Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 52021IR2689

Parecer do Comité das Regiões Europeu — Proteção das indicações geográficas industriais e artesanais na União Europeia

COR 2021/02689

JO C 61 de 4.2.2022, p. 26–29 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

4.2.2022   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 61/26


Parecer do Comité das Regiões Europeu — Proteção das indicações geográficas industriais e artesanais na União Europeia

(2022/C 61/06)

Relatora:

Martine PINVILLE (FR-PSE), membro da Assembleia Regional da Nova Aquitânia

RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU

Observações gerais

1.

congratula-se com o anúncio feito pela Comissão Europeia no seu Plano de Ação em matéria de Propriedade Intelectual, de novembro de 2020, de examinar a possibilidade de criar um sistema da UE para a proteção das indicações geográficas dos produtos não agrícolas; recorda que o CR já solicitara que se ponderasse tal possibilidade em fevereiro de 2015 (1);

2.

assinala que o artigo 3.o do Tratado da União Europeia (TUE) reconhece a salvaguarda e o desenvolvimento do património cultural europeu como um dos objetivos a ter em conta no desenvolvimento do mercado interno, que o artigo 118.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) visa assegurar uma proteção uniforme dos direitos de propriedade intelectual na União dentro do mercado único e que o artigo 169.o do TFUE assegura a proteção dos direitos dos consumidores (incluindo a promoção do seu direito à informação);

3.

privilegia a utilização do termo «indicações geográficas industriais e artesanais», que considera mais claro e específico do que o termo «indicações geográficas dos produtos não agrícolas»;

4.

congratula-se com o amplo apoio em prol da adoção de uma iniciativa da UE que estabeleça um regime de proteção das indicações geográficas industriais e artesanais, manifestado quer no contexto da consulta pública sobre a avaliação de impacto inicial lançada no final de 2020 pela Comissão Europeia, quer no âmbito da consulta às partes interessadas, realizada em 19 de maio de 2021, antes da elaboração do presente parecer; insta, por conseguinte, os seus membros e as partes interessadas territoriais a confirmarem esse apoio mediante a participação ativa na «Consulta pública sobre as indicações geográficas para produtos não agrícolas», lançada pela Comissão Europeia em 29 de abril de 2021, que decorre até 22 de julho de 2021, inclusive (2);

5.

lamenta que a falta de harmonização a nível europeu sobre as indicações geográficas industriais e artesanais resulte numa variedade de instrumentos jurídicos nacionais, enfraquecendo assim a proteção dos produtos e das empresas;

6.

observa que, à data, existe um tratamento jurídico distinto ao nível da UE, em função da natureza da indicação geográfica, uma vez que a UE apenas regulamenta a proteção das denominações de origem e das indicações geográficas dos vinhos, dos vinhos aromatizados, das bebidas espirituosas e dos produtos agrícolas/géneros alimentícios;

7.

assinala que nem a Organização Mundial do Comércio (OMC) — no seu Acordo sobre os Aspetos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio (Acordo TRIPS) — nem o Ato de Genebra do Acordo de Lisboa relativo às denominações de origem e às indicações geográficas, a que a UE aderiu recentemente, diferenciam as indicações geográficas em função do tipo de produto; considera, além disso, que a adesão da UE ao Ato de Genebra requer que esta dê uma resposta à proteção das indicações geográficas industriais e artesanais;

8.

salienta que são sobretudo as microempresas e as pequenas e médias empresas, implantadas nos territórios, inclusivamente nas zonas rurais, que dispõem de um verdadeiro saber-fazer emanado do legado histórico desses territórios, configurando verdadeiros polos setoriais, quem envereda por estratégias e abordagens no domínio das indicações geográficas. Algumas empresas tornaram-se líderes do mercado mundial e são particularmente importantes para o funcionamento da economia europeia e para a independência da UE relativamente aos mercados mundiais;

9.

observa que as indicações geográficas também respondem a uma mudança na procura dos consumidores, no sentido de maior rastreabilidade e transparência sobre a origem do produto e o seu processo de produção. Essa mudança também se reflete na procura da marca «fabrico local», uma tendência que se acelerou com a crise da COVID-19;

10.

considera que o reconhecimento das indicações geográficas industriais e artesanais tem um impacto nas prioridades dos programas da UE em fase de elaboração, nomeadamente no âmbito da estratégia industrial, do Pacto Ecológico e da revisão da política comercial, bem como no futuro das zonas rurais e no desenvolvimento de cadeias de abastecimento curtas;

Necessidade de um quadro europeu uniforme com uma dimensão territorial

11.

considera que a criação de um sistema específico de proteção das indicações geográficas industriais e artesanais permitirá, em especial: reforçar a proteção jurídica dos produtos com indicações geográficas, inclusive na Internet; desenvolver instrumentos para ajudar a combater a contrafação e a concorrência desleal; criar empregos e ações de formação num único território e assegurar a sua manutenção; aumentar a transparência para os consumidores; por último, assegurar um verdadeiro reconhecimento do saber-fazer, de nível excecional em alguns casos;

12.

assinala que o sistema de registo de marcas não permite uma proteção eficaz das denominações dos produtos e acarreta um custo significativo para os seus titulares;

13.

é, por conseguinte, favorável à extensão da proteção das indicações geográficas aos produtos industriais e artesanais ao abrigo de um regulamento europeu assente no artigo 118.o, primeiro parágrafo, do TFUE, que teria por base as competências partilhadas entre a União Europeia e os Estados-Membros e cumpriria todas as condições para respeitar o princípio da subsidiariedade, em especial porque criaria as condições para uma proteção uniforme e equitativa das indicações geográficas industriais e artesanais em todo o mercado interno, evitando simultaneamente distorções da concorrência;

14.

considera que os órgãos de poder local e regional europeus dispõem de uma grande variedade de produtos industriais e artesanais decorrentes de um saber-fazer muitas vezes ancestral; entende que a promoção e a proteção adequadas desses produtos podem contribuir para manter o valor acrescentado e os empregos não deslocalizáveis, em particular nas zonas rurais, e para proteger o património local;

15.

salienta que o reforço da posição das empresas que obtiveram o reconhecimento de uma indicação geográfica industrial e artesanal permitiria relocalizar segmentos do seu setor, contribuindo assim para a reindustrialização dos territórios e para uma maior independência económica da UE relativamente aos mercados mundiais;

16.

salienta que as avaliações de impacto sobre as indicações geográficas para os produtos agroalimentares demonstraram que essas indicações também conduzem a um aumento dos rendimentos dos produtores, muitas vezes em zonas rurais ou periféricas. A criação de um sistema europeu de indicações geográficas industriais e artesanais deverá ter o mesmo resultado, assim como um impacto positivo na coesão territorial. Além disso, no estudo que a Comissão Europeia publicou em 2020 sobre os aspetos económicos da proteção das indicações geográficas para os produtos não agrícolas (3), indica-se que estas reforçam a competitividade dos produtores ao aumentar a visibilidade dos produtos, a sua reputação e a predisposição dos consumidores para pagar mais por produtos cujas características e origem estão garantidas;

17.

considera, além disso, que as indicações geográficas dos produtos industriais e artesanais contribuem para estruturar e diversificar a oferta cultural e turística num dado território, por exemplo através do turismo industrial, em torno da partilha do saber-fazer e de gestos de excelência;

18.

salienta o papel que alguns órgãos de poder local e regional podem desempenhar e já desempenham no apoio aos setores, tanto na fase de elaboração das indicações geográficas industriais e artesanais (tempo de consulta) como na aplicação (desenvolvimento de instrumentos de comunicação, apoio à certificação, aconselhamento jurídico, etc.) e promoção;

Aspetos práticos relacionados com o processo de registo, os controlos e a proteção das indicações geográficas industriais e artesanais

19.

salienta que, no contexto de um sistema comum para todas as indicações geográficas, se deve, tanto quanto possível, aproveitar a experiência adquirida no setor agrícola e agroalimentar e privilegiar uma abordagem harmonizada entre os diferentes regimes;

20.

recomenda, a este respeito, a fim de assegurar a coerência entre os dois sistemas, que a Comissão Europeia estabeleça um mecanismo de coordenação sólido dos seus serviços competentes, nomeadamente durante o processo de avaliação dos dossiês, para evitar eventuais conflitos relacionados com a utilização dos nomes; solicita igualmente que as indicações geográficas industriais e artesanais sejam integradas no registo europeu das indicações geográficas GIview, que já inclui as indicações geográficas agrícolas;

21.

reitera a sua posição de que a proteção das indicações geográficas industriais e artesanais não deve estar limitada no tempo, mas deverá, não obstante, prever a possibilidade de retirar a proteção nas mesmas condições que regem as indicações geográficas de produtos agrícolas (4);

22.

considera que será necessário prever um período transitório para os Estados-Membros que já dispõem de um sistema de proteção, a fim de permitir a adaptação das indicações geográficas anteriormente registadas a nível nacional e a sua integração num novo sistema europeu;

23.

é de opinião que se deve igualmente prever um sistema de coordenação ou de reconhecimento que permita proteger os produtos que já beneficiam de uma denominação de origem em determinados Estados-Membros;

24.

preconiza a utilização de um logótipo europeu obrigatório para que os consumidores ou clientes reconheçam/identifiquem esses produtos;

25.

solicita que o procedimento de registo do modelo agrícola em duas fases seja aplicado às indicações geográficas industriais e artesanais: em primeiro lugar, a nível nacional ou regional, em função da organização interna do Estado, e depois a nível europeu;

26.

recomenda que o procedimento de registo seja limitado no tempo e gerido pelo Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia, desde que se confira ao mesmo as competências necessárias para o efeito;

27.

salienta que a relação entre a zona geográfica e o produto é fundamental e se reflete especialmente na importância preponderante do fator humano e do saber-fazer nas indicações geográficas industriais e artesanais. Em alguns territórios, a matéria-prima deixou de estar disponível ou já não é adequada, mas tal não impediu a manutenção — ou mesmo o florescimento — das empresas e do saber-fazer necessários ao fabrico de produtos de excelência;

28.

considera que os cadernos de especificações e obrigações das indicações geográficas industriais e artesanais devem ser transparentes e credíveis para assegurar a confiança dos consumidores. As especificações devem indicar as fases de fabrico, a sua localização, ou mesmo a sua verificação, e os elementos relativos à conformidade com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável;

29.

está particularmente atento à questão da inovação e da investigação, que não deverá ser entravada pelas especificações. Com efeito, muitas empresas inovam (abordagem global, conceção, origem das matérias-primas, inovação social, utilização de materiais de origem biológica ou reciclados, utilização de tecnologias e patentes), desencadeando uma dinâmica territorial e conservando uma comunidade humana e profissional em torno dos produtos em questão;

30.

considera que, uma vez que a indicação geográfica é um selo de garantia oficial, cumpre assegurar controlos fiáveis dos operadores em causa, a fim de garantir o cumprimento das especificações pelos fabricantes, assim como a segurança e a confiança dos consumidores;

31.

recomenda, para o efeito, que se privilegie a certificação, uma vez que assegura um controlo externo e independente a custos aceitáveis;

32.

recomenda a introdução de um nível de proteção idêntico ao existente para as indicações geográficas agrícolas, nomeadamente em matéria de intervenção dos Estados-Membros mediante medidas administrativas ou judiciais adequadas para prevenir ou impedir a utilização ilegal das indicações geográficas industriais e artesanais;

33.

salienta que as regras em matéria de proteção das indicações geográficas industriais e artesanais devem incorporar a proteção na Internet;

34.

considera que os grupos titulares de indicações geográficas são os pilares das indicações geográficas industriais e artesanais, uma vez que asseguram o seu reconhecimento e a sua gestão corrente. Devem desempenhar um papel significativo no acompanhamento, proteção e promoção das indicações geográficas;

35.

reitera a sua posição de que, em casos específicos e bem fundamentados, é razoável prever a concessão a uma única entidade do registo de uma indicação geográfica, desde que o acesso à mesma seja possível para novos produtores que cumpram as respetivas regras (5);

36.

considera que os custos associados ao processo de pedido e registo não devem dissuadir os produtores e devem assumir a forma de uma contribuição única, como uma taxa de registo. Em contrapartida, os custos a suportar pelas autoridades competentes a nível nacional devem limitar-se à avaliação, promoção e, se for caso disso, supervisão dos controlos e aplicação de medidas administrativas ou judiciais para pôr termo à utilização ilegal das indicações geográficas industriais e artesanais;

Aspetos relativos ao comércio e à concorrência

37.

salienta que os produtos com indicações geográficas estão presentes em diferentes circuitos de comercialização, como as cadeias de abastecimento curtas, a Internet ou os circuitos profissionais, como a hotelaria. A proteção proporcionada por uma indicação geográfica permitirá desenvolver estes mercados, por exemplo integrando estes cabazes de produtos em campanhas de promoção regionais e/ou nacionais, ou como parte da promoção do turismo industrial;

38.

solicita à Comissão Europeia que, a fim de promover contratos públicos sustentáveis, esclareça em que medida as indicações geográficas industriais e artesanais podem ser utilizadas nos procedimentos de adjudicação de contratos públicos com base em critérios ambientais objetivos, como as cadeias de abastecimento curtas e a internalização dos custos externos;

39.

recorda que muitas indicações geográficas industriais e artesanais são exportadas e necessitam de proteção dentro e fora da Europa. Na ausência de uma proteção mais ampla, as estratégias coletivas de indicações geográficas e as empresas envolvidas não podem ser plenamente eficazes, conduzindo a uma fraca proteção dos seus direitos de propriedade industrial e à continuação dos atos de contrafação e de concorrência desleal que prejudicam as empresas amiúde localizadas em zonas rurais. Importa alargar essa proteção face aos produtos comercializados na UE importados de países terceiros;

40.

salienta, por último, que um regulamento europeu para as indicações geográficas industriais e artesanais permitirá incluí-las na lista de produtos abrangidos pelos acordos comerciais da UE com países terceiros, garantindo assim a sua proteção em mercados-chave;

41.

insta, por conseguinte, a Comissão a elaborar um projeto de regulamento relativo à proteção das indicações geográficas dos produtos industriais e artesanais da União Europeia e a apresentá-lo para consulta e decisão; solicita à Comissão que tenha em conta as considerações e recomendações apresentadas no presente parecer; assegurará a sua participação ativa e o seu apoio.

Bruxelas, 13 de outubro de 2021.

O Presidente do Comité das Regiões Europeu

Apostolos TZITZIKOSTAS


(1)  Parecer do CR — Extensão da proteção das indicações geográficas da União Europeia aos produtos não agrícolas (ECOS-V-064, COR-2014-05386-00-00-AC-TRA).

(2)  https://ec.europa.eu/growth/news/commission-seeks-public-opinion-protection-industrial-designs-and-eu-wide-geographical-indications-2021-04-29_en

(3)  Comissão Europeia, Direção-Geral do Mercado Interno, da Indústria, do Empreendedorismo e das PME, «Aspetos económicos da proteção das indicações geográficas ao nível da UE para os produtos não agrícolas na UE», estudo realizado por ECORYS, VVA e ConPolicy, 2020.

(4)  Ibidem.

(5)  Ibidem.


Top