.

    16

    Posteriormente, o dr. Van Den Eeckhaut reformulou por três vezes o seu projecto de relatório; da primeira vez, em 19 de Abril de 1982, depois de ter tomado conhecimento dos relatórios dos drs. Cis e Lieschke; da segunda vez, em 25 de Agosto de 1982, depois de ter recebido as observações do dr. Fidotti; e, finalmente, uma terceira vez, em 2 de Março de 1983, depois de ter recebido um projecto de relatório do dr. Fidotti e observações do dr. Castrica, ambos favoráveis ao reconhecimento da existência de doença profissional, assim como observações do dr. De Meersman, concluindo pela inexistência de doença profissional. Nas várias versões do seu projecto, o dr. Van Den Eeckhaut concluiu pela inexistência de doença profissional no caso do recorrente.

    17

    O dr. De Meersman subscreveu o projecto de relatório de 2 de Março de 1983. O dr. Fidotti não o assinou e, por telegrama de 21 de Abril de 1983, anunciou ter observações a fazer. Não tendo recebido essas observações até ao princípio de Junho de 1983, o dr. Van Den Eeckhaut enviou ao Parlamento Europeu, em 3 de Junho de 1983, as conclusões da junta médica, assinadas por ele próprio e pelo dr. De Meersman.

    18

    Com base nas conclusões da junta médica, o chefe da Divisão dos Assuntos Sociais do Parlamento Europeu informou o recorrente, em 4 de Outubro de 1983, de que não se verificara a existência, no seu caso, de qualquer doença profissional. Seguidamente, o Parlamento Europeu solicitou ao recorrente o pagamento da importância de 43050 BFR, representando metade dos honorários do dr. Van Den Eeckhaut, conforme se prevê no artigo 23.o, n.o 2, terceiro parágrafo, da regulamentação, para a situação em que, como no caso presente, o parecer da junta médica coincide com o projecto de decisão da autoridade investida do poder de nomeação. Não tendo o recorrente dado sequência a tal pedido, foi-lhe descontada da pensão de invalidez a importância de 43050 BFR.

    19

    Por carta de 19 de Outubro de 1983, o recorrente manifestou expressamente reservas quanto à regularidade do processo observado e pediu o reembolso das importâncias despendidas para se submeter aos exames dos drs. Cis e Lieschke e para mandar traduzir, para a junta mèdica, os relatórios elaborados após esses exames. O reembolso dessas importâncias foi recusado ao recorrente por carta do chefe da Divisão dos Assuntos Sociais, de 10 de Novembro de 1983.

    20

    Em 19 de Novembro de 1983, o recorrente reclamou das decisões do Parlamento Europeu de 4 de Outubro e 10 de Novembro de 1983, ao abrigo do artigo do artigo 90.o, n.o 2, do estatuto. O indeferimento tácito da reclamação verificou-se em 19 de Março de 1984. O presente recurso foi registado na Secretaria do Tribunal em 18 de Junho de 1984.

    21

    Na sua essência, o objecto do recurso consiste em:

    que se declare verificada a irregularidade dos trabalhos e do relatório definitivo da junta médica e que, consequentemente, sejam anuladas as decisões comunicadas por cartas do chefe da Divisão dos Assuntos Sociais, de 4 de Outubro e 10 de Novembro de 1983, que declaram não sofrer o recorrente de qualquer doença profissional;

    que se declare que as decisões relativas ao reconhecimento de uma doença profissional devem ser adoptadas pela autoridade competente para aplicar a regulamentação, em conformidade com as suas determinações, e que tal não se verificou no caso em apreço;

    que se ordene a essa entidade que reconheça a natureza profissional da enfermidade do recorrente e que lhe seja efectuado o pagamento do subsídio devido por força do artigo 73.o do estatuto;

    que se ordene ao Parlamento Europeu o pagamento ao recorrente das importâncias seguintes: a) 43050 BFR deduzidos da pensão do recorrente, representando metade dos honorários do dr. Van Den Eeckhaut, montante imputado ao recorrente por aplicação do artigo 23.o, n.o 2, terceiro parágrafo, da regulamentação; b) 38820 BFR despendidos pelo recorrente para se apresentar aos exames médicos dos drs. Cis e Lieschke, ordenados pelo Parlamento Europeu; c) 5350 BFR despendidos pelo recorrente com a tradução, para os membros da junta mèdica, dos relatónos dos drs. Cis e Lieschke.

    22

    Na rèplica, o recorrente formula ainda diversos pedidos. Estes devem ser rejeitados, por terem um objecto diferente do objecto do recurso, tal como está exposto acima.

    Quanto à admissibilidade

    23

    O Parlamento Europeu alega a inadmissibilidade de várias partes do pedido por se pretender com elas que o Tribunal profira um acórdão declarativo e dirija ordens à administração.

    24

    Sem que se torne necessário examinar se o Tribunal tem competência para proferir acórdãos declarativos e dirigir ordens à administração, basta verificar que os pedidos visados podem ser analisados como fundamentos do recurso contra as decisões de 4 de Outubro e 10 de Novembro de 1983, sendo pacífico que, em caso de anulação, o Parlamento Europeu deverá tomar as medidas necessárias à execução do acórdão.

    Quanto ao fundo do recurso

    a) Sobre o processo anterior à constituição da junta médica

    25

    O recorrente contesta a regularidade do projecto de decisão que lhe foi transmitido pelo Parlamento Europeu, nos termos do artigo 21.o, primeiro parágrafo, da regulamentação, em consequência do qual o recorrente solicitou a constituição da junta médica.

    26

    O recorrente alega primeiramente que o projecto de decisão que punha termo ao inquérito administrativo previsto nos artigos 16.o a 18.o da regulamentação não lhe foi comunicado regularmente, por essa comunicação provir de um funcionário que não possuía poderes para o efeito.

    27

    O Parlamento Europeu considera que o procedimento é regular, porque a decisão final de 4 de Outubro de 1983 teria sido tomada pela entidade competente. E apresenta várias decisões de delegação, das quais resultaria que os poderes para aplicação do artigo 73.o do estatuto pertencem ao secretário-geral que, por decisão de 1 de Março de 1982, teria validamente delegado os seus poderes no chefe da Divisão dos Assuntos Sociais. Assim, a decisão final teria sido regularmente tomada, pelo que o procedimento não seria passível de quaisquer críticas.

    28

    Cumpre notar que o recorrente tem razão quando alega uma irregularidade do processo, na medida em que o projecto de decisão que pôs termo ao inquérito administrativo não lhe foi comunicado por um funcionário habilitado para o efeito. No entanto, convém notar que a decisão final de 4 de Outubro de 1983 emana do chefe da Divisão dos Assuntos Sociais que, nessa data, estava validamente habilitado para adoptar essa decisão em nome da autoridade investida do poder de nomeação. Acresce que o projecto de decisão não teve consequências no que respeita à conclusão do processo, uma vez que o recorrente solicitou o parecer da junta médica. É princípio assente que uma irregularidade processual só implica a anulação de uma decisão, no todo ou em parte, se se determinar que, não existindo essa irregularidade, a decisão impugnada poderia ter tido um conteúdo diferente (acórdão de 29 de Outubro de 1980, Van Landewyck/Comissão, processos apensos 209 a 215 e 218/78, Recueil 1980, p. 3125). Não sendo esse o caso presente, a queixa decorrente do facto de o projecto não ter sido comunicado pela autoridade competente não pode ser atendida.

    29

    O recorrente critica, em seguida, o projecto de decisão, na medida em que este conclui pela inexistência de doença profissional. Em seu entender, as circunstâncias do caso deveriam ter levado necessariamente o Parlamento Europeu a concluir, nessa fase, pela existência de uma doença profissional. O recorrente aduz três argumentos para justificar essa afirmação.

    30

    Em primeiro lugar, o recorrente considera que o Parlamento Europeu não deveria ter baseado o seu projecto de decisão apenas no relatório médico do dr. De Meersman, de 24 de Fevereiro de 1981, mas ter tomado também em consideração os relatórios do dr. Cis, de 5 de Dezembro de 1979, e do dr. Lieschke, de 23 de Abril de 1981, os quais, segundo o recorrente, concluíam pela existência de uma doença profissional.

    31

    O Parlamento Europeu responde que os relatórios dos drs. Cis e Lieschke foram elaborados, não no âmbito do processo de verificação de doença profissional, que é objecto do presente recurso, mas no quadro de um inquérito informal paralelo ao processo de verificação de invalidez. A esse respeito, o Parlamento Europeu invoca a sua nota interna de 8 de Janeiro de 1980 e a sua carta de 25 de Maio de 1981, dirigida ao recorrente, que confirmariam o que antecede.

    32

    Importa referir que o recorrente não apresenta qualquer prova da qual resulte que os relatórios dos drs. Cis e Lieschke deveriam ser apensos ao processo de verificação de doença profissional. Pelo contrário, resulta dos documentos juntos pelo Parlamento Europeu que esses relatórios se prendem com a verificação da invalidez do recorrente. Assim sendo, o Parlamento Europeu não tinha qualquer obrigação de tomar em consideração esses dois relatórios médicos aquando da elaboração do seu projecto de decisão, uma vez que os processos conducentes à aplicação dos artigos 73.o e 78.o do estatuto são distintos e dão lugar a decisões independentes entre si (acórdão de 15 de Janeiro de 1981, B./Parlamento Europeu, 731/79, Recueil 1981, p. 107).

    33

    Em segundo lugar, o recorrente alega que o conteúdo do relatório do dr. De Meersman, de 24 de Fevereiro de 1981, deveria ter levado o Parlamento Europeu a comunicar-lhe um projecto de decisão favorável.

    34

    O Parlamento Europeu responde que o recorrente, ao recorrer para a junta médica, reconheceu tacitamente a regularidade do processo seguido até então.

    35

    Este segundo argumento do recorrente é também destituído de fundamento. Convém, de facto, salientar que o relatório do dr. De Meersman conclui de modo categórico pela inexistência de doença profissional. Assim, o projecto de decisão está conforme com as conclusões desse relatório. De qualquer modo, tal como resulta do acórdão de 29 de Novembro de 1984 (Suss/Comissão, 265/83, Recueil 1984, p. 4029), a administração, nessa fase do processo, não está vinculada às conclusões emitidas pelos médicos por si escolhidos.

    36

    Em terceiro lugar, o recorrente sustenta que o Parlamento Europeu já reconheceu tacitamente a origem profissional da sua invalidez, ao fixar o montante da sua pensão de invalidez em 70.o do vencimento-base. Essa decisão teria sido tomada com base no artigo 78.o, segundo parágrafo, do estatuto, aplicável em caso de invalidez devida a doença profissional. Sob pena de se tornar incoerente, o Parlamento Europeu deveria ter confirmado esse reconhecimento tácito da origem profissional da doença no presente processo, e comunicar ao recorrente um projecto de decisão nesse sentido.

    37

    Também este terceiro argumento deve ser rejeitado. De facto, o Parlamento Europeu declara justificadamente que foi com base nos artigos 78.o, terceiro parágrafo, e 77o, segundo parágrafo, do estatuto que o montante da pensão de invalidez do recorrente foi fixado em 70 % do vencimento-base. Resulta das disposições referidas que a fixação dessa percentagem para a pensão de invalidez em nada implica o reconhecimento da origem profissional da invalidez. Não existe, portanto, qualquer contradição entre a decisão relativa à pensão de invalidez e aquela que é objecto do presente recurso.

    38

    Resulta das considerações que antecedem que o projecto de decisão referido no artigo 21.o, primeiro parágrafo, da regulamentação, não está ferido de qualquer irregularidade que possa afectar a validade da decisão final.

    b) Sobre o funcionamento da junta médica

    39

    O recorrente critica também a regularidade do funcionamento da junta médica por o relatório da mesma não conter a assinatura do dr. Fidotti, encarregado de defender os seus interesses, e por o princípio da colegialidade ter sido ignorado, uma vez que as observações do dr. Fidotti não foram tomadas em consideração.

    40

    O Parlamento Europeu considera, por sua vez, que a ausência da assinatura do dr. Fidotti no relatório da junta médica apenas traduz o desacordo que persistia entre esse médico e os seus colegas quanto às conclusões da junta médica. O recorrente não pode queixar-se de os argumentos dos médicos que representavam os seus interesses não terem sido tomados em conta: foi devido às observações dos drs. Fidotti e Castrica que o dr. Van Den Eeckhaut reviu por várias vezes o seu projecto de relatório; por outro lado, o dr. Van Den Eeckhaut esperou em vão, durante seis semanas, pelas observações do dr. Fidotti anunciadas num telegrama de 21 de Abril de 1983, antes de transmitir ao Parlamento Europeu o relatório de 3 de Junho de 1983, assinado por ele próprio e pelo dr. De Meersman.

    41

    A argumentação do recorrente deve ser afastada. Por um lado, a queixa baseada na ausência da assinatura do dr. Fidotti não tem fundamento, uma vez que a junta médica delibera validamente por maioria dos seus membros (acórdão de 21 de Maio de 1981, Morbelli/Comissão, 156/80, Recueil 1981, p. 1357). Por outro lado, não houve desrespeito do princípio da colegialidade. Conforme resulta do processo, o dr. Van Den Eeckhaut reviu, efectivamente, o seu projecto de relatório na sequência das observações dos drs. Fidotti e Castrica, e aguardou durante seis semanas observações suplementares do dr. Fidotti antes de enviar o seu relatório ao Parlamento Europeu.

    42

    Resulta do que antecede que o funcionamento da junta médica não está ferido de qualquer irregularidade.

    c) Sobre o reembolso de metade dos honorarios do dr. Van Den Eeckhaut

    43

    O artigo 23.o, n.o 2, terceiro parágrafo, da regulamentação determina que, quando o parecer da junta médica coincide com o projecto de decisão da autoridade investida do poder de nomeação, o funcionario deve suportar os honorarios e demais despesas do mèdico que escolheu, e metade dos honorarios e demais despesas do terceiro médico.

    44

    Foi nos termos dessa disposição que o Parlamento Europeu deduziu da pensão de invalidez do recorrente o montante de 43050 BFR, que representam metade dos honorários do terceiro membro da junta médica, o dr. Van Den Eeckhaut.

    45

    Deve constatar-se que o parecer da junta médica coincide com o projecto de decisão e que o procedimento foi regular. Sendo assim, justificava-se a recusa de reembolsar ao recorrente metade dos honorários do dr. Van Den Eeckhaut, descontados da pensão de invalidez do recorrente.

    d) Sobre o reembolso das despesas efectuadas pelo recorrente para se submeter aos exames médicos dos drs. Cis e Lieschke

    46

    O Tribunal constatou acima que os exames médicos dos drs. Cis e Lieschke foram ordenados no àmbito do processo de verificação de invalidez, que não é objecto do presente recurso.

    47

    Assim, justificava-se a recusa, transmitida pela carta de 10 de Novembro de 1983, de reembolsar ao recorrente as despesas feitas por este para se submeter aos exames médicos acima referidos.

    e) Sobre o reembolso das despesas feitas pelo recorrente com a tradução dos relatórios médicos dos drs. Cis e Lieschke

    48

    Deve constatar-se que foi o recorrente que tomou a iniciativa de mandar traduzir esses documentos, sem que nada o obrigasse a isso.

    49

    Assim sendo, era justificada a recusa, comunicada pela carta de 10 de Novembro de 1983, de reembolsar ao recorrente as despesas que efectuou com a tradução dos referidos relatórios médicos.

    Conclusão

    50

    Atendendo às considerações que antecedem, deve ser negado provimento ao recurso.

    Quanto às despesas

    51

    Nos termos do artigo 69.o, n.o 2, do Regulamento Processual, a parte vencida é condenada nas despesas.

    52

    Contudo, nos termos do artigo 70.o do mesmo regulamento, as despesas em que incorram as instituições nos recursos dos agentes das Comunidades são suportadas por aquelas.

    53

    Todavia, no caso em apreço, a irregularidade derivada da comunicação do projecto de decisão por um funcionário sem poderes para o efeito pode ter pesado na decisão do recorrente de interpor o recurso. Consequentemente, metade das despesas do recorrente devem ser suportadas pelo Parlamento Europeu, em aplicação do artigo 69.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento Processual, que permite ao Tribunal determinar que as partes suportem as despesas, no todo ou em parte, por motivos excepcionais.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL (Primeira Secção)

    decide:

     

    1)

    É negado provimento ao recurso.

     

    2)

    O Parlamento Europeu suportará metade das despesas do recorrente, para além das suas próprias despesas.

     

    Joliet

    Bosco

    O'Higgins

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, a 23 de Abril de 1986.

    O secretário

    P. Heim

    O presidente da Primeira Secção

    R. Joliet


    ( *1 ) Língua do processo: italiano.

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