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Document 52020DC0522

Recomendação de RECOMENDAÇÃO DO CONSELHO relativa ao Programa Nacional de Reformas de Portugal de 2020 e que emite um parecer do Conselho sobre o Programa de Estabilidade de Portugal de 2020

COM/2020/522 final

Bruxelas, 20.5.2020

COM(2020) 522 final

Recomendação de

RECOMENDAÇÃO DO CONSELHO

relativa ao Programa Nacional de Reformas de Portugal de 2020 e que emite um parecer do Conselho sobre o Programa de Estabilidade de Portugal de 2020


Recomendação de

RECOMENDAÇÃO DO CONSELHO

relativa ao Programa Nacional de Reformas de Portugal de 2020 e que emite um parecer do Conselho sobre o Programa de Estabilidade de Portugal de 2020

O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 121.º, n.º 2, e o artigo 148.º, n.º 4,

Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 1466/97 do Conselho, de 7 de julho de 1997, relativo ao reforço da supervisão das situações orçamentais e à supervisão e coordenação das políticas económicas 1 , nomeadamente o artigo 5.º, n.º 2,

Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 1176/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2011, sobre prevenção e correção dos desequilíbrios macroeconómicos 2 , nomeadamente o artigo 6.º, n.º 1,

Tendo em conta a recomendação da Comissão Europeia,

Tendo em conta as resoluções do Parlamento Europeu,

Tendo em conta as conclusões do Conselho Europeu,

Tendo em conta o parecer do Comité do Emprego,

Tendo em conta o parecer do Comité Económico e Financeiro,

Tendo em conta o parecer do Comité da Proteção Social,

Tendo em conta o parecer do Comité de Política Económica,

Considerando o seguinte:

(1)Em 17 de dezembro de 2019, a Comissão adotou a Estratégia Anual para o Crescimento Sustentável, assinalando o início do Semestre Europeu de 2020 para a coordenação das políticas económicas. A referida estratégia teve devidamente em conta o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, proclamado em 17 de novembro de 2017 pelo Parlamento Europeu, pelo Conselho e pela Comissão. Em 17 de dezembro de 2019, com base no Regulamento (UE) n.º 1176/2011, a Comissão adotou igualmente o Relatório sobre o Mecanismo de Alerta, tendo identificado Portugal como um dos Estados-Membros que deviam ser objeto de uma apreciação aprofundada. Nessa mesma data, a Comissão adotou igualmente uma recomendação de recomendação do Conselho sobre a política económica da área do euro.

(2)O relatório de 2020 relativo a Portugal 3 foi publicado em 26 de fevereiro de 2020. Nele se avaliavam os progressos realizados por Portugal em resposta às recomendações específicas por país adotadas pelo Conselho em 9 de julho de 2019 4 , o seguimento dado às recomendações adotadas em anos anteriores e os progressos alcançados por Portugal na consecução dos seus objetivos nacionais fixados no âmbito da estratégia Europa 2020. Esse relatório incluía igualmente uma apreciação aprofundada, efetuada nos termos do artigo 5.º do Regulamento (UE) n.º 1176/2011, cujos resultados foram também publicados em 26 de fevereiro de 2020. A análise da Comissão levou-a a concluir que Portugal regista desequilíbrios macroeconómicos. Em especial, os grandes volumes de passivos externos líquidos e de dívida pública e privada, bem como a elevada percentagem de empréstimos não produtivos, constituem fatores de vulnerabilidade, num contexto de baixo crescimento da produtividade.

(3)Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde declarou oficialmente o surto de COVID-19 como uma pandemia à escala mundial. Trata-se de uma grave emergência de saúde pública, afetando os cidadãos, as sociedades e as economias. Para além de exercer uma enorme pressão sobre os sistemas nacionais de saúde, tem perturbado as cadeias de abastecimento mundiais, provocado volatilidade nos mercados financeiros, desencadeado choques na procura dos consumidores e produzido efeitos negativos nos mais diversos setores. A pandemia está a pôr em risco o emprego dos cidadãos, os seus rendimentos e a atividade das empresas, tendo provocado um importante choque económico cujas graves repercussões já se fazem sentir na União Europeia. Em 13 de março de 2020, a Comissão adotou uma Comunicação 5 em que apelava para a adoção de uma resposta económica coordenada à crise, associando todos os intervenientes a nível nacional e da União.

(4)Vários Estados-Membros declararam um estado de emergência ou introduziram medidas de emergência. As medidas de emergência devem ser estritamente proporcionais, necessárias, limitadas no tempo e consentâneas com as normas europeias e internacionais. Devem ser objeto de escrutínio democrático e de um controlo jurisdicional independente.

(5)Em 20 de março de 2020, a Comissão adotou uma Comunicação sobre a ativação da cláusula de derrogação geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento 6 . A cláusula, como enunciada no artigo 5.º, n.º 1, no artigo 6.º, n.º 3, no artigo 9.º, n.º 1, e no artigo 10.º, n.º 3, do Regulamento (CE) n.º 1466/97 e no artigo 3.º, n.º 5, e no artigo 5.º, n.º 2, do Regulamento (CE) n.º 1467/97, facilita a coordenação das políticas orçamentais em caso de recessão económica grave. Na sua comunicação, a Comissão compartilhou com o Conselho a sua opinião de que, dada a grave recessão económica resultante do surto de COVID-19, as circunstâncias atuais permitem ativar a referida cláusula. Em 23 de março de 2020, os Ministros das Finanças dos Estados-Membros manifestaram o seu acordo com esta apreciação da Comissão. A ativação da cláusula de derrogação geral autoriza um desvio temporário relativamente à trajetória de ajustamento em direção ao objetivo orçamental de médio prazo, desde que tal não ponha em risco a sustentabilidade orçamental a médio prazo. No que respeita à vertente corretiva, o Conselho pode também decidir, com base numa recomendação da Comissão, adotar uma trajetória orçamental revista. A cláusula de derrogação geral não suspende os procedimentos previstos pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento. Autoriza os Estados-Membros a desviarem-se dos requisitos orçamentais que se aplicariam em circunstâncias normais, permitindo paralelamente que a Comissão e o Conselho adotem as necessárias medidas de coordenação das políticas no âmbito do Pacto.

(6)É necessário prosseguir as medidas para limitar e controlar a propagação da pandemia, reforçar a resiliência dos sistemas nacionais de saúde, atenuar as consequências socioeconómicas através de medidas de apoio às empresas e às famílias e assegurar condições adequadas de saúde e segurança no local de trabalho, com vista a retomar a atividade económica. A União deve tirar pleno partido dos vários instrumentos de que dispõe para apoiar os esforços desenvolvidos pelos Estados-Membros nesses domínios. Paralelamente, os Estados-Membros e a União devem unir esforços para elaborar as medidas necessárias para restabelecer o funcionamento normal das nossas sociedades e economias, bem como o crescimento sustentável, integrando nomeadamente os objetivos da transição ecológica e da transformação digital, para além de extrair as devidas ilações da crise.

(7)O surto de COVID-19 realçou a flexibilidade proporcionada pelo mercado único para permitir a sua adaptação a situações extraordinárias. No entanto, a fim de assegurar uma transição rápida e harmoniosa para a fase de recuperação, bem como a livre circulação de bens, serviços e trabalhadores, as medidas excecionais que impedem o funcionamento normal do mercado único devem ser suprimidas assim que deixarem de ser indispensáveis. A crise atual demonstrou a necessidade de planos de preparação para situações de crise no setor da saúde, comportando, nomeadamente, melhores estratégias de aquisição, cadeias de abastecimento diversificadas e reservas estratégicas de bens essenciais. Trata-se de aspetos fundamentais a ter em conta na elaboração de planos mais gerais de preparação para situações de crise.

(8)O legislador da União já alterou os quadros legislativos pertinentes 7 , no intuito de permitir aos Estados-Membros mobilizarem todos os recursos não utilizados dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento, para que possam fazer face aos efeitos excecionais da pandemia de COVID-19. Essas alterações proporcionarão maior flexibilidade, bem como procedimentos simplificados e harmonizados. Para aliviar a pressão sobre os fluxos de caixa, os Estados-Membros podem também beneficiar de uma taxa de cofinanciamento de 100 % a partir do orçamento da União no exercício contabilístico de 2020-2021. Portugal é incentivado a tirar pleno partido dessas possibilidades para apoiar os cidadãos e os setores mais afetados pelos problemas levantados pela crise.

(9)As consequências socioeconómicas da pandemia irão provavelmente repartir-se de forma desigual entre as regiões portuguesas em virtude das suas diferentes estruturas de especialização, em especial nas regiões fortemente dependentes do turismo, como o Algarve e as regiões ultraperiféricas da Madeira e dos Açores. Isto implica um risco substancial de agravamento das disparidades regionais e territoriais em Portugal. Paralelamente ao risco de erosão temporária do processo de convergência entre os Estados-Membros, a situação atual exige a adoção de respostas estratégicas bem focalizadas.

(10)Em 16 de maio de 2020, Portugal apresentou o seu Programa Nacional de Reformas de 2020 e o seu Programa de Estabilidade de 2020. A fim de ter em conta as interligações entre ambos, os dois programas foram avaliados em simultâneo.

(11)Portugal encontra-se atualmente na vertente preventiva do Pacto de Estabilidade e Crescimento e está sujeito à regra relativa à dívida. Em 13 de julho de 2018, o Conselho recomendou a Portugal que assegurasse que a taxa de crescimento nominal das despesas públicas primárias líquidas 8 não excedesse 0,7 % em 2019, o que corresponde a um ajustamento estrutural anual de 0,6 % do PIB. A avaliação geral da Comissão confirma a existência de um desvio significativo em relação à trajetória de ajustamento recomendada rumo ao objetivo de médio prazo em 2019, bem como em 2018 e 2019, considerados em conjunto. No entanto, dada a ativação da cláusula de derrogação geral, não se justificam para Portugal outras etapas no âmbito do procedimento relativo aos desvios significativos.

(12)No seu Programa de Estabilidade de 2020, o Governo não incluiu um cenário macroeconómico nem planos relativamente ao saldo das administrações públicas e ao rácio dívida pública/PIB, pelo menos no que se refere a 2020. O Programa de Estabilidade de 2020 estima, contudo, que cada período de 30 dias úteis – ou seja, de cerca de um mês e meio de calendário – de confinamento pode ter, em média, um impacto negativo no PIB anual equivalente a 6,5 pontos percentuais. As perspetivas macroeconómicas e orçamentais são afetadas pela elevada incerteza decorrente do surto de COVID-19. Existem riscos específicos do país subjacentes às projeções orçamentais, associados ao aumento dos passivos contingentes públicos decorrentes de algumas empresas públicas e às medidas relacionadas com o surto de COVID-19 destinadas ao setor privado, a acrescer aos níveis significativos preexistentes e que se prendem, em parte, com potenciais repercussões orçamentais adicionais em resultado de novas medidas de apoio à banca.

(13)Em resposta à pandemia de COVID-19, e no âmbito de uma abordagem coordenada a nível da União, Portugal adotou medidas orçamentais para incrementar a capacidade do seu sistema de saúde, conter a pandemia e aliviar a pressão que recai sobre as pessoas e os setores que foram particularmente afetados. O Programa de Estabilidade de 2020 apresenta uma estimativa dos efeitos orçamentais dessas medidas, numa base mensal ou anual, sem contudo incluir quaisquer projeções relativas a um valor total anual para 2020. As medidas incluem, designadamente, um apoio pontual específico às empresas para retomarem as suas atividades (508,0 milhões de EUR ou 0,3 % do PIB), um regime simplificado de interrupção temporária do trabalho («layoff», num valor correspondente a 373,3 milhões de EUR ou 0,2 % do PIB por cada mês de aplicação) e a aquisição de equipamento de proteção individual pelo sistema de saúde (0,1 % do PIB por cada mês de aplicação) 9 . A Comissão estima que essas medidas poderão ter um custo orçamental direto global correspondente a aproximadamente 2,5 % do PIB em 2020. Além disso, Portugal anunciou medidas que, sem terem necessariamente um impacto orçamental imediato, contribuirão para apoiar a liquidez das empresas e das famílias, num montante aproximado de 25,2 mil milhões de EUR, o que equivale a cerca de 12,5 % do PIB, segundo as estimativas do Programa de Estabilidade de 2020. Essas medidas incluem o diferimento do imposto sobre o valor acrescentado e dos impostos sobre o rendimento das pessoas singulares e coletivas, bem como das contribuições para a segurança social (7,9 mil milhões de EUR ou 3,9% do PIB), para além de linhas de crédito com garantia estatal e outras iniciativas similares (4,0 mil milhões de EUR ou 2,0 % do PIB). De modo geral, as medidas tomadas por Portugal são consentâneas com as orientações estabelecidas na Comunicação da Comissão relativa a uma resposta económica coordenada ao surto de COVID-19. A plena aplicação dessas medidas, seguida de uma reorientação das políticas orçamentais com vista a alcançar situações orçamentais prudentes a médio prazo, sempre que as condições económicas o permitam, contribuirão para preservar a sustentabilidade orçamental a médio prazo.

(14)Com base nas previsões da Comissão da primavera de 2020, e num cenário de políticas inalteradas, prevê-se que o défice das administrações públicas em Portugal atinja 6,5 % do PIB em 2020 e 1,8 % em 2021. O rácio dívida-PIB das administrações públicas deverá atingir um pico de 131,6 % do PIB em 2020, devendo em seguida diminuir para 124,4 % em 2021.

(15)Em 20 de maio de 2020, a Comissão emitiu um relatório elaborado em conformidade com o artigo 126.º, n.º 3, do Tratado, relativamente a Portugal, por se prever que o limiar de 3 % do PIB para o défice seja excedido em 2020. De modo geral, a análise sugere que o critério do défice, na aceção do Tratado e do Regulamento (CE) n.º 1467/1997, não é cumprido.

(16)A pandemia de COVID-19 eclodiu em Portugal no início de março de 2020, fazendo recair uma grande pressão sobre o seu sistema de saúde. O Governo português adotou rapidamente um vasto leque de medidas estritas em matéria de confinamento, após ter decretado um estado de emergência constitucional entre 18 de março e 2 de maio de 2020, para limitar tanto quanto possível a propagação da doença e a perda de vidas humanas. O país tomou medidas para reforçar a capacidade de resposta do seu sistema de saúde e aplanar a curva de contágio, de modo a não sobrecarregar os hospitais. As medidas de contenção a nível nacional e mundial têm limitado severamente a atividade económica na maioria dos setores, afetando de forma particularmente grave o turismo e as atividades conexas, ensombrecendo as perspetivas sociais e económicas em Portugal, em especial no que respeita às micro, pequenas e médias empresas (PME). De acordo com as projeções, a economia deverá contrair-se em 6,8 % em 2020 e crescer 5,8 % em 2021.

(17)Para atenuar o impacto imediato da pandemia de COVID-19 na saúde das pessoas, têm vindo a ser incorridas, em larga escala, avultadas despesas em benefício do sistema de saúde. São necessários investimentos para melhorar a resiliência do sistema de saúde, a fim de garantir a disponibilidade dos equipamentos, produtos e infraestruturas necessários para reforçar as capacidades de resposta a situações de crise, nomeadamente em matéria de cuidados intensivos, testes de diagnóstico, investigação médica aplicada e tecnológica e em termos de acesso universal, incluindo fora das zonas urbanas e nas regiões ultraperiféricas da Madeira e dos Açores. No início do surto de COVID-19, foi progressivamente posto em prática um plano que visava introduzir um novo modelo de governação para os hospitais públicos, que previa aumentos substanciais dos seus orçamentos anuais. A sua firme implementação, na conjuntura atual, pode contribuir para reforçar a resiliência do sistema de saúde. A crise de COVID-19 demonstrou a fragilidade das estruturas de cuidados de longa duração em Portugal, que registaram taxas de contaminação e mortalidade mais elevadas. Não obstante as melhorias verificadas na cobertura territorial dos cuidados de longa duração ao longo da última década, as taxas de acesso universal são baixas em todas as regiões do país. Por outro lado, antes do surto de COVID-19 previa-se que as despesas consagradas aos cuidados de saúde de longa duração registariam um dos maiores aumentos na União (em percentagem do PIB). Impõe-se continuar a desenvolver esforços para melhorar a eficiência e a capacidade dos cuidados de saúde e dos cuidados de longa duração para combater a crise atual, bem como para enfrentar os desafios colocados pelo envelhecimento demográfico.

(18)Após a persistente evolução positiva do mercado de trabalho que se verificou a partir de 2014, Portugal passará agora a enfrentar desafios extraordinários a nível do emprego, em consequência da pandemia. Segundo as previsões da Comissão, o desemprego deverá aumentar para 9,7 % da população ativa em 2020 e, em seguida, descer para 7,4 % em 2021 (situava-se em 6,5 % em 2019). Para apoiar o emprego e atenuar o risco de perda de postos de trabalho, Portugal simplificou e adaptou a utilização do seu regime de interrupção temporária do trabalho. Uma utilização mais focalizada dos programas nacionais e da União poderá preservar o emprego e a atividade económica, nomeadamente entre as pequenas e médias empresas (PME). Na fase de retoma, a prossecução de políticas ativas do mercado de trabalho focalizadas e personalizadas, destinadas nomeadamente a assegurar a melhoria das competências e a requalificação profissional, irá desempenhar um papel decisivo para manter a população ativa apta a reintegrar o mercado de trabalho. A cooperação entre os empregadores, as instituições de ensino e formação e os serviços públicos de emprego será fundamental para gerar uma retoma dos recrutamentos.

(19)O surto de COVID-19 exige a tomada de medidas para atenuar as repercussões sociais e proteger as pessoas em situação vulnerável, por forma a não exacerbar as desigualdades. Essas medidas incluem regimes de subsídios de desemprego e de apoio ao rendimento a favor dos trabalhadores mais afetados, incluindo trabalhadores por conta própria e trabalhadores atípicos, bem como o acesso a serviços e medidas de promoção da reinserção no mercado de trabalho. A execução de um plano nacional de contingência no domínio social, em cooperação com os parceiros sociais e a sociedade civil, poderá contribuir para dar uma resposta imediata e coordenada à crise, a fim de atenuar as suas consequências sociais. É de referir o efeito positivo, em termos de distribuição do rendimento, que resultou da introdução de alterações estratégicas destinadas a inverter o declínio na eficácia das transferências sociais nos últimos anos como, por exemplo, o aumento do rendimento mínimo, o complemento solidário para idosos, bem como as pensões e as prestações familiares. Todavia, em 2018 as transferências sociais (excluindo pensões) só reduziram a percentagem da população em risco de pobreza em 23,8 % em Portugal, muito abaixo da média da UE (34 %). Além disso, a adequação do regime de rendimento mínimo figura entre as mais baixas da União, proporcionando um rendimento correspondente a apenas 40% do limiar nacional de pobreza.

(20)A pandemia de COVID-19 gerou uma procura importante no que se refere à utilização de tecnologias digitais para garantir o acesso continuado ao ensino e às atividades empresariais, atendendo à necessidade de adotar medidas de distanciamento social. Os estabelecimentos de ensino e os centros de formação foram encerrados em Portugal e a aprendizagem tradicional com base na presença física foi interrompida. Aproximadamente 6 % das famílias não têm ainda acesso à Internet, o que afeta cerca de 50 000 alunos, e a cobertura da rede de telecomunicações varia muito consoante se trate de zonas urbanas ou rurais. Os estudantes oriundos de famílias mais favorecidas do ponto de vista socioeconómico estão em melhores condições de fazer face aos desafios colocados pelo ensino à distância. Além disso, Portugal apresenta um elevado défice de competências digitais. Em 2019, 48 % da população não dispunha de competências digitais básicas, incluindo cerca de 26 % que não tinham quaisquer competências digitais, e a percentagem de pessoas que nunca utilizaram a Internet é o dobro da média da UE. As circunstâncias atuais exigem a realização intensiva de cursos de formação à distância, bem como o desenvolvimento de esforços para ajudar as pessoas afetadas pela exclusão digital a superar os obstáculos enfrentados no acesso à aprendizagem à distância. A adoção, pelas empresas, de tecnologias digitais, a fim de propor modalidades alternativas de trabalho e serviços digitais, permitirá assegurar a continuidade das atividades das empresas cujos serviços podem ser prestados virtualmente, atenuando assim o impacto das restrições em alguns setores. Este aspeto é particularmente importante em Portugal, cuja economia se caracteriza essencialmente por microempresas concentradas em setores tradicionais. Um dos fatores principais que entrava a digitalização das PME é o défice de competências digitais, resultante dos baixos níveis gerais de literacia digital entre os gestores e os trabalhadores.

(21)Para prevenir a ocorrência de falências evitáveis e permitir às empresas superarem o choque e manterem-se competitivas, Portugal adotou uma série de medidas destinadas a apoiar as empresas viáveis, em especial as PME, que foram afetadas pela imposição de medidas de distanciamento social que implicaram restrições à realização de atividades, bem como uma queda da procura a nível nacional e mundial. Estas medidas visam sobretudo prestar apoio à liquidez, nomeadamente mediante garantias concedidas pelo Estado e por instituições financeiras, subvenções diretas, diferimentos de impostos e redução das contribuições para a segurança social. Concentram-se, em especial, nos setores mais afetados, incluindo o turismo, a hotelaria e as atividades económicas conexas, bem como nos setores da indústria transformadora e nas empresas exportadoras. É importante que essas medidas sejam aplicadas de forma atempada e eficiente pelas instituições públicas e pelos intermediários do setor privado. Neste contexto, o Governo português simplificou o processo de acesso às linhas de crédito, nomeadamente a documentação a apresentar pelas empresas. Aquando da conceção e aplicação destas medidas, impõe-se ter em conta a resiliência do setor bancário. Outras ações estratégicas visam apoiar o empreendedorismo e os trabalhadores por conta própria.

(22)Para promover a recuperação económica, será importante antecipar a realização de projetos de investimento público robustos e promover o investimento privado, nomeadamente através de reformas adequadas. Os investimentos favoráveis ao crescimento que visem apoiar a investigação e a inovação, a digitalização, a conectividade e a transição ecológica contribuirão para a retoma da economia portuguesa, bem como para a sua reorientação em direção a um crescimento sustentável a longo prazo. Os investimentos nas infraestruturas de transportes poderão contribuir para dar resposta à situação periférica de Portugal, nomeadamente ao colmatarem as lacunas em matéria de ligações ferroviárias com Espanha e ao permitirem explorar o potencial, atualmente subutilizado, dos portos portugueses. O plano nacional em matéria de energia e clima elaborado por Portugal faz notar as importantes necessidades de investimento para combater as alterações climáticas e assegurar a transição energética. Existe ainda uma margem alargada para melhorar a eficiência energética dos imóveis e reduzir o consumo de energia nas empresas. Uma melhor conectividade energética na Península Ibérica poderá permitir uma maior concorrência e facilitar a implantação das energias renováveis. O investimento pode igualmente ajudar a antecipar os efeitos adversos das alterações climáticas (por exemplo inundações e incêndios florestais), bem como contribuir para melhorar a gestão da água e das águas residuais e desenvolver o potencial da economia circular. A programação do Fundo para uma Transição Justa durante o período 2021-2027 poderá ajudar Portugal a enfrentar certos desafios levantados pela transição para uma economia com impacto neutro no clima, nomeadamente nos territórios abrangidos pelo anexo D do relatório relativo ao país 10 , Isto permitirá a Portugal tirar o melhor partido possível desse fundo. 

(23)O sistema judicial português tornou-se mais eficiente nos últimos anos, graças a uma série de medidas que continuam a ser implementadas. No entanto, a pandemia e a recessão dela resultante poderão conduzir a um maior número de litígios, o que é suscetível de agravar os estrangulamentos que subsistem, designadamente em termos de morosidade dos processos judiciais e do grande número de processos em atraso nos tribunais administrativos e fiscais. Uma maior eficiência e resiliência do sistema judicial poderão melhorar o quadro empresarial em benefício, nomeadamente, das PME e dos investidores nacionais.

(24)Ao passo que as presentes recomendações colocam a tónica em dar resposta às repercussões socioeconómicas da pandemia e em facilitar a retoma económica, as recomendações específicas por país adotadas pelo Conselho em 9 de julho de 2019 referiam também reformas que são essenciais para enfrentar os desafios estruturais de médio a longo prazo. Essas recomendações continuam a ser pertinentes e deverão continuar a ser monitorizadas ao longo do ciclo anual do Semestre Europeu no próximo ano. O mesmo é válido no que se refere às recomendações relativas às políticas económicas em matéria de investimento. Estas últimas recomendações devem ser tidas em conta na programação estratégica do financiamento da política de coesão após 2020, incluindo nas medidas destinadas a atenuar a crise atual, bem como nas estratégias de saída.

(25)Ao longo dos últimos anos, assistiu-se à concretização de várias melhorias globais no sistema bancário português. Os indicadores de rentabilidade melhoraram em consequência dos esforços envidados para aumentar a eficiência do setor e reduzir as provisões e imparidades. Com esta melhor rentabilidade, o sistema bancário prosseguiu a sua trajetória de reforço dos rácios de capital. Os níveis de fundos próprios continuam, porém, a ser inferiores à média da UE. O rácio de empréstimos não produtivos prosseguiu a sua trajetória descendente que perdura há vários anos, mas continua a ser o dobro do rácio da UE. A capacidade de gerar rendimentos continua a ser problemática numa conjuntura caracterizada por baixas taxas de juro e numa economia cujo nível de endividamento é ainda elevado. Mais recentemente, a desaceleração económica, a crise da COVID-19 e as baixas taxas de juro suscitam desafios para o setor bancário e refletir-se-ão na qualidade de crédito dos empréstimos concedidos. Por outro lado, os bancos portugueses continuam a estar expostos a certas regiões muito dependentes da evolução dos preços dos produtos de base, nomeadamente do petróleo. A exposição a estas áreas geográficas é sensível ao risco de mercado, ao risco cambial e ao risco de crédito, podendo afetar a qualidade de crédito dos empréstimos concedidos a empresas expostas às referidas áreas.

(26)A morosidade dos processos de insolvência foi identificada como um dos fatores essenciais que impedem os bancos de resolver rapidamente o problema inerente ao volume atual de empréstimos não produtivos. Este fator também influencia de forma significativa o valor dos referidos ativos no mercado secundário, uma vez que os resultados desses processos, aferidos enquanto pagamentos aos credores, são considerados insuficientes. A repartição dos empréstimos não produtivos continua a revelar uma proporção persistentemente elevada de empréstimos a empresas (cerca de dois terços), menos passíveis de uma abordagem rápida e normalizada. Nos últimos anos, introduziram-se diversas alterações quer nos processos de insolvência quer nos processos executórios de natureza cível. Novos ajustamentos, visando nomeadamente suprir os atrasos injustificados, ajudariam tanto os credores como os mutuários, permitindo a estes últimos beneficiar de um nova oportunidade.

(27)O Semestre Europeu assegura o quadro para uma coordenação contínua das políticas económicas e de emprego na União, passíveis de contribuir para uma economia sustentável. Os Estados-Membros fizeram o balanço dos progressos realizados no que respeita à execução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas nos seus Programas Nacionais de Reformas de 2020. Ao assegurar a plena implementação das recomendações que se seguem, Portugal contribuirá para a realização de progressos em direção à consecução dos ODS e para os esforços envidados em comum no sentido de garantir a sustentabilidade da competitividade na União.

(28)A estreita coordenação entre as economias da União Económica e Monetária é fundamental para assegurar uma rápida recuperação face ao impacto económico do surto de COVID-19. Portugal, enquanto Estado-Membro cuja moeda é o euro – e tendo em conta as orientações estratégicas emitidas pelo Eurogrupo – deve assegurar que as suas políticas continuam a ser consentâneas com as recomendações para a área do euro, bem como coordenadas com aquelas aplicadas pelos demais EstadosMembros da área do euro.

(29)No contexto do Semestre Europeu de 2020, a Comissão procedeu a uma análise exaustiva da política económica de Portugal, publicada no relatório de 2020 relativo a Portugal. A Comissão analisou igualmente o Programa de Estabilidade de 2020 e o Programa Nacional de Reformas de 2020, bem como o seguimento dado às recomendações dirigidas a Portugal em anos anteriores. A Comissão tomou em consideração não só a sua pertinência para a sustentabilidade da política orçamental e socioeconómica em Portugal, mas também a sua conformidade com as regras e orientações da União, dada a necessidade de reforçar a governação económica global da União mediante um contributo a nível da União para as futuras decisões nacionais.

(30)Tendo em conta essa avaliação, o Conselho examinou o Programa de Estabilidade de 2020, estando o seu parecer 11 consubstanciado, em especial, na recomendação 1 infra.

(31)Tendo em conta os resultados da apreciação aprofundada realizada pela Comissão e a presente avaliação, o Conselho analisou o Programa Nacional de Reformas de 2020 e o Programa de Estabilidade de 2020. As presentes recomendações têm em conta a necessidade de combater a pandemia e de facilitar a recuperação económica enquanto primeiro passo necessário para permitir um ajustamento dos desequilíbrios. As recomendações que incidem diretamente sobre os desequilíbrios macroeconómicos identificados pela Comissão nos termos do artigo 6.º do Regulamento (UE) n.º 1176/2011 estão consubstanciadas nas recomendações 1, 2, 3 e 4,

RECOMENDA que, em 2020 e 2021, Portugal tome medidas no sentido de:

1.Adotar, em consonância com a cláusula de derrogação geral, todas as medidas necessárias para combater eficazmente a pandemia, sustentar a economia e apoiar a recuperação subsequente. Quando as condições económicas o permitirem, prosseguir políticas orçamentais destinadas a alcançar situações orçamentais prudentes a médio prazo e a garantir a sustentabilidade da dívida pública, reforçando simultaneamente o investimento. Reforçar a resiliência do sistema de saúde e assegurar a igualdade de acesso a serviços de qualidade na área da saúde e dos cuidados de longa duração.

2.Apoiar o emprego e atribuir prioridade às medidas que visem preservar os postos de trabalho. Garantir uma proteção social suficiente e eficaz, bem como o apoio aos rendimentos. Apoiar a utilização das tecnologias digitais, a fim de assegurar a igualdade de acesso a um ensino e formação de qualidade e reforçar a competitividade das empresas.

3.Implementar medidas temporárias destinadas a proporcionar o acesso à liquidez por parte das empresas, em especial pequenas e médias empresas. Antecipar a realização de projetos de investimento público robustos e promover o investimento privado para estimular a recuperação económica. Focalizar o investimento na transição ecológica e digital, em especial na produção e utilização eficientes e não poluentes da energia, bem como nas infraestruturas ferroviárias e na inovação.

4.Aumentar a eficiência dos tribunais administrativos e fiscais.

Feito em Bruxelas, em

   Pelo Conselho

   O Presidente

(1)    JO L 209 de 2.8.1997, p. 1.
(2)    JO L 306 de 23.11.2011, p. 25.
(3)    SWD(2020) 521 final.
(4)    JO C 301 de 5.9.2019, p. 117.
(5)    COM(2020) 112 final.
(6)    COM(2020) 123 final.
(7)

   Regulamento (UE) 2020/460 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de março de 2020, que altera os Regulamentos (UE) n.º 1303/2013, (UE) n.º 1301/2013 e (UE) n.º 508/2014 no respeitante a medidas específicas para mobilizar investimentos nos sistemas de cuidados de saúde dos Estados-Membros e noutros setores das suas economias em resposta ao surto de COVID-19 (Iniciativa de Investimento Resposta ao Coronavírus) (JO L 99 de 31.3.2020, p. 5) e Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2020, que altera os Regulamentos (UE) n.º 1301/2013 e (UE) n.º 1303/2013 no que respeita a medidas específicas destinadas a proporcionar uma flexibilidade excecional para a utilização dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento em resposta ao surto de COVID-19 (JO L 130 de 24.4.2020, p. 1).

(8)    A despesa pública primária líquida é composta pelas despesas públicas totais, excluindo as despesas com juros, as despesas relativas a programas da União inteiramente cobertas por receitas de fundos da União e as alterações não discricionárias das despesas com subsídios de desemprego. A formação bruta de capital fixo financiada a nível nacional é repartida por um período de quatro anos. São tidas em conta as medidas discricionárias do lado da receita e os aumentos de receitas impostos por lei. As medidas pontuais, tanto do lado da receita como da despesa, são compensadas entre si.
(9)    A incidência orçamental é expressa em percentagem do PIB em 2020, de acordo com as previsões da Comissão da primavera de 2020.
(10)    SWD(2020) 251 final.
(11)    Nos termos do artigo 5.º, n.º 2, do Regulamento (CE) n.º 1466/97 do Conselho.
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