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Document 52021AA0001

Parecer n.o 1/2021 (apresentado nos termos do artigo 322.o do TFUE) sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece a Reserva de Ajustamento ao Brexit [COM(2020) 854 final]

ECA_OPI_2021_1

JO C 101 de 23.3.2021, p. 1–7 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

23.3.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 101/1


PARECER N.o 1/2021

(apresentado nos termos do artigo 322.o do TFUE)

sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece a Reserva de Ajustamento ao Brexit

[COM(2020) 854 final]

(2021/C 101/01)

ÍNDICE

 

Pontos

Página

Introdução

1-7

2

Parte I: Observações gerais

8-14

4

Arquitetura da Reserva

8-12

4

Auditoria e prestação de contas

13-14

5

Parte II: Observações específicas

15-23

5

Período de elegibilidade

15-16

5

Cálculo do pré-financiamento

17

5

Elegibilidade das despesas

18

6

Metodologia de amostragem

19

6

Imposto sobre o Valor Acrescentado

20

6

Declaração de gestão

21

6

Elaboração de relatórios e avaliação

22-23

6

O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 322.o,

Tendo em conta a proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece a Reserva de Ajustamento ao Brexit, apresentada pela Comissão em 25 de dezembro de 2020 (a seguir designada por «proposta»),

Tendo em conta os pedidos de parecer sobre a proposta mencionada, apresentados pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho em 20 de janeiro de 2021,

Tendo em conta o Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União, que altera os Regulamentos (UE) n.o 1296/2013, (UE) n.o 1301/2013, (UE) n.o 1303/2013, UE n.o 1304/2013, (UE) n.o 1309/2013, (UE) n.o 1316/2013, (UE) n.o 223/2014 e (UE) n.o 283/2014, e a Decisão n.o 541/2014/UE, e revoga o Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 (1) («Regulamento Financeiro»),

Tendo em conta o Acordo sobre a saída do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (2) (a seguir designado por «Acordo de Saída»),

ADOTOU O SEGUINTE PARECER:

Introdução

1.

O Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte saiu da União Europeia em 1 de fevereiro de 2020, data de entrada em vigor do Acordo de Saída. Este Acordo previa um período de transição até 31 de dezembro de 2020 e garantia condições de «manutenção do statu quo» para os cidadãos, os consumidores e as empresas, tanto na UE como no Reino Unido.

2.

Consequentemente, embora ambas as partes tenham celebrado, em 24 de dezembro, um novo Acordo de Comércio e Cooperação entre a UE e o Reino Unido (3), formam agora, desde 1 de janeiro de 2021, dois mercados separados e dois espaços regulamentares e jurídicos distintos. Foram criados obstáculos ao comércio de bens e serviços e à mobilidade transfronteiras, com consequências para a administração pública, as empresas, os cidadãos e as partes interessadas de ambos os lados.

3.

Nas conclusões da sua reunião extraordinária de 17-21 de julho de 2020, o Conselho Europeu anunciou a criação de um novo instrumento especial, a Reserva de Ajustamento ao Brexit (a seguir designada por «Reserva»), com uma dotação total de 5 mil milhões de EUR a preços de 2018. O Conselho Europeu convidou a Comissão a apresentar uma proposta de regulamento.

4.

A Comissão apresentou a sua proposta em dezembro de 2020. A Reserva tem por objetivo prestar apoio aos Estados-Membros, às regiões e aos setores mais gravemente afetados pela saída do Reino Unido, atenuando assim o impacto negativo na coesão económica, social e territorial. Todos os Estados-Membros são elegíveis para receber apoio da Reserva.

5.

Propõe-se ativar a Reserva em duas rondas de afetações, das quais a primeira em 2021 sob a forma de um pré-financiamento substancial no valor de 4 mil milhões de EUR. O método de repartição da parte do pré-financiamento de cada Estado-Membro baseia-se em dois fatores principais: o comércio com o Reino Unido e o peixe capturado na zona económica exclusiva do Reino Unido (4). A figura 1 mostra como, utilizando esse método, o pré-financiamento seria repartido entre os Estados-Membros.

Figura 1

Afetação do pré-financiamento (critérios associados ao comércio e à pesca)

Image 1

Fonte:

Comissão Europeia.

6.

Os Estados-Membros teriam de solicitar uma contribuição financeira da Reserva até 30 de setembro de 2023. Os restantes mil milhões de EUR cobririam qualquer despesa elegível que excedesse o montante pago a título de pré-financiamento, mas dentro dos limites do total dos recursos disponíveis. As contribuições adicionais da Reserva seriam pagas principalmente em 2024.

7.

A base jurídica (5) da proposta da Comissão exige a consulta ao Tribunal de Contas Europeu (TCE), tendo o Parlamento Europeu (6) e o Conselho (7) solicitado o seu parecer. O presente parecer responde a esse pedido e pretende contribuir para a análise da proposta da Comissão pelos legisladores. Para o efeito, o TCE apresenta observações gerais e específicas nas quais, entre outros aspetos, destaca as principais questões em causa e os riscos associados.

Parte I: Observações gerais

Arquitetura da Reserva

8.

Segundo a proposta, o período de referência (a seguir designado por «período de elegibilidade») para as medidas de execução destinadas a atenuar as consequências adversas da saída do Reino Unido decorre de 1 de julho de 2020 a 31 de dezembro de 2022. Os Estados-Membros têm de apresentar pedidos de contribuição financeira até 30 de setembro de 2023, fornecendo informações pormenorizadas sobre a despesa pública total incorrida durante o período de elegibilidade (8). Os pedidos são acompanhados de um relatório de execução especificando as medidas de atenuação tomadas e a forma como foram executadas, bem como de uma declaração de gestão e de um parecer de auditoria independente abrangendo a totalidade do período de referência. Com base nestas informações, apenas então a Comissão avalia a elegibilidade e a adequação das medidas escolhidas, o que constitui uma derrogação à abordagem anual aplicada aos fundos em regime de gestão partilhada (9). A figura 2 descreve este processo, apresentando as datas principais.

Figura 2

Calendário aplicável à Reserva

Image 2

Fonte:

TCE.

9.

Os Estados-Membros recebem 4 mil milhões de EUR, ou seja, 80 % dos fundos de reserva, a título de pré-financiamento. Antes do pagamento, devem notificar à Comissão a identidade dos organismos responsáveis pela gestão e controlo da Reserva e do organismo ao qual será pago o pré-financiamento. Embora o nível de pré-financiamento seja invulgarmente elevado, permite aos Estados-Membros reagirem rapidamente à situação excecional e tem em conta o facto de que o saldo final não será pago, na melhor das hipóteses, antes do final de 2023.

10.

A arquitetura da proposta da Comissão cumpre o objetivo de proporcionar flexibilidade aos Estados-Membros. A disponibilização de montantes significativos da Reserva por meio de pré-financiamentos permite aos Estados-Membros reagirem rapidamente à evolução das circunstâncias e combaterem os efeitos negativos do Brexit de forma mais eficaz. A proposta estabelece os domínios genéricos em que pode ser aplicado o financiamento, sem os definir em mais pormenor, mas os Estados-Membros têm poder discricionário quanto aos tipos de projetos ou medidas que desejem financiar (10).

11

A flexibilidade proporcionada pela Reserva, em especial a ausência da obrigação de os Estados-Membros informarem oficialmente a Comissão sobre as regiões, os domínios e os setores mais gravemente afetados e de descreverem as medidas que irão financiar antes da atribuição do pré-financiamento, gera vários riscos associados à incerteza. A Reserva poderá ser usada para apoiar medidas que, na realidade, não são elegíveis, levando a que a Comissão, posteriormente, não reembolse custos aos Estados-Membros. Além disso, as medidas escolhidas podem não ser as melhores e podem não permitir atingir o objetivo pretendido.

12.

A proposta exige que os Estados-Membros confirmem que elaboraram descrições dos seus sistemas de gestão e controlo (11). Os Estados-Membros podem recorrer, para a gestão da Reserva, aos organismos designados e aos sistemas já criados para a execução dos fundos da UE. Caso decidam estabelecer novos sistemas, corre-se o risco de estes serem ineficazes. A Comissão deve, nas fases iniciais do período de elegibilidade, avaliar se são adequados para contribuir para a proteção dos interesses financeiros da UE.

Auditoria e prestação de contas

13.

A proposta prevê a designação de um organismo de auditoria independente em cada Estado-Membro para auditar o sistema de gestão e controlo e realizar auditorias das medidas financiadas (12). Este organismo de auditoria é, por conseguinte, um interveniente fundamental para garantir à Comissão que os sistemas de gestão e controlo dos Estados-Membros funcionam adequadamente e que as despesas são legais e regulares. Contudo, a proposta carece de pormenores e de definições claras em relação a determinados elementos importantes, como a metodologia de amostragem e a quantificação e correção dos erros.

14.

Esta falta de clareza pode não assegurar uma estratégia de auditoria coerente e comparável em todos os Estados-Membros, reduzindo assim a garantia que a Comissão poderia obter dos seus trabalhos e pareceres de auditoria.

Parte II: Observações específicas

Período de elegibilidade

15.

A proposta estabelece que o período de elegibilidade para as medidas de execução deve decorrer de julho de 2020 a dezembro de 2022 (13). A Comissão teve em consideração que a proposta faz parte da preparação para o termo do período de transição, tendo por base e complementando o trabalho realizado pela UE e pelos Estados-Membros no contexto das medidas de preparação tomadas durante as negociações do Brexit (14).

16.

O período de elegibilidade deve facilitar o objetivo de utilizar a Reserva para apoiar as medidas de preparação e contribuir para atenuar o impacto económico da saída do Reino Unido. Todavia, a proposta não especifica claramente o raciocínio subjacente ao período de elegibilidade escolhido nem examina a sua adequação aos objetivos declarados.

Cálculo do pré-financiamento

17.

A metodologia escolhida e aplicada pela Comissão para calcular a parte dos Estados-Membros no pré-financiamento baseia-se em dois fatores: o comércio com o Reino Unido e o peixe capturado nas águas do Reino Unido. Através desta metodologia, a Comissão pretende obter a melhor estimativa do impacto do Brexit nos respetivos Estados-Membros. Porém, tendo em conta as muitas incertezas ainda associadas ao impacto da saída do Reino Unido, incluindo a deslocação de setores de atividade económica deste país para a UE, corre-se o risco de o método de repartição escolhido não refletir plenamente a exposição específica da economia de um Estado-Membro.

Elegibilidade das despesas

18

A proposta estabelece que as despesas são elegíveis se forem efetuadas e pagas durante o período de elegibilidade (15). Prevê igualmente que as contribuições da Reserva assumem a forma de reembolso dos custos elegíveis efetivamente suportados e pagos pelos Estados-Membros na execução das medidas (16). Na opinião do Tribunal, a proposta permite interpretações divergentes quanto à elegibilidade das despesas. Por conseguinte, deve ser clarificado que os custos devem ser suportados e pagos durante o período de elegibilidade, tanto ao nível dos organismos designados como dos destinatários finais.

Metodologia de amostragem

19.

A proposta descreve o processo de auditoria das medidas financiadas, bem como a metodologia de amostragem correspondente (17). Nos casos em que permite um método de amostragem não estatística, a proposta estabelece que as unidades de amostragem devem cobrir uma determinada proporção da população no exercício contabilístico. Dado que a auditoria das medidas financiadas deve abranger todo o período de elegibilidade, ou seja, dois anos e meio, a referência a «exercício contabilístico» afigura-se incoerente com a metodologia global.

Imposto sobre o Valor Acrescentado

20.

Nos termos da proposta, a Reserva não apoia o imposto sobre o valor acrescentado (18). O Tribunal congratula-se com a abordagem proposta, que está em consonância com a recomendação que expressou pela última vez no seu exame rápido de casos, publicado em 2018, sobre o reembolso do IVA no domínio da coesão. O Tribunal recomendou excluir o reembolso do IVA aos organismos públicos a partir de fundos da UE como forma de reduzir o risco de erros nas despesas do domínio da Coesão e assegurar uma melhor utilização dos fundos da União na perspetiva de uma boa gestão financeira (19).

Declaração de gestão

21.

Segundo a proposta, os Estados-Membros devem apresentar uma declaração de gestão, o parecer de um organismo de auditoria independente e um relatório de execução (ponto 8) como parte integrante dos seus pedidos de contribuições financeiras da Reserva (20). O Tribunal observa que o modelo da declaração de gestão, constante do anexo II da proposta, não prevê uma declaração da pessoa responsável pela gestão da Reserva, confirmando o bom funcionamento do sistema de controlo. Esta declaração é exigida pelo artigo 63.o, n.o 6, alínea c), do Regulamento Financeiro, e a sua falta limitaria a garantia que a declaração poderia fornecer. Teria igualmente implicações para o parecer de auditoria, que normalmente avaliaria a exatidão da declaração.

Elaboração de relatórios e avaliação

22.

Nos termos da proposta, a Comissão realiza uma avaliação para examinar a eficácia, eficiência, pertinência, coerência e o valor acrescentado da Reserva para a UE (21). Embora reconheça que é importante encontrar o justo equilíbrio entre os requisitos de acompanhamento e os encargos administrativos para os Estados-Membros, o Tribunal observa que os pedidos de contribuições financeiras devem incluir unicamente valores relativos aos indicadores de realizações (22). Apesar de estes indicadores serem mensuráveis, como já referido, fornecem apenas informações limitadas sobre a eficácia de uma medida para dar resposta às consequências negativas da saída do Reino Unido (23). Além disso, a proposta não exige que os Estados-Membros estabeleçam metas para os referidos indicadores, o que tornará ainda mais difícil uma avaliação significativa da eficácia da Reserva.

23.

De acordo com as Orientações para Legislar Melhor, só podem ser obtidos resultados sólidos e fiáveis através de avaliações objetivas independentes (24). Embora a proposta preveja uma avaliação completa da Reserva, conduzindo à apresentação de um relatório ao Parlamento Europeu e ao Conselho até 30 de junho de 2027, não indica explicitamente que a avaliação deva ser independente.

O presente parecer foi adotado pelo Tribunal de Contas, no Luxemburgo, na sua reunião de 25 de fevereiro de 2021.

Pelo Tribunal de Contas

Klaus-Heiner LEHNE

Presidente


(1)  JO L 193 de 30.7.2018, p. 1.

(2)  JO C 384 I de 12.11.2019, p. 1.

(3)  JO L 444 de 31.12.2020, p. 14.

(4)  Anexo I da proposta.

(5)  Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, artigo 322.o, n.o 1, alínea a).

(6)  Parlamento Europeu — D300288 (20.1.2021).

(7)  Conselho — SGS 21/000201 (20.1.2021).

(8)  Artigo 9.o da proposta.

(9)  Artigo 7.o, n.o 4: «Em derrogação dos n.os 5, 6 e 7, do artigo 63.o do Regulamento Financeiro, os documentos referidos nessas disposições devem ser apresentados uma única vez, nos termos do artigo 10.o do presente regulamento.»

(10)  Artigo 5.o da proposta.

(11)  Artigo 13.o, n.o 1, da proposta.

(12)  Artigo 13.o, n.o 4, da proposta.

(13)  Artigo 2.o, n.o 1, e artigo 5.o, n.o 2, da proposta.

(14)  Considerando 7 da proposta.

(15)  Artigo 5.o, n.o 2, da proposta.

(16)  Artigo 7.o, n.o 2, da proposta.

(17)  Artigo 13.o, n.o 4, da proposta.

(18)  Artigo 6.o, alínea a), da proposta.

(19)  Exame Rápido de Casos, Reembolso do IVA no domínio da Coesão: uma utilização dos fundos da UE propensa a erros e não otimizada, novembro de 2018.

(20)  Artigo 10.o, n.os 1 e 2, da proposta.

(21)  Artigo 16.o da proposta.

(22)  Anexo II da proposta.

(23)  Relatório do Tribunal de Contas Europeu sobre o desempenho do orçamento da UE – Situação no final de 2019, ponto 4.19: «Os indicadores de realizações têm uma ligação direta com as atividades financiadas pelo orçamento da UE, mas dão poucas informações sobre os progressos na concretização dos objetivos da política.»

(24)  SWD(2017) 350 final, de 7 de maio de 2017, p. 53.


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