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Document 61962CC0031

Conclusões do advogado-geral Roemer apresentadas em 14 de Novembro de 1962.
Milchwerke Heinz Wöhrmann & Sohn KG e Alfons Lütticke GmbH contra Comissão da Comunidade Económica Europeia.
Processos apensos 31/62 e 33/62.

Edição especial inglesa 1962-1964 00195

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1962:39

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

KARL ROEMER

apresentadas em 14 de Novembro de 1962 ( *1 )

Senhor Presidente,

Senhores Juízes,

Nos dois recursos interpostos por duas empresas alemãs contra a Comissão da CEE, os debates de hoje foram limitados à admissibilidade dos recursos, o que restringe assim o âmbito da nossa argumentação.

Os recursos incidem sobre várias decisões da Comissão relativas à fixação de um direito compensatório sobre as importações de leite em pó inteiro na República Federal da Alemanha. São a decisão de 15 de Março de 1961, publicada no Jornal Oficial de 13 .4.1961, p. 595, da qual foi publicada uma rectificação no Jornal Oficial de 2.5.1961, p. 688, e a decisão de prorrogação de 13 de Dezembro de 1961, publicada no Jornal Oficial de 27 .1.1962, p. 137. A Comissão adoptou todas estas decisões ao abrigo do artigo 155.o, quarto parágrafo, do Tratado. São decisões que, em princípio, podem ser objecto de recurso de anulação.

Os recursos basearam-se, primitivamente, no artigo 184.o do Tratado. No decurso das audiências, as recorrentes invocaram também, subsidiariamente, o artigo 173. o, segundo parágrafo.

É sob o ângulo destas duas disposições que deve ser apreciada a admissibilidade dos recursos, sem que, certamente, seja necessário entrar nos problemas específicos que as recorrentes e a recorrida amplamente trataram, como a admissibilidade da alteração dos fundamentos do pedido e a qualificação de decisão ou de regulamento a atribuir aos actos impugnados.

1. O artigo 184.o

Segundo as recorrentes, o sentido do artigo 184.o é o de alargar a protecção jurisdicional das pessoas que, tendo em conta o carácter normativo do acto impugnado (no caso em apreço, um regulamento), não podem interpor um recurso com base no artigo 173.o, segundo parágrafo. Além disso, o artigo 184.o teria como finalidade que os interessados não ficassem dependentes do facto de um tribunal nacional submeter ou não a questão ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias nos termos do artigo 177.o Os pressupostos de aplicação do artigo 184.o estariam preenchidos no caso em apreço, pelo facto de as recorrentes se encontrarem implicadas num processo pendente nas instâncias nacionais.

Parece-nos que esta interpretação do artigo 184.o é manifestamente errónea.

Eis o texto do artigo:

«Mesmo depois de terminar o prazo fixado no terceiro parágrafo do artigo 173. o, qualquer parte pode, em caso de litígio que ponha em causa um regulamento do Conselho ou da Comissão, invocar os meios previstos no primeiro parágrafo do artigo 173.o para arguir, perante o Tribunal de Justiça, a inaplicabilidade desse regulamento.»

Em nossa opinião, resulta do seu próprio texto que esta disposição não estabelece uma via de recurso, isto é, não cria um novo recurso. Limita-se, no âmbito de um litígio pendente com base noutras disposições, a alargar os meios de recurso a outras situações:

qualquer parte, portanto também a que está impedida de impugnar directamente um regulamento nos termos do artigo 173.o, pode requerer ao Tribunal de Justiça que declare que esse regulamento não é aplicável num caso concreto, declaração essa que se deve distinguir da anulação.

este pedido pode ser apresentado mesmo depois de terminado o prazo durante o qual um regulamento pode ser directamente impugnado.

O artigo 184.o regulamenta aquilo a que se pode chamar excepção de ilegalidade, cuja qualificação dogmática, pelo menos no que se refere ao Tratado CECA, foi objecto dos processos 9 e 10 /56. Destes processos resultou a ideia de que um recorrente tem o direito«… de invocar, após terminado o prazo previsto… como fundamento de um recurso que visa uma decisão individual, a irregularidade das decisões e recomendações gerais…». Em referência ao artigo 184.o do Tratado CEE, o Tribunal salientou que «os Tratados que instituem a Comunidade Económica Europeia e a Euratom adoptam expressamente um ponto de vista análogo» ( 1 ).

É pois evidente que o artigo 184.o apenas tem aplicação no âmbito de um processo intentado perante o Tribunal de Justiça das Comunidades. Não permite interpor um recurso autónomo para este Tribunal para decidir uma questão incidental que apresenta interesse para a decisão de um processo pendente num tribunal nacional.

Só esta interpretação dá um sentido racional ao artigo 184.o, segundo o sistema de protecção jurisdicional do Tratado, enquanto que a concepção das recorrentes implicaria como resultado que a limitação do direito de recurso ratione temporis e ratione materiae, que o artigo 173. o intencionalmente previu, desapareceria completamente e que, além disso, as relações entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça europeu, que o artigo 177.o regula de forma completa, seriam fundamentalmente alteradas pela introdução de um meio de recurso para o Tribunal de Justiça que as partes utilizariam directamente.

O artigo 184.o não pode, portanto, servir de base aos recursos.

2. O artigo 173.o, segundo parágrafo

Subsidiariamente, invocam as recorrentes o artigo 173.o, terceiro parágrafo, com o fundamento de que o prazo de recurso nele previsto só começaria a correr a partir do momento em que se torna manifesto que a decisão diz respeito ao recorrente. Não nos interrogaremos sobre se este fundamento invocado posteriormente e o fim do recurso podem sequer ser de considerar. Ao analisá-los, é imediatamente evidente que o ponto de vista das recorrentes é insustentável. O artigo 173. o foi concebido no interesse da segurança jurídica, de forma a que, em princípio, o início de contagem do prazo de recurso possa ser determinado sem dificuldade. Se o recurso visa um acto publicado, o prazo começa indubitavelmente a correr a partir «da publicação do acto», o que resulta nitidamente das versões francesa, italiana e neerlandesa do Tratado.

Já mencionámos a data da publicação dos actos impugnados no Jornal Oficial. As datas são as seguintes: 13 de Abril de 1961, 2 de Maio de 1961 e 27 de Janeiro de 1962. Os recursos foram interpostos em 4 de Outubro e 9 de Outubro de 1962. Sendo o prazo de recurso de dois meses, é assim evidente que o recurso não foi interposto no prazo prescrito. Mas, mesmo que se quisesse admitir que o conhecimento ulterior pelos interessados é que devia dar início ao decurso do prazo, não haveria qualquer diferença, pois as recorrentes não alegaram que só tenham tido conhecimento dos actos impugnados nos dois últimos meses antes da interposição do recurso.

3.

Chegamos portanto à conclusão de que as recorrentes não podem atingir o fim em vista pelo meio que seguiram, ou seja, recorrendo directamente ao Tribunal de Justiça. As suas objecções sobre a questão de saber se os seus interesses estão suficientemente protegidos pela possibilidade de invocar a ilegalidade das decisões da Comissão no âmbito de processos instaurados segundo o direito nacional e de agir para que o tribunal nacional submeta a questão ao Tribunal de Justiça segundo o processo previsto no artigo 177.o são essencialmente questões que respeitam ao órgão jurisdicional nacional e não podem aqui ser tratadas.

No caso em apreço, o Tribunal deve apenas declarar que os recursos são inadmissíveis e que as recorrentes devem suportar as despesas.


( *1 ) Língua original: alemào.

( 1 ) Colect. 1954-1961, pp. 175 e 229.

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