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Document 52022AE1786

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.° 909/2014 no que diz respeito à disciplina da liquidação, à prestação transfronteiras de serviços, à cooperação no domínio da supervisão, à prestação de serviços bancários auxiliares e aos requisitos aplicáveis às centrais de valores mobiliários de países terceiros [COM(2022) 120 final — 2022/0074 (COD)]

EESC 2022/01786

JO C 443 de 22.11.2022, p. 87–92 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

22.11.2022   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 443/87


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.o 909/2014 no que diz respeito à disciplina da liquidação, à prestação transfronteiras de serviços, à cooperação no domínio da supervisão, à prestação de serviços bancários auxiliares e aos requisitos aplicáveis às centrais de valores mobiliários de países terceiros

[COM(2022) 120 final — 2022/0074 (COD)]

(2022/C 443/12)

Relator:

Kęstutis KUPŠYS

Correlator:

Christophe LEFÈVRE

Consulta

Conselho da União Europeia, 12.4.2022

Parlamento Europeu, 4.4.2022

Base jurídica

Artigos 114.o e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em secção

1.7.2022

Adoção em plenária

14.7.2022

Reunião plenária n.o

571

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

185/0/1

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) considera que as soluções propostas pela Comissão para resolver as cinco questões principais identificadas durante o processo de revisão do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários são, de um modo geral, suficientes e eficazes. Com procedimentos de liquidação mais eficazes a nível da UE, os mercados de capitais serão mais atrativos, quer para emitentes, quer para investidores, e estaremos mais próximos de concretizar a União dos Mercados de Capitais (UMC).

1.2

O CESE acolhe favoravelmente e considera proporcionadas as iniciativas da Comissão de substituir os procedimentos de passaporte existentes por uma notificação, bem como a proposta de reforçar a cooperação no domínio da supervisão, mediante a criação, mas não a duplicação, de colégios de autoridades de supervisão adequados.

1.3

No que se refere à prestação de serviços bancários auxiliares, o CESE identifica novas oportunidades em soluções baseadas na liquidação em moeda de banco central. Para diminuir ainda mais um conjunto de riscos diversos, deve ser feita uma maior utilização da atual plataforma TARGET2-Securities (T2S) de liquidação de valores mobiliários em moeda de banco central multidivisas.

1.4

O CESE considera vantajoso complementar a proposta da Comissão em apreço com as disposições sobre o reconhecimento do papel central da T2S para a infraestrutura de liquidação de valores mobiliários europeus, resolvendo simultaneamente, embora de forma parcial, o problema do subdesenvolvimento dos serviços bancários auxiliares entre as Centrais de Valores Mobiliários (Central Securities Depositories — CSD).

1.5

O CESE observa que a parte mais controversa da proposta, «a abordagem em duas etapas» para a eventual aplicação dos procedimentos de recompra obrigatória, continua a ser uma opção equilibrada. Os procedimentos de recompra obrigatória não devem ser tidos em consideração até os motivos subjacentes às falhas de liquidação serem analisados em pormenor e se obter alguma clareza sobre se outras medidas destinadas a reduzir as falhas de liquidação alcançarão resultados satisfatórios.

1.6

O Comité está plenamente ciente de que o regime-piloto da tecnologia de registo distribuído constitui uma parte importante do contexto legislativo da revisão do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários, mas adverte que a criação de um «ambiente de testagem da regulamentação» não deve estabelecer um precedente para o enfraquecimento das normas em vigor em matéria de comportamento no mercado e proteção dos investidores. As CSD devem desempenhar um papel fundamental na gestão das redes de tecnologia de registo distribuído, definida de uma forma que reduza o risco de contraparte. Além disso, o CESE advoga normas de supervisão mais robustas com vista à aplicação de sanções e recomenda que o Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários exija às CSD, aos seus emitentes e aos seus participantes que criem um mecanismo viável e permanente de intercâmbio e partilha de dados pertinentes para a aplicação de sanções europeias comuns.

2.   Contexto

2.1

As CSD são entidades que detêm e administram valores mobiliários e permitem que as transações de valores mobiliários sejam realizadas de forma desmaterializada (1). As CSD operam a infraestrutura que assegura que as transações de valores mobiliários podem ser concluídas. Esse serviço principal das CSD é geralmente designado por «liquidação». Na UE, as CSD existentes (2) liquidam transações de valor bem superior a 1 000 biliões de euros por ano (mais de 70 vezes o produto interno bruto da UE (3) ou 17 vezes superior ao valor em circulação de todos os valores mobiliários detidos em contas de CSD (4)). As CSD também prestam outros serviços básicos, tais como i) serviço de registo em conta, ou seja, o registo de valores mobiliários recém-emitidos, e ii) serviço de administração de sistema de registo centralizado, ou seja, o registo de todas as alterações na detenção desses valores mobiliários. Para as CSD que operam dentro de fronteiras nacionais, há várias décadas que estavam instituídos procedimentos comprovados e eficientes, mas os mercados tornaram-se mais interligados e, devido ao aumento das transações transfronteiriças na Europa, tornou-se evidente a necessidade de harmonização da liquidação transfronteiriça e de outros serviços.

2.2

O Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários, adotado após a crise financeira de 2008, entrou em vigor em 17 de setembro de 2014 e foi aplicado de forma faseada (5). Trouxe melhorias substanciais ao ambiente pós-negociação, nomeadamente o estabelecimento de um período de liquidação normalizado, a melhoria da disciplina da liquidação transfronteiriça, a introdução de regras coerentes para as CSD na UE (por exemplo, licenciamento, autorização, supervisão) e a liberdade de os emitentes de valores mobiliários escolherem a sua CSD.

2.3

Um dos principais progressos realizados pelo regulamento dizia respeito à disciplina da liquidação — medidas destinadas a prevenir a ocorrência de falhas de liquidação e a resolver essas falhas, caso ocorressem. No entanto, uma avaliação mais aprofundada demonstrou que estas medidas não eram suficientes, pois os indicadores de falhas de liquidação da UE mantiveram-se consideravelmente piores do que os de outros centros financeiros, mesmo tendo em consideração a natureza altamente fragmentada dos mercados de capitais da UE em comparação com os mercados extremamente homogéneos de outras geografias (6).

2.4

O regulamento previa outra grande melhoria destinada a facilitar os fluxos transfronteiriços de capitais — a liberdade de prestação de serviços noutro Estado-Membro (ou «sistema de passaporte», semelhante ao quadro pan-UE para o setor bancário que funciona sem problemas) —, que estimulou as CSD a expandirem as suas atividades além das fronteiras nacionais. O regulamento tornou ainda possível a prestação de serviços bancários auxiliares (serviços que apoiam a liquidação de valores mobiliários) por CSD, desde que cumprindo rigorosamente os requisitos prudenciais específicos para os riscos de crédito relacionados com esses serviços. Contudo, o quadro jurídico não conduziu ao nível de integração pretendido do sistema de serviços de liquidação da UE, com as CSD relutantes em prestar serviços auxiliares ou em participar num procedimento de passaporte oneroso.

2.5

Em março de 2022, a Comissão, agindo em conformidade com o artigo 75.o do regulamento, que prevê uma revisão, apresentou uma proposta de revisão do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários. Esta revisão aborda os seguintes cinco problemas principais:

(i)

requisitos complexos em matéria de procedimento de passaporte;

(ii)

cooperação insuficiente em matéria de supervisão;

(iii)

requisitos desproporcionados para a prestação de serviços bancários auxiliares;

(iv)

lacunas que conduzem a liquidações falhadas;

(v)

informações insuficientes sobre as atividades disponibilizadas por CSD de países terceiros na UE.

2.6

Em 22 de junho de 2015, quase em simultâneo à entrada em vigor do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários, mas desenvolvida de forma independente, a T2S foi lançada como a primeira plataforma de liquidação de valores mobiliários em moeda de banco central multidivisas (7). Para os clientes (geralmente bancos) das CSD que estão ligadas à plataforma T2S, tal significa poderem escolher entre a liquidação em euros em moeda de banco comercial ou de banco central. Ao liquidarem valores mobiliários em moeda de banco central com recurso à T2S, as CSD podem disponibilizar aos seus clientes o acesso ao fundo comum de liquidez dos serviços TARGET do Eurosistema para liquidação de garantias, pagamentos e valores mobiliários. Portanto, a liquidez necessária para liquidar transações por toda a Europa foi significativamente reduzida. Contudo, tal não afetou os custos por variadas razões, mas sobretudo por ainda se verificar uma fragmentação do mercado entre moedas: em 2019, as taxas da T2S passaram de 15 cêntimos de euro por transação de «entrega contra pagamento» para 23,5 cêntimos de euro (8). A T2S continua fora do âmbito da proposta de revisão do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários apresentada pela Comissão em março de 2022.

3.   Observações na generalidade

3.1

Tal como referido no Parecer do CESE — Uma União dos Mercados de Capitais ao serviço das pessoas e das empresas — novo plano de ação (9), o Comité acolhe com agrado as iniciativas da Comissão para concretizar a visão ambiciosa da UMC, que consiste em permitir fluxos de capitais por toda a UE, em prol dos consumidores, dos investidores e das empresas. Das 16 medidas delineadas no Plano de Ação para a UMC, uma das mais importantes é a melhoria da prestação transfronteiras de serviços de liquidação (Ação n.o 13), uma vez que as lacunas da regulamentação em vigor são evidentes e considera-se que uma ação legislativa célere permitirá que a UMC avance.

3.2

Quanto aos cinco problemas principais identificados pela Comissão, que conduziram à revisão do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários, o CESE considera que as soluções apresentadas são suficientes e eficazes:

3.3

A proposta de substituir os requisitos em matéria de procedimento de passaporte existentes, que são considerados pouco claros ou complexos, por uma notificação (o que significa que os Estados-Membros não podem recusar o pedido de uma CSD), é um passo importante no sentido de um sistema de liquidação mais harmonioso e interligado, que conduzirá à redução dos custos para as CSD dispostas a prestar serviços transfronteiriços. Continua, porém, por apurar de que forma estas medidas de apoio se traduzirão em poupanças de custos para os emitentes e os investidores. Em especial, importa assegurar que as autoridades de supervisão nos países de origem conservam a fiscalização do mercado.

3.4

A necessidade de reduzir os custos melhorando, simultaneamente, a cooperação em matéria de supervisão levou à proposta da Comissão de criar colégios de supervisão, que o CESE apoia vivamente enquanto medida adequada e equilibrada. O Comité acolhe favoravelmente a introdução de apenas um colégio para a CSD em vez de dois colégios separados, de modo a assegurar que a CSD não fica sujeita, ao mesmo tempo, ao «colégio para efeitos de passaporte» e ao «colégio a nível do grupo». Tal deverá poupar custos e ajudar a alcançar sinergias consideráveis em matéria de supervisão.

3.5

Uma das melhorias principais do quadro de prestação de serviços bancários auxiliares tem que ver com a alteração do artigo 54.o, n.o 4, do regulamento, que o Comité apoia vivamente, uma vez que permite que as CSD solicitem a prestação dos serviços supramencionados não apenas às instituições de crédito designadas, mas também a outras CSD.

3.6

No entanto, o CESE reconhece que esta alteração poderá aumentar os riscos em matéria de estabilidade financeira. Embora o CESE considere importante o objetivo de melhorar a prestação de serviços transfronteiriços em resultado de haver menores obstáculos à prestação de serviços bancários auxiliares, e de partilhar essa aspiração, entende existirem oportunidades em soluções baseadas na liquidação em moeda de banco central, o que é intrinsecamente mais seguro. É certo que esta situação teria de ser abordada em grande medida fora do âmbito do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários — por exemplo, através do alargamento da T2S, do desenvolvimento de moedas digitais de bancos centrais por grosso, da eliminação de obstáculos jurídicos, etc.

3.7

No entanto, não é claro se a via escolhida pela Comissão, de incumbir a Autoridade Bancária Europeia (EBA) de elaborar um projeto de normas técnicas de regulamentação para definir um limiar abaixo do qual esses serviços bancários auxiliares podem ser prestados por instituições de crédito, é a correta. Um aspeto positivo é que a calibração de um limiar poderá ser realizada da melhor forma por esta Autoridade e a Comissão terá maior margem de manobra, se necessário. Apesar disso, o CESE abordou, em várias ocasiões (10), a questão de os colegisladores não estarem dotados de competência para decidir sobre matérias importantes no ato legislativo em apreço. Por conseguinte, o CESE apoia a adoção de decisões sobre matérias de política económica fundamentais através do processo legislativo ordinário (11).

3.8

O CESE acolhe muito favoravelmente as medidas destinadas a melhorar a disciplina da liquidação. Apoia ainda o facto de a revisão prever em vários pontos clarificações e exceções relacionadas com a questão da disciplina da liquidação. É especialmente importante a decisão da Comissão de evitar introduzir de imediato procedimentos de recompra obrigatória; estes procedimentos de recompra poderão tornar-se aplicáveis se e quando o regime de sanções por si só não conseguir alcançar melhorias em matéria de falhas de liquidação na União Europeia. A introdução de mecanismos de repercussão, que evitará a aplicação de procedimentos de recompra obrigatória em cadeia, parece atenuar as insuficiências subjacentes (ou o receio de uma aplicação imperfeita) do regime de procedimentos de recompra obrigatória proposto. O CESE considera prudente a abordagem «em duas etapas» para a eventual aplicação dos procedimentos de recompra obrigatória e considera que, desta forma, os mercados de capitais europeus tornar-se-ão mais atrativos a longo prazo, tanto para os emitentes como para os investidores.

3.9

As disposições relativas a CSD de países terceiros são especialmente importantes no contexto de uma busca da UE por uma autonomia estratégica aberta. O CESE acolhe com agrado o requisito introduzido pela alteração do artigo 25.o do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários, que refere que as CSD que tencionem prestar serviços de liquidação nos termos da legislação de um Estado-Membro devem notificar a Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA). O Comité apoia ainda as medidas introduzidas pela revisão que regulamentam outros aspetos das operações de CSD de países terceiros na UE, conduzindo, desta forma, a condições de concorrência equitativas e a um ambiente de melhor concorrência.

4.   Observações na especialidade

Papel da T2S

4.1

Tendo em conta a importância considerável da T2S, o CESE entende necessário instituir um quadro de supervisão e fiscalização coerente para o papel desta plataforma no sistema global de liquidação. Os atuais acordos voluntários entre o Banco Central Europeu (BCE), a ESMA, as autoridade nacionais competentes das CSD que participam na T2S e os bancos centrais que supervisionam as CSD devem ser atualizados, de modo a assegurar que o novo quadro legislativo prevê funções claras para todas as autoridades participantes: as autoridades nacionais competentes, os bancos centrais e o BCE como fiscalizadores principais e a ESMA como supervisora. Este quadro melhorado pode assumir a forma de um colégio de supervisores.

4.2

Por conseguinte, o CESE insta os colegisladores a incluírem a plataforma de liquidação sistémica T2S no âmbito de aplicação do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários e a criarem as condições para a adoção generalizada da liquidação através da ferramenta T2S na UE (12). Tal é necessário para fazer com que este sistema multidivisas funcione finalmente na sua plena capacidade, apesar das reservas compreensíveis dos bancos centrais e das CSD em países fora da área do euro. O papel da T2S na harmonização dos fluxos de dados e de informações — um aspeto crucial para uma prestação de serviços eficaz pelas CSD — também deve ser reconhecido e incluído na proposta legislativa.

4.3

Atualmente, a T2S é acompanhada com base num conjunto de princípios da infraestrutura dos mercados financeiros incluídos no quadro de supervisão do BCE — uma abordagem «ligeira» que reconhece a importância sistémica desta plataforma para o Espaço Económico Europeu. O Comité entende que não existem conflitos regulamentares relativamente à independência incontestada do BCE, pois a T2S pode ser considerada um instrumento da infraestrutura para os participantes no mercado financeiro que, por uma série de motivos, funciona melhor sob a égide do BCE do que noutros contextos. Além disso, a participação do BCE na liquidação de valores mobiliários através da plataforma afasta-se um pouco das funções clássicas do banco central, conduzindo claramente à necessidade de incluir a T2S no Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários, de modo a criar um quadro regulamentar coerente e eficaz.

Monitorização da disciplina da liquidação

4.4

O CESE observa que a parte mais controversa da proposta, a eventual aplicação de procedimentos de recompra obrigatória, realizados com recurso a uma abordagem «em duas etapas», continua a ser uma opção particularmente equilibrada a ter em consideração até que se obtenha alguma clareza sobre se outras medidas que visam reduzir as falhas de liquidação atingirão resultados satisfatórios.

4.5

Considera, no entanto, que abordar a questão o mais rapidamente possível conduzirá a uma melhor e mais profunda compreensão dos motivos das falhas de liquidação. Por conseguinte, o CESE apela à indicação de uma data concreta para a avaliação do progresso dos indicadores de falhas de liquidação e dos motivos subjacentes às falhas, na forma de um relatório público elaborado pela autoridade competente, idealmente no prazo de 12 meses após a entrada em vigor do regime de sanções.

4.6

Embora haja quem defenda a eliminação definitiva da obrigação dos procedimentos de recompra, o CESE é mais cauteloso, à luz do número de falhas de liquidação inaceitavelmente elevado (também em comparação com outras jurisdições financeiras importantes). Descartar uma opção política importante do conjunto de instrumentos ao dispor da Comissão não melhoraria a situação. A adoção de um ato de execução parece ser uma opção adequada a este caso em particular.

4.7

O CESE reconhece que existe uma forma extremamente eficaz de obter uma diminuição rápida dos valores relativos às falhas de liquidação — um aumento das sanções em vigor até se alcançar o equilíbrio adequado. Deve prestar-se especial atenção às falhas de liquidação que envolvam práticas de «vendas a descoberto». Os procedimentos de recompra obrigatória poderiam tornar-se uma opção de último recurso, pronta a ser aplicada com extrema prudência após consultas adequadas com os participantes no mercado se todas as outras opções falharem.

4.8

Antes de se empreender qualquer ação, deve ser dada especial atenção às medidas destinadas a encurtar as cadeias de intermediários. As razões para a utilização generalizada da técnica de «correspondência prévia» exigem um exame aprofundado. Uma vez que muitas falhas (técnicas) ocorrem devido a atrasos nas cadeias de liquidação longas, os procedimentos de recompra obrigatória não podem ser impostos sem ter em conta este fator nem antes de serem aplicadas medidas adequadas para incentivar a redução das «cadeias de comando» de liquidação.

Liquidação de «ativos digitais» no sistema de liquidação de uma CSD

4.9

A ascensão dos «ativos digitais» veio realçar a interligação funcional dos serviços de transação e de liquidação de um determinado ativo. A adoção da tecnologia de registo distribuído, no setor financeiro e em todos os outros, encerra um grande potencial. Para que a transação e liquidação de ativos «tradicionais» se mantenha competitiva na transação e liquidação de «ativos digitais», as CSD devem poder estabelecer facilmente os seus próprios sistemas de negociação para os instrumentos em que liquidam as transações. O Comité está plenamente ciente de que o regime-piloto da tecnologia de registo distribuído constitui uma parte importante do contexto legislativo da revisão do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários. O Comité apoia o adiamento de qualquer alteração ao Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários que vise concretizar todo o potencial da tecnologia de registo distribuído até ser adotada a proposta da Comissão para o regime-piloto supramencionado. Contudo, o Comité propõe, como medida intercalar, a possibilidade de criação de um sistema de negociação multilateral para instrumentos que sejam liquidados no âmbito de um sistema de liquidação de uma CSD. A manutenção de um sistema de negociação multilateral deve ser considerada um serviço auxiliar na aceção da secção B, ponto 1, do anexo ao Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários.

4.10

O Comité adverte que a criação de um «ambiente de testagem da regulamentação» não deve estabelecer um precedente para o enfraquecimento das normas em vigor em matéria de comportamento no mercado e proteção dos investidores. Transferir totalmente os processos de liquidação para redes por tecnologia de registo distribuído melhora a eficiência, pois diminui os custos de transação associados e reduz o risco envolvido quando da redução da cadeia de intermediários demasiado alargada. Não obstante, o risco de contraparte não desaparece simplesmente por se potenciar as redes de tecnologia de registo distribuído. É fundamental assegurar que os requisitos para participação nestas redes são definidos de uma forma que reduza o risco de contraparte. As CSD devem desempenhar um papel fundamental na gestão da infraestrutura.

Aplicação de sanções

4.11

A revisão do Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários surge num momento extremamente difícil — em plena guerra da Rússia contra a Ucrânia. A infraestrutura dos mercados financeiros europeus foi concebida para conseguir superar choques como este; além disso, a sua parte (sistemicamente) importante — a rede de CSD — é agora fundamental para assegurar que as sanções ocidentais à Rússia são devidamente aplicadas a nível operacional. O CESE insta a Comissão a fornecer as orientações necessárias nos casos em que as ações relacionadas com sanções entrem em «território desconhecido», gerando incerteza junto dos intervenientes no mercado. Certas disposições destas orientações de «solução rápida» podem ser tidas em conta em novas melhorias da proposta de revisão, tornando-a mais apta para desafios futuros.

4.12

No contexto da evolução da conjuntura internacional, o CESE propõe que o Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários exija às CSD, aos seus emitentes e aos seus participantes que criem um mecanismo viável e permanente de intercâmbio e partilha de dados pertinentes para a aplicação de sanções europeias comuns. Não se deve chegar à situação em que se omite uma ação apenas porque os vários participantes não conseguem chegar a uma conclusão que deveria ser simples ou pelo menos exequível (ou seja, se considerada em conjunto). A questão de saber se o Regulamento Liquidação e Centrais de Valores Mobiliários deve ser considerado como um instrumento jurídico adequado para o efeito é legítima. No entanto, o CESE advoga normas de supervisão mais robustas com vista à aplicação de sanções.

Bruxelas, 14 de julho de 2022.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Os valores mobiliários podem ser detidos de forma física ou desmaterializada.

(2)  Existem 26 CSD, além de duas CSD internacionais. Fonte: Registo da ESMA.

(3)  Com base nos dados do Eurostat sobre o PIB de 2021, ou seja, 14,4 biliões de euros.

(4)  No final de 2020, os valores mobiliários detidos nos sistemas de liquidação da UE ascendiam a mais de 56 biliões de euros. Dados gerados através da base de dados de estatísticas sobre negociação, compensação e liquidação de valores mobiliários do Banco Central Europeu. Consultada em 4 de maio de 2022.

(5)  JO C 299 de 4.10.2012, p. 76.

(6)  As falhas de liquidação de títulos de capital, calculadas em percentagem do número total de transações, caíram 3 % antes da turbulência do mercado provocada pela COVID-19, mas desde então voltaram a aumentar 4,5 %. Em percentagem do valor, o rácio aumentou para 9 % em janeiro de 2021, quando era de 6 % antes de março de 2020. Fonte: «Impact Assessment Report» [Relatório de avaliação de impacto]. No entanto, a experiência de mercado demonstra que a maioria das «falhas» ocorre porque a instrução de liquidação chega ao sistema de liquidação através de uma cadeia de intermediários após o dia designado pelas partes finais como «dia de liquidação previsto».

(7)  Sistema TARGET2-Securities [disponível em inglês]. Atualmente, estão ligadas à T2S 19 CSD de 20 países europeus. A coroa dinamarquesa está disponível para liquidação na T2S desde outubro de 2018.

(8)  Sistema de estabelecimento de preços da TARGET2-Securities [disponível em inglês].

(9)  JO C 155 de 30.4.2021, p. 20.

(10)  Mais recentemente no Parecer do CESE — Revisão do quadro Solvência II, adotado em fevereiro de 2022, ver ponto 2.3 (JO C 275 de 18.7.2022, p. 45).

(11)  Parecer do CESE — Revisão do quadro Solvência II (JO C 275 de 18.7.2022, p. 45).

(12)  À exceção da coroa dinamarquesa, nenhuma outra liquidação em moeda distinta do euro pode ser realizada através do sistema T2S, pois intervenientes importantes fora da liquidação da área do euro estão algo hesitantes em aderir e estão a adotar uma abordagem de «esperar para ver».


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