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Document 52022AE0598

Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Tornar os produtos sustentáveis a norma [COM(2022) 140 final] e Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um quadro para definir os requisitos de conceção ecológica dos produtos sustentáveis e que revoga a Diretiva 2009/125/CE [COM(2022) 142 final — 2022/0095(COD)]

EESC 2022/00598

JO C 443 de 22.11.2022, p. 123–129 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

22.11.2022   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 443/123


Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Tornar os produtos sustentáveis a norma

[COM(2022) 140 final]

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um quadro para definir os requisitos de conceção ecológica dos produtos sustentáveis e que revoga a Diretiva 2009/125/CE

[COM(2022) 142 final — 2022/0095(COD)]

(2022/C 443/18)

Relator:

Thomas WAGNSONNER

Consulta

Comissão Europeia, 16.5.2022

Parlamento Europeu, 2.5.2022

Conselho, 10.6.2022

Base jurídica

Artigos 192.o, n.o 1, e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

30.6.2022

Adoção em plenária

14.7.2022

Reunião plenária n.o

571

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

205/1/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) aprecia as propostas no âmbito do Plano de Ação para a Economia Circular e apoia, em particular no presente parecer, a forma de tornar os produtos mais sustentáveis. Além disso, considera também necessária uma abordagem jurídica harmonizada. Salienta também que o conteúdo da proposta relativa ao novo Regulamento Conceção Ecológica ainda está, em grande parte, indefinido, pois será determinado através de diversos atos delegados. Além disso, dada a necessidade de reduzir o consumo de recursos e proteger o clima, o CESE propõe uma aplicação mais rápida e mais ambiciosa do regulamento.

1.2

O CESE salienta, em particular, que o êxito da economia circular depende de uma boa participação e informação de todos os agentes económicos — produtores, consumidores, trabalhadores —, bem como das administrações públicas. Neste contexto, uma regulamentação clara, adequada e coerente é indispensável para uma boa aplicação, a fim de dar aos produtos sustentáveis uma oportunidade justa de competir.

1.3

O CESE congratula-se com os novos elementos do regulamento em apreço, como o alargamento do âmbito de aplicação, os novos requisitos de conceção ecológica (durabilidade, reparabilidade, reciclagem, impacto ambiental, emissões de CO2, etc.), e as obrigações de informação através do passaporte digital e dos rótulos dos produtos, sublinhando a importância de uma informação correta e adequada, em particular para os consumidores;

1.4

O CESE apoia a proibição da destruição de produtos não vendidos, sejam eles produtos novos, produtos rejeitados ou produtos a reparar. Congratula-se igualmente com o facto de o regulamento, em conjugação com o pacote legislativo sobre a circularidade, abordar problemas como o branqueamento ecológico ou a obsolescência;

1.5

O Fórum da Conceção Ecológica, a quem foram cometidas várias funções, constitui um organismo de apoio à aplicação. Neste fórum, todas as partes interessadas e os representantes da sociedade civil, incluindo os parceiros sociais, devem ter a oportunidade de contribuir com ideias e propostas para melhorar o processo;

1.6

O CESE está ciente do desafio colocado aos produtores e empresas, sobretudo às pequenas e médias empresas (PME), e sublinha a necessidade de evitar encargos burocráticos desnecessários. Vê igualmente a oportunidade de alcançar um novo nível de produção europeu Made in Europe (Fabricado na Europa) graças às normas aplicáveis aos produtos sustentáveis;

1.7

Os instrumentos de declaração de conformidade e autorregulação abrem espaço ao empreendedorismo. Um controlo eficiente e coordenado entre os Estados-Membros, a par da prestação adequada de informações ao consumidor, reforçam a confiança na transição bem-sucedida de economias lineares para economias circulares.

1.8

Infelizmente, o CESE regista o facto de o regulamento não abordar a dimensão social. Uma mera referência à proposta da Comissão sobre a diretiva relativa ao dever de diligência das empresas afigura-se insuficiente.

2.   Contexto

2.1

O sistema económico linear exerce pressão sobre os recursos mundiais. No período entre as conferências sobre o clima da ONU, realizadas em Paris e em Glasgow, consumiu-se mais de meio bilião de toneladas de novos recursos. Segundo o relatório de 2022 sobre as lacunas em matéria de circularidade (Circularity-Gap-Report 2022(1), a nível mundial, apenas se recicla 8,6 % do que é utilizado ou, inversamente, existe uma lacuna de circularidade de mais de 90 %. A economia circular pode efetivamente contribuir para reduzir o consumo de recursos.

2.2

A necessidade de preservar os recursos tem sido reconhecida na Europa. A Comissão Europeia propôs o Pacto Ecológico, a estratégia de crescimento da UE para uma sociedade justa e próspera com uma economia moderna, eficiente na utilização de recursos e competitiva. A necessidade de ação é reforçada pelos problemas da cadeia de abastecimento resultantes da pandemia e da invasão da Ucrânia pela Rússia. As empresas e os consumidores estão a sofrer carências e aumentos de preços em muitos domínios.

2.3

Especificamente, no final de março de 2022, a Comissão Europeia apresentou as seguintes iniciativas como parte do Plano de Ação para a Economia Circular:

Comunicação da Comissão — Tornar os produtos sustentáveis a norma

Proposta de regulamento relativo à conceção ecológica dos produtos sustentáveis

Plano de Trabalho da Conceção Ecológica e Etiquetagem Energética para 2022-2024

Estratégia da UE em prol da Sustentabilidade e Circularidade dos Têxteis

Proposta de revisão do regulamento relativo aos produtos de construção

Proposta para a capacitação dos consumidores para a transição ecológica

2.4

O presente parecer tem por objeto a Comunicação — Tornar os produtos sustentáveis a norma [COM(2022) 140 final] e a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um quadro para definir os requisitos de conceção ecológica dos produtos sustentáveis e que revoga a Diretiva 2009/125/CE [COM(2022) 142 final — 2022/0095 (COD)].

2.5

A comunicação em apreço aponta para a necessidade de repensar o modelo económico linear dominante e de adotar medidas no sentido de uma economia circular. Uma ação harmonizada a nível europeu reforçará a competitividade, criará empregos e oferecerá aos consumidores produtos sustentáveis. Tal requer uma nova abordagem do fabrico de produtos, que vá além dos atuais requisitos mínimos (REACH, etiquetagem energética, embalagem, etc.).

2.6

O novo Regulamento Conceção Ecológica terá um âmbito de aplicação muito mais vasto e contribuirá para a conservação de recursos e a eficiência energética através das iniciativas setoriais previstas para os têxteis, os produtos de construção, etc. Em particular, as novas disposições sobre o prolongamento da vida útil do produto (durabilidade, reparabilidade, melhor reciclagem, etc.) e o reforço das informações sobre o produto através do respetivo passaporte digital exigirão que as empresas apresentem de forma transparente as qualidades e o impacto do ciclo de vida dos seus produtos. Os consumidores terão a oportunidade de comparar e, por conseguinte, de avaliar os produtos que cumprem os requisitos de sustentabilidade europeus.

2.7

As especificações do produto previstas no Regulamento Conceção Ecológica são complementadas por outras medidas de acompanhamento. A posição e a confiança dos consumidores serão reforçadas por informações obrigatórias sobre os benefícios do produto e as suas vantagens ambientais, bem como por indicações sobre a reparabilidade e a durabilidade e pela proibição de branqueamento ecológico. Os controlos dos produtos pelas autoridades e a monitorização transparente do cumprimento dos critérios do produto oferecem segurança, permitem escolher entre produtos de alta qualidade e, deste modo, asseguram condições de concorrência equitativas para os operadores económicos.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE concorda, de modo geral, com os objetivos da economia circular e da iniciativa para produtos sustentáveis, uma vez que a sustentabilidade implica, neste contexto, uma combinação de aspetos ambientais, económicos e sociais. Tal significa que todos os agentes económicos terão de cumprir requisitos necessários, novos e exigentes. As empresas deverão orientar a sua produção e conceção de produtos por critérios de sustentabilidade e disponibilizar informações sobre os mesmos. Os consumidores devem poder compreender estas informações e, com base nelas, assumir a responsabilidade de tomar a decisão «certa». Neste contexto, cabe realizar campanhas de informação adequadas a fim de sensibilizar para estas questões. É necessário um controlo eficaz para assegurar que os objetivos são atingidos e não são contornados, pois tal prejudicaria a imagem da Europa enquanto local de negócios e promoveria o «ceticismo verde». Sobretudo, o objetivo é proporcionar bons empregos, melhorar o desenvolvimento e assegurar uma abordagem holística e a informação dos consumidores e clientes.

3.2

O regulamento em apreço e a economia circular estabelecem normas novas. Para que estas orientações sejam aceites e aplicadas na prática e conduzam a uma economia circular, cabe envolver os intervenientes económicos — consumidores, fabricantes, empresários, sindicatos, instituições de investigação — de forma empenhada e proativa. Neste sentido, será útil fornecer informações pertinentes sobre as oportunidades e os objetivos e assegurar a participação oportuna das partes interessadas.

3.3

O CESE apoia a abordagem harmonizada do regulamento e dos atos delegados para evitar a fragmentação e abordar as especificidades dos produtos, a acessibilidade para os consumidores e a concorrência. Os produtos sustentáveis constituem uma oportunidade europeia para as empresas, a inovação e o emprego, que tem em conta as preocupações dos consumidores em matéria de impacto ambiental e longevidade dos produtos.

3.4

Saúda-se o alargamento do âmbito de aplicação a mais produtos e os requisitos mais elevados. O CESE observa que estão previstas novas obrigações para as empresas de produção, por exemplo através do passaporte digital do produto, de regras sobre bens não vendidos e de regras específicas ao produto, que são necessárias para realizar a economia circular. Ao mesmo tempo, o regulamento estabelece um novo padrão Made in Europe [fabricado na Europa]. São ainda criadas oportunidades para a economia no domínio da conceção, tratamento de resíduos e reparação.

3.5

O CESE salienta a necessidade de assegurar a coerência entre todos os domínios legislativos pertinentes. Tal inclui a coerência, no âmbito deste plano de ação, em matéria de calendarização e conteúdo, a fim de não reduzir a eficácia em consequência da segmentação das disposições jurídicas e do seu tratamento diferente nos vários Estados-Membros. Contudo, é igualmente importante prestar atenção à coerência com outros atos jurídicos conexos importantes, como a recente proposta de diretiva da Comissão Europeia relativa ao dever de diligência das empresas, e com as regras sobre resíduos importantes para a circularidade, incluindo as medidas de exportação, o Regulamento Fiscalização do Mercado, etc.

3.6

O CESE reconhece a necessidade de adotar atos delegados. Não obstante, dado que muitos elementos só serão conhecidos quando da elaboração desses atos, insta a Comissão Europeia a apresentar um plano de trabalho mais pormenorizado. O objetivo é assegurar a inclusão de uma grande diversidade de produtos nos atos delegados e, simultaneamente, a participação das organizações da sociedade civil e dos sindicatos numa fase precoce.

3.7

O CESE observa que o Regulamento Conceção Ecológica é um texto legislativo muito complexo que provocará uma mudança do modelo económico. É necessária uma aplicação rápida, mas também correta, do seu conteúdo. Existe, portanto, uma necessidade de recursos humanos adequados para a aplicação dos atos delegados. Uma vez que os consumidores, as empresas, os serviços de reparação e as autoridades de controlo também se deparam com novos requisitos, é ainda necessário envolver adequadamente no processo de informação todos os operadores económicos.

3.8

Os organismos públicos devem desempenhar um papel de liderança em matéria de aquisições ecológicas no âmbito dos respetivos procedimentos de contratação pública. No entanto, poderia também alcançar-se um efeito de reforço ao incorporar a aquisição ecológica enquanto requisito nas orientações de financiamento para subsídios ou subvenções, como os vários programas de investimento da UE destinados a empresas ou terceiros.

3.9

O CESE considera que os requisitos de conceção ecológica devem resultar em benefícios claros e facilmente percetíveis para os consumidores. Os requisitos abrangentes do novo Regulamento Conceção Ecológica podem levar ao aumento do custo de aquisição dos produtos, embora este efeito seja compensado por melhores condições de desempenho, durabilidade, atualização e reparabilidade dos produtos, bem como por um valor mais elevado no fim de vida dos produtos. É possível poupar energia e custos utilizando aparelhos mais eficientes do ponto de vista energético. Além disso, os bens duradouros são mais económicos. Com a nova proposta de diretiva, os consumidores poderiam poupar, em média, 285 euros (2) por ano. O regulamento destaca a comportabilidade, cabendo ter em conta os diferentes orçamentos familiares dos consumidores, de modo a evitar que a conceção ecológica se torne exclusiva. Por conseguinte, é ainda mais importante disponibilizar apoio financeiro aos consumidores para a primeira aquisição e a reparação de produtos sustentáveis.

3.10   Considerações ecológicas

3.10.1

A conceção ecológica faz parte do pensamento circular, algo que o CESE destaca em relação a:

Legislação e medidas de controlo: a atenuação dos requisitos ou a inclusão de derrogações nos atos delegados ou no âmbito dos compromissos voluntários, bem como as possibilidades de evasão e as lacunas no controlo, seriam contrárias aos objetivos. Os requisitos de conceção ecológica, de desempenho e de informação, incluindo os parâmetros do produto, devem ser coerentes a um nível exigente.

Empresas, que já devem ter em conta o impacto ambiental ao longo do ciclo de vida, a utilização prolongada, a facilidade de manutenção e reparação do produto durante a fase de conceção, bem como a sua transformação num produto de seguimento secundário quando atingir o seu fim de vida. A normalização dos produtos também deve ser reconsiderada. Os exemplos incluem as dimensões diferentes dos pneus ou dos cabos de carregamento.

Consumidores, que devem receber informação essencial sobre o impacto ambiental, a durabilidade, a reparabilidade, a utilização subsequente e a eliminação do produto quando tomam as suas decisões de compra.

3.10.2

Após a utilização prolongada e a reutilização dos produtos, a reciclagem é a etapa seguinte prevista pelo regulamento para a poupança de recursos. O objetivo é aumentar a taxa de reciclagem dos produtos, a reciclabilidade dos produtos e o valor dos setores da reciclagem e da reparação. O CESE apoia esta orientação, mas salienta que ainda existem alguns obstáculos técnicos, jurídicos e conceptuais a ultrapassar.

A abordagem do ciclo dos materiais revela a enorme necessidade de mudança. A título de exemplo, refira-se que as taxas de reciclagem mais elevadas devem ser acompanhadas de percentagens mínimas de utilização de materiais reciclados e que a reciclabilidade teórica (3) dos produtos deve ser consentânea com as possibilidades técnicas de reciclagem e a aplicação prática de medidas de reciclagem. No setor dos plásticos, por exemplo, há que proceder a diversas alterações na conceção e produção, de modo a não equiparar as matérias-primas secundárias às matérias-primas primárias (4).

A reciclagem é também uma oportunidade para a Europa: por exemplo, os minerais metálicos de alta qualidade são importados como matérias-primas ou produtos e, depois de utilizados, são eliminados quase gratuitamente ou enviados para todo o mundo, incluindo carros e resíduos eletrónicos em particular. Estes devem ser considerados como recicláveis e tratados como tal. O desmantelamento, o tratamento e a reciclagem beneficiam o clima, mas também criam grande valor acrescentado e empregos (5). Em todos estes processos, é também crucial não perder de vista o equilíbrio económico, ecológico e social.

3.10.3

O CESE congratula-se com a proposta de adoção de medidas sobre os bens não vendidos, embora considere que estas poderiam ser mais ambiciosas. A sociedade não vê com bons olhos a destruição de produtos intactos, incluindo produtos novos, devolvidos ou reparáveis, na medida em que se trata de um desperdício de recursos. Na perspetiva do CESE, a proposta da Comissão de exigir, numa primeira fase, apenas documentação às empresas e de isentar as pequenas e médias empresas (PME) fica aquém das expetativas. A possibilidade de adotar medidas mais fortes apenas através de atos delegados levanta dúvidas sobre a prossecução efetiva dos objetivos. O CESE apoia a proibição da destruição de produtos não vendidos, desde que não sejam perigosos. Além disso, as empresas e plataformas retalhistas deverão desenvolver práticas comerciais que reduzam de forma decisiva o número de produtos devolvidos e de reservas de produtos não vendidos. Importa também sensibilizar os consumidores para o impacto ambiental dos bens devolvidos.

3.11   Considerações económicas

3.11.1

O CESE salienta que a proposta de regulamento, em princípio, não levanta objeções por parte das PME, embora seja encarada com ceticismo. As PME dispõem de recursos (humanos) limitados. Em particular, as medidas de apoio mencionadas no regulamento devem ser orientadas para as lacunas e as necessidades das PME. Além disso, as PME são confrontadas com dificuldades de acesso aos contratos públicos conexos. Por conseguinte, cabe procurar soluções para que possam participar nos procedimentos correspondentes. Em última análise, na perspetiva das PME, é necessário assegurar a complementaridade entre a regulamentação em matéria de produtos sustentáveis e a regulamentação específica aos produtos. A satisfação desta necessidade evitará uma duplicação dos custos e da burocracia.

3.11.2

Os serviços de reparação são fundamentais para o prolongamento da vida dos produtos. Deste modo, há que facilitar aos prestadores de serviços de reparação, às empresas de reutilização socioeconómica e às iniciativas de reparação lançadas pela sociedade civil e a nível local a possibilidade de encontrarem o seu lugar neste modelo circular. Na Alemanha e na Áustria, por exemplo, as iniciativas de reparação beneficiaram com a criação de um seguro de reparação, que ao mesmo tempo legitima esta abordagem.

3.12

Os novos modelos económicos orientados para a circularidade (6) são citados na comunicação como uma ferramenta importante. Estes novos modelos devem ser atrativos, inovadores e proativos, quer para as empresas quer para os consumidores, e assegurar condições de trabalho adequadas. Já existem modelos em prática neste domínio, como a economia da partilha, o produto como serviço, o pagamento em função da utilização, etc. O CESE recomenda vivamente incentivar a utilização das plataformas de boas práticas existentes, adaptando-as aos atuais desafios da economia circular. Exemplos atualmente enumerados incluem a rotatividade dos materiais de construção — os materiais são oferecidos a novos utilizadores em caso de demolição ou conversão —, ou as redes de reparação, através das quais consumidores e prestadores de serviços de reparação podem entrar em contacto. No entanto, muitas bases de dados são pouco atrativas, tanto para os prestadores como para os utilizadores.

3.13

O CESE aponta para a necessidade de sensibilizar os consumidores para que adotem comportamentos sustentáveis e utilizem os produtos até ao fim da sua vida útil. Os estudos científicos (7) revelam que os produtos já não utilizados mas que ainda funcionam (por exemplo, computadores portáteis, telemóveis, torradeiras, etc.) são guardados em casa até seis anos. Portanto, são necessários incentivos adequados para que os consumidores mantenham os artigos não utilizados no ciclo de utilização.

3.14   Considerações sociais

3.14.1

Infelizmente, o CESE regista o facto de a dimensão social não ser abrangida pelo regulamento. Uma mera referência à proposta de diretiva relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade (8), apresentada pela Comissão, afigura-se insuficiente, na medida em que esta diretiva, ao colocar claramente em primeiro plano uma abordagem orientada para o processo relativamente às cadeias de valor mundiais, pode não abordar suficientemente as questões sociais específicas aos produtos. O CESE frisa que, do ponto de vista da sustentabilidade, as suas três dimensões — económica, social e ambiental — devem ser sempre tratadas em conjunto, pelo que propõe que a Comissão reexamine o regulamento no que diz respeito à pertinência de incorporar também aspetos sociais específicos ao produto.

3.14.2

O CESE salienta que os empregos verdes não são automaticamente empregos sustentáveis, se não forem tidos em conta todos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Deve ser assegurado, especialmente por razões de concorrência, que as normas laborais são respeitadas.

3.14.3

Um projeto dos parceiros sociais europeus (9) analisou o impacto da economia circular no emprego e nas condições de trabalho. A transição para uma economia circular poderá criar entre 250 000 e 700 000 postos de trabalho até 2030. Os efeitos por setor e região são muito diferentes. Os setores da gestão de resíduos e da reparação alcançarão benefícios acima da média, ao passo que os setores mineiro e químico serão negativamente afetados. Também será necessária mão de obra qualificada (por exemplo, na gestão de resíduos). Em geral, deve ter-se o cuidado de assegurar que estão disponíveis empregos bons e que são pagos salários dignos. O CESE lamenta que a Comissão não preveja atualmente qualquer diálogo social sobre as consequências para os trabalhadores da transição para a economia circular.

4.   Observações na especialidade

4.1   Informações no passaporte digital do produto, nos rótulos normais e nos rótulos ecológicos

4.1.1

O CESE congratula-se com o facto de o passaporte digital de produtos possibilitar o acesso a informações completas sobre os produtos. Importa disponibilizar informações pertinentes e facilmente acessíveis a todos os intervenientes ao longo da cadeia de abastecimento. A prestação de informações básicas em matéria de circularidade deve permitir aos consumidores tomar decisões de aquisição, reutilização, reparação e eliminação de produtos. As informações devem abranger o conteúdo de CO2 do produto, a proporção de terras raras, os ingredientes perigosos, os materiais não recicláveis, a lista de peças reparáveis, assim como a sua disponibilidade ou, no caso de software, a compatibilidade e os custos. Saúda-se a possibilidade de incluir informação sobre outros aspetos de sustentabilidade no passaporte digital dos produtos (10). Propõe-se que o passaporte digital dos produtos seja complementado por um índice de reparação que contenha informações, em particular, sobre a reparabilidade de peças de desgaste importantes, o preço das peças sobressalentes e a sua disponibilidade ao longo do tempo, bem como informações sobre as condições de trabalho sob as quais os produtos foram fabricados. As informações essenciais devem também ser disponibilizadas aos consumidores em formato físico, como a garantia ou o teor de CO2 do produto.

O passaporte digital de produtos não deve ser uma ferramenta que obrigue as empresas a lançar mão de recursos adicionais (recolha de dados), devendo antes integrar-se nos sistemas existentes. Porém, a exigência de fornecer dados cada vez mais transparentes, mas que ao mesmo tempo são sensíveis, pode igualmente exigir uma revisão da coerência da decisão à luz dos direitos de propriedade industrial.

4.1.2   Rótulos

As informações sobre o produto, a definir nos atos delegados, devem ser comunicadas aos consumidores através dos rótulos. O CESE sublinha que a informação deve ser comunicada aos clientes de forma correta, visível e clara, sendo essencial disponibilizar dados sobre o impacto climático, o conteúdo e a composição, o cumprimento das normas laborais, a durabilidade e reparabilidade.

4.1.3   Rótulos ecológicos

Muitos produtos e serviços beneficiam do rótulo ecológico europeu, sendo certificados por meio de um parecer. Assim, os consumidores podem facilmente identificar a sustentabilidade ambiental do produto, a sua durabilidade e qualidade elevada, e compará-lo com outros. No entanto, os requisitos associados ao rótulo ecológico podem apenas complementar, e não substituir, os requisitos decorrentes do Regulamento Conceção Ecológica, devendo as autoridades ter igualmente em conta as informações contidas nos rótulos ecológicos ao procederem a controlos ao abrigo do Regulamento Conceção Ecológica.

4.2   Mercados em linha

É importante assegurar a igualdade de condições de todos os operadores económicos, pelo que as disposições em matéria de responsabilidade devem, em particular, aplicar-se também nos mercados em linha quando nenhum outro agente da cadeia de abastecimento tome medidas contra um produto não conforme (11).

4.3

A fiscalização do mercado — controlo, proibições, coimas — é delegada nos Estados-Membros e a publicação de irregularidades tem lugar no Sistema de Informação e Comunicação para a Fiscalização do Mercado (ICSMS), um sistema europeu de notificação e informação para produtos considerados não conformes ou perigosos. Apoia-se a proposta de alargar e melhorar a fiscalização do mercado, uma vez que entre 10 % e 25 % dos produtos examinados não estão em conformidade com o disposto na Diretiva Conceção Ecológica (12). A fim de permitir que os Estados-Membros desempenhem as suas funções, é importante afetar recursos à fiscalização do mercado. Em particular, no que diz respeito às infrações, cabe assegurar que a não conformidade de um produto é devidamente acompanhada pelas autoridades de fiscalização do mercado. Infelizmente, há sempre casos em que a avaliação de conformidade é contornada, como recentemente aconteceu com as máscaras de proteção contra a COVID-19. As autoridades devem proceder a controlos aleatórios em permanência. As organizações de consumidores também devem ser envolvidas enquanto denunciantes competentes em caso de infrações. Tal poderia ser aplicado de forma rápida e eficaz, em conjugação com a diretiva relativa às ações coletivas para a proteção dos interesses coletivos dos consumidores. Uma fiscalização eficaz do mercado em todos os Estados-Membros exige um papel muito ativo da Comissão Europeia neste domínio, de modo que todas as empresas do Espaço Económico Europeu estejam sujeitas a condições de concorrência equitativas através de controlos com o mesmo nível de rigor. Além disso, chama-se a atenção para o potencial de melhoria da convivialidade do sítio Web do ICSMS e da informação nele contida.

4.4

O CESE saúda o Fórum da Conceção Ecológica e a participação de todas as partes interessadas neste processo, mas assinala que, para poder funcionar eficazmente, deve ser dotado de responsabilidades, competências e recursos que lhe permitam desempenhar as tarefas que lhe foram atribuídas. Por exemplo, a avaliação das medidas de autorregulação não pode ser feita pelo fórum; esta é uma tarefa que compete às autoridades ou à Comissão Europeia.

4.5

A autorregulação como instrumento alternativo a um ato delegado para um grupo de produtos deve constituir uma exceção. Neste caso, os seus critérios de clareza, de cobertura do mercado e de qualidade devem estar próximos dos previstos nos atos delegados.

4.6

O CESE gostaria de mencionar especificamente a Plataforma Europeia das Partes Interessadas na Economia Circular (13) em relação ao assunto em questão. Lançada conjuntamente pelo CESE e pela Comissão Europeia em março de 2017, a iniciativa apoia novas parcerias e o desenvolvimento de soluções de economia circular em toda a Europa. Destina-se também a expressar a importante contribuição que a economia circular pode dar para a realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Bruxelas, 14 de julho de 2022.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Circle Economy: The Circularity Gap Report 2022 [Economia circular: Relatório de Lacunas de Circularidade 2022], projeto da Plataforma PACE (Platform for Accelarating the Circular Economy).

(2)  https://ec.europa.eu/info/energy-climate-change-environment/standards-tools-and-labels/products-labelling-rules-and-requirements/energy-label-and-ecodesign/about_de#Energysavings

(3)  Pomberger, R. (2020). Über theoretische, praktische und reale Recyclingfähigkeit [Sobre a reciclabilidade teórica, prática e real]. https://doi.org/10.1007/s00506-020-00721-5, https://doi.org/10.1007/s00506-019-00648-6

(4)  Comunicação — Uma Estratégia Europeia para os Plásticos na Economia Circular, COM(2018) 28 final.

(5)  JO C 220 de 9.6.2021, p. 118.

(6)  Ver Parecer do CESE — A inovação como impulsionadora de novos modelos de negócio (parecer exploratório), INT/778 (JO C 303 de 19.8.2016, p. 28).

(7)  Consulta pública, NAT/851, apresentação de Gudrun Obersteiner, 29.4.2022.

(8)  COM(2022) 71 final.

(9)  https://www.etuc.org/en/publication/european-social-partners-project-circular-economy-and-world-work-0

(10)  COM(2022) 142 final — 2022/0095(COD), p. 29, ponto 26.

(11)  Ver Parecer INT/957 do CESE — Revisão da Diretiva Segurança Geral dos Produtos, (JO C 105 de 4.3.2022, p. 99), no qual são abordados aspetos importantes sobre a segurança dos produtos.

(12)  J. Bürger / G. Paulinger, Câmara do Trabalho de Viena (2022) https://emedien.arbeiterkammer.at/viewer/resolver?urn=urn:nbn:at:at-akw:g-5230098, p. 88.

(13)  https://circulareconomy.europa.eu/platform/


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