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Document 61962CJ0016

    Acórdão do Tribunal de 14 de Dezembro de 1962.
    Confédération nationale des producteurs de fruits et légumes e outros contra Conselho da Comunidade Económica Europeia.
    Processos apensos 16/62 e 17/62.

    Edição especial inglesa 1962-1964 00175

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:1962:47

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    14 de Dezembro de 1962 ( *1 )

    Nos processos apensos 16/62,

    1)

    Confédération nationale des producteurs de fruits et légumes, associação com sede em Paris, representada pela mesa em exercício,

    2)

    Fédération nationale des producteurs de fruits, associação com sede em Paris, representada pela mesa em exercício,

    3)

    Fédération nationale des producteurs de légumes, associação com sede em Paris, representada pela mesa em exercício,

    e 17 /62,

    Fédération nationale des producteurs de raisins de table, representada pela mesa em exercício,

    com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete do advogado Georges Margue, 20, rue Philippe II,

    recorrentes,

    assistidos por Pierre de Font-Réaulx, advogado na cour d'appel de Paris,

    apoiadas por

    Assemblée permanente des présidents de chambres d'agriculture, organismo público com sede em Paris, representada pelo seu presidente em exercício, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete do advogado Georges Margue, 20, rue Philippe II,

    interveniente,

    assistida por Pierre de Font-Réaulx, advogado na cour d'appel de Paris,

    contra

    Conselho da Comunidade Económica Europeia, representado pelo seu consultor jurídico Jacques Mégret, na qualidade de agente,

    que têm por objecto a anulação do Regulamento n.o 23 do acima mencionado Conselho, e designadamente do disposto no artigo 9.o ,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

    composto por: A. M. Donner, presidente, L. Delvaux e R. Rossi, presidentes de secção, A. Trabucchi e R. Lecourt, juízes,

    advogado-geral: M. Lagrange

    secretário: A. Van Houtte

    profere o presente

    Acórdão

    (A parte relativa à matéria de facto não é reproduzida)

    Fundamentos da decisão

    Quanto à admissibilidade

    1

    Nos termos do segundo parágrafo do artigo 173.o do Tratado CEE, as pessoas singulares ou colectivas só podem interpor recurso de um acto da Comissão ou do Conselho se este acto for uma decisão de que são destinatárias ou uma decisão que, embora tomada sob a forma de regulamento ou de decisão dirigida a outra pessoa, lhes diga directa e individualmente respeito.

    Daí resulta que estas pessoas não podem interpor um recurso de anulação dos regulamentos adoptados pelo Conselho ou pela Comissão.

    O Tribunal admite que o regime assim instituído pelos Tratados de Roma prevê, para a admissibilidade dos recursos de anulação interposto por particulares, condições mais restritivas do que o Tratado CECA.

    No entanto, não compete ao Tribunal pronunciar-se sobre os méritos deste regime, que resulta claramente do texto em análise.

    Designadamente, o Tribunal não pode fazer sua a interpretação proposta por uma das recorrentes no decurso da fase oral do processo, segundo a qual o termo «decisão» utilizado no segundo parágrafo do artigo 173.o abrange igualmente os regulamentos.

    Esta interpretação extensiva defronta-se com o facto de o artigo 189.o fazer uma distinção clara entre as noções respectivas de «decisão» e de «regulamento».

    É inconcebível que o termo «decisão» seja utilizado no artigo 173.o num outro sentido que não o sentido técnico resultante do artigo 189.o

    Resulta das considerações que precedem que, se o acto impugnado é um regulamento, os presentes recursos devem ser julgados inadmissíveis.

    Para apreciar esta questão, o Tribunal não pode contentar-se com a designação oficial do acto, mas deve ter em conta em primeiro lugar o seu objecto e o seu conteúdo.

    2

    Nos termos do artigo 189.o do Tratado CEE, o regulamento tem carácter geral e é directamente aplicável em todos os Estados-membros, enquanto que a decisão só é obrigatória para os destinatários que ela designar.

    O critério de distinção deve ser procurado no «alcance» geral ou não do acto em questão.

    A característica essencial da decisão consiste na limitação dos «destinatários» aos quais se dirige, enquanto que o regulamento, de carácter essencialmente normativo, é aplicável não a destinatários limitados, designados ou identificáveis, mas a categorias consideradas abstractamente e no seu todo.

    Portanto, para determinar nos casos duvidosos se se está em presença de uma decisão ou de um regulamento, é preciso averiguar se o acto em questão diz individualmente respeito a sujeitos determinados.

    Nestas condições, se um acto qualificado como regulamento pelo seu autor contém disposições que são de natureza a dizer respeito a certas pessoas singulares ou colectivas de uma maneira não só directa mas também individual, é necessário admitir, sem prejuízo da questão de saber se este acto considerado no seu conjunto pode ser qualificado, a justo título, como um regulamento, que estas disposições não têm de forma alguma um carácter regulamentar e podem portanto ser impugnadas por essas pessoas nos termos do artigo 173.o, segundo parágrafo.

    3

    No presente caso, o acto em causa foi qualificado como «regulamento» pelo seu autor.

    No entanto, as recorrentes sustentam que a disposição impugnada tem na realidade a natureza de uma «decisão tomada sob a forma de regulamento».

    É sem dúvida possível que uma decisão tenha igualmente um âmbito de aplicação muito vasto.

    No entanto, não pode considerar-se como uma decisão um acto aplicável a situações determinadas objectivamente e que produz efeitos jurídicos imediatos, em todos os Estados-membros, relativamente a categorias de pessoas consideradas de forma geral e abstracta, a menos que seja provado que esse acto diz individualmente respeito a determinadas pessoas, no sentido do segundo parágrafo do artigo 173.o

    No caso em apreço, a disposição impugnada produz efeitos jurídicos imediatos, em todos os Estados-membros, relativamente a categorias de pessoas determinadas de forma geral e abstracta.

    Efectivamente, o artigo 9.o do acto impugnado — disposição especialmente em causa no presente processo — suprime, para certos produtos e dentro de certos prazos, as restrições quantitativas à importação e as medidas de efeito equivalente.

    Além disso, este artigo prevê a renúncia, por parte dos Estados-membros, à aplicação do disposto no artigo 44.o do Tratado, ou seja, designadamente, ao direito de suspender ou reduzir temporariamente as importações.

    Assim sendo, o dito artigo elimina as restrições à liberdade dos operadores económicos exportarem ou importarem no interior da Comunidade.

    Resta examinar se a disposição impugnada diz individualmente respeito às recorrentes.

    Embora esta disposição, ao obrigar os Estados a pôr termo ou a renunciar a diversas medidas susceptíveis de favorecer os produtores agrícolas, afecte por isso mesmo os seus interesses e os dos membros das associações recorrentes, verifica-se, no entanto, que a dita disposição diz individualmente respeito a estes membros ao mesmo título que a todos os outros produtores agrícolas da Comunidade.

    Aliás, não pode aceitar-se o princípio segundo o qual um acto que afecta os interesses gerais de uma categoria de empresários diz individualmente respeito a uma associação, na sua qualidade de representante dessa categoria.

    Este princípio, que tem como efeito concentrar num único sujeito de direito interesses próprios dos membros de uma categoria, a quem são aplicáveis, nessa qualidade, verdadeiros regulamentos, prejudicaria o sistema do Tratado, que só admite o recurso de anulação interposto por particulares das decisões que os afectam enquanto destinatários, ou dos actos que os atingem de uma maneira análoga.

    Nestas condições, não pode admitir-se que a disposição em causa diga individualmente respeito às recorrentes.

    Resulta de tudo o que precede que o recorrido qualificou correctamente como regulamento a disposição impugnada.

    Assim, a excepção de inadmissibilidade tem fundamento e os recursos devem ser julgados inadmissíveis, sem que seja necessário examinar a questão de saber se as recorrentes têm qualidade para agir sempre que os seus membros o podem fazer.

    Quanto às despesas

    Por força do disposto no n.o 2 do artigo 69.o do Regulamento do Tribunal de Justiça, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo as recorrentes e a interveniente sido vencidas, há que condená-las nas despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    vistos os autos,

    ouvido o relatório do juiz-relator,

    ouvidas as alegações das partes,

    ouvidas as conclusões do advogado-geral,

    vistos os artigos 173.o e 189.o do Tratado CEE,

    visto o Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça da CEE,

    visto o Regulamento do Tribunal, e designadamente os artigos 69.o, n.o 2, e 91.o, n.o 4,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

    decide:

     

    1)

    Os recursos são julgados inadmissíveis.

     

    2)

    As recorrentes suportarão as suas próprias despesas e são condenadas a suportar as despesas causadas ao recorrido pelos seus recursos respectivos.

     

    3)

    A interveniente suportará as suas próprias despesas e é condenada a suportar as despesas causadas ao recorrido pelas respectivas intervenções.

     

    Donner

    Delvaux

    Rossi

    Riese

    Hammes

    Trabucchi

    Lecourt

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Dezembro de 1962.

    O secretário

    A. Van Houtte

    O presidente em exercício

    L. Delvaux,

    presidente de secção


    ( *1 ) Língua do processo: francês.

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