Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 52023AB0030

    Parecer do Banco Central Europeu de 4 de outubro de 2023 sobre a transparência e integridade das atividades de notação ambiental, social e de governação (ASG) (CON/2023/30)

    CON/2023/30

    JO C, C/2023/1354, 1.12.2023, ELI: http://data.europa.eu/eli/C/2023/1354/oj (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    ELI: http://data.europa.eu/eli/C/2023/1354/oj

    European flag

    Jornal Oficial
    da União Europeia

    PT

    Série C


    C/2023/1354

    1.12.2023

    PARECER DO BANCO CENTRAL EUROPEU

    de 4 de outubro de 2023

    sobre a transparência e integridade das atividades de notação ambiental, social e de governação (ASG)

    (CON/2023/30)

    (C/2023/1354)

    Introdução e base jurídica

    Em 13 de junho de 2023, a Comissão Europeia publicou uma proposta de regulamento relativo à transparência e integridade das atividades de notação ambiental, social e de governação (ASG) (1) (a seguir «regulamento proposto»).

    O Banco Central Europeu (BCE) decidiu emitir um parecer por sua própria iniciativa sobre o regulamento proposto. A competência do BCE para emitir parecer baseia-se no artigo 127.o, n.o 4, e no artigo 282.o, n.o 5, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), uma vez que o regulamento proposto contém disposições relativas 1) à atribuição fundamental do Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC) de definir e executar a política monetária da União, nos termos do artigo 127.o, n.o 2, do Tratado, 2) às atribuições do BCE no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito, nos termos do artigo 127.o, n.o 6, do Tratado e 3) à contribuição do SEBC para a boa condução das políticas desenvolvidas pelas autoridades competentes relativas à estabilidade do sistema financeiro, nos termos do artigo 127.o, n.o 5, do Tratado.

    O presente parecer foi aprovado pelo Conselho do BCE nos termos do artigo 17.o-5, primeiro período, do Regulamento Interno do Banco Central Europeu.

    1.   Observações genéricas

    1.1.

    O BCE congratula-se com o regulamento proposto, que introduz uma abordagem regulamentar comum para reforçar a adequação, a integridade, a transparência, a responsabilidade, a boa governação e a independência das atividades de notação ASG, contribuindo para a transparência e a qualidade das notações ASG. O BCE apoia firmemente o objetivo do regulamento proposto de contribuir para o bom funcionamento do mercado interno, assegurando simultaneamente um elevado nível de proteção dos consumidores e dos investidores e prevenindo a ecomaquilhagem e outros tipos de desinformação, mediante a introdução de requisitos de transparência relativos às notações ASG e de regras sobre a organização e conduta dos prestadores de serviços de notação ASG (2).

    1.2.

    O regulamento proposto faz parte integrante da estratégia mais ampla da Comissão em matéria de financiamento sustentável (3). A consecução dos objetivos estabelecidos no Pacto Ecológico Europeu (4) e no Acordo de Paris (5) e consagrados no Regulamento (UE) 2021/1119 do Parlamento Europeu e do Conselho («Lei Europeia em matéria de Clima») (6) depende do contributo de todos os agentes económicos (7) e exige investimentos significativos, uma parte substancial dos quais deverá proceder do setor privado (8). O financiamento sustentável e, em particular, o regulamento proposto, podem desempenhar um papel importante neste contexto, permitindo aos investidores identificar investimentos sustentáveis do ponto de vista ambiental e ajustar as respetivas carteiras de acordo com as suas próprias preferências em matéria de sustentabilidade.

    1.3.

    Através dos canais acima referidos, espera-se que o regulamento proposto contribua para um maior desenvolvimento de um mercado de capitais verdes da União integrado, profundo e líquido, que promova, por sua vez, a União dos Mercados de Capitais num âmbito mais vasto (9). A criação de mercados de capitais ecológicos maduros e integrados na União exigirá esforços para reforçar os mercados de capitais, incluindo uma maior harmonização da supervisão e da proteção dos investidores. A este respeito, o BCE congratula-se com o facto de a Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) ser incumbida de supervisionar os prestadores de serviços de notação ASG.

    2.   Pertinência do regulamento proposto para os objetivos e atribuições do BCE e do Eurosistema

    As questões relacionadas com a sustentabilidade, nomeadamente as alterações climáticas, podem ter impacto na forma como os bancos centrais desempenham os seus mandatos (10), em especial devido à sua relevância para a política monetária, a estabilidade financeira e a supervisão prudencial das instituições de crédito.

    2.1.   Relevância para a política monetária

    2.1.1.

    As alterações climáticas e a transição para uma economia mais sustentável afetam as perspetivas em matéria de estabilidade de preços, que constitui o objetivo primordial do SEBC, através do seu impacto em indicadores macroeconómicos tais como a inflação, a produção, o emprego, as taxas de juro, o investimento e a produtividade, a estabilidade financeira e a transmissão da política monetária (11). Os riscos físicos e os riscos de transição associados às alterações climáticas podem, nomeadamente, afetar as avaliações e a qualidade creditícia das empresas, com repercussões para as instituições de crédito e para o sistema financeiro (12). Embora ainda estejam a ser desenvolvidas metodologias para avaliar a magnitude dos riscos relacionados com o clima para os bancos e a estabilidade financeira, as estimativas disponíveis sugerem que o impacto destes riscos é suscetível de ser significativo (13). Este facto poderá, por sua vez, afetar a transmissão da política monetária, nomeadamente por força da obsolescência de ativos (stranding of assets) e da súbita reapreciação dos riscos financeiros relacionados com o clima. Além disso, no que diz respeito ao setor bancário, o valor das garantias pode sofrer reduções e podem materializar-se perdas de crédito, o que poderá diminuir a posição de capital e de liquidez das instituições de crédito e de outros intermediários financeiros, debilitando assim a sua capacidade de canalizar fundos para a economia real. A Rede de Bancos Centrais e Supervisores para a Descarbonização do Sistema Financeiro (Network of Central Banks and Supervisors for Greening the Financial System – NGFS) recomenda, por conseguinte, que os bancos centrais considerem os possíveis efeitos das alterações climáticas na economia. A NGFS argumenta que estes efeitos podem ser relevantes para a política monetária, mesmo que apenas se materializem para além do horizonte convencional de médio prazo da política monetária (14).

    2.1.2.

    Além disso, na prossecução do seu objetivo de manutenção da estabilidade dos preços e no cumprimento das suas atribuições de definição e execução da política monetária da União, o Eurosistema deve respeitar o requisito estabelecido no artigo 18.o-1, segundo travessão, dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu (a seguir «Estatutos do SEBC») no sentido de conceder empréstimos contra garantias adequadas. São aplicáveis considerações semelhantes em matéria de gestão de riscos às compras definitivas de créditos e instrumentos negociáveis realizadas nos termos do artigo 18.o-1, primeiro travessão, dos Estatutos do SEBC. Por conseguinte, nas suas operações de política monetária, o Eurosistema deve procurar evitar perdas e assegurar uma proteção adequada do respetivo balanço face a riscos através, nomeadamente, do seu quadro de controlo do risco. O Eurosistema deve, consequentemente, identificar, monitorizar e atenuar os riscos, incluindo os riscos financeiros relacionados com o clima, associados aos ativos de garantia que aceita nas suas operações de crédito de cedência de liquidez e às suas carteiras de ativos adquiridos em transações definitivas. Estes riscos podem afetar o valor dos ativos aceites como garantia pelos bancos centrais ou incluídos nas respetivas carteiras de ativos adquiridos a título definitivo para fins de política monetária. Acresce que a necessidade de gerir esses riscos é também relevante para a carteira não relacionada com a política monetária do Eurosistema.

    2.1.3.

    Além disso, nos termos dos artigos 127.o, n.o 1, e 282.o, n.o 2, do TFUE e tal como refletido no artigo 2.o dos Estatutos do SEBC, sem prejuízo do objetivo de manutenção da estabilidade de preços, o Eurosistema deve apoiar as políticas económicas gerais da União, tendo em vista contribuir para a realização dos objetivos desta, tal como enunciados no artigo 3.o do Tratado da União Europeia. Tais objetivos incluem um elevado nível de proteção e de melhoria da qualidade do ambiente. A Lei Europeia em matéria de Clima estabelece um objetivo vinculativo de neutralidade climática na União até 2050, tendo em vista alcançar meta de longo prazo em matéria de temperatura fixada no Acordo de Paris. Por dizer respeito a todos os aspetos concebíveis da política económica da União, a Lei Europeia em matéria de Clima faz parte das políticas económicas gerais da União que o BCE deve apoiar.

    2.1.4.

    Tendo em conta o que precede, e como indicado no reexame da estratégia de política monetária do Conselho do BCE e do plano de ação climática que o acompanha, publicados em 8 de julho de 2021 (15), ao ajustar os seus instrumentos de política monetária, o BCE escolherá a configuração que melhor apoie as políticas económicas gerais da União, desde que duas configurações do instrumento estabelecido sejam igualmente conducentes, e não prejudiciais, à estabilidade de preços.

    2.1.5.

    A este respeito, a definição de normas regulamentares que assegurem a transparência e uma elevada qualidade das notações ASG é suscetível de acelerar a melhoria da qualidade da divulgação de informações e dos dados ambientais em termos mais gerais. Estes desenvolvimentos reforçariam, por seu turno, a capacidade do Eurosistema para incorporar considerações relacionadas com as alterações climáticas na definição e implementação da política monetária.

    2.2.   Aplicação do regulamento proposto aos bancos centrais

    2.2.1.

    O considerando 15 do regulamento proposto estabelece que as notações ASG elaboradas pelas autoridades europeias ou nacionais e pelos bancos centrais também devem ser isentas das regras relativas aos prestadores de serviços de notação ASG. A disposição substantiva que prevê a isenção estabelece que o regulamento proposto não se aplica a notações ASG, produzidas por bancos centrais, que preencham cumulativamente as seguintes condições: a) não serem pagas pela entidade objeto de notação; b) não serem divulgadas ao público; c) serem atribuídas de acordo com os princípios, padrões e procedimentos que asseguram a adequação, integridade e independência das atividades objeto de notação previstas no regulamento proposto; e d) não terem relação com instrumentos financeiros emitidos pelos respetivos bancos centrais dos Estados-Membros (16).

    2.2.2.

    O BCE congratula-se com a inclusão de uma isenção para os bancos centrais relativamente ao âmbito de aplicação do regulamento proposto, porquanto tal poderá apoiar as ações do Eurosistema no sentido de incorporar considerações relacionadas com as alterações climáticas na condução da sua política monetária e, em particular, no seu quadro de ativos de garantia para operações de crédito de cedência de liquidez (17). Este aspeto é particularmente relevante na atual conjuntura, em que a disponibilidade, a transparência e a qualidade das notações ASG produzidas por prestadores comerciais de serviços de notação ASG não são ainda as adequadas para utilização pelos bancos centrais. É, por conseguinte, necessário, pelo menos temporariamente, que os bancos centrais possam desenvolver e aplicar metodologias próprias de avaliação a alguns aspetos dos fatores ASG, nomeadamente preocupações climáticas, que sejam adaptadas e adequadas às necessidades do Eurosistema na prossecução dos seus objetivos de política monetária.

    2.2.3.

    Essas metodologias podem ser relevantes para as operações de crédito de cedência de liquidez do Eurosistema. Como observado anteriormente, estas operações são parte integrante do quadro de política monetária do Eurosistema e devem estar «adequadamente garantidas», de acordo com o disposto no artigo 18.o-1 dos Estatutos do SEBC, a fim de proteger o Eurosistema contra perdas financeiras relacionadas com o risco de contraparte (18). Além disso, de acordo com o artigo 18.o-2 dos Estatutos do SEBC, o BCE deve definir os princípios gerais para as operações de mercado aberto e de crédito a realizar por si próprio ou pelos bancos centrais nacionais, incluindo princípios para a divulgação das condições em que estão dispostos a efetuar essas operações. Estas condições integram regras públicas sobre determinadas medidas de controlo de risco, a que estão sujeitos os ativos elegíveis mobilizados como garantia (19). Na mesma linha, todos os ativos elegíveis transacionáveis estão enumerados na base de dados de ativos elegíveis do Eurosistema, publicada no sítio Web do BCE e atualizada diariamente pelo BCE, a fim de proporcionar transparência às suas contrapartes de política monetária e assegurar a eficácia operacional do quadro.

    2.2.4.

    Na sequência do reexame da estratégia de política monetária do Conselho do BCE e do plano de ação climática que o acompanha, publicados em 8 de julho de 2021 (20), o BCE anunciou várias medidas para ter em conta considerações relacionadas com o clima no seu quadro de ativos de garantia para operações de crédito de cedência de liquidez. Estas medidas incluem a introdução de limites à mobilização de determinados ativos emitidos por entidades com uma pegada de carbono elevada que podem ser dados em garantia por contrapartes individuais e o nexo entre a elegibilidade dos ativos de garantia e o cumprimento, por parte dos emitentes de ativos mobilizados, das disposições do direito da União em matéria de financiamento sustentável (21).

    2.2.5.

    Estas medidas serão tomadas na prossecução do objetivo primordial do Eurosistema de manutenção da estabilidade dos preços e de apoio às políticas económicas gerais na União, sem prejuízo do objetivo da estabilidade dos preços. O BCE entende que o regulamento proposto tem por finalidade introduzir requisitos para os prestadores de serviços de notação ASG que operam numa base comercial, não se destinando a ser aplicado às medidas de execução da política monetária dos bancos centrais do Eurosistema. Tal é evidenciado pela ampla isenção aplicável aos bancos centrais referida no considerando 15 do regulamento proposto e pelo facto de o regulamento proposto definir os prestadores de serviços de notação ASG como pessoas coletivas cuja atividade inclui a disponibilização e a distribuição de notações ou pontuações ASG a título profissional, ou seja, numa base comercial (22). No entanto, dependendo da sua conceção, quando o Eurosistema divulgar o resultado da aplicação da sua metodologia para identificar os emitentes ou os ativos que ficam sujeitos a tais medidas, existe o risco de que esta informação possa ser entendida como estando abrangida pela definição lata de «notação ASG» constante do regulamento proposto (23). Neste contexto, o BCE observa que a atual formulação da isenção para as notações ASG produzidas pelos bancos centrais parece ter um âmbito desnecessariamente restrito, que entra em conflito com o exercício das competências do Eurosistema ao abrigo dos Tratados.

    2.2.6.

    Em primeiro lugar, o requisito da isenção que impõe às «notações ASG» produzidas por bancos centrais «não serem divulgadas ao público» (24) parece obstar à capacidade do Eurosistema de comunicar às suas contrapartes de política monetária, através da sua base de dados de ativos elegíveis acessível ao público, as condições em que está disposto a efetuar operações de crédito de cedência de liquidez nos termos do artigo 18.o-2 dos Estatutos do SEBC. Em última análise, este requisito obsta também à capacidade do Eurosistema de conduzir operações de política monetária de forma transparente e eficiente.

    2.2.7.

    Em segundo lugar, o BCE observa que as medidas do Eurosistema relacionadas com o clima poderiam ser, e seriam, concebidas e emitidas de forma compatível com o espírito imperativo dos princípios, padrões e procedimentos que asseguram a adequação, integridade e independência das atividades objeto de notação (25), previstas no presente regulamento (26). O BCE observa, no entanto, que várias disposições do regulamento proposto (27) são apenas relevantes e adequadas no que diz respeito aos prestadores de serviços de notação ASG que operam numa base comercial. Como tal, a condição da isenção estabelecida na proposta de regulamento, que exige que as «notações ASG» dos bancos centrais sejam «atribuídas de acordo com os princípios, padrões e procedimentos que asseguram a adequação, integridade e independência das atividades objeto de notação» (28), não é adequada nem pertinente para os bancos centrais no exercício das suas atribuições legais.

    2.2.8.

    No caso de o Eurosistema não poder beneficiar da isenção pelas razões acima expostas, tal poderá significar que parte da definição e implementação da política monetária do Eurosistema, em particular a parte do quadro de ativos de garantia do Eurosistema que procura dar resposta a considerações relacionadas com o clima, pode ser sujeita à autorização e à supervisão da ESMA. Dado que as atividades do Eurosistema de concessão de empréstimos com garantia e de compra de ativos a título definitivo são instrumentos fundamentais para a execução da política monetária, tal consequência não seria compatível com o princípio da independência dos bancos centrais previsto no artigo 130.o do TFUE e no artigo 7.o dos Estatutos do SEBC, nem com a competência do Eurosistema para conduzir a política monetária da União (29).

    2.2.9.

    Além disso, o BCE observa que tal consequência não contribuiria para a realização dos objetivos do regulamento proposto de reforçar a proteção dos consumidores e dos investidores e de prevenir a ecomaquilhagem e outros tipos de desinformação. Ao contrário das notações ASG produzidas por prestadores de serviços de notação ASG que operam numa base comercial, as medidas do Eurosistema são concebidas para dar cumprimento aos seus objetivos definidos no Tratado de assegurar a estabilidade de preços através da condução da política monetária, concedendo empréstimos contra garantias adequadas, protegendo o seu balanço e apoiando as políticas económicas gerais na União. Devido a esta diferença essencial entre as avaliações do desempenho climático realizadas pelos bancos centrais e as notações ASG emitidas por prestadores de serviços de notação ASG comerciais, o BCE considera que os bancos centrais do SEBC devem ser isentos, por analogia com a isenção concedida às notações ASG produzidas por todas as outras autoridades públicas da União ou dos Estados-Membros ao abrigo do regulamento proposto (30), tal como já refletido no considerando 15 do regulamento proposto. Não parece existir qualquer razão concreta para tratar as «notações ASG» produzidas pelos bancos centrais de forma diferente das notações ASG produzidas pelas autoridades públicas da União ou dos Estados-Membros ou para tratar os membros do SEBC de forma menos favorável relativamente às empresas financeiras regulamentadas na União que utilizam notações ASG para fins internos (31), ambas total e incondicionalmente isentas da aplicação do regulamento proposto. O BCE recomenda que o regulamento proposto seja alterado em conformidade.

    2.3.   Relevância para a estabilidade financeira

    2.3.1.

    O BCE apoia o objetivo do regulamento proposto de reforçar a fiabilidade e a comparabilidade das notações ASG. O reforço da fiabilidade e da comparabilidade das notações ASG será fundamental para facilitar uma fixação eficiente dos preços de mercado, em consonância com o princípio de uma economia de mercado aberta, apoiando assim a estabilidade financeira, pelas razões a seguir expostas. Reforçará igualmente a capacidade do BCE para acompanhar e fazer face ao impacto das alterações climáticas na estabilidade financeira.

    2.3.2.

    Em primeiro lugar, a comparabilidade das notações ASG num número crescente de prestadores do serviço é atualmente limitada. Tal deve-se a vários fatores, entre os quais diferenças metodológicas, no contexto de um mercado de instrumentos de financiamento sustentável de dimensões significativas em crescimento. As notações ASG podem ter efeitos significativos nas detenções de ativos e no retorno dos ativos, dado poderem influenciar diretamente as escolhas dos investidores. A falta de transparência atual impede a comparabilidade e constitui um obstáculo à utilização coerente dos dados ASG pelos participantes nos mercados financeiros, o que, por sua vez, prejudica a capacidade das notações ASG de fornecer aos investidores sinais eficazes para uma afetação eficiente do capital, condição fundamental para permitir que os mercados de capitais contribuam para o financiamento da transição ecológica. Neste contexto, o BCE congratula-se com o facto de o regulamento proposto exigir que os prestadores de serviços de notação ASG esclareçam melhor a metodologia subjacente às notações ASG que emitem. Assim sendo, o BCE reconhece que, mesmo com o benefício do regulamento proposto, continuarão a existir abordagens metodológicas diferentes e a dispersão das pontuações das notações ASG manter-se-á também. Tal reflete tanto as diferentes metodologias aplicadas por diferentes prestadores do serviço como, em parte, o facto de a agregação dos vários componentes ambiental, social e de governação continuar a diferir de forma significativa. O BCE recomenda, por conseguinte, que se proceda à monitorização das melhorias na comparabilidade. Se os progressos se revelarem insatisfatórios, poderá ser considerada a adoção de novas medidas legislativas.

    2.3.3.

    Em segundo lugar, o risco de ecomaquilhagem das notações ASG pode minar a confiança dos consumidores nos produtos de financiamento sustentável, sendo suscetível de causar fluxos de saída a nível setorial, diminuir o investimento na sustentabilidade e atrasar os esforços de transição, podendo assim contribuir para uma acumulação contínua de riscos climáticos a nível sistémico.

    2.3.4.

    O BCE congratula-se igualmente com o facto de o regulamento a proposto exigir que os prestadores de serviços de notação ASG clarifiquem melhor a finalidade e os objetivos das notações ASG que emitem (32). Coexistem atualmente no mercado diferentes abordagens no que diz respeito aos objetivos e à abordagem de materialidade subjacentes às notações ASG. Algumas notações ASG visam quantificar o desempenho efetivo de uma entidade em termos ASG (ou seja, a materialidade do impacto), a fim de fundamentar vários tipos de estratégia de investimento orientadas para a sustentabilidade. Muitas outras notações ASG visam, no entanto, medir o impacto potencial dos fatores ASG na relação risco/rendimento do investimento sem um nexo direto com a sustentabilidade efetiva das atividades concretas subjacentes (ou seja, a materialidade financeira). O BCE considera que a coexistência destas diferentes abordagens, que servem, ao mesmo tempo, estratégias de investimento diferentes, contribui para suscitar a confusão quanto ao objetivo das notações ASG, ao grau em que medem o desempenho real em matéria de sustentabilidade e, em última análise, à sua capacidade para incidir nos resultados reais em termos de sustentabilidade na economia real. Tal pode ser uma fonte de ecomaquilhagem, na medida em que as notações ASG podem não corresponder às expectativas do público quanto ao impacto real dos investimentos financiados na sustentabilidade. Simultaneamente, a estabilidade financeira pode também ser afetada negativamente se as notações ASG forem indevidamente utilizadas como medidas diretas da solvabilidade financeira. Neste contexto, o BCE recomenda que o regulamento proposto preveja a imposição aos prestadores de serviços de notação ASG de uma obrigação de comunicação clara, por exemplo, através de uma declaração de exoneração de responsabilidade explícita, de que as notações ASG, mesmo as predominantemente concebidas como métricas de risco, não constituem métricas diretas do risco de crédito. Esta obrigação tornaria mais fácil a distinção entre as notações ASG e as notações de risco estabelecidas no mercado, evitando-se assim qualquer confusão quanto à respetiva finalidade.

    2.3.5.

    Por último, embora tal extravase o âmbito de aplicação do regulamento proposto, o BCE defende que são necessárias medidas adicionais e mais concretas para assegurar que as agências de notação de risco reflitam, nas suas metodologias, de forma sistemática e adequada, os riscos associados às alterações climáticas, como parte de considerações ambientais, sociais e de governação mais amplas, e divulguem, nas notações de risco, a pertinência e a materialidade dos riscos associados às alterações climáticas. As agências de notação de risco devem esclarecer se, e de que forma, essas notações servem de base à sua avaliação da qualidade creditícia de uma determinada entidade, a fim de assegurar a sua adequada utilização pelos participantes no mercado, bem como a comparabilidade entre os diferentes emitentes.

    2.4.   Relevância para a supervisão prudencial das instituições de crédito

    2.4.1.

    As instituições significativas diretamente supervisionadas pelo BCE devem gerir e divulgar com prudência os riscos relacionados com o clima e o ambiente (33). Em especial, espera-se que, ao formularem e aplicarem a sua estratégia empresarial e os seus quadros de governação e de gestão dos riscos, tenham em conta os riscos relacionados com o clima e o ambiente, como fatores impulsionadores das categorias de riscos existentes. Neste contexto, o BCE observou que algumas instituições de crédito, entre outras, utilizam notações ASG externas para monitorizar os riscos relacionados com o clima (34).

    2.4.2.

    O BCE considera que a adoção de normas abrangentes de informação sobre as características das notações ASG, as suas metodologias e as suas fontes de dados através do regulamento proposto é fundamental para facilitar a utilização das notações ASG como fator de produção nos processos de monitorização conduzidos pelas instituições de crédito. As instituições de crédito, enquanto potenciais utilizadores de notações ASG, devem estar em condições de avaliar os objetivos de uma notação ASG, a especificação exata dos temas abrangidos por uma notação ASG no que diz respeito aos fatores ambiental, social ou de governação e os contributos respetivos dos fatores individuais para as notações agregadas. Tal é necessário para atenuar os riscos que podem surgir da dependência das instituições face às notações ASG agregadas, por exemplo, quando o fraco desempenho de uma entidade objeto de notação em termos de fatores ambientais pode ser ocultado por um bom desempenho em termos de fatores sociais e de governação. A transparência é fundamental para garantir que as instituições de crédito não aplicam de forma mecânica as notações ASG como indicadores de risco de crédito, mas estão em condições de extrair dessas notações as informações relevantes para os fins da sua própria avaliação do risco.

    Nos casos em que o BCE recomenda alterações ao regulamento proposto, as sugestões de reformulação específicas, acompanhadas de um texto explicativo, constam de um documento técnico de trabalho separado. O documento técnico de trabalho está disponível em inglês no EUR-Lex.

    Feito em Frankfurt am Main, em 4 de outubro de 2023.

    A Presidente do BCE

    Christine LAGARDE


    (1)  COM(2023) 314 final.

    (2)  Ver o artigo 1.o do regulamento proposto.

    (3)  Comunicação da Comissão sobre uma Estratégia de financiamento da transição para uma economia sustentável (COM(2021) 390 final).

    (4)  A Comissão publicou o seu documento sobre o Pacto Ecológico Europeu em 11 de dezembro de 2019; ver COM(2019) 640 final.

    (5)  Acordo de Paris adotado no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (JO L 282 de 19.10.2016, p. 4).

    (6)  Regulamento (UE) 2021/1119 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de junho de 2021, que cria o regime para alcançar a neutralidade climática e que altera os Regulamentos (CE) n.o 401/2009 e (UE) 2018/1999 («Lei europeia em matéria de clima») (JO L 243 de 9.7.2021, p. 1).

    (7)  Comunicação da Comissão sobre uma Estratégia de financiamento da transição para uma economia sustentável (COM(2021) 390 final).

    (8)  Ver também a exposição de motivos do regulamento proposto.

    (9)  Ver «Towards a green capital markets union for Europe» (Rumo a uma União dos Mercados de Capitais Verdes para a Europa), discurso de Christine Lagarde, Presidente do BCE, na conferência de alto nível da Comissão sobre a proposta de Diretiva Divulgação de Informações sobre Sustentabilidade das Empresas, Frankfurt am Main, 6 de maio de 2021, disponível no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (10)  Ver o ponto 2.4 do Parecer CON/2021/12 do Banco Central Europeu, de 19 de março de 2021, sobre o mandato e as funções do Magyar Nemzeti Bank em matéria de sustentabilidade ambiental, e o ponto 2 do Parecer CON/2021/27 do Banco Central Europeu, de 7 de setembro de 2021, sobre uma proposta de diretiva que altera a Diretiva 2013/34/UE, a Diretiva 2004/109/CE, a Diretiva 2006/43/CE e o Regulamento (UE) n.o 537/2014, no que respeita à comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas (JO C 446 de 3.11.2021, p. 2). Todos os pareceres do BCE estão publicados no EUR-Lex.

    (11)  Ver o comunicado de imprensa intitulado «BCE apresenta plano de ação para incluir considerações sobre as alterações climáticas na sua estratégia de política monetária», 8 de julho de 2021, disponível no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (12)  Ver «Climate-related risks to financial stability», (Riscos para a estabilidade financeira relacionados com as alterações climáticas), editorial do Relatório do BCE sobre a análise da estabilidade financeira, maio de 2021, disponível (em inglês) no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (13)  Ver o ponto 2.4 do Parecer CON/2021/12; o ponto 2.2 do Parecer CON/2021/22 do Banco Central Europeu, de 11 de junho de 2021, sobre a regulamentação do desfasamento de prazos de vencimento do forint entre instituições de crédito; e Isabel Schnabel, «Never waste a crisis: COVID-19, climate change and monetary policy» (Nunca desperdice uma crise: COVID 19, alteração climática e política monetária), mesa redonda virtual sobre «Sustainable Crisis Responses in Europe» (Respostas sustentáveis à crise na Europa), INSPIRE Research Network, de 17 de julho de 2020, disponível (em inglês) no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (14)  Ver o ponto 2.4 do Parecer CON/2021/12 e a página 3 de «Climate change and monetary policy: initial takeaways» (Alterações climáticas e política monetária: primeiras conclusões), junho de 2020, disponível no sítio Web da Rede de Bancos Centrais e Supervisores para a Descarbonização do Sistema Financeiro em www.ngfs.net

    (15)  Disponível no sítio web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (16)  Ver o artigo 2.o, n.o 2, alínea i), do regulamento proposto.

    (17)  Ver o comunicado de imprensa do BCE, de 4 de julho de 2022, intitulado «BCE toma novas medidas para incorporar as alterações climáticas nas suas operações de política monetária», disponível no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (18)  Ver o considerando 18 da Orientação (UE) 2015/510 do Banco Central Europeu, de 19 de dezembro de 2014, relativa ao enquadramento para a implementação da política monetária do Eurosistema (BCE/2014/60) (JO L 91 de 2.4.2015, p. 3).

    (19)  Ver, em especial, a Orientação (UE) 2015/510 (BCE/2014/60) (JO L 91 de 2.4.2015, p. 3) e a Orientação (UE) 2016/65 do Banco Central Europeu, de 18 de novembro de 2015, relativa às margens de avaliação a aplicar na implementação da política monetária do Eurosistema (BCE/2015/35) (JO L 14 de 21.1.2016, p. 30).

    (20)  Disponível no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (21)  Ver o comunicado de imprensa do BCE, de 4 de julho de 2022, intitulado «BCE toma novas medidas para incorporar as alterações climáticas nas suas operações de política monetária», disponível no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (22)  Ver o artigo 3.o, ponto 4, do regulamento proposto.

    (23)  O artigo 3.o, ponto 1, do regulamento proposto define «notação ASG» como «um parecer, uma pontuação ou uma combinação de ambos, relativos a uma entidade, a um instrumento financeiro, a um produto financeiro ou ao perfil ou características ASG de uma empresa, ou à exposição a riscos ASG ou ao impacto sobre as pessoas, a sociedade e o ambiente, que se baseiam numa metodologia estabelecida e num sistema de classificação definido das categorias de notação e que são atribuídos a terceiros, independentemente de essa notação ASG ser explicitamente rotulada como “notação” ou “pontuação” ASG».

    (24)  Ver o artigo 2.o, n.o 2, alínea i), subalínea b), do regulamento proposto.

    (25)  Ver o artigo 2.o, n.o 2, alínea i), subalínea c), do regulamento proposto.

    (26)  Ver, por exemplo, o artigo 130.o do TFEU e os artigos 7.o (Independência), 36.o (Pessoal) e 37.o (Segredo profissional) dos Estatutos do SEBC. Ver também a Orientação (UE) 2021/2253 do Banco Central Europeu, de 2 de novembro de 2021, que estabelece os princípios do Código Deontológico do Eurosistema (BCE/2021/49) (JO L 454 de 17.12.2021, p. 7) e o Código Deontológico do BCE (JO C 204 de 20.6.2015, p. 3), em especial a parte 0 das Regras aplicáveis ao Pessoal do BCE - Parte respeitante ao Código Deontológico (JO C 375 de 6.11.2020, p. 25).

    (27)  Ver, por exemplo, as seguintes disposições do regulamento proposto: o artigo 15.o, que veda aos prestadores de serviços de notação ASG o exercício de outras atividades (tais como atividades de prestação de consultoria a investidores ou empresas; emissão e venda de notações de risco; atividades de investimento; e atividades de auditoria); o artigo 23.o, n.o 3, que respeita à supervisão pela ESMA relativamente ao risco de conflito de interesses no seio de um prestador de serviços de notação ASG devido à estrutura de propriedade, aos interesses de controlo ou às atividades desse prestador de serviços de notação ASG; e o artigo 25.o, que respeita aos valores cobrados pelos prestadores de serviços de notação ASG aos seus clientes.

    (28)  Ver o artigo 2.o, n.o 2, alínea i), subalínea c), do regulamento proposto.

    (29)  Ver o artigo 127.o, n.os 1 e 2, e o artigo 282.o do TFUE.

    (30)  Ver o artigo 2.o, n.o 2, alínea g), do regulamento proposto.

    (31)  O artigo 2.o, n.o 2, alínea b), do regulamento a proposto prevê uma isenção para as «notações ASG produzidas por empresas financeiras regulamentadas na União que sejam utilizadas para fins internos ou para a prestação de serviços e produtos financeiros internos».

    (32)  Ver o considerando 11 e o artigo 21.o, do regulamento proposto. Em especial, o anexo III, ponto 1, alínea d), exige que os prestadores de serviços de notação ASG divulguem ao público informações sobre o objetivo das notações, indicando claramente se a notação está a avaliar riscos, impactos ou outras dimensões.

    (33)  Ver o «Guia sobre riscos climáticos e ambientais», Supervisão Bancária do BCE, novembro de 2020, disponível no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu

    (34)  Ver «Walking the talk – Banks gearing up to management risks from climate change and environmental degradation» (Cumprir promessas: bancos preparam-se para gerir os riscos decorrentes das alterações climáticas e da degradação ambiental), Supervisão Bancária do BCE, novembro de 2022, disponível no sítio Web do BCE em www.ecb.europa.eu


    ELI: http://data.europa.eu/eli/C/2023/1354/oj

    ISSN 1977-1010 (electronic edition)


    Top