Wybierz funkcje eksperymentalne, które chcesz wypróbować

Ten dokument pochodzi ze strony internetowej EUR-Lex

Dokument 52024DC0088

    RELATÓRIO DA COMISSÃO AO CONSELHO Reexame do Regulamento (UE) 2022/1369 relativo a medidas coordenadas de redução da procura de gás, com a redação que lhe foi dada pelo Regulamento (UE) 2023/706

    COM/2024/88 final

    Bruxelas, 27.2.2024

    COM(2024) 88 final

    RELATÓRIO DA COMISSÃO AO CONSELHO

    Reexame do Regulamento (UE) 2022/1369 relativo a medidas coordenadas de redução da procura de gás, com a redação que lhe foi dada pelo Regulamento (UE) 2023/706


    I.Introdução

    Desde a agressão militar não provocada e injustificada da Rússia contra a Ucrânia, o aprovisionamento de gás russo à UE tem sido continuamente interrompido. Em resposta à tentativa da Rússia de utilizar a energia como arma política, a Comissão adotou o plano REPowerEU, com o objetivo de poupar energia, acelerar a transição para as energias limpas e diversificar o aprovisionamento energético, a fim de eliminar progressivamente a sua dependência dos combustíveis fósseis russos o mais rapidamente possível. Embora a UE dependesse da Rússia para 45 % do seu aprovisionamento de gás em 2021, o aprovisionamento de gás russo diminuiu continuamente desde fevereiro de 2022 e representou 15 % do total das importações de gás da UE em 2023.

    A fim de atenuar os graves riscos de segurança do aprovisionamento que se materializaram em 2022 em resultado de novos cortes no aprovisionamento por parte da Rússia, a UE adotou o Regulamento (UE) 2022/1369 em agosto de 2022 (a seguir designado por «Regulamento Redução da Procura»), para reduzir voluntariamente a procura de gás de forma coordenada em 15 %. Se for declarado um alerta da União, esta meta passa a ser uma redução obrigatória. Tendo em conta os riscos persistentes e a necessidade de uma redução coordenada contínua da procura de gás, em março de 2023 a UE adotou o Regulamento (UE) 2023/706 que prorrogou por um ano o Regulamento Redução da Procura.

    O artigo 9.º do Regulamento Redução da Procura prorrogado estabelece que, até 1 de março de 2024, a Comissão tem de reexaminar o regulamento tendo em conta a situação geral do aprovisionamento de gás à União e apresentar ao Conselho um relatório com as principais conclusões desse reexame. Com base nesse relatório, a Comissão pode propor a prorrogação do período de aplicação deste regulamento.

    II.Situação atual da segurança do aprovisionamento

    As importações russas por gasoduto diminuíram significativamente desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, de 150 mil milhões de m³ antes da crise para 25 mil milhões de m³ em 2023. Esta diminuição foi principalmente compensada por uma redução da procura de cerca de 65 mil milhões de m³. O aumento das importações de GNL (cerca de 50 mil milhões de m³) e por meio de gasodutos alternativos (cerca de 10 mil milhões de m³) também contribuiu para o abandono progressivo do gás russo.

    Figura 1 — Abandono progressivo do recurso ao gasoduto russo em 2023 em comparação com a situação pré‑crise

    Fonte: DG ENER B4 e Centro Comum de Investigação, com base em dados da REORTG

    Os mercados mundiais do gás continuam a registar constrangimentos e prevê-se que a situação se mantenha assim durante algum tempo, uma vez que, de acordo com as previsões, até 2026, as novas capacidades de liquefação de GNL a nível mundial serão limitadas 1 . O choque de aprovisionamento resultante da invasão da Ucrânia pela Rússia levou a preços elevados e voláteis do gás e da eletricidade em 2022 e 2023, com um pico vivido no verão de 2022, quando os preços dispararam acima de 300 EUR/MWh. Durante o verão e o outono de 2023 ainda se assistiu a episódios de grande volatilidade significativa, quando os preços aumentaram mais de 50 % em poucas semanas 2 . Os preços do gás continuam sujeitos a volatilidade e são mais elevados do que antes da crise, com consequências inevitáveis para os cidadãos e para a competitividade das indústrias.

    Existem outros riscos remanescentes com diferentes graus de probabilidade que, a concretizarem‑se, podem contribuir para tornar mais precário o delicado equilíbrio entre a oferta e a procura alcançado. Entre eles incluem-se: uma recuperação da procura asiática de GNL, que reduziria a disponibilidade de gás no mercado mundial do gás; uma vaga de frio no resto do inverno, que poderia conduzir a um aumento da procura de gás; condições meteorológicas extremas que poderiam afetar o armazenamento de energia hidroelétrica ou uma baixa disponibilidade de produção nuclear que exigiria um maior recurso à produção de eletricidade a partir do gás; e novas possíveis perturbações no aprovisionamento de gás, incluindo a suspensão total das importações de gás da Rússia ou a interrupção das infraestruturas críticas existentes no setor do gás.

    A probabilidade de tais perturbações nas infraestruturas críticas existentes é difícil de avaliar, mas pode ser ilustrada por dois exemplos recentes ocorridos desde a adoção do primeiro Regulamento (UE) 2022/1369 relativo à redução da procura. Em setembro de 2022, o gasoduto NordStream 1 foi sabotado a tal ponto que não tem a capacidade de transportar gás num futuro previsível. Em outubro de 2023, o Balticconnector, um importante gasoduto que liga a Finlândia à Estónia com uma capacidade de cerca de 7 milhões de m3/dia, foi interrompido. Uma investigação em curso verifica se o dano foi externo e se foi causado pela âncora de um navio. Consequentemente, a Finlândia ainda não está em condições de cumprir o critério N – 1 como parte da norma relativa à infraestrutura definida no artigo 5.º do Regulamento (UE) 2017/1938 e declarou o segundo nível de crise mais elevado, em conformidade com o artigo 11.º do Regulamento (UE) 2017/1938. Para o seu aprovisionamento de gás, a Finlândia depende agora exclusivamente da sua capacidade de importação de GNL, predominantemente através do terminal de GNL de Inkoo, com uma capacidade de cerca de 13 milhões de m3/dia, para uma procura diária máxima de cerca de 9 a 12 milhões de m3/dia. O Balticconnector deve voltar a funcionar apenas após o inverno de 2023-2024.

    Além disso, desde a adoção do relatório anterior que reexamina o Regulamento Redução da Procura 3 , o panorama geopolítico deteriorou-se ainda mais. Conflitos armados de alta intensidade atingiram várias regiões de abastecimento e trânsito, como o Médio Oriente e o mar Vermelho, além da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia.

    As ameaças à segurança do aprovisionamento de gás da UE também foram destacadas pela Agência Internacional de Energia (AIE) num relatório de dezembro de 2022 4 , que alertou contra a complacência à luz da melhoria da situação em comparação com o pico da crise no verão de 2022. Tal foi seguido pelo Relatório sobre o Mercado de Gás, do 1.º trimestre de 2024 5 , em que a AIE indica que o aprovisionamento global de gás continua a registar constrangimentos, uma vez que um aumento na capacidade de liquefação a nível mundial (+13 mil milhões de m³) não foi suficiente para cobrir uma diminuição de 38 mil milhões de m³ do gás russo transportado por gasoduto para a UE. Segundo a AIE, apesar dos elevados níveis de armazenamento na UE, os riscos de períodos de frio no final do inverno e de restrições inesperadas à oferta continuam a existir num mercado com constrangimentos. Além disso, a Rede Europeia dos Operadores das Redes de Transporte de Gás (REORTG) publicou o Winter Supply Outlook 2023/2024 (as suas perspetivas de aprovisionamento para o inverno de 2023-2024) com uma panorâmica para o verão 6 , na qual indicou a importância da redução da procura para o enchimento das instalações de armazenamento e a segurança do aprovisionamento na UE, embora a situação geral da segurança do aprovisionamento na UE tenha melhorado significativamente.

    Neste contexto, a redução significativa da procura de gás natural (–18 % entre agosto de 2022 e dezembro de 2023) tem sido essencial para preservar o delicado equilíbrio do gás na UE. Em particular, uma redução contínua da procura de gás ao longo da época de enchimento de 2023 foi um dos principais fatores que levaram a que se atingisse um nível de enchimento das instalações de armazenamento sem precedentes a 1 de novembro de 2023 (99 %). Esta redução da procura também contribuiu significativamente para uma gestão sensata do armazenamento durante a primeira parte da época de inverno de 2023-2024, cuja capacidade ainda está em cerca de 70 % a 1 de fevereiro.



    III.Medidas voluntárias de redução da procura aplicadas pelos Estados-Membros

    Em conformidade com o artigo 7.º, n.º 2, do Regulamento Redução da Procura, prorrogado pelo Regulamento (UE) 2023/706, de 30 de março de 2023, os Estados-Membros foram obrigados a atualizar os seus planos nacionais de emergência estabelecidos pelo artigo 8.º do Regulamento (UE) 2017/1938, a fim de refletirem as medidas voluntárias de redução da procura aplicadas. No relatório anterior sobre o Regulamento Redução da Procura 7 , a Comissão já tinha delineado as medidas tomadas pelos Estados-Membros e transmitidas à data da redação do relatório. As medidas incluíam, nomeadamente:

    1.Campanhas de informação para sensibilizar os consumidores;

    2.Limitações de aquecimento e arrefecimento em, por exemplo, edifícios públicos;

    3.Mudança de combustível e aceleração das medidas de eficiência energética.

    Desde o relatório de 2023 sobre a redução da procura, vários planos de emergência nacionais recentemente apresentados incluem, na sua maioria, medidas semelhantes às delineadas nos planos de emergência nacionais apresentados anteriormente e destacados no Relatório COM(2023) 173, nomeadamente: 

    ·campanha de sensibilização para incentivar a redução do consumo de gás entre os consumidores, 

    ·financiamento adicional para medidas de eficiência energética destinadas à indústria, ao aquecimento urbano e às famílias, 

    ·aumento do financiamento e dos leilões de fontes de energia renováveis, bem como aumento do apoio financeiro à implantação de bombas de calor, 

    ·desconto nas contas de gás e eletricidade em caso de redução do consumo e/ou aumento das tarifas para aqueles que aumentaram significativamente o consumo, 

    ·facilitação do regresso ao funcionamento ou do prolongamento da vida útil das centrais elétricas para reduzir e substituir o consumo de gás nas centrais a gás, quer regressando da reserva para o mercado quer voltando a colocar na reserva as destinadas a encerrar,

    ·utilização temporária de maior capacidade das redes elétricas de ultra-alta tensão, a fim de facilitar a participação de determinadas centrais elétricas na reserva da rede,

    ·flexibilização das normas ambientais para facilitar a mudança de combustível,

    ·redução obrigatória do consumo de eletricidade nos edifícios públicos,

    ·prémios para introduzir biometano na rede, em substituição do gás natural.



    IV.Redução da procura – análise setorial

    Entre agosto de 2022 e dezembro de 2023 (17 meses), os Estados-Membros da UE reduziram o consumo global de gás em 18 % (cerca de 101 mil milhões de m³). A figura 2 representa a variação no consumo de gás natural desde a aplicação do Regulamento (UE) 2022/1369 do Conselho relativo a medidas coordenadas de redução da procura. 21 Estados-Membros atingiram a meta de redução voluntária de 15 %.

    Figura 2 — Variação da procura de gás natural entre agosto de 2022 e dezembro de 2023 (17 meses) face ao mesmo período da média quinquenal por Estado-Membro

    Fonte: economista principal da DG ENER, com base na série NRG_CB_GASM do Eurostat

    De acordo com o balanço energético de 2022, 36 % do gás natural foi utilizado por agregados familiares e serviços, 32 % foi destinado à produção de eletricidade e calor e 23 % à indústria (apenas uso de energia). A repartição setorial da procura de gás nos setores industrial, residencial e da eletricidade é essencial para compreender o impacto das medidas de redução da procura no bem-estar socioeconómico da UE. Permite aos Estados-Membros e à Comissão Europeia compreender melhor a natureza das reduções e, eventualmente, identificar eventuais desafios. Na ausência de dados estatísticos oficiais suficientes e frequentemente comunicados ao Eurostat para efeitos desta análise, o Centro Comum de Investigação estimou a repartição setorial da redução da procura de gás para 2022-2023 com base em nove Estados-Membros da UE que representam 80 % do consumo de gás natural da UE 8 . De acordo com essas estimativas, os setores residencial e industrial contribuíram, respetivamente, com 43 % e 47 % para as reduções globais da procura, enquanto o setor da energia contribuiu com 10 % (ver figura 3).

    Figura 3— Contribuição setorial para a redução da procura de gás (UE9) entre agosto de 2022 e setembro de 2023

    Nota: A análise inclui nove Estados-Membros ou 80 % da procura de gás da UE. Os Estados-Membros são: BE, DE, EL, ES, FR, HR, IT, HU e NL.

    Fonte: Centro Comum de Investigação, com base nos dados do Eurostat e da ENaGaD (procura de gás natural na Europa)

    Setor residencial/temperatura 

    O consumo de gás no setor residencial está fortemente correlacionado com a temperatura exterior. De acordo com os dados fornecidos pelo Centro Comum de Investigação, a época de inverno de 2022-2023 registou uma redução de 7 % no número de graus-dias de aquecimento em comparação com a média quinquenal, sugerindo um inverno ligeiramente mais ameno. 9 Durante os dois meses iniciais da época de inverno de 2023, o número de graus-dias de aquecimento foi também inferior à média quinquenal em 9 %. Ao mesmo tempo, as reduções da procura de gás ascenderam a 19 % (inverno 2022-2023) e a 22 % (primeiros dois meses do inverno de 2023-2024), o que indica que estas reduções foram mais substanciais do que as variações meteorológicas, em parte devido às medidas acima referidas.

    Setor da produção de eletricidade 

    Ao longo de 2022, o despacho de centrais a gás manteve-se relativamente estável, indicando uma produção estável, apesar do aumento dos preços do gás. Os desafios na redução da conversão de gás em energia foram exacerbados pela disponibilidade limitada de capacidade nuclear e devido à diminuição da contribuição da energia hidroelétrica. A capacidade eólica e solar suplementar acrescentada em 2022 teve um efeito contrário e contribuiu para a produção adicional de 65 TWh (com base na Rede Europeia dos Operadores das Redes de Transporte de Eletricidade — REORTE), impedindo nomeadamente um novo aumento do consumo de gás. 

    O pacote de eletricidade em 2023 alterou-se em comparação com o ano anterior devido ao regresso progressivo da capacidade nuclear, aos elevados níveis de energia hidroelétrica e à continuação da implantação de energias renováveis. A figura 4 representa a variação na produção de eletricidade por tipo de produção em 2023 relativamente à média quinquenal e a 2022. Em relação ao ano de 2022, a produção nuclear na UE conheceu um aumento de 7 TWh, com as centrais nucleares francesas a atingirem um despacho próximo da média quinquenal em setembro de 2023. A produção de energia hidroelétrica aumentou 41 TWh, capitalizando os níveis elevados dos reservatórios de água em comparação com 2022. A produção de eletricidade a partir da energia solar e da energia eólica aumentou 28 TWh e 35 TWh, respetivamente. Em 2022, a instalação das capacidades solar e eólica já tinha atingido 41,5 GW e 15,5 GW, respetivamente. É de assinalar que a implantação voltou a intensificar-se em 2023, com mais 53,5 GW e 16,0 GW de capacidade adicionada à rede elétrica da UE.

    Figura 4 — Variação na produção de eletricidade por tipo de produção em 2023 (janeiro a novembro)

    Nota: Os dados de produção de eletricidade de dezembro ainda não estão disponíveis.

    Nota 2: A produção de energia solar não contabiliza a produção de eletricidade a jusante do contador.

    Fonte: economista principal da DG ENER, com base na plataforma de transparência da REORTE

    O regresso progressivo da produção de energia nuclear e hidroelétrica em 2023, associado à implantação de energias renováveis que decorreu ao longo do período, exerceu uma pressão descendente sobre a utilização de gás natural para a produção de eletricidade e calor. Além disso, registou-se uma redução da procura de eletricidade de 6 % durante o mesmo período, o que resultou numa diminuição das necessidades de consumo de gás no setor da eletricidade.

    Consequentemente, registou-se uma diminuição de cerca de 9 % (9 mil milhões de m³) da procura de gás para eletricidade e calor desde agosto de 2022 10 em comparação com o período de referência de cinco anos.

    Setor industrial 

    77 % do consumo anual de gás no setor industrial foi utilizado em cinco subsetores com utilização intensiva de energia 11 : produtos químicos, minerais não metálicos, produtos alimentares, metais de base e produtos de papel. A utilização do gás está estreitamente ligada ao nível da atividade de produção industrial. A figura 5 representa a variação da produção industrial dos subsetores globais da indústria transformadora e dos subsetores com utilização intensiva de energia entre agosto de 2022 e setembro de 2023 em comparação com a média quinquenal.

    Figura 5 — Variação da produção industrial nos subsetores globais da indústria transformadora e dos subsetores com utilização intensiva de energia entre agosto de 2022 e setembro de 2023 em comparação com a média quinquenal

    Fonte: economista principal da DG ENER, com base na série STS_INPR_M do Eurostat

    O declínio da produção industrial com utilização intensiva de energia resultou numa diminuição da utilização de gás, principalmente nos cinco subsetores com utilização intensiva de energia. A figura 6 representa o consumo mensal de gás nos cinco subsetores com utilização intensiva de energia indexados em relação ao período de referência de cinco anos. Pode observar-se que os subsetores dos produtos químicos e dos metais de base diminuíram o consumo de gás no início da crise, seguidos apenas nos meses mais recentes pelos subsetores dos produtos de papel e dos minerais não metálicos. A diminuição da procura de gás natural materializou-se na maioria dos subsetores industriais com utilização intensiva de energia nos últimos meses, indicando provavelmente um declínio mais estrutural da atividade industrial nos setores dos produtos químicos, minerais não metálicos, metais de base e produtos de papel. Uma vez que a redução global da procura voluntária ultrapassa os 15 %, havia margem para a recuperação da procura industrial no âmbito da meta voluntária, o que não se verificou até à data.

    É importante notar que a diminuição do consumo de gás devido à diminuição da atividade industrial foi complementada por medidas de eficiência energética aceleradas e/ou pela mudança de combustível devido à crise energética. No entanto, devido ao preço mais baixo do gás, as indústrias com capacidade de duplo combustível que mudaram de combustível em 2022 ou 2023 deverão voltar ao gás devido ao seu preço mais baixo.

    Figura 6 — Estimativa do consumo mensal de gás nos subsetores com utilização intensiva de energia na UE27

    Fonte: economista principal da DG ENER, com base no Eurostat

    V.Perspetivas de segurança do aprovisionamento para 2024-2025

    Desde agosto de 2022 e a entrada em vigor do Regulamento Redução da Procura de Gás até dezembro de 2023, a procura de gás na UE caiu 18 % (cerca de 101 mil milhões de m³) em comparação com os níveis anteriores à crise. De todos os fatores que contribuíram para substituir o aprovisionamento de gás russo, a redução da procura de gás foi o mais importante, tal como descrito mais pormenorizadamente nas secções 2 e 4 (ver figura 1).

    Uma nova diminuição ou uma suspensão total das importações russas, como parte dos esforços da UE para eliminar gradualmente a dependência da Rússia, ou possíveis cortes unilaterais no aprovisionamento por parte da Rússia, como se verificou em 2022-2023, é um cenário importante a analisar quando se analisa a segurança do aprovisionamento de gás da UE. As ruturas do aprovisionamento russo constituem um cenário particularmente pertinente a considerar (tal como simulado na figura 7), devido ao termo, em 31 de dezembro de 2024, do atual acordo de trânsito através da Ucrânia (um dos dois corredores de abastecimento russos remanescentes: cerca de 15 mil milhões de m³/ano). A escalada das tensões geopolíticas pode, posteriormente, criar riscos ainda maiores de novos cortes de fornecimento por parte da Rússia. Por conseguinte, embora possam ocorrer outros cenários, tais como uma perturbação apenas do corredor de trânsito ucraniano, a probabilidade de um cenário de rutura total do aprovisionamento russo, independentemente da causa da perturbação, aumentou significativamente em comparação com o ano passado e é essencial ter em conta essa possibilidade tendo em vista a segurança do aprovisionamento da UE.

    Por esta razão, é essencial ter em consideração as sensibilidades da procura de gás na preparação para os futuros invernos. Este ano, o Winter Supply Outlook 2023/2024 12 da REORTG foi complementado com uma panorâmica para o verão e conclui que, em caso de interrupção total do gasoduto russo, os armazenamentos precisariam ser preenchidos a 46 % no início da temporada de injeção, juntamente com uma redução de 15 % da procura, fortes suprimentos de GNL e capacidades aprimoradas, para atingir os 90 % necessários no início do inverno de gás, no final de setembro de 2024. A figura 7 representa as projeções de enchimento das instalações de armazenamento em diferentes cenários de redução contínua da procura, sem prejuízo dos instrumentos comerciais ou estratégicos que possam ser utilizados para alcançar essa redução, com base nos últimos dados disponíveis de informação sobre o mercado e pressupondo uma interrupção total do aprovisionamento de gasodutos russos 13 . Esses cenários preveem um nível de armazenamento de 49 % no final do inverno (31 de março de 2024), tendo em conta os elevados níveis de armazenamento comunicados a 16 de dezembro de 2022 e com base na experiência de 2023 (a média da UE era de 56 % a 1 de abril de 2023). No entanto, o nível médio de armazenamento a 1 de abril do período de referência 14 era de 33 %. Note-se também que várias publicações 15  apontam para que as capacidades de produção e liquefação de gás a nível mundial não aumentem significativamente antes de 2026, o que significa que a disponibilidade de gás natural deve permanecer limitada até ao inverno de 2026-2027.

    Figura 7 — Níveis de armazenamento por mês consoante a continuação da redução da procura


    Nota: A figura mostra os níveis de armazenamento no final de cada mês.

    Fonte: economista principal da DG ENER, com base em dados do Eurostat, AGSI e informações de mercado sobre fluxos de gás

    A figura 7 explora três cenários:

    ·Cenário «sem redução contínua da procura»: as importações de gás russo por gasoduto são interrompidas e a redução da procura de gás não se prolonga para além de 31 de março de 2024. Tal levaria a que o nível de armazenamento baixasse para 64 %, muito aquém da meta de 90 % até 1 de novembro de 2024, e completamente esgotado em fevereiro de 2025.

    ·Cenário de «redução contínua da procura até novembro de 2024»: as importações de gás russo por gasoduto são interrompidas e, com a continuação da redução da procura de gás até novembro de 2024, atingem a meta de armazenamento de novembro, mas as reservas esgotam-se rapidamente em seguida, atingindo apenas cerca de 10 % dos níveis de enchimento até ao final de março de 2025. A segurança do aprovisionamento de gás da UE para o inverno seguinte de 2025-2026 ficaria assim comprometida.

    ·Cenário «continuação da redução da procura até março de 2025»: cenário em que as importações de gás russo por gasoduto são interrompidas e, com uma redução contínua da procura de 15 %, os níveis de armazenamento atingem a meta de armazenamento de novembro. Além disso, no final de março de 2025, os níveis de armazenamento podem ser de cerca de 36 %. Este nível pode ser considerado adequado antes da época de enchimento de 2025.

    Tais cenários têm em conta elementos-chave da segurança do aprovisionamento de gás, como a evolução dos níveis de armazenamento durante o inverno e a evolução do fornecimento de gás russo e mundial. Além disso, há que considerar um culminar adicional de riscos de evolução desfavorável para a segurança do aprovisionamento da UE que poderiam acontecer para além dos cenários acima referidos, tais como um potencial aumento da procura mundial de GNL e uma certa recuperação da procura de gás industrial. Uma incerteza particularmente significativa é o clima, uma vez que um inverno mais frio do que a média em 2023-2024 ou 2024-2025 teria um impacto significativo na segurança do aprovisionamento de gás da UE. Supondo uma redução de 15 % e a maior procura para cada mês entre 2014 e 2021, a procura anual pode aumentar em 28 mil milhões de m³. O Winter Supply Outlook da REORTG confirma que, no caso de um inverno frio, é necessária uma redução da procura de 15 % para que a rede de gás seja capaz de satisfazer a procura e atingir pelo menos um nível de enchimento das instalações de armazenamento de 30 %.

    Por conseguinte, embora a UE tenha um poder de influência limitado para aumentar o fornecimento mundial de gás, a gestão do armazenamento (apoiada pelas alterações do Regulamento Armazenamento 16 ao Regulamento Aprovisionamento de Gás e pelas trajetórias de armazenamento) e a redução da procura revelaram-se eficazes para garantir a segurança do aprovisionamento de gás da UE desde o início da crise. Continuam a ser instrumentos importantes, caso os níveis de armazenamento atinjam níveis inadequados durante o resto do inverno de 20232024 ou caso se concretizem os riscos de evolução desfavorável. No entanto, os mercados reagem aos aumentos de preços, o que pode facilitar uma redução suficiente da procura caso se concretizem os riscos de evolução desfavorável.

    Além disso, a ACER insiste no seu parecer 17 sobre o Winter Supply Outlook 2023/2024 da REORTG: «A concretização de [...] fatores de risco pode conduzir à escassez da oferta [...]. Seguirse-iam reduções forçadas da procura de gás e a redução involuntária da procura dos consumidores de gás não essencial seria uma medida de emergência de último recurso». A ACER apela também a uma «vigilância contínua no que diz respeito à situação do aprovisionamento de gás e à monitorização da aplicação do regulamento da UE relativo à redução da procura de gás». 



    VI.Conclusão

    Com vista a mitigar os graves riscos de segurança do aprovisionamento em 2022, no contexto do REPowerEU, a UE adotou o Regulamento (UE) 2022/1369, a fim de reduzir a procura de gás em 15 %. Em março de 2023, a UE decidiu prolongar esta redução por meio do Regulamento (UE) 2023/706, tendo em conta, entre outros aspetos, a necessidade urgente de reabastecer as instalações de armazenamento e os constrangimentos que persistem no mercado devido, por exemplo, à baixa disponibilidade de energia hidroelétrica e nuclear. 

    O presente relatório indica que a situação em matéria de segurança do aprovisionamento continua delicada, embora tenha melhorado graças a investimentos específicos e a uma série de medidas, incluindo a meta de redução fixada pelo Regulamento Redução da Procura, que foi ultrapassada pelos Estados-Membros. Tal deve-se, em parte, ao facto de os mercados mundiais do gás continuarem a registar muitos constrangimentos e de se esperar que assim se mantenham até 2026, quando entrarem em funcionamento novas capacidades de liquefação. Existem outros riscos remanescentes que, a concretizarem-se, podem contribuir para tornar ainda mais precário o equilíbrio entre a oferta e a procura, tais como novas possíveis perturbações no aprovisionamento de gás, incluindo a suspensão das importações de gás russo ou uma perturbação das infraestruturas críticas existentes no setor do gás, uma recuperação da procura asiática de GNL, um inverno frio e um baixo armazenamento de energia hidroelétrica. Além disso, o panorama geopolítico mais amplo deteriorou-se ainda mais, uma vez que conflitos armados de alta intensidade atingiram várias outras regiões de abastecimento e trânsito, como o Médio Oriente e o mar Vermelho.

    A redução da procura contribuiu significativamente para a eliminação gradual de 65 mil milhões de m³ de gás russo em 2023, o que foi conseguido principalmente pelos agregados familiares e pelo setor industrial. Além disso, a fim de garantir um elevado nível de preparação para o inverno e assegurar que os Estados-Membros cumprem a meta de enchimento das instalações de armazenamento de 90 % a 1 de novembro de 2024, os níveis de armazenamento da UE devem permanecer suficientemente elevados durante o inverno. Em 2023, tal como em 2022, a redução da procura foi crucial para terminar o inverno com níveis de armazenamento adequados e proporcionar a flexibilidade necessária no verão de modo que a meta de armazenamento de 90 % pudesse ser cumprida, mantendo os preços em níveis mais baixos e contendo a volatilidade. A redução da procura também ajudou a atingir a meta de armazenamento em agosto, bem antes de novembro. Tal permitiu igualmente que os participantes no mercado da UE armazenassem gás na Ucrânia no final do verão de 2023, reforçando mutuamente a segurança do aprovisionamento de gás da UE e da Ucrânia.

    Ademais, é essencial considerar o Regulamento Redução da Procura juntamente com os efeitos do Regulamento Armazenamento. Ambos os elementos fazem parte da arquitetura da UE em matéria de segurança do aprovisionamento e reforçam-se mutuamente. A redução da procura de gás proporcionou aos Estados-Membros e aos participantes no mercado a flexibilidade necessária para cumprirem as metas de armazenamento sem exercerem uma pressão suplementar sobre o mercado mundial do gás, já de si sujeito a constrangimentos.

    Se a situação do aprovisionamento permanecer precária ou continuar a deteriorar-se e a colocar em risco a meta de armazenamento de 90 % para novembro de 2024, a redução da procura continuará a desempenhar um papel essencial em 2024 e nos anos seguintes para estabilizar o mercado do gás. 

    (1)

    Segundo a publicação World Energy Outlook 2023 da AIE, 250 mil milhões de m³/ano de capacidade de liquefação deverão entrar em funcionamento antes de 2030, sendo que a grande maioria dos quais só é esperada entre 2025-2027.

    (2)

    Ocorreram episódios de volatilidade significativa, por exemplo, depois de terem sido anunciados ataques a instalações de GNL australianas em setembro e após a interrupção do gasoduto Balticconnector e o ataque do Hamas em outubro.

    (3)

    Relatório COM(2023) 173 e documento SWD(2023) 63, sobre o reexame do Regulamento (UE) 2022/1369.

    (4)

      How to Avoid Gas Shortages in the European Union in 2023 – análise da AIE .

    (5)

      https://iea.blob.core.windows.net/assets/601bff14-5d9b-4fef-8ecc-d7b2e8e7449a/GasMarketReportQ12024.pdf

    (6)

      https://www.entsog.eu/outlooks-reviews#winter-outlooks-and-reviews .

    (7)

    Relatório COM(2023) 173.

    (8)

    Os nove Estados-Membros da UE são a Bélgica, a Alemanha, a Grécia, a Espanha, a França, a Croácia, a Itália, a Hungria e os Países Baixos. A análise baseia-se em dados públicos comunicados apenas pelos operadores nacionais de redes de transporte destes países, o que permite proceder às estimativas relativas aos consumidores de gás nos setores industrial e residencial. A análise é complementada com dados do Eurostat sobre o consumo de gás para a produção de eletricidade.

    (9)

    Cálculos DG ENER/CET, com base na série NRC_CHDD_M do Eurostat. Note-se que o Eurostat calcula o total da UE como a média (geográfica) ponderada por espaço dos dados relativos a cada Estado-Membro. No contexto da presente análise, tal ponderação é inadequada. Por conseguinte, recalculámos um total da UE como a média de cada Estado-Membro, ponderada pela sua população (demo_gind).

    (10)

    Os relatórios sobre o consumo de gás no setor da energia estão aquém dos relatórios sobre o consumo global de gás. Portanto, o prazo inclui apenas o período de agosto de 2022 a outubro de 2023.

    (11)

    Balanço energético de 2021

    (12)

      https://www.entsog.eu/outlooks-reviews#winter-outlooks-and-reviews

    (13)

    Pressupostos:

    ·níveis de armazenamento em 8 de dezembro de 2023 (91,3 %),

    ·o aprovisionamento de gás por gasoduto (exceto da Rússia) corresponde à média entre janeiro de 2022 e outubro de 2023,

    ·nenhum aprovisionamento do gás russo por gasoduto no início da simulação,

    ·o aprovisionamento de GNL é igual ao aprovisionamento máximo de GNL em 2023,

    ·procura média de gás da UE27 no período de referência, aplicando as percentagens de redução indicadas,

    ·exportações para a Suíça, Ucrânia e Moldávia com base nos fluxos de 2022-2023.

    (14)

    O período de referência vai de 2016 a 2021.

    (15)

      Publicação da AIE , publicação do GIIGNL .

    (16)

    Regulamento (UE) 2022/1032 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de junho de 2022, que altera os Regulamentos (UE) 2017/1938 e (CE) n.º 715/2009 no que respeita ao armazenamento de gás.

    (17)

      ACER_Opinion_11-2023_on_ENTSOG_Winter_Supply_Outlook_2023-2024.pdf (europa.eu) .

    Góra