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Document 52021AE4578

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta de Recomendação do Conselho sobre a aprendizagem mista para um ensino primário e secundário inclusivo e de elevada qualidade [COM(2021) 455 final]

EESC 2021/04578

JO C 105 de 4.3.2022, p. 128–133 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

4.3.2022   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 105/128


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta de Recomendação do Conselho sobre a aprendizagem mista para um ensino primário e secundário inclusivo e de elevada qualidade

[COM(2021) 455 final]

(2022/C 105/19)

Relatora-geral:

Tatjana BABRAUSKIENĖ

Relator-geral:

Michael MCLOUGHLIN

Consulta

Conselho, 30.8.2021

Base jurídica

Artigo 165.o, n.o 4, e artigo 166.o, n.o 4 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção do Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em plenária

20.10.2021

Reunião plenária n.o

654

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

152/0/0

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) congratula-se com o facto de a proposta salientar que «a educação é um direito humano fundamental e um direito da criança». O CESE congratula-se igualmente com o facto de a proposta ter por objetivo aplicar o Pilar Europeu dos Direitos Sociais (PEDS) e outras iniciativas importantes da UE (1) que visam reforçar a cooperação entre os Estados-Membros, envidando esforços para tornar a educação inclusiva e de qualidade numa realidade na transição ecológica e digital da vida social e económica e do mercado de trabalho.

1.2

O CESE exorta novamente «a Comissão Europeia e os Estados-Membros a implementar o primeiro princípio do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, que visa assegurar que todas as pessoas na Europa têm direito a uma educação inclusiva e de qualidade, a formação e a aprendizagem ao longo da vida» (2), bem como a aplicá-lo de modo a melhorar a disponibilização de aptidões e competências digitais, apoiando a igualdade de acesso à aprendizagem mista para todos e um financiamento público sustentável, acordado com os parceiros sociais do setor da educação e com a sociedade civil.

1.3

O CESE remete para o seu parecer (3), no qual salienta que «a aplicação do Plano de Ação para a Educação Digital 2021-2027 deve traduzir-se num diálogo eficaz, na consulta das partes interessadas, na observância e na aplicação dos direitos laborais, bem como na informação, na consulta e na participação dos trabalhadores no desenvolvimento de competências digitais e de empreendedorismo, nomeadamente no domínio do EFP [ensino e formação profissionais], da educação de adultos e da formação de trabalhadores, a fim de reduzir o défice de competências que as empresas enfrentam».

1.4

O CESE exorta os Estados-Membros a aproveitar a experiência educativa adquirida durante a crise da COVID-19 e a assegurar que a aprendizagem mista seja cuidadosamente concebida e praticada em programas curriculares equilibrados com o apoio de instrumentos pedagógicos adequados, a fim de assegurar que seja proporcionado um ambiente de aprendizagem e instrumentos adequados e inovadores para todas as crianças. Os Estados-Membros devem garantir que a aprendizagem mista seja estabelecida para apoiar a qualidade e a inclusividade da educação, em particular para as crianças necessitadas. Embora esteja a ganhar terreno e a receber mais atenção, o conceito de aprendizagem mista ainda carece de investigações e estudos suplementares, principalmente na perspetiva das desvantagens educativas, bem como para as escolas primárias e para os primeiros anos do ensino secundário.

1.5

O CESE observa que, a fim de assegurar uma maior autonomia aos estudantes no seu processo de aprendizagem, é importante que a aprendizagem mista esteja disponível para todos os estudantes, e não apenas para aqueles que vivem em zonas rurais sem acesso à escola, ou para os do ensino superior, em que a aprendizagem independente é requerida pelos estudantes.

1.6

O CESE assinala que, nos casos de aprendizagem não escolar, baseada em projetos, é necessário garantir a saúde e a segurança dos alunos, em particular dos alunos do ensino e formação profissionais (EFP). O ensino à distância a longo prazo, em vigor durante a crise da COVID-19, teve um impacto negativo no bem-estar mental e físico dos estudantes e dos professores, bem como nos resultados de aprendizagem dos alunos. O CESE congratula-se com a ênfase da proposta na necessidade de recorrer a profissionais de saúde mental qualificados a fim de assegurar um apoio eficaz para o bem-estar dos estudantes e dos professores.

1.7

O CESE solicita aos Estados-Membros que assegurem a inclusão da aprendizagem mista na sua estratégia de educação, na sequência de um diálogo eficaz com os parceiros sociais e as partes interessadas pertinentes do setor da educação, de forma a contribuir positivamente para uma aprendizagem inclusiva e de qualidade para os estudantes, garantindo o acesso a bons ambientes de ensino e aprendizagem, bem como aos instrumentos e ao apoio necessários para os professores, sem deixar os estudantes sem apoio.

1.8

O CESE apela ainda aos Estados-Membros para que assegurem que a aprendizagem mista não prejudica o valor social da educação ou a relevância do ensino presencial nos programas educativos. A experiência do ensino e aprendizagem em linha durante a situação de emergência causada pela pandemia de COVID-19 colocou em evidência o valor insubstituível do ensino presencial e da interação e do feedback contínuos entre professores e estudantes para assegurar uma educação inclusiva e de qualidade. As relações entre os estudantes e os professores são fundamentais para a motivação e aprendizagem dos estudantes, pelo que não devem ser prejudicadas pela aprendizagem mista.

1.9

O CESE solicita aos Estados-Membros que assegurem que a elaboração de planos educativos individualizados tem em consideração as necessidades dos estudantes em matéria de tecnologias de apoio. Além disso, o CESE assinala que tal exige que os professores recebam a assistência adequada de pessoal de apoio, estejam familiarizados com estas tecnologias e sejam capazes de as utilizar de forma eficaz para responder às necessidades dos alunos com deficiência.

1.10

O CESE destaca o papel central dos professores no que respeita à aprendizagem mista. O intercâmbio de pessoal, os projetos colaborativos e o ensino individualizado são possíveis se os professores dispuserem de um tempo de trabalho adequado para esse efeito e do apoio da direção escolar. É muito importante desenvolver uma comunidade de aprendizagem mista para promover o valor da tecnologia de ensino e formação.

1.11

Ademais, o CESE salienta que, para assegurar a inclusão e a qualidade da educação, a aprendizagem mista deve contribuir para a aplicação das «Conclusões do Conselho sobre os professores e formadores europeus do futuro». Neste sentido, o CESE exorta os Estados-Membros a apoiar eficazmente os professores na sua preparação para prestar apoio aos estudantes em matéria de aprendizagem mista de qualidade, melhorando, atualizando e tornando o desenvolvimento profissional inicial e contínuo mais relevante para as necessidades dos professores e dos estudantes.

1.12

O CESE congratula-se com as medidas propostas para apoiar a literacia informática dos professores, como cursos, programas e instrumentos de melhoria de competências digitais, para os professores e o desenvolvimento e a divulgação de módulos e recursos pedagógicos em linha e no local. Além disso, a proposta deveria apoiar o direito de os professores beneficiarem de um desenvolvimento profissional contínuo, atualizado e acessível. Este facto deve ser reconhecido no diálogo social e na negociação coletiva a nível nacional, regional e local, com a participação significativa dos parceiros sociais do setor da educação.

1.13

O CESE salienta que os cursos em linha abertos a todos (MOOC) não são necessariamente interativos ou assentes numa boa pedagogia. Por conseguinte, insta a Comissão a prestar um apoio mais diversificado à formação de professores, formadores, dirigentes escolares e formadores de professores sobre aprendizagem mista na plataforma School Education Gateway, que conduza a uma certificação. Os recursos técnicos e materiais desenvolvidos com o apoio da Comissão para ser utilizados no contexto da aprendizagem mista devem ser fiáveis, fáceis de utilizar, traduzidos para todas as línguas oficiais da UE e unanimemente aceites por todas as partes interessadas no processo de aprendizagem. O CESE recomenda que os projetos das Academias de Professores Erasmus+ também sejam convidados a desenvolver programas conjuntos de formação de professores credenciados para melhorar a pedagogia em matéria de aprendizagem mista. Deve analisar-se o papel das microcredenciais no contexto da aprendizagem mista.

1.14

O CESE congratula-se com o facto de a proposta colocar a tónica no bem-estar e na atratividade da profissão docente, sugerindo que os Estados-Membros contratem mais professores para apoiar o bem-estar do pessoal docente. O CESE constata que a grande escassez de professores e as condições de trabalho e salariais pouco atrativas (4) têm um efeito negativo na qualidade do ensino. Esta situação pode criar um obstáculo ao desenvolvimento de sistemas de aprendizagem mista inclusivos e de alta qualidade.

1.15

O CESE salienta que a combinação do ensino presencial e do ensino à distância exige que os professores sejam criativos e inovadores (5) e que possuam boas competências pedagógicas. É essencial conceber a aprendizagem mista de forma a respeitar a carga de trabalho, o tempo de trabalho e as condições de trabalho dignas dos professores, garantindo que tenham um ambiente de trabalho favorável.

1.16

O CESE recomenda que seja assegurada uma direção escolar democrática, que permita aos estudantes e professores dispor de uma independência efetiva para orientarem o seu próprio processo de aprendizagem e ensino. O CESE salienta uma vez mais a importância de assegurar e reforçar a governação democrática dos sistemas de educação e formação, o que deve implicar «uma consulta significativa das organizações da sociedade civil» (6).

1.17

O CESE observa que a aprendizagem mista fora de um ambiente de educação formal, por exemplo, a aprendizagem informal e não formal, deve ser reconhecida, mediante a aplicação efetiva da Recomendação do Conselho, de 20 dezembro de 2012, sobre a validação da aprendizagem não formal e informal. Com efeito, a aprendizagem informal e não formal desempenha um papel importante no apoio ao desenvolvimento de competências interpessoais, comunicativas e cognitivas essenciais, nomeadamente a criatividade, a cidadania ativa e as competências para a vida profissional. A participação nos processos de validação deve ser acessível a todos e apoiada por investimentos públicos sustentáveis.

1.18

O CESE salienta que uma aprendizagem mista bem desenvolvida deve ser apoiada por investimentos públicos sustentáveis, ocupar um lugar de destaque no âmbito do Semestre Europeu e beneficiar do apoio de fundos adicionais da UE, como o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, o Erasmus+ e o Fundo Social Europeu Mais (FSE+). O apoio ao acesso a programas de aprendizagem em linha de qualidade é essencial para qualquer aluno. É necessário mais investimento, especialmente para assegurar um ensino à distância de alta qualidade aos alunos do EFP, garantir o seu acesso a instrumentos e simuladores que os ajudem na aprendizagem prática independente num ambiente seguro, bem como para disponibilizar centros comunitários de aprendizagem ao longo da vida (7) e bibliotecas.

1.19

O CESE constata que a utilização crescente de instrumentos digitais no âmbito da aprendizagem mista põe cada vez mais em perigo a segurança dos dados de alunos e professores, bem como os direitos de propriedade intelectual dos professores. Por conseguinte, a Comissão e os Estados-Membros devem prever um financiamento público sustentável e criar um quadro jurídico adequado em consulta com os parceiros sociais e as partes interessadas do setor da educação, assegurando a proteção de dados e os direitos de propriedade intelectual na educação. O CESE manifesta preocupação com o facto de a recomendação considerar que não são necessários recursos suplementares para aplicar os planos da proposta. O financiamento pode ser uma forma de estimular a cooperação em domínios em que a UE não dispõe de uma forte competência. Os custos podem envolver custos de alojamento, manutenção e equipamento para a integração de uma plataforma, alojamento de recursos didáticos, segurança de dados, equipamento de professores e alunos, etc. Os alunos mais desfavorecidos serão os mais prejudicados se não se dispuser de recursos adequados.

1.20

O CESE exorta a Comissão e os Estados-Membros a abordar a proliferação dos prestadores de ensino e a expansão do setor das tecnologias educativas, que será cada vez mais favorecido pela aplicação da aprendizagem mista nos programas educativos. O CESE convida os Estados-Membros a elaborar regulamentações nacionais, incluindo a possibilidade de criar plataformas públicas de ensino e aprendizagem em linha para proteger o valor público da educação. Além disso, as plataformas públicas devem ser estabelecidas em consulta significativa com os parceiros sociais e as partes interessadas do setor da educação, respeitando plenamente a autonomia profissional dos professores e do pessoal docente, bem como a liberdade académica e a autonomia das instituições de ensino, sem exercer pressão sobre os professores ou o pessoal docente quanto ao material educacional e aos métodos pedagógicos que utilizam.

1.21

Tendo em conta a importância atribuída a todo o domínio da aprendizagem mista, o CESE propõe que, para a recomendação em apreço, se desenvolva uma medição discreta e uma recolha de dados diferenciados em função da idade, reconhecendo as diferentes necessidades de desenvolvimento das crianças e dos jovens. Tal deve permitir também recolher informações sobre parâmetros relacionados com as desvantagens, como a intimidação e o abandono escolar precoce. As medições precisas podem ser desenvolvidas em conjunto com os parceiros pertinentes. Da mesma forma, por conseguinte, deve prever-se uma comunicação de informações e um acompanhamento claros da aplicação da recomendação.

2.   Observações na generalidade

2.1

O presente parecer analisa a proposta de Recomendação do Conselho sobre a aprendizagem mista para um ensino primário e secundário inclusivo e de elevada qualidade. O presente parecer também coloca a tónica no ensino profissional inicial de nível secundário. A proposta de recomendação não defende a generalização de uma presença reduzida do educador na aprendizagem, nem incentiva a que se passe mais horas à frente de um ecrã. O CESE congratula-se com o envolvimento dos jovens, que deve ser sustentado e contínuo em todo o processo.

2.2

Segundo um estudo da Comissão Europeia (8), a aprendizagem mista é entendida como uma abordagem híbrida que combina a aprendizagem na escola com a aprendizagem à distância, incluindo a aprendizagem em linha. A aprendizagem mista consiste num modelo flexível que pode apoiar o progresso de um projeto ou ciclo de estudos, sem exigir que os professores e os aprendentes estejam sempre no mesmo espaço físico.

2.3

Enquanto a aprendizagem baseada na escola melhora as capacidades sociais dos aprendentes, o bem-estar, o sentido de pertença, o sentido de comunidade e uma melhor interação pessoal entre professores e alunos, e entre os alunos, a aprendizagem mista bem organizada pode ajudar os aprendentes a alcançar uma aprendizagem mais independente, individualizada e autodirigida (9). Poderá ser particularmente interesse para a aprendizagem relacionada com as artes, incluindo materiais em suporte de vídeo.

2.4

Embora a proposta descreva a aprendizagem mista como uma abordagem híbrida, enfatizando a sua flexibilidade e o seu potencial para incentivar o estudo independente, é necessário um maior esclarecimento sobre o papel que os professores e os formadores desempenham na aplicação da aprendizagem mista. Neste sentido, é importante garantir que a aprendizagem mista seja aplicada nos programas curriculares através de uma abordagem escolar holística, tendo em conta as necessidades dos professores, dos estudantes e das suas famílias. É também necessário que a aprendizagem mista seja aplicada durante o horário escolar e não cause uma sobrecarga insustentável para os professores nem um fardo adicional para as famílias dos alunos.

3.   Observações na especialidade

3.1

A crise da COVID-19 forçou os alunos das escolas primárias, secundárias e do EFP a ser mais independentes. As escolas e os professores (na sua maioria sem qualquer preparação adequada) foram obrigados a adaptar-se, perante a situação de emergência, ao ensino em linha e à distância, recorrendo a mensagens digitais, ao correio eletrónico, às conversações por vídeo em linha e a outros meios para estabelecer contacto com os alunos, a fim de proporcionar um ensino adequado durante o confinamento. Tratou-se também de um desafio significativo para os alunos com deficiência, que se encontram em maior desvantagem na interação através dos meios digitais. Os governos, as emissões televisivas, os parceiros sociais, os prestadores de ensino e formação, as ONG e os indivíduos atuaram de forma incrivelmente rápida para apoiar os professores na criação de salas de aula virtuais e plataformas de colaboração, mas ainda há muito por fazer.

3.2

Tendo em conta o enorme impacto da crise da COVID-19 nos jovens e no sistema educativo, também devemos ser prudentes quanto ao momento da mudança. É necessário tempo para processar o regresso às aulas presenciais, e muitos jovens precisam de se habituar ao regresso ao «normal». Tantas mudanças em tão pouco tempo podem ser desestabilizadoras. As crianças e os jovens sofreram as consequências da crise da COVID-19. A sua educação, socialização, perspetivas económicas e saúde mental foram particularmente afetadas durante a pandemia. A prioridade no próximo período deve ser o regresso à normalidade, dedicando especial atenção ao bem-estar, à saúde mental e à aprendizagem formal.

3.3

O CESE manifesta a sua preocupação face à capacidade das escolas primárias, e mesmo de alguns primeiros anos das escolas secundárias, para abordar a aprendizagem mista, uma vez que os aprendentes destas faixas etárias carecem amiúde das competências necessárias para participar ativamente num ambiente de aprendizagem mista. Geralmente, falta-lhes autonomia, competências de colaboração, competências em tecnologias da informação e comunicação, construção do conhecimento, competências de autoavaliação e várias outras competências ditas do século XXI. Estas competências são necessárias para uma aprendizagem bem-sucedida num ambiente misto, pelo que a sua ausência numa população de aprendentes representa uma ameaça séria à qualidade da aprendizagem mista prestada. É necessário estabelecer um princípio segundo o qual a transição experimental para a aprendizagem mista na escolaridade começa com os alunos mais velhos e não com os mais novos.

3.4

O CESE chama a atenção para o facto de os alunos do EFP terem sido os que mais perderam na experiência de aprendizagem prática nos programas de aprendizagem durante a pandemia de COVID-19. A falta de acesso à banda larga e aos instrumentos informáticos, a interação inadequada entre os professores e os estudantes, bem como a falta de ambientes de aprendizagem adequados contribuíram para uma maior percentagem de abandono escolar, em particular entre as raparigas e as crianças oriundas de meios socioeconómicos desfavorecidos. Por conseguinte, a aprendizagem mista deve ser cuidadosamente concebida e implantada de modo a assegurar um ambiente e instrumentos de aprendizagem inclusivos para todas as crianças. Embora a recomendação se centre amplamente no ensino primário e secundário, e também no EFP inicial de nível secundário, seria útil explorar o potencial da aprendizagem mista na área dos programas de aprendizagem.

3.5

A proposta inclui entre as suas medidas uma resposta direta à crise, dando «prioridade ao bem-estar físico e mental dos aprendentes e das suas famílias», bem como impulsionar «o desenvolvimento das competências digitais dos alunos e das famílias». Neste sentido, o CESE salienta a importância de alargar o âmbito da garantia do bem-estar e da melhoria das competências digitais a todo o sistema educativo, nomeadamente os professores, os formadores e os dirigentes escolares.

3.6

O CESE congratula-se com a proposta da Comissão de desenvolver, em cooperação com os Estados-Membros, material de orientação específico, manuais e outra documentação concreta, com base em dados comprovados, atividades de aprendizagem entre pares e boas práticas. Tal permitirá colmatar as lacunas identificadas no apoio ao desenvolvimento de uma abordagem de aprendizagem mista a nível da escola e do sistema. Os parceiros sociais e outras partes interessadas pertinentes também devem fazer parte desta cooperação. Cada ação, mudança ou ajuste no domínio dos sistemas educativos devem ser efetuados com o máximo cuidado. Devemos ter a certeza absoluta de que tais mudanças não agravam de forma alguma as desvantagens educativas e o abandono escolar precoce, que são indubitavelmente os maiores desafios que o nosso sistema educativo enfrenta.

3.7

O CESE considera que a aprendizagem mista tem potencial para transformar completamente o ensino e a aprendizagem. No entanto, embora a proposta realce as «oportunidades criadas pela combinação da aprendizagem, incluindo a melhoria da qualidade e da inclusividade da educação e da formação, bem como do desenvolvimento de competências alargadas e do bem-estar dos aprendentes», o CESE salienta que as limitações na aplicação da aprendizagem mista devem ser cuidadosamente consideradas. Deve ser prestada especial atenção às regiões rurais e às zonas pobres, onde faltam infraestruturas (falta de acesso a banda larga e a instrumentos informáticos) e um ambiente de apoio (ambiente doméstico, contexto financeiro, etc.) que possibilitem uma aprendizagem mista de qualidade benéfica para os estudantes. A ligação a redes potentes e fiáveis, especialmente quando toda a família precisa de se conectar para tratar dos seus assuntos, é fundamental. Além disso, nem todos os estudantes têm níveis suficientes de competências digitais, autodisciplina ou autonomia necessários para acompanhar as aulas de forma independente e realizar tarefas sem interação presencial com os professores. De uma forma geral, o êxito da aprendizagem mista depende muito da supervisão e assistência dos pais — especialmente no caso dos alunos mais jovens. Esta situação corre o risco de criar ou aumentar as desigualdades nos resultados de aprendizagem dos alunos e contribuir para um aumento na taxa de abandono escolar precoce, uma vez que nem todos têm pais que são capazes ou têm disponibilidade para desempenhar eficazmente essa função.

3.8

Embora os sistemas educativos tenham registado um movimento crescente no sentido da privatização nos últimos anos, a aprendizagem mista deve ser aplicada nos programas educativos de modo a proteger a responsabilidade e a transparência na governação dos sistemas públicos de ensino da influência dos interesses e intervenientes privados e comerciais. A educação enquanto bem público não deve ser prejudicada pela aprendizagem mista.

3.9

Antes da pandemia de COVID-19, os educadores enfrentavam o desafio de um crescente fosso de aprendizagem entre os alunos devido a diversas pressões socioeconómicas. Outros fatores incluem o racismo, a segregação e um declínio geral da mobilidade ascendente e uma recessão na economia global. Em geral, também tem sido registada uma maior dependência dos trabalhos de casa, por exemplo, o que apenas serve para aumentar as disparidades de resultados. O isolamento e a autoaprendizagem também têm efeitos psicológicos prejudiciais. Para muitos alunos, especialmente aqueles de origens socioeconómicas desfavorecidas, a interação presencial com os professores e os colegas proporciona conforto e ajuda a reduzir o fosso de aprendizagem. A atual pandemia de COVID-19 exacerbou este fosso de aprendizagem, incluindo o fosso de competências digitais, colocando mais estudantes em risco de falhar na aprendizagem.

3.10

O CESE chama a atenção para o facto de a formação inicial e o desenvolvimento profissional contínuo dos professores não serem suficientes para os dotar das competências adequadas, incluindo competências digitais, métodos pedagógicos ou materiais de ensino úteis no contexto da aprendizagem mista. Tal aplica-se, em especial, ao trabalho com alunos com necessidades especiais, num contexto multicultural, ou com alunos desfavorecidos, o que é ainda mais problemático do que o habitual, pois penaliza precisamente os grupos de alunos que necessitam de mais apoio na situação atual. O Fórum Europeu das Pessoas com Deficiência apela à igualdade de acesso aos serviços de educação para os trabalhadores e os alunos com deficiência, bem como à disponibilização de medidas como a linguagem gestual, a legendagem em direto e o trabalho adaptado.

3.11

Os instrumentos de autoavaliação mencionados na proposta, como a futura ferramenta SELFIE para os professores, têm potencial para apoiar a aplicação da aprendizagem mista. No entanto, o CESE chama a atenção para o risco de estes instrumentos poderem criar uma avaliação comparativa entre as instituições de ensino, com vista à criação de classificações escolares, ligas e concursos. É importante que a aplicação da aprendizagem mista respeite as características específicas de quaisquer instituições de ensino e as prioridades no que diz respeito à utilização das tecnologias da informação e comunicação (TIC), as quais devem ser acordadas pelos professores, formadores e dirigentes escolares.

3.12

O trabalho com crianças e jovens deve basear-se cada vez mais na participação real e contínua das pessoas envolvidas, de acordo com o artigo 12.o da Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU. À exceção de uma consulta, a recomendação não dá grande ênfase aos pontos de vista das crianças. Esta lacuna deve ser colmatada. Muitos Estados-Membros estão a desenvolver modelos de boas práticas e a UE está a elaborar a sua própria estratégia para os direitos da criança. Este tipo de mudança deverá acabar por ser visível na gestão e avaliação escolares.

Bruxelas, 20 de outubro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  COM(2020) 625 final, COM(2020) 624 final, JO C 66 de 26.2.2021, p. 1, JO C 221 de 10.6.2021, p. 3.

(2)  JO C 56 de 16.2.2021, p. 1.

(3)  JO C 286 de 16.7.2021, p. 27.

(4)  Comissão Europeia: «Teachers in Europe Careers, Development and Well-being» [Professores na Europa, carreiras, desenvolvimento e bem-estar], 2021.

(5)  Comissão Europeia: «Blended learning in school education — guidelines for the start of the academic year 2020/21» [Aprendizagem mista na educação escolar — orientações para o início do ano letivo 2020/2021].

(6)  JO C 286 de 16.7.2021, p. 27.

(7)  Downes, P. (2011). Multi/Interdisciplinary Teams for Early School Leaving Prevention: Developing a European Strategy Informed by International Evidence and Research [Equipas multi/interdisciplinares para a prevenção do abandono escolar precoce: desenvolvimento de uma estratégia europeia com base em dados e investigações internacionais]. Comissão Europeia, NESET (Rede de Peritos sobre os Aspetos Sociais da Educação e da Formação), Direção-Geral Educação e Cultura: Bruxelas.

(8)  Comissão Europeia: «Blended learning in school education — guidelines for the start of the academic year 2020/21» [Aprendizagem mista na educação escolar — orientações para o início do ano letivo 2020/2021].

(9)  Ibid.


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