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Document 61984CC0270
Opinion of Mr Advocate General Darmon delivered on 23 April 1986. # Assunta Licata v Economic and Social Committee. # Staff committee - Termination of a member's term of office. # Case 270/84.
Conclusões do advogado-geral Darmon apresentadas em 23 de Abril de 1986.
Assunta Licata contra Comité Económico e Social.
Comité do Pessoal - Tempo do mandato de um membro.
Processo 270/84.
Conclusões do advogado-geral Darmon apresentadas em 23 de Abril de 1986.
Assunta Licata contra Comité Económico e Social.
Comité do Pessoal - Tempo do mandato de um membro.
Processo 270/84.
Colectânea de Jurisprudência 1986 -02305
ECLI identifier: ECLI:EU:C:1986:170
MARCO DARMON
apresentadas em 23 de Abril de 1986 ( *1 )
Senhor Presidente,
Senhores Juízes,
1. |
Os membros do Comité do Pessoal de uma instituição comunitária podem continuar a exercer o mandato até ao seu termo quando, eleitos para representar os agentes de determinada categoria, quadro ou regime, forem nomeados para uma categoria, quadro ou regime diferentes no decurso do seu mandato? É este, sob reserva da admissibilidade do recurso da recorrente, o problema que o Tribunal terá de resolver nos presentes autos. Contratada pelo Comité Económico e Social (a seguir «CES»), no dia 1 de Março de 1977, como agente local, Assunta Licata foi eleita, em 21 de Abril de 1983, para o Comité do Pessoal desta instituição, como única representante dos agentes sujeitos ao regime aplicável aos outros agentes das Comunidades. Após ter passado nas provas de um concurso de recrutamento, foi nomeada, em 22 de Dezembro de 1983, funcionária da categoria D. Esta nova situação — passagem da interessada do regime aplicável aos outros agentes para o dos funcionários das Comunidades — levou o Comité do Pessoal a suscitar, a partir de Março de 1984, a questão da sua representatividade. Por carta de 2 de Maio de 1984, o Comité do Pessoal, de acordo com o parecer emitido pelo Serviço Jurídico do CES, consultado sobre a matéria pela administração, solicitou ao secretário-geral da instituição a adaptação da Decisão 1896/75-A, de 28 de Julho de 1975, relativa às «disposições referentes à composição e funcionamento do Comité do Pessoal». Informou-o, por outro lado, da sua intenção de organizar eleições parciais para a substituição de Assunta Licata. De acordo com o estabelecido no primeiro parágrafo do artigo 1.o do anexo II do estatuto, o segundo parágrafo do artigo 5.o da Decisão 1896/75-A prevê que os membros do Comité do Pessoal sejam eleitos, em regra, por dois anos, podendo este período ser alterado pela instituição mas sem nunca ficar inferior a um ano. A mesma norma estabelece, por outro lado, que «O mandato de membro do comité finda igualmente no caso de demissão voluntária ou cessação de funções.» Basta a verificação de qualquer destas eventualidades para pôr fim antecipado ao mandato do representante, independentemente do tempo do seu exercício já decorrido. Visando expressamente «as propostas de alteração apresentadas pelo Comité do Pessoal» e baseando-se em «razões de clareza e segurança jurídicas», o presidente do CES, pela Decisão 173/84-A, de 7 de Maio de 1984, adaptou as disposições do segundo parágrafo do artigo 5.o, já referido, determinando que «O mandato de membro do Comité do Pessoal termina também em caso de demissão voluntária, cessação definitiva de funções ou mudança de categorìa, quadro ou regime, quando a representatividade do Comité do Pessoal referida no artigo 3.o deixar de estar assegurada.» Entretanto, na sequência duma reunião de concertação com os representantes da União Sindical, ocorrida no dia 16 de Maio seguinte, a administração, tendo em consideração as críticas formuladas por esta organização, decidiu suspender a aplicação daquela decisão até novo parecer do Serviço Jurídico. Por nota de 19 de Junho de 1984, este confirmou o seu primeiro parecer. Em 25 de Junho, sem esperar mais nada, o Comité do Pessoal resolveu, por seu lado, aplicar a Decisão 173/84-A, recusando contar o voto da recorrente. Disso informou o secretário-geral, em 17 de Junho. Em resposta datada de 31 de Julho de 1984, este confirmou expressamente que a aplicação da Decisão 173/84-A estava suspensa até Setembro. Em 9 de Outubro de 1984, o Comité do Pessoal convocou uma assembleia geral para a organização de eleições parciais. Por carta dirigida, em 11 de Outubro seguinte, ao Comité do Pessoal (tendo por objecto a «representatividade do Comité do Pessoal»), o secretário-geral do CES precisou que «a Decisão 173/87-A (estava) de novo em vigor». |
2. |
Foi neste contexto que, em 6 de Novembro de 1984, Assunta Licata dirigiu ao CES uma reclamação contra:
Baseando-se nas disposições do artigo 91.o, n.o 4, do estatuto, interpôs, em 14 de Novembro seguinte,
Por despacho de 11 de Dezembro de 1984, o presidente da Primeira Secção ordenou o seguinte : «Até ser lavrado acórdão sobre a questão de fundo, é suspensa a Decisão 173/84-A do presidente do Comité Económico e Social, de 7 de Maio de 1984, na parte em que invoca como causa da cessação do mandato de membro do Comité de Pessoal a mudança de categoria, quadro ou regime. São igualmente suspensas as eleições parciais organizadas em aplicação da mencionada decisão.» |
3. |
O exame da legalidade da Decisão 173/84-A está dependente da admissibilidade do recurso, contestada pela instituição recorrida. Como fundamento desta excepção, o CES apresenta, em substância, os seguintes argumentos. Antes de mais, considera que, por força do despacho de suspensão de 11 de Dezembro de 1984, o recurso interposto por Assunta Licata ficou sem objecto. Adiada a realização das eleições parciais — o que, longe de a privar do seu mandato, lhe permite cumpri-lo até ao seu termo normal —, desde logo o seu interesse em demandar ficou prejudicado. Por outro lado, o recorrido sustenta que os pedidos formulados no recurso e na reclamação são diferentes. O segundo fundamento do recurso, referente à decisão de organizar eleições parciais, não consta da reclamação. A recorrente não terá, assim, respeitado o princípio de que todo o recurso de um funcionário deve ser precedido de uma reclamação, nos termos do disposto no artigo 91.o do estatuto. Finalmente, o CES afirma que a recorrente não concretizou a natureza do acto violador dos seus interesses, termo a quo dos prazos estatutários de recurso. Não pode tratar-se da Decisão 173/84-A, que tem natureza regulamentar e, por isso, é inatacável por meio de recurso individual. A única decisão que lhe aplicou individualmente esta medida de natureza genérica foi a recusa, pelo Comité do Pessoal, em 25 de Junho, de contar o voto da recorrente. A reclamação, neste aspecto, foi tardia e, por conseguinte, o recurso é inadmissível. |
4. |
Não merece acolhimento nenhum dos fundamentos de inadmissibilidade indicados pelo recorrido. Em primeiro lugar, o recurso contencioso interposto por Assunta Licata não é de modo algum desprovido de objecto já que, nesta data, continua no exercício do seu mandato, pois as eleições gerais, que deviam pôr-lhe termo, foram adiadas por despacho de 11 de Junho de 1985, proferido no processo 146/85 R, Diezler e outros (Recueil 1985, p. 1805), até ser lavrado acórdão neste último processo. O seu interesse em agir, longe de ser teórico, tem assim um carácter vivo e actual. De qualquer forma, subsiste a questão do pagamento das despesas neste Tribunal, o que, por si só, pode justificar o interesse em agir por parte da recorrente. Em segundo lugar, se os pedidos formulados na reclamação e no recurso não são idênticos, trata-se apenas de diferenças formais. Assim, o primeiro pedido formulado no requerimento de interposição do recurso — a anulação da decisão impeditiva do cumprimento do mandato da recorrente, «ao excluí-la do Comité do Pessoal por aplicação da Decisão 173/84-A» — constitui uma síntese dos dois pedidos que constam da reclamação. Quanto ao segundo, relativo à decisão do CES de organizar eleições parciais, constitui o seu necessário complemento. Há, para retomar a expressão do advogado-geral Mancini nas suas conclusões no processo 173/84, Rasmussen, uma «continuidade substancial» entre os pedidos da reclamação e do recurso. As alegadas divergências de formulação não são determinantes, já que as conclusões do recurso «não alteram o fundamento nem o próprio objecto da reclamação» (processo 173/84, Rasmussen, acórdão de 23 de Janeiro de 1986, Recueil 1986, p. 197, n.o 12). Em definitivo, a questão da admissibilidade deve ser examinada por referencia ao acto, da autoria do CES, que aplicou à recorrente a Decisão Geral 173/84-A. A este respeito, o CES não pode seriamente sustentar que, por causa da independência do Comité do Pessoal, as decisões tomadas por este órgão se impõem sem reserva. As instituições comunitárias têm a obrigação de velar pela legalidade de todas as decisões tomadas pelos órgãos eleitos no seu seio. No primeiro acórdão do processo 54/75, De Dapper (Recueil 1976, p. 1381), colocando precisamente esta questão a propósito de um conflito sobre as eleições do Comité do Pessoal, o Tribunal, após análise aprofundada das pertinentes disposições do estatuto dos funcionários, chegou a esta mesma conclusão, sublinhando que «as instituições têm não só o direito de intervir oficiosamente, se tiverem dúvidas sobre a regularidade da eleição do Comitê do Pessoal, mas também o dever de decidir as reclamações que possam ser-lhes dirigidas a tal respeito, no quadro do procedimento estabelecido pelos artigos 90.o e 91.o do estatuto» (processo 54/75, já referido, n.o 23). O Tribunal deduziu a existência «desta responsabilidade» das disposições do n.o 2 do artigo 9.o do estatuto, que atribuem a cada instituição o encargo de determinar «a composição e as regras de funcionamento» do Comité do Pessoal, e, mais genericamente, «da autonomia de organização de que (cada uma) dispõe no âmbito da respectiva competência e do seu dever de garantir aos seus funcionários a faculdade de escolherem os seus representantes com total liberdade e dentro do respeito pelas regras da democracia» (processo 54/75, já referido, n.o 22). Para lá do contencioso eleitoral, estas afirmações de princípio levam-nos a pensar que cada instituição tem o dever de controlar a regularidade dos actos relativos tanto à composição como ao funcionamento do Comité do Pessoal — o que constitui, para todo o funcionário, uma garantia fundamental, na medida em que é pressuposto do controlo jurisdicional do Tribunal. Precisamente — confirmou-o a audiência — o CES, pela sua carta de 11 de Outubro de 1984, concretizou em torno da situação individual criada pela mudança de regime de Assunta Licata a aplicação da Decisão geral 173/84-A. Manifestação do seu dever de intervir, esta cana veio, efectivamente, reforçar de novo a referida decisão, até aí suspensa. Definitivamente, o CES — com ou sem razão, isso depende da apreciação quanto ao fundo da causa — com esta decisão individual consignou implicitamente que Assunta Licata já não tinha a qualidade necessária ao exercício do mandato em que fora investida e ratificou a decisão pela qual o Comité do Pessoal, em 9 de Outubro precedente, desencadeara o processo eleitoral destinado ao preenchimento do lugar da recorrente, considerado vago. E necessário, assim, ver na decisão individual tomada em 11 de Outubro o acto lesivo cuja anulação é pedida pela recorrente. A reclamação e o recurso, portanto, foram apresentados nos prazos estatutários e devem ser declarados admissíveis. |
5. |
É, assim, pela via de excepção, que a recorrente pretende levar o Tribunal a declarar a ilegalidade da Decisão Geral 173/84-A. Apresenta, para tanto, três fundamentos. Pelo primeiro, acusa a administração de não ter consultado o Comité do Pessoal, contrariamente ao exigido pelo artigo 6.o da Decisão 1896/75-A, antes de ter adoptado a decisão geral impugnada. Estando o Comité do Pessoal na origem desta decisão de adaptação, a recorrente não manteve este fundamento, substituindo-o por um outro de ordem formal, retirado da falta de consulta do Comité do Estatuto, contra o disposto no artigo 110.o do estatuto. Sem entrar na apreciação do mérito deste fundamento, basta realçar que apenas foi invocado na réplica. Como tal, deve ser considerado inadmissível, nos termos do disposto no artigo 42.o, n.o 2, do Regulamento Processual. O segundo fundamento assenta na violação do quarto parágrafo do artigo 1.o do anexo II do estatuto, em cujos termos «A composição do Comité do Pessoal... deve ser tal que assegure a representação de todas as categorias de funcionários e de todos os quadros previstos no artigo 5.o do estatuto, bem como dos agentes referidos no primeiro parágrafo do artigo 7.o do regime aplicável aos outros agentes das Comunidades». Efectivamente, para a recorrente, a Decisão 173/84-A seria contrária à ratio legis desta disposição, na medida em que exige que a representação de todos os funcionários de uma instituição, qualquer que seja a sua categoria, regime ou quadro, se mantenha ao longo de toda a duração do seu mandato, quando, em sua opinião, isso se aplica apenas ao início de funções do Comité do Pessoal. Acrescenta que a mudança para categoria, regime ou quadro diferentes não elimina no eleito o conhecimento dos problemas específicos dos seus antigos colegas, nem as ligações com eles estabelecidas. Finalmente, no seu último fundamento, a recorrente sustenta que o CES fez aplicação retroactiva da Decisão 173/84-A ao aplicar-lhe, depois de a ter criado, uma nova condição de expiração do seu mandato, inexistente no momento em que foi eleita membro do Comité do Pessoal. |
6. |
Estes dois fundamentos não podem afectar a legalidade da decisão. Como o Tribunal sublinhou no seu acórdão De Dapper, a exigência feita pelo quarto parágrafo do artigo 1.o do anexo II do estatuto visa, da mesma forma que a norma sobre o quórum de participação nas eleições, «garantir a representatividade do Comité do Pessoal» (processo 54/75, n.o 17), isto é, de um órgão que, precisou o Tribunal, «desempenha um papel de grande importância no funcionamento administrativo das instituições», pela tripla missão que lhe está confiada: «representar os interesses do pessoal junto da instituição, ... assegurar um contacto permanente entre esta e o seu pessoal e... cooperar, assim, no bom funcionamento dos serviços» (processo 54/75, já referido, n.os 11 e 12). No quadro da autonomia de organização que lhe é reconhecida pelo artigo 9.o, n.o 2, do estatuto, cada instituição, em cujo seio é criado um Comité do Pessoal, deve, por consequência, garantir a eficácia plena do princípio da representação assim consagrado. Ora, em nosso entender, a representatividade do Comité do Pessoal pressupõe, necessariamente, que a representação dos agentes de cada categoria, quadro ou regime seja assegurada por eleitos que deles façam parte e neles continuem enquanto durar o mandato. Efectivamente, qualquer que seja a boa fé do membro eleito pelos agentes de um grupo categorial, poderá, no caso de passagem para outro grupo, ver-se confrontado com conflitos de interesses que oponham os agentes de cada um desses grupos. Sob pena de irrealismo, não posso negar que cada categoria, quadro ou regime tem interesses e solidariedades próprias, por vezes conflituais. Mesmo assumindo o Comité do Pessoal uma missão geral junto da administração, os seus membros foram eleitos para representar os agentes de uma categoria, de um quadro ou de um regime determinados. Efectivamente, para lá das «questões horizontais», referentes ao conjunto do pessoal de uma instituição, que terão de encarar no âmbito do seu mandato, é preciso não menosprezar os problemas «verticais», relativos às dificuldades próprias da categoria, do quadro ou do regime que representam, e que poderão ser chamados a invocar no seio do Comité do Pessoal. Nestas condições, a eventualidade de o representante, que já não faça parte da categoria, quadro ou regime dos agentes que o elegeram, ser colocado perante um conflito de carácter «categorial»lato sensu não é de modo algum hipotética. Além disso, o estatuto afirmou expressamente o princípio da representação própria de todas as categorias, quadros ou regimes, a propósito da «composição» do Comité do Pessoal. Assim, longe de constituir uma mera condição de elegibilidade, a pluralidade de representação, enquanto princípio garante da representatividade e, assim, do próprio funcionamento do Comité do Pessoal, não só deve ser assegurada aquando da formação do comité, mas deve ainda verificar-se, em relação a cada um dos seus membros, ao longo de todo o seu mandato, por forma a que a sua composição seja o reflexo fiel da diversidade dos grupos categoriais que compõem a instituição. Não se verificando a demissão voluntária da requerente, o CES tinha, assim, no âmbito do seu dever de controlo, a obrigação, face ao princípio estatutário de representação que enforma a composição do Comité do Pessoal, de tirar as consequências da situação criada pela sua nomeação como funcionária. A via escolhida — medidas genéricas complementando a lista dos casos de cessação antecipada do mandato que constava do artigo 5.o da Decisão de base 1896/75-A, de preferência a uma simples carta convidando a recorrente e o Comité a agir de acordo com o estatuto — não pode, a nosso ver, revestir natureza determinante. Trata-se de uma medida de natureza interpretativa e não normativa, que vem explicitar um princípio estatutário. Enquanto tal, é, naturalmente, desprovida de qualquer efeito retroactivo. |
7. |
Por tudo o que vem dito, propomos que o Tribunal
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( *1 ) Traduzido do francês.