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Document 52016DC0752

    RELATÓRIO DA COMISSÃO Relatório final do inquérito setorial sobre os mecanismos de capacidade

    COM/2016/0752 final

    Bruxelas, 30.11.2016

    COM(2016) 752 final

    RELATÓRIO DA COMISSÃO

    Relatório final do inquérito setorial sobre os mecanismos de capacidade

    {SWD(2016) 385 final}


    RELATÓRIO DA COMISSÃO

    Relatório final do inquérito setorial sobre os mecanismos de capacidade

    1. Introdução

    A estratégia europeia «União da Energia» visa garantir uma energia segura, sustentável e a preços acessíveis aos consumidores europeus 1 . Não obstante os importantes progressos alcançados na concretização destes objetivos, a preocupação com a segurança do fornecimento de eletricidade tem vindo a crescer num número cada vez maior de Estados-Membros. No intuito de evitar possíveis insuficiências no fornecimento de eletricidade, alguns Estados-Membros já criaram ou pretendem criar diferentes tipos de mecanismos de capacidade. Estes mecanismos preveem a remuneração dos produtores de eletricidade e outros fornecedores de capacidade, nomeadamente operadores que usem soluções de resposta do lado da procura, para que estejam disponíveis em caso de necessidade.

    Os apoios públicos a fornecedores de capacidade podem criar distorções de concorrência no mercado da eletricidade e, em princípio, constituem auxílios estatais. Muitas vezes, os mecanismos de capacidade só concedem subvenções aos fornecedores de capacidade nacionais, ignorando o valor das importações e distorcendo os sinais de investimento. Tal significa a perda de muitos dos benefícios de um mercado interno da energia aberto e bem conectado e o aumento dos custos para os consumidores. Além disso, estes mecanismos por vezes favorecem certas tecnologias ou agentes do mercado, sem qualquer justificação objetiva, ou impedem a entrada de novos operadores concorrenciais no mercado da eletricidade. Esta situação falseia a concorrência, pode comprometer os objetivos de descarbonização e eleva o preço a pagar pela segurança do aprovisionamento. Por conseguinte, em 29 de abril de 2015, a Comissão lançou um inquérito setorial em matéria de auxílios estatais, para compreender melhor a necessidade, a forma e a incidência no mercado dos mecanismos de capacidade.

    O presente relatório final expõe as principais conclusões do inquérito, fornecendo mais pormenores no relatório junto em anexo 2 . Descreve as situações em que os mecanismos de capacidade constituem auxílios estatais e explica a posição da Comissão sobre estes mecanismos à luz das regras aplicáveis em matéria de auxílios estatais 3 4 . Ao aplicar estas regras, a Comissão pretende garantir que os Estados-Membros apenas introduzem mecanismos de capacidade quando é necessário e que o fazem sem compartimentar o mercado interno da energia em mercados nacionais, em detrimento dos consumidores e, eventualmente, dos objetivos climáticos.

    Durante o inquérito setorial, os serviços da Comissão centraram a sua análise nos mercados de eletricidade de onze Estados-Membros que já introduziram, ou tencionam introduzir, mecanismos de capacidade 5 . Os referidos serviços recolheram numerosas informações junto dos Estados-Membros, autoridades reguladoras da energia, associações e operadores de mercado, em reuniões e através de duas séries de questionários dirigidas a mais de 200 interessados. Em 13 de abril de 2016, a Comissão publicou um relatório intercalar sobre o inquérito setorial para consulta pública 6 . O presente relatório tem em conta as 114 respostas recebidas na sequência do relatório intercalar 7 .

    O presente relatório e respetivos anexos são apresentados juntamente com um pacote de propostas legislativas no âmbito dos esforços desenvolvidos para a criação de uma União da Energia da UE, com políticas visionárias em matéria de alterações climáticas. O pacote contém propostas legislativas destinadas a melhorar a conceção e o funcionamento dos mercados da eletricidade («iniciativa "Configuração do Mercado"»), incluindo propostas para melhorar as políticas de adequação da produção nacional baseadas nos resultados do inquérito setorial, que deverão, a prazo, reduzir a necessidade de mecanismos de capacidade para garantir a segurança do aprovisionamento 8 .

    2. Preocupações com a segurança do aprovisionamento

    2.1. Existe um problema de segurança de aprovisionamento de eletricidade hoje na UE?

    Desde o início da crise económica e financeira em 2008, a procura de eletricidade na UE baixou. A capacidade total de produção instalada, durante o mesmo período, continuou a aumentar 9 . Por conseguinte, as margens de capacidade 10 aumentaram 11 , e, desde 2010, os picos de preços nos mercados da eletricidade tornaram-se menos frequentes 12 . O inquérito setorial confirmou que as insuficiências de capacidade que deram origem a cortes de eletricidade para os consumidores, devido a uma produção insuficiente de eletricidade, foram extremamente raras nos últimos cinco anos 13 . Por outras palavras, a UE, no seu conjunto, conhece hoje uma situação de sobrecapacidade.

    No entanto, a situação varia entre os Estados-Membros. Alguns Estados-Membros parecem enfrentar verdadeiros desafios relacionados com a segurança do aprovisionamento, com diferente magnitude e duração, e existem problemas locais específicos nesta matéria em certas regiões de alguns Estados-Membros. Acresce que um número considerável das atuais centrais elétricas deverá desaparecer nos próximos anos. Algumas centrais elétricas aproximam-se do seu fim de vida operacional, outras não conseguem satisfazer as novas normas em matéria ambiental e de emissões, outras ainda serão progressivamente eliminadas por opções nacionais em matéria de política energética (p. ex., eliminação gradual da energia nuclear na Alemanha).

    Num plano mais geral, o setor europeu da eletricidade está a atravessar um período de transição sem precedentes. A liberalização dos mercados e os esforços para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa alteraram profundamente a forma como a eletricidade é produzida, comercializada e consumida. A produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis está a crescer rapidamente. Esta evolução reduziu os preços grossistas da eletricidade, mas também diminuiu a utilização de tecnologias convencionais de produção, como o carvão e o gás, porque as energias renováveis têm geralmente custos de produção mais baixos. Tanto o declínio da procura, como a redução dos preços e as menores taxas de utilização baixaram a rentabilidade da produção convencional de eletricidade. Paralelamente, as tecnologias convencionais flexíveis mantiveram um papel muito importante: a crescente utilização de fontes de energia renováveis, nomeadamente eólica e solar 14 , com uma produção variável em função das condições meteorológicas e dos períodos diurno e noturno, requer sistemas energéticos flexíveis, incluindo uma capacidade de reserva fiável, que possa assumir a forma de produção convencional, soluções de resposta à procura ou armazenamento, para garantir uma segurança contínua do aprovisionamento.

    Os Estados-Membros estão preocupados com a possibilidade de a atual capacidade de produção de eletricidade, mesmo com o investimento esperado numa nova capacidade, não ser suficiente para manter a segurança do aprovisionamento no futuro. Se a baixa rendibilidade de hoje da capacidade da produção tradicional apenas reflete a atual situação de sobrecapacidade, pode não haver razão para nos preocuparmos com a adequação futura da capacidade. No entanto, se essa baixa rendibilidade resulta igualmente de deficiências no mercado ou na regulamentação, os incentivos ao investimento podem revelar-se insuficientes para manter níveis adequados de capacidade a médio e longo prazo.

    2.2. Porque pode o investimento ser insuficiente para garantir um aprovisionamento seguro no futuro?

    Os operadores económicos decidem manter a capacidade atual ou investir em novas capacidades em função do lucro previsto.

    Para verificar se os mercados analisados são capazes de promover um investimento suficiente na capacidade para satisfazer a procura futura, o inquérito setorial procurou a existência de deficiências na regulação e/ou no mercado suscetíveis de entravar esse investimento. Com efeito, o inquérito identificou várias falhas no mercado que podem impedir os mercados de eletricidade de obter investimento suficiente para garantir a segurança do aprovisionamento. Em especial, segundo o inquérito setorial, para funcionarem eficazmente, os mercados da eletricidade dependem de uma subida suficiente dos preços nos períodos em que a oferta tem maior dificuldade em responder à procura. Os lucros gerados pelos elevados preços nestes períodos de «escassez» da oferta constituem um importante incentivo ao investimento, sobretudo para as tecnologias flexíveis que operam raramente e que necessitam, por isso, de recuperar os custos de investimento em relativamente poucas horas de funcionamento.

    Na prática, vários fatores limitam a capacidade dos mercados de eletricidade para oferecer preços elevados nos períodos de escassez. Em primeiro lugar, poucos consumidores individuais de eletricidade conseguem responder às variações de preços em tempo real e reduzir o consumo nas horas de pico, quando os preços são mais altos. Não havendo uma procura sensível aos preços, as regras adotadas pelas autoridades nacionais para equilibrar a oferta e a procura incluem, frequentemente, limites de preços regulamentados muito baixos, que não refletem a disponibilidade dos clientes para pagar um aprovisionamento seguro e que conduzem, portanto, a preços que não refletem o valor real de dispor de recursos adicionais adequados 15 . 

    Em segundo lugar, mesmo quando não existem limites de preços explícitos, as regras de gestão dos mercados de compensação, em que os próprios operadores de mercado ajustam em tempo real a produção de eletricidade à procura e que determinam, em última instância, o preço à hora da eletricidade, limitam na prática os preços nos mercados a prazo 16 . 

    Em terceiro lugar, uma delimitação clara das zonas de abastecimento 17 é crucial para que os mercados consigam enviar sinais de localização corretos para o investimento na produção e transporte. Quando os preços são fixados numa grande zona de abastecimento sem ter em conta as limitações do sistema de transporte, são necessárias medidas de «redispatching» fora do mercado, para parar uma parte da capacidade de produção e ativá-la noutro local (mediante um custo suplementar), dentro dessa grande zona, para equilibrar a rede. Este redespacho fora do mercado compromete os sinais de investimento e distorce os preços da eletricidade, criando subvenções ocultas para alguns consumidores e sobretaxas para outros 18 . Esta distorção de preços prejudica o comércio transfronteiriço e reduz os incentivos para investir numa maior capacidade de interconexão entre os Estados-Membros. O inquérito setorial demonstrou que a configuração atual das zonas de abastecimento na UE cria problemas significativos para o funcionamento e desenvolvimento de um mercado interno da energia eficiente.

    Por último, mesmo nos casos em que é permitida a fixação de preços para situações de escassez e em que as zonas de abastecimento estão devidamente delimitadas, os participantes no mercado podem ainda hesitar em investir numa nova capacidade, devido ao grau de incerteza considerável sobre a futura evolução do mercado, nomeadamente o impacto sobre o seu investimento da crescente quota de mercado das energias renováveis e, eventualmente, da extrema volatilidade dos preços.

    3.  Reformar o mercado da eletricidade

    O inquérito setorial identificou um conjunto de reformas do mercado, que poderão minimizar as preocupações com a segurança do aprovisionamento, ou mesmo eliminar totalmente a necessidade de mecanismos de capacidade. Os Estados-Membros deverão, por conseguinte, implementar estas reformas antes ou no momento de instituir qualquer mecanismo de capacidade.

    Os preços que refletem o valor real da eletricidade podem enviar sinais a favor de novos investimentos numa capacidade fiável e flexível, necessária para garantir a segurança do aprovisionamento de eletricidade. Eliminar os limites de preços excessivamente baixos, permitindo ao invés uma subida dos preços que reflita a disponibilidade para pagar dos consumidores é, pois, uma reforma crucial do mercado. As regras de equilíbrio do mercado devem ser melhoradas de forma que os custos suportados pelos operadores das redes, para manter o sistema equilibrado, sejam plenamente refletidos nos preços de compensação pagos pelos agentes do mercado que estão «em desequilíbrio» 19 . Todos os agentes do mercado devem beneficiar de incentivos e da oportunidade de apoiar o equilíbrio do sistema, garantindo que a sua produção e consumo de eletricidade real e medida corresponde à eletricidade que se comprometeram por contrato a comprar ou vender nos mercados a prazo 20 . 

    Os Estados-Membros podem preocupar-se com o facto de a eliminação dos limites de preços e o aumento dos preços grossistas em períodos de pico poderem afetar os preços a retalho. O inquérito setorial concluiu que tais riscos podem ser geridos pelo próprio mercado, através da introdução, por exemplo, de produtos de cobertura dos riscos que permitam aos fornecedores e aos consumidores finais protegerem-se contra os picos de preços, inclusive a longo prazo, através de contratos de compra garantidos a longo prazo 21 . Esta cobertura a longo prazo também pode contribuir para a apoiar a viabilidade comercial dos investimentos dos produtores, convertendo preços de escassez potenciais incertos num fluxo de rendimento regular certo. Uma maior utilização deste tipo de contratos deve, pois, ser encarada como um desenvolvimento útil que pode, desde logo, ajudar a reduzir a necessidade de mecanismos de capacidade.

    Além disso, as entidades reguladoras podem mostrar-se relutantes em permitir que os preços grossistas aumentem, quer por receio de abuso do poder de mercado, quer pela preocupação de que resultem em preços de venda a retalho mais elevados para as famílias e a indústria. O risco de abuso do poder de mercado associado a uma maior volatilidade dos preços pode ser mitigado, alargando a participação no mercado e aumentando a concorrência, e melhorando a transparência, a disponibilidade dos dados e a vigilância do mercado 22 . 

    Uma segunda reforma importante do mercado diz respeito à participação de operadores que oferecem soluções de resposta à procura no mercado. Melhorar a reatividade da procura à evolução dos preços em tempo real é crucial porque pode estabilizar picos de procura e, deste modo, reduzir a necessidade de capacidade de produção suplementar. No entanto, os referidos operadores continuam a confrontar-se com importantes obstáculos à sua participação no mercado e o quadro jurídico está fragmentado em toda a UE. Em alguns mercados, os operadores com soluções de resposta à procura não estão autorizados a participar, ao passo que noutros o regime de tarifação da rede ou a falta de regras técnicas tornam pouco atrativa ou mesmo impossível a participação ativa dos consumidores nos mercados.

    Por último, o inquérito setorial demonstra que a delimitação das zonas de abastecimento deve ser examinada e revista, de forma a permitir a formação de preços locais apropriados que estimulem o investimento nas capacidades de produção em locais onde estas não existam, bem como nas infraestruturas de transporte necessárias para encaminhar a eletricidade dos produtores para os consumidores.

    A iniciativa «Configuração do Mercado» contém propostas para abordar todas estas questões: o desenvolvimento de mercados de curto prazo que respondam à necessidade de aumentar as quotas de produção de energia eólica e solar, com quotas mais variáveis e menos previsíveis; regras harmonizadas para a participação dos operadores que oferecem soluções de resposta à procura; a harmonização dos produtos de compensação e regras aplicáveis à prestação transfronteiriça — um novo aumento da concorrência no mercado de compensação e uma melhoria do processo de definição das zonas de abastecimento.

    Os Estados-Membros que propõem mecanismos de capacidade deveriam envidar esforços adequados para responder às suas preocupações de adequação da capacidade através de reformas dos mercados. Por outras palavras, nenhum mecanismo de capacidade deverá ser um substituto para a reforma do mercado.

    4.    Quando implementar um mecanismo de capacidade?

    As reformas de mercado acima descritas podem solucionar muitas deficiências na regulação e no mercado que causam insuficiências de capacidade. Reformar plenamente o mercado pode, contudo, ser um processo moroso, ou pode não ser suficiente para resolver completamente o problema subjacente da adequação da capacidade. Por esta razão, alguns Estados-Membros decidiram adotar medidas complementares sob a forma de mecanismos de capacidade.

    Embora a conceção dos mecanismos de capacidade varie, todos oferecem aos fornecedores de capacidade receitas suplementares, sob a forma de pagamentos em troca da disponibilização da capacidade de produção de eletricidade. Esta remuneração pode constituir um auxílio estatal, que tem de ser notificado à Comissão para aprovação, de acordo com a legislação da UE nesta matéria. Em princípio, a Comissão considerará que um mecanismo de capacidade está sujeito às regras em matéria de auxílios estatais sempre que: i) a medida seja da iniciativa e/ou envolva a participação do Governo 23 , ii) o seu principal objetivo seja garantir a segurança do aprovisionamento de eletricidade 24 e iii) preveja uma remuneração dos fornecedores de capacidade, além das receitas obtidas, caso existam, com a venda da eletricidade.

    Após a notificação de uma medida, a Comissão, com base nas orientações relativas aos auxílios estatais em matéria de energia e ambiente, aprecia, em primeiro lugar, se é necessário superar algum problema específico de segurança de aprovisionamento que o mercado, por si só, não é capaz de resolver. Os Estados-Membros podem demonstrar que é o caso, fornecendo elementos de prova factuais de que o mercado tem poucas probabilidades de garantir o nível de segurança de aprovisionamento que consideram adequado — definido em relação a uma norma de fiabilidade económica baseada na disponibilidade dos consumidores para pagar. Tal significa identificar as deficiências do mercado que estão na origem do problema, quantificar o seu impacto provável nos investimentos e na fiabilidade do sistema e estimar a diferença entre o nível esperado e o nível desejado de segurança do aprovisionamento.

    As avaliações da adequação que a Comissão examinou até à data fornecem geralmente uma análise quantificada, mas o inquérito setorial revela que há ainda muito trabalho a fazer para que a introdução de mecanismos de capacidade se fundamente numa avaliação objetiva e aprofundada da adequação do sistema de energia elétrica. Quando as avaliações de adequação não são suficientemente fiáveis, s autoridades poderão ter de corrigir problemas de adequação a curto prazo, correndo o risco de as intervenções serem onerosas, distorcerem a concorrência e aumentarem a incerteza no mercado.

    Em primeiro lugar, as abordagens e práticas utilizadas para calcular a adequação da capacidade variam consideravelmente entre os Estados-Membros. Dado que os Estados-Membros utilizam metodologias, métricas e pressupostos diferentes, e uma vez que estes não são claramente comunicados, é difícil garantir resultados fiáveis e comparáveis. Os participantes no inquérito setorial defenderam fortemente a necessidade de garantir avaliações da adequação mais comparáveis, verificáveis e objetivas. Para dar resposta a estas preocupações, a iniciativa «Configuração do Mercado» da Comissão propõe a introdução de uma avaliação da adequação dos recursos coordenada a nível europeu e baseada num método harmonizado.

    Em segundo lugar, muito pode ser melhorado no que diz respeito às abordagens adotadas pelos Estados-Membros em matéria de normas de fiabilidade, ou seja, o nível declarado de segurança do aprovisionamento desejado pelo Governo. Uma norma de fiabilidade economicamente eficiente baseia-se no valor que os consumidores de eletricidade atribuem à segurança do aprovisionamento. Por outras palavras, os Estados-Membros devem proceder a uma análise dos custos-benefícios para determinar em que medida é útil incentivar os operadores do mercado a respeitarem uma determinada norma de fiabilidade. Muitos Estados-Membros, contudo, não realizam essa análise, nem aferem o valor atribuído pelos consumidores ao fornecimento contínuo de eletricidade. Vários Estados-Membros que introduziram mecanismos de capacidade não definiram sequer uma norma de fiabilidade. Nos casos em que existem normas de fiabilidade, muitas vezes não são tidas em conta ao conceber os mecanismos de capacidade ou definir a sua dimensão.

    A nível da UE, a Rede Europeia de Operadores de Redes de Transporte de Eletricidade (REORT-E) está a desenvolver uma metodologia baseada nas probabilidades para avaliar a situação em termos de adequação da capacidade em toda a Europa. A iniciativa «Configuração do Mercado» da Comissão propõe novas melhorias para a avaliação e o desenvolvimento de metodologias aplicáveis à escala da UE para calcular normas de fiabilidade economicamente coerentes que sirvam de base para qualquer decisão de aplicação de um mecanismo da capacidade 25 . Prevê igualmente que os Estados-Membros com mecanismos de capacidade introduzam uma norma de fiabilidade que tenha por base o valor atribuído pelos consumidores à segurança do aprovisionamento.

    Uma avaliação rigorosa da adequação, tendo em conta a situação regional e baseada numa norma de fiabilidade económica bem definida, é essencial para identificar os riscos que pesam sobre a segurança do aprovisionamento e definir a dimensão necessária de um eventual mecanismo de capacidade.

    5.    Adaptar a solução ao problema

    Nos casos em que já foram implementadas ou estão previstas reformas do mercado, e uma avaliação adequada da capacidade tenha identificado uma deficiência residual na regulação ou no mercado, um mecanismo de capacidade pode ser apropriado para garantir a segurança dos fornecimentos de eletricidade aos consumidores. Existem diferentes tipos de mecanismos de capacidade, sendo alguns mais adequados do que outros para abordar os diferentes problemas de adequação.

    5.1    Que tipos de mecanismos de capacidade existem na Europa?

    O inquérito setorial identificou 35 mecanismos de capacidade nos onze Estados-Membros abrangidos. Podem ser divididos em duas categorias: mecanismos «específicos» e mecanismos «à escala do mercado», visando ambos garantir uma capacidade suficiente para satisfazer uma norma de fiabilidade. Os mecanismos específicos apoiam unicamente a capacidade suplementar necessária, além da capacidade garantida pelo mercado sem subvenções, ao passo que os mecanismos à escala do mercado apoiam todos os intervenientes no mercado necessários para respeitar a norma de fiabilidade. Estes mecanismos podem ainda subdividir-se em mecanismos «baseados no volume» e mecanismos «baseados nos preços». Nos mecanismos baseados no volume, a capacidade total necessária é previamente determinada e um processo baseado no mercado é então utilizado para estabelecer o preço a pagar. Nos mecanismos baseados nos preços, o preço é fixado administrativamente num nível calculado para gerar investimentos no montante de capacidade necessário.

    O inquérito setorial identificou três tipos de mecanismos específicos: as reservas estratégicas, em que uma parte da capacidade é conservada fora do mercado para ser utilizada em situações de emergência; os concursos para a criação de novas capacidades, em que são concedidos apoios a novos projetos de investimento frequentemente situados em zonas específicas; e uma remuneração de capacidade baseada nos preços, no quadro da qual são efetuados pagamentos administrativos a um subconjunto de capacidade no mercado.

    O inquérito setorial identificou igualmente três tipos de mecanismos à escala do mercado: os modelos de comprador centralizado, em que um comprador central adquire a capacidade necessária em nome dos fornecedores/consumidores; os regimes de obrigação descentralizada, em que os fornecedores têm a obrigação de tomar as suas próprias disposições para contratar a capacidade de que necessitam; e uma remuneração de capacidade baseada nos preços, no quadro da qual é disponibilizado um pagamento administrativo a todos os intervenientes no mercado.  

    Por último, o inquérito setorial identificou mecanismos de resposta à procura, também conhecidos por «regimes de interruptibilidade», em seis dos onze Estados-Membros. Estes mecanismos são específicos e apenas remuneram operadores que oferecem soluções de resposta à procura.

    5.2    Que mecanismo de capacidade é adequado para cada problema?

    Consoante o tipo de problema de adequação da capacidade identificado, podem ser apropriados diferentes tipos de mecanismos de capacidade. Os principais problemas de adequação encontrados no inquérito setorial podem ser classificados em quatro categorias:

    1.preocupações com a capacidade a longo prazo do mercado para promover investimento suficiente;

    2.preocupações de natureza temporária, quando a organização atual do mercado não envia sinais de investimento adequados, mas se espera que o mercado venha a ser eficaz a longo prazo;

    3.preocupações de natureza local (ou seja, num local específico num Estado-Membro) que não podem ser resolvidas com rapidez suficiente através do investimento no transporte de eletricidade ou de uma melhor delimitação de zonas de abastecimento e

    4.receios de que, sem um apoio adicional, os consumidores de energia não participem suficientemente na gestão da procura de eletricidade e na segurança do aprovisionamento.

    Preocupações com a adequação a longo prazo

    Nos casos em que são identificadas preocupações com a adequação a longo prazo, o mecanismo de capacidade mais apropriado para resolver o problema, limitando simultaneamente as distorções da concorrência e do comércio, é provavelmente um mecanismo à escala do mercado baseado no volume. Este mecanismo pode substituir as potenciais receitas obtidas em períodos incertos de preços elevados em tempos de escassez por um rendimento regular e garantido. Pode, por conseguinte, reforçar a segurança dos investimentos.

    Para assegurar a coerência entre as reformas de mercado necessárias para garantir as importações em tempo oportuno e a introdução de um mecanismo de capacidade, um mecanismo baseado em «opções de fiabilidade» pode ser a melhor escolha. Neste mecanismo, os agentes do mercado recebem um rendimento certo e regular associado à sua capacidade, mas perdem a oportunidade de beneficiar dos preços elevados em caso de escassez de eletricidade.

    Preocupações com a adequação temporária

    Quando as avaliações da adequação mostram e os decisores políticos estão convencidos de que, a longo prazo, o mercado pode ser reformado de modo a incentivar suficientemente o investimento, e desde que haja capacidade disponível suficiente para garantir a segurança do aprovisionamento até que os mercados procedam aos investimentos, não são necessárias intervenções a longo prazo 26 . Todavia, poderá ser necessário garantir que a capacidade existente não desaparece prematuramente.

    Em tais circunstâncias, uma reserva estratégica pode ser a resposta mais apropriada, porque pode ajudar a controlar a parte da capacidade existente que sai do mercado. Além disso, é possível limitar ao máximo as distorções do mercado se a reserva conservada for tão pequena quanto possível, for concebida de forma a não promover novas capacidades de produção 27 e for ela própria conservada fora do mercado para preservar os sinais de preços do mercado e os incentivos à manutenção da capacidade existente. A fim de assegurar o seu caráter temporário, as reservas estratégicas não devem exigir compromissos a longo prazo (por exemplo, contratos de um ano renováveis) ou longos prazos de execução. Devem igualmente prever, desde o início, uma data final clara ligada às reformas de mercado planeadas, o que contribuirá para preservar os futuros sinais de investimento.

    Preocupações com a adequação local

    As preocupações com a adequação de natureza local são, na maioria dos casos, abordadas de forma mais apropriada através da melhoria das ligações entre o local em causa e outros locais com capacidade suficiente. Sempre que uma melhoria das ligações não for possível (por exemplo, em ilhas remotas) ou quando for demasiado dispendiosa, a escassez local deve ser refletida nos preços locais da eletricidade, pois tal incentiva tanto o investimento em novas capacidades de produção como poupanças de energia por parte dos consumidores. Para tal, é necessária uma zona de abastecimento separada para o local em causa.

    Quando a criação de uma zona de abastecimento separada não é possível — porque, por exemplo, a zona deficitária é tão pequena que não existe qualquer concorrência e toda a capacidade na zona tem de ser inteiramente regulada —, pode ser apropriado introduzir um mecanismo de capacidade. Quando preocupações com a adequação a longo prazo forem identificadas e esteja a ser introduzido um mecanismo à escala do mercado, este mecanismo pode por vezes também ser adaptado para resolver um problema de adequação local. Por exemplo, a Itália prevê, e a Irlanda tenciona, criar diferentes zonas de preços de capacidade dentro de um mecanismo de capacidade à escala do mercado, para enviar sinais a favor de investimentos locais.

    Uma medida mais precisa também pode ser adequada para responder a uma preocupação de adequação local. Certas formas de reservas estratégicas podem ser limitadas a uma determinada região, tal como um concurso para novas capacidades. A dimensão destes mecanismos específicos pode ser adaptada ao défice de capacidade identificado. O risco particular dos concursos é, no entanto, que a nova capacidade possa obrigar a capacidade existente a sair do mercado e criar uma situação em que os intervenientes no mercado contem, no futuro, com os concursos para investir em novas capacidades em vez de reagirem aos sinais do mercado.

    Em conclusão, exceto para sistemas muito isolados, em que o transporte é exageradamente dispendioso, a introdução de novas infraestruturas de transporte ou as reformas estruturais dos mercados de eletricidade, refletindo as limitações dos locais, podem ser as soluções a longo prazo mais apropriadas para as preocupações de capacidade local. Os mecanismos de capacidade local poderão, contudo, ser instrumentos necessários enquanto estiverem a ser introduzidas as reformas exigidas.

    Preocupações com o papel dos consumidores de energia

    O quarto motivo de preocupação é que a procura dos consumidores de energia continue a ser inflexível, embora a procura flexível seja essencial para equilibrar com eficiência de custos um mercado da eletricidade, com crescente volatilidade dos preços grossistas, devido à produção variável de energia renovável e ao potencial dos elevados preços de escassez. Esta preocupação pode levar um Estado-Membro a introduzir um regime de interruptibilidade ou regras específicas para incentivar a resposta à procura, num mecanismo à escala do mercado baseado no volume.

    A apreciação inicial da Comissão de oito regimes de interruptibilidade adotados nos 11 Estados-Membros sugere que podem ser justificados, tendo em conta o seu contributo para a segurança do aprovisionamento a curto e a longo prazo 28 . A resposta à procura poderá ser um instrumento útil para equilibrar o sistema a curto prazo, e, a longo prazo, uma procura totalmente reativa pode eliminar a necessidade de mecanismos de capacidade, uma vez que permite aos consumidores pagar diferentes níveis de fiabilidade. No entanto, a adequação dos regimes de interruptibilidade — e, por conseguinte, a sua conformidade com as regras da UE em matéria de auxílios estatais — depende essencialmente da sua conceção e do seu funcionamento efetivo.

    As regras em matéria de auxílios estatais exigem geralmente que os mecanismos de capacidade se abram a todas as tecnologias 29 . No caso dos mecanismos de resposta à procura, no entanto, a ausência de concorrência entre os diferentes recursos pode ser justificada. Se um mecanismo de resposta à procura permite uma ampla participação de grandes e pequenas indústrias e dos agrupamentos de resposta à procura, não fornece capacidades excedentárias, tem por base um concurso e não se destina a influenciar a formação de preços de escassez de eletricidade adequados, pode ser uma forma apropriada de intervenção. Em contrapartida, é pouco provável que os mecanismos de resposta à procura em que demasiada capacidade é adquirida a apenas um subconjunto de grandes beneficiários industriais sejam aprovados ao abrigo das regras em matéria de auxílios estatais. Correm o risco de subvencionar as indústrias com utilização intensiva de energia, sem oferecer aos outros consumidores de eletricidade um valor correspondente em termos de reforço da segurança do aprovisionamento.

    As boas práticas identificadas no inquérito setorial também revelam que, quando um apoio específico está disponível para uma solução de resposta à procura, este apoio não deve permanecer disponível por um período de tempo indefinido. O objetivo deve ser o de apoiar o desenvolvimento da resposta à procura, para que, a longo prazo, esta possa competir no mercado (ou num mecanismo de capacidade à escala do mercado).

    As remunerações da capacidade são geralmente inadequadas

    Por último, no que diz respeito às «remunerações da capacidade», o inquérito setorial revela que há pouca probabilidade de estes mecanismos determinarem o preço correto da capacidade, uma vez que impedem que o mercado estabeleça esse preço de forma concorrencial, dependendo antes de um preço «administrativo». É, pois, improvável que reflitam corretamente a situação de escassez real. Comportam um risco elevado de sub ou sobrecontratação de capacidade, em especial porque estes mecanismos tendem a reagir lentamente à evolução do mercado. A presunção geral é, pois, de que é pouco provável que os mecanismos baseados nos preços sejam medidas apropriadas, independentemente da preocupação específica em causa.

    Escolher o tipo de mecanismo de capacidade adaptado ao problema identificado:

    para os riscos a longo prazo, os mecanismos de capacidade à escala do mercado são os instrumentos mais adequados, a par de reformas do mercado para limitar o papel do mecanismo de capacidade;

    para riscos temporários, uma reserva estratégica é provavelmente a solução mais adequada, durante o processo de reforma do mercado, para garantir a segurança do aprovisionamento a longo prazo. A reserva deve ser conservada fora do mercado;

    para um problema de adequação a nível local, a questão deve ser resolvida através da melhoria das ligações à rede ou a definição de zonas de abastecimento mais apropriadas, mas vários mecanismos podem ser instrumentos de transição apropriados;

    para desenvolver a flexibilidade do lado da procura, um regime de interruptibilidade pode ser uma solução adequada;

    é pouco provável que as remunerações de capacidade administrativas sejam apropriadas, porque a falta de concorrência implica um elevado risco de não se atingir o objetivo ou de sobrecompensação. 

    6.    Uma conceção mais cuidadosa

    Independentemente do tipo de mecanismo adotado, todos os Estados-Membros têm de fazer escolhas de conceção precisas relativamente a três elementos de base dos mecanismos de capacidade:

    elegibilidade: quem pode participar no mecanismo de capacidade?

    dotação: como fixar o preço da capacidade e selecionar os fornecedores de capacidade?

    conceção do produto: quais são as obrigações e as sanções aplicáveis aos fornecedores de capacidade?

    As decisões tomadas sobre todos estes pontos determinam a eficácia do mecanismo de capacidade para garantir a segurança do aprovisionamento ao menor custo possível e em que medida afeta a concorrência e as trocas comerciais entre fornecedores de capacidade que concorrem à subvenção no quadro do mecanismo, pelas distorções que provoca no mercado da eletricidade e nas trocas entre os Estados-Membros.

    6.1    Elegibilidade: quem pode participar?

    Em termos de elegibilidade, muitos dos atuais mecanismos de capacidade estão abertos apenas a um número limitado de fornecedores de capacidade. Em certos casos, alguns fornecedores de capacidade estão explicitamente excluídos da participação. Nos outros casos, certos requisitos como a dimensão, as exigências ambientais ou os curtos prazos de execução 30 , reduzem implicitamente o número de potenciais fornecedores de capacidade.

    As capacidades novas e existentes são frequentemente objeto de concurso separado e não incentivadas a concorrer no quadro do mesmo mecanismo de capacidade — perdendo uma oportunidade de intensificar a pressão concorrencial entre todos os participantes. Normalmente, a capacidade de outros países é normalmente excluída e alguns Estados-Membros nem sequer têm em conta a contribuição das importações ao avaliar a quantidade de capacidade interna necessária, o que origina uma série de sobrecapacidades nacionais.

    O inquérito mostrou também que os mecanismos de capacidade excessivamente seletivos podem conduzir a uma sobrecompensação dos seus participantes, uma vez que a pressão concorrencial é menor quando o processo de atribuição tem uma participação limitada. As remunerações a fornecedores de capacidade resultantes desta concorrência limitada são normalmente mais elevadas do que o financiamento de que necessitam efetivamente para fornecer o serviço de disponibilidade.

    Quando a elegibilidade é limitada, os Estados-Membros têm também tendência para introduzir mecanismos adicionais ao longo do tempo, de tal modo que, eventualmente, quase toda a capacidade tem a oportunidade de pedir apoio. Isto ajuda a explicar por que razão em apenas onze Estados-Membros foram encontrados 35 mecanismos 31 . Esta abordagem fragmentada da adequação da capacidade pode gerar ineficiências, e o recurso a múltiplos mecanismos de capacidade não é normalmente adequada, exceto quando um mecanismo adicional é utilizado para apoiar a resposta à procura. Por exemplo, quando é adotado um mecanismo de capacidade à escala do mercado, a introdução de um mecanismo de capacidade adicional tem de ser justificada demonstrando uma outra deficiência do mercado que não pode ser resolvida com o mecanismo à escala do mercado.

    No entanto, esta situação está a mudar. Observa-se uma tendência crescente e bem-vinda para adotar mecanismos abertos a um grupo mais alargado de potenciais fornecedores de capacidade e os novos mecanismos que estão a ser desenvolvidas em França, na Irlanda, na Itália e na Polónia foram todos concebidos para permitir a concorrência entre as diferentes tecnologias de capacidade e entre os recursos novos e existentes. A França e a Irlanda estão também a desenvolver planos para permitir a participação direta transfronteiriça nos seus mecanismos de capacidade. Tal é essencial para eliminar distorções dos sinais de investimento que favorecem o investimento interno e beneficiam os operadores históricos. Esta situação também incentiva a continuação do investimento na interconexão, onde esta constitui a forma mais rentável de reforçar a segurança do aprovisionamento. No relatório do inquérito setorial, a Comissão apresentou ideias para a aplicação prática da participação transfronteiriça. Na iniciativa «Configuração do Mercado», a Comissão propõe regras comuns vinculativas em matéria de participação transfronteiriça, para reduzir a complexidade, ineficiência e, em última análise, os custos para os consumidores, e respeitar os objetivos de descarbonização dos Estados-Membros.

    Embora, de um modo geral, existam fortes benefícios de uma elegibilidade máxima, o inquérito setorial identificou duas exceções a esta regra. Em primeiro lugar, a importância da resposta à procura a longo prazo como solução para as deficiências do mercado pode justificar regimes de interruptibilidade limitados apenas às soluções de resposta à procura. Em segundo lugar, uma vez que só se justificam reservas estratégicas para resolver problemas temporários, e uma vez que devem ser concebidas para ter uma interferência mínima no mercado, não são suscetíveis de promover novas capacidades que exigem compromissos a longo prazo.

    6.2    Dotação: como fixar o preço da capacidade e selecionar os fornecedores de capacidade?

    O inquérito setorial revelou a existência tanto de processos de atribuição administrativa, como de atribuição concorrencial. Num processo de atribuição administrativa, todos os fornecedores de capacidade elegíveis são selecionados sem concurso e o nível de remuneração da capacidade é previamente definido pelas autoridades públicas ou negociado bilateralmente entre as autoridades e o fornecedor de capacidade. Um concurso permite que os potenciais fornecedores de capacidade concorram entre si para fornecerem o nível exigido de capacidade, fixando o nível de remuneração da capacidade com base nas forças de mercado.

    Nos processos de atribuição administrativa não é provável que seja revelado o valor real da capacidade e, consequentemente, que o contrato apresente uma boa relação custo-benefício, uma vez que comporta o risco de sub ou sobrecapacidade. A falta de um processo concorrencial também impede que o consumidor beneficie de uma melhor relação de preços. Em Espanha, por exemplo, o custo de um serviço de interruptibilidade desceu quase para metade após a introdução de um leilão concorrencial. Os concursos são, em princípio, instrumentos mais eficazes, combinados com regras de elegibilidade que assegurem condições de concorrência entre todos os fornecedores capazes de garantir a capacidade necessária.

    Até agora, os processos administrativos e concorrenciais têm sido igualmente comuns nos 11 Estados-Membros abrangidos pelo inquérito, mas os mecanismos novos ou revistos planeados pelos Estados-Membros utilizam cada vez mais os concursos. A Irlanda e a Itália, por exemplo, tencionam substituir os processos administrativos por leilões concorrenciais.

    6.3    Produto de capacidade: o que têm de fazer os fornecedores de capacidade?

    Todos os mecanismos de capacidade incluem certas obrigações que os fornecedores de capacidade têm de respeitar, desde a obrigação de construir e explorar uma central elétrica, até obrigações relacionadas com o cumprimento das instruções do operador de rede (p. ex., produção de eletricidade), obrigações que são mais complexas (p. ex., opções de fiabilidade que requerem compensações financeiras quando o preço de exercício é ultrapassado por um preço de referência).

    Existem também muitas regras diferentes para as situações de incumprimento pelos fornecedores de capacidade (sanções). Alguns mecanismos excluem simplesmente os fornecedores de capacidade de qualquer remuneração futura, mas a maioria exige a restituição dos montantes recebidos ou o pagamento de uma sanção adicional.

    O inquérito setorial concluiu que, quando as obrigações são limitadas e as sanções em caso de incumprimento são de baixo valor, não há incentivo suficiente para que as instalações sejam fiáveis. Tanto as sanções dos mecanismos de capacidade como os preços de escassez de eletricidade enviam sinais de produção ou de redução da procura em situações de escassez. Contudo, apenas os preços da eletricidade fornecem um sinal para as importações dentro do mercado interno da energia. A fim de evitar distorções do comércio transfronteiriço, os Estados-Membros devem, pois, evitar substituir os sinais de preços por sanções dos mecanismos de capacidade.

    Outra conclusão do relatório é que os mecanismos que incluem soluções de resposta à procura impõem, geralmente, obrigações diferentes para os prestadores de serviços de resposta à procura e para os produtores de eletricidade. Pode justificar-se uma certa diferenciação nas obrigações e sanções aplicáveis à produção e às soluções de resposta à procura, pelo menos a curto prazo, para permitir o desenvolvimento da resposta à procura, o que, a longo prazo, garantirá uma resposta mais adequada às deficiências subjacentes do mercado do que os mecanismos de capacidade.

    6.4    Minimizar as distorções da concorrência e do comércio através de uma conceção adequada

    Os mecanismos de capacidade podem distorcer a concorrência no mercado da eletricidade, quer no interior do Estado-Membro de estabelecimento do mecanismo quer além-fronteiras. No entanto, o inquérito setorial apurou que estas distorções podem, em grande medida, ser superadas garantindo um elevado grau de concorrência no próprio mecanismo de capacidade.

    Em primeiro lugar, nos mercados de eletricidade concentrados, os mecanismos de capacidade podem provocar distorções de concorrência no mercado da eletricidade do Estado-Membro de estabelecimento do mecanismo. Tal sucede quando as receitas do mecanismo de capacidade essencialmente acrescem à capacidade existente detida pelos operadores históricos. Esta situação aumenta os obstáculos à entrada para os concorrentes e reforça a concentração do mercado da eletricidade. Um processo concorrencial e aberto de seleção dos fornecedores de capacidade, em que novos operadores de todas as tecnologias podem concorrer com os atuais fornecedores de capacidade, contribuirá grandemente para reduzir as distorções da concorrência. Podem ser necessárias garantias adicionais (p. ex., certificados de transação transparentes e organizados), para criar condições equitativas de concorrência para os novos operadores, em particular em sistemas descentralizados. Em contrapartida, em determinadas circunstâncias, pode ser possível utilizar os mecanismos de capacidade para ajudar uma nova entrada no mercado — por exemplo, oferecendo contratos de longa duração para novas capacidades ou um prémio para a participação em concursos.

    Em segundo lugar, os mecanismos de capacidade criam distorções transfronteiriças, quer alterando os sinais para o comércio da eletricidade, quer afetando os incentivos ao investimento em capacidades nacionais e estrangeiros, bem como em termos de interconexões.

    Dada a importância dos preços da eletricidade enquanto sinal de importações e exportações de eletricidade eficientes no mercado interno da energia, os mecanismos de capacidade devem ser concebidos para coexistir com os preços elevados de escassez de eletricidade. Um Estado-Membro que opte por recorrer aos preços da eletricidade pode atrair importações na altura certa e, ao mesmo tempo, proporcionar incentivos fortes à fiabilidade. Reformas que permitam preços de escassez de eletricidade e uma conceção do produto de capacidade que coexista com os preços de escassez da eletricidade são, por conseguinte, fundamentais para evitar distorções das trocas comerciais 32 . 

    Além do impacto potencial sobre o comércio em períodos de escassez, os mecanismos de capacidade à escala do mercado têm em geral um impacto negativo nos preços da eletricidade, uma vez que os fornecedores de capacidade obtêm hoje parte do seu rendimento do mecanismo de capacidade e não do mercado da eletricidade. Se as receitas da capacidade só estão disponíveis para os fornecedores de capacidade nacionais, esta situação cria uma distorção a favor de investimentos na capacidade nacional, mais do que nas capacidades de outros países ou nas interconexões, que também garantem a segurança do aprovisionamento. Para transmitir sinais eficientes e evitar obstáculos no Mercado Interno da Energia, é pois essencial uma plena participação transfronteiriça nos mecanismos à escala do mercado.

    O inquérito setorial demonstrou que os mecanismos de capacidade devem ser abertos a todos os tipos de potenciais fornecedores de capacidade e basear-se num processo concorrencial de fixação dos preços para garantir que a concorrência reduz o preço pago pela capacidade. A concorrência entre fornecedores de capacidade deve ser tão ampla quanto possível e deve ser dada uma atenção especial a novas entradas.

    Os mecanismos de capacidade devem assegurar incentivos à fiabilidade e ser concebidos para coexistir com os preços de escassez de eletricidade, para evitar distorções comerciais inaceitáveis e uma sobrecapacidade no mercado interno.

    Os mecanismos de capacidade à escala do mercado devem ser abertos à participação transfronteiriça explícita para garantir incentivos à continuação do investimento nas interconexões e reduzir os custos a longo prazo da segurança de aprovisionamento da UE.

    7.    Conclusões e próximas etapas

    Tendo em conta a evolução em curso e as reformas dos mercados da eletricidade na UE, a Comissão continuará a acompanhar de perto a evolução dos mecanismos de capacidade e a melhorar as orientações definidas no presente relatório final e nos respetivos anexos, tendo em conta a sua prática decisória. Com base no inquérito setorial, podem ser estabelecidas oito conclusões gerais 33 . 

    Em primeiro lugar, tornou-se evidente que, não obstante a atual sobrecapacidade no conjunto da UE, há uma preocupação generalizada com a possibilidade de, no futuro, a capacidade de produção de eletricidade no mercado seja, ou se torne, insuficiente para garantir atempadamente uma segurança adequada do aprovisionamento.

    Em segundo lugar, as reformas do mercado da eletricidade são indispensáveis, uma vez que ajudarão a dar resposta às preocupações sobre a inadequada segurança do aprovisionamento. Contudo, a maioria dos Estados-Membros ainda não implementaram reformas adequadas. A iniciativa «Configuração do Mercado» da Comissão propõe, por conseguinte, um conjunto de reformas destinadas a melhorar o funcionamento dos mercados da eletricidade da UE e a Comissão irá exigir que os Estados-Membros implementem reformas para acompanhar a introdução prevista de qualquer mecanismo de capacidade.

    Em terceiro lugar, mesmo que, em princípio, um mercado reformado tenha potencial para garantir um aprovisionamento seguro, persiste a incerteza sobre se os preços de mercado cada vez mais voláteis e as raras situações de escassez podem influenciar as decisões de investimento a longo prazo. Por esta razão, alguns Estados-Membros decidiram introduzir mecanismos de capacidade para garantir a segurança do aprovisionamento de eletricidade. Estes mecanismos envolvem auxílios estatais e têm de ser notificados à Comissão Europeia de acordo com as regras em matéria de auxílios estatais. Estes mecanismos serão aprovados se os Estados-Membros demonstrarem a sua necessidade e se as distorções da concorrência forem reduzidas ao mínimo, em conformidade com as regras em matéria de auxílios estatais, tendo em conta os resultados do inquérito setorial, como resumido na presente comunicação.

    Em quarto lugar, é crucial proceder a uma avaliação rigorosa da adequação económica em relação a uma norma de fiabilidade económica precisa, para identificar os riscos para a segurança do aprovisionamento e determinar a dimensão necessária dos mecanismos de capacidade. Essa avaliação rigorosa permitirá reduzir de forma significativa os riscos de atribuição de uma sobrecapacidade e ajudará a limitar as distorções da concorrência geradas pelos mecanismos de capacidade criar. Uma maior harmonização na UE das avaliações da adequação contribuirá para aumentar a transparência e reforçar a confiança nos resultados dessas avaliações. A iniciativa «Configuração do Mercado» da Comissão propõe, por conseguinte, desenvolver uma metodologia de avaliação reforçada da adequação a nível da UE, bem como avaliações de adequação anuais a realizar pela Rede Europeia dos Operadores das Redes de Transporte de Eletricidade.

    Em quinto lugar, o tipo de mecanismo de capacidade escolhido deve ser adaptado ao problema identificado:

    sempre que um Estado-Membro identifique um risco a longo prazo de investimento insuficiente, os mecanismos de capacidade à escala do mercado (como adotado, por exemplo, no Reino Unido e França, e como previsto na Irlanda e Itália) são provavelmente a forma mais apropriada de intervenção. Devem também ser efetuadas reformas do mercado para limitar os auxílios estatais necessários através do mecanismo de capacidade;

    sempre que um Estado-Membro identifique um risco temporário, uma reserva estratégica é provavelmente a forma mais apropriada de intervenção, uma vez que se destina a abranger situações em que o mercado proporcionará a segurança do aprovisionamento a longo prazo, mas existem preocupações quanto à capacidade a curto ou a médio prazo. As reservas estratégicas só devem ser utilizadas em situações de emergência. Devem ser conservadas fora do mercado para minimizar as distorções no seu funcionamento diário. As reservas estratégicas devem constituir medidas transitórias que acompanhem reformas do mercado e ser eliminadas progressivamente logo que as reformas entrem em vigor;

    sempre que um Estado-Membro identifique um problema de adequação da produção local, a escolha do mecanismo dependerá das condições específicas de mercado. A longo prazo, porém, o problema local deve ser resolvido através de uma melhoria das ligações à rede ou de zonas de abastecimento mais adequadas que introduzam preços de eletricidade locais que reflitam o equilíbrio da oferta e da procura locais;

    sempre que um Estado-Membro manifestar a sua preocupação com um desenvolvimento insuficiente da flexibilidade do lado da procura, um regime de interruptibilidade pode ser uma solução adequada, mas deve evitar-se que o sistema se torne numa subvenção a favor das indústrias de elevada intensidade energética;

    independentemente do mecanismo escolhido, deve ser revisto periodicamente a fim de verificar a necessidade de manutenção do mecanismo da capacidade;

    as remunerações administrativas da capacidade têm pouca probabilidade de ser apropriadas, independentemente do problema em causa, porque a ausência de um processo concorrencial comporta um elevado risco de não se atingir o objetivo ou de uma sobrecompensação.

    Em sexto lugar, os mecanismos de capacidade devem ser abertos a todos os tipos de potenciais fornecedores de capacidade. Este facto, combinado com um processo concorrencial de fixação de preços, garante que a concorrência reduza o preço pago pela capacidade. As únicas exceções são os mecanismos de resposta à procura, dada a sua especial capacidade para corrigir as deficiências subjacentes do mercado, bem como as reservas estratégicas, que não devem promover novas capacidades de produção, para minimizar as distorções do mercado.

    Em sétimo lugar, os mecanismos de capacidade à escala do mercado devem ser abertos à participação transfronteiriça explícita para minimizar as distorções da concorrência e do comércio transfronteiriço, garantir incentivos à continuação do investimento nas interconexões e reduzir os custos a longo prazo da segurança de aprovisionamento da UE.

    Por último, o inquérito setorial revelou que um certo número de mecanismos de capacidade existentes foi concebido de uma forma que aborda todos os problemas de concorrência. A Comissão irá trabalhar com os Estados-Membros no sentido de tornar gradualmente todos os atuais mecanismos de capacidade conformes com as regras em matéria de auxílios estatais, tendo em conta as conclusões do inquérito setorial, o que contribuirá para dar maior segurança aos fornecedores de capacidade e aos outros agentes económicos, bem como para enviar sinais corretos aos investidores.

    (1)

    1Comunicação da Comissão «Uma estratégia-quadro para uma União da Energia resiliente dotada de uma política em matéria de alterações climáticas virada para o futuro», de 25 de fevereiro de 2015, COM(2015) 80.

    (2)

     Documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha o relatório final do inquérito setorial sobre os mecanismos de capacidade, 30 de novembro de 2016, SWD(2016) 385.

    (3)

    As «Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014-2020» (EEAG) (2014/C, 200/01) incluem regras específicas para apreciar os mecanismos de capacidade na perspetiva do direito da concorrência.

    (4)

     Saliente-se que as conclusões do inquérito setorial são conclusões gerais que não substituem a necessidade de uma apreciação casuística de qualquer medida de auxílio estatal.

    (5)

    Bélgica, Croácia, Dinamarca, França, Alemanha, Irlanda, Itália, Polónia, Portugal, Espanha e Suécia.

    (6)

     C(2016) 2017 e SWD(2016)119.

    (7)

     Uma síntese das respostas à consulta pública figura em anexo ao relatório (documento de trabalho dos serviços da Comissão) que acompanha esta comunicação.

    (8)

     O pacote inclui revisões dos Regulamentos (CE) n.os 713/2009 e 714/2009, bem como da Diretiva 2009/72/CE. Inclui ainda uma proposta de novo regulamento em matéria de preparação para os riscos no setor elétrico, que revoga a Diretiva 2005/89/CE.

    (9)

    Esta divergência resulta, essencialmente, da implementação de decisões de investimento tomadas antes do início da crise. Embora a capacidade instalada total tenha aumentado de forma diferente em cada um dos 11 Estados-Membros abrangidos pelo inquérito setorial, aumentou mais de 30 % desde 2000 no conjunto da UE.

    (10)

    A margem de capacidade é normalmente calculada enquanto diferença entre a capacidade instalada e o pico (ou nível médio) da procura. A capacidade instalada pode ser ajustada de acordo com a sua disponibilidade prevista, para melhor indicar a margem de capacidade prevista.

    (11)

    A ENTSO-E considerou que a margem entre a quantidade de eletricidade necessária nos períodos de pico e a eletricidade que pode ser produzida com a capacidade disponível é de 13 % para o conjunto da UE («ENTSO-E: 2015 Scenario Outlook & Adequacy Forecast», disponível em https://www.entsoe.eu/Documents/SDC%20documents/SOAF/150630_SOAF_2015_publication_wcover.pdf ).

    (12)

    Os números publicados pela ACER revelam uma menor frequência de picos de preços nos mercados da eletricidade na UE desde 2010 («ACER Annual Report on the Results of Monitoring the Internal Electricity Market in 2015», disponível em: http://www.acer.europa.eu/Official_documents/Acts_of_the_Agency/Publication/ACER%20Market%20Monitoring%20Report%202015%20-%20ELECTRICITY.pdf ).

    (13)

    A única exceção significativa é a Polónia, onde uma vaga de calor, em agosto de 2015, levou a cortes de produção forçados.

    (14)

    As energias solar e eólica representaram 11 % da produção de eletricidade na UE-28 em 2014 (Eurostat). Contudo, se em alguns Estados-Membros são responsáveis durante certas horas por quase toda a produção, noutras não produzem nenhuma energia.

    (15)

    A imposição eficaz de limites de preços deve, em princípio, refletir a disponibilidade média dos consumidores para pagar a continuidade do aprovisionamento nos períodos de escassez, o chamado «valor da carga perdida» (VOLL).

    (16)

    Por exemplo, se forem demasiado baixas, as sanções aplicadas em caso de desequilíbrio no momento da distribuição podem agir como um limite de preços implícito nos mercados diários e noutros mercados a prazo, porque os operadores podem preferir pagar as sanções do que pagar os preços elevados.

    (17)

    As zonas de abastecimento definem-se como áreas de preços uniformes, ou seja, onde todas as propostas de oferta e procura são fixadas ao mesmo tempo e pelo mesmo preço.

    (18)

     Por exemplo, se houver demasiada procura e uma produção insuficiente numa determinada área dentro de grande zona de abastecimento, bem como uma rede de transportes insuficiente para conectar essa área ao resto da zona, os preços nessa área serão demasiado baixos em comparação com os custos reais de produção da eletricidade para consumo nessa área. Para outras áreas isoladas na zona de abastecimento em que a produção excede largamente a procura, os preços serão demasiado elevados. Consequentemente, os consumidores de uma parte da zona de abastecimento subsidiam os consumidores de outras partes e os preços de mercado permanecem distorcidos, pelo que os mercados não conseguem enviar sinais de investimento para os locais corretos. 

    (19)

     Os produtores que produzem menos do que prometido, ou os retalhistas que utilizam mais energia do que prometido, contribuem para o desequilíbrio total do sistema e, por conseguinte, têm de pagar preços de compensação. As propostas da iniciativa «Configuração do Mercado» preveem certas derrogações a este princípio geral (ver artigo 4.º da proposta de regulamento «Eletricidade»).

    (20)

    Nos casos em que a eliminação dos limites de preços não conduz ao surgimento desejado de preços de escassez, alguns operadores do mercado da eletricidade introduziram uma fixação administrativa de preços para situações de escassez. Trata-se de uma intervenção reguladora em que uma majoração de preços pré-determinada é aplicada automaticamente ao preço de mercado, à medida que aumenta a probabilidade de não satisfação da procura. Deste modo, com a redução das margens da capacidade, os preços da eletricidade serão automaticamente fixados num nível que refletirá o risco de escassez e que dará aos agentes do mercado fortes incentivos à produção (ou à redução da procura), quando o sistema mais necessitar de eletricidade. Exemplos de fixação administrativa de preços para situações de escassez podem ser encontrados no Texas e no mecanismo «reserve scarcity pricing function» no Reino Unido. A Irlanda está a introduzir um sistema semelhante.

    (21)

    Exemplos deste tipo de produtos de cobertura de riscos existem na Austrália e foram introduzidos na Alemanha pela EEX.

    (22)

     A aplicação da legislação em matéria antitrust pode igualmente impedir comportamentos anticoncorrenciais, mas não deve ser interpretada como um obstáculo à formação de preços de eletricidade elevados per se, quando estes preços representam o valor da eletricidade em períodos de escassez.

    (23)

    Um serviço puramente acessório desenvolvido e explorado de forma autónoma por um ORT não constitui um mecanismo de capacidade relevante do ponto de vista das regras em matéria de auxílios estatais.

    (24)

    Quando um Governo estabelece um regime de apoio às energias renováveis e concede subvenções a um operador de um parque eólico, é provável que o principal objetivo da medida seja a descarbonização do setor da eletricidade. Neste caso, embora a medida aumente a capacidade disponível no mercado, não é considerada um mecanismo de capacidade e, por conseguinte, será apreciada à luz das regras aplicáveis ao apoio às energias renováveis.

    (25)

    Prevê, por exemplo, a obrigação de ter em conta uma avaliação económica da rendibilidade futura do parque de produção (que pode incluir a avaliação do impacto da evolução prevista dos preços dos diferentes combustíveis e do preço do carbono), o contributo das reformas do mercado previstas e o impacto potencial de um maior investimento nas soluções de resposta à procura e nas redes.

    (26)

    Uma reserva estratégica pode igualmente ser utilizada como instrumento para colmatar uma lacuna, se necessário, até introduzir um mecanismo de capacidade à escala do mercado baseado no volume, e também pode ser útil para evitar um período de transição no mecanismo à escala do mercado em que os prazos de execução dos leilões são demasiado curtos para assegurar a concorrência de novos operadores.

    (27)

    As novas capacidades de produção necessitam geralmente de compromissos a longo prazo, para poderem competir com as capacidades existentes. É improvável que estes compromissos a longo prazo sejam compatíveis com a necessária natureza temporária de uma reserva estratégica.

    (28)

    Note-se que esta apreciação no âmbito do inquérito setorial não pode substituir a necessidade de uma apreciação individual de todas as medidas de auxílio estatal, não devendo esta declaração ser interpretada no sentido de que os mecanismos ainda não apreciados e sujeitos à decisão da Comissão serão considerados compatíveis.

    (29)

     Dentro dos limites dos objetivos em matéria de alterações climáticas, conforme reconhecido pelas orientações relativas aos auxílios no domínio da energia e do ambiente nos pontos (220) e (233) (e).

    (30)

    O «prazo de execução» é o tempo que medeia entre a atribuição de uma oferta de capacidade e o momento da execução.

    (31)

     Todavia, alguns são mecanismos antigos, outros estão apenas ainda planeados, e não são todos utilizados ao mesmo tempo.

    (32)

    O produto de capacidade «opção de fiabilidade» pode ser particularmente útil para alcançar este objetivo, porque deixa intactos os sinais do mercado e após a implementação dos preços de escassez não acarreta uma sanção adicional por incumprimento a acatar pelo mecanismo de capacidade.

    (33)

    Estas conclusões centram-se principalmente na aptidão de diversos mecanismos de capacidade para solucionar problemas de segurança do aprovisionamento de eletricidade do modo economicamente mais rentável e que minimize a distorção do mercado. No entanto, os mecanismos de capacidade podem afetar o cabaz de produção e, nessa medida, interagir com os instrumentos de política que visam promover a descarbonização. Tal como foi reconhecido nas orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia nos pontos (220) e (233)(e), a conceção dos mecanismos de capacidade deve ter em conta estes impactos, de modo a contribuir para a coerência global da política energética da UE nos mercados da eletricidade.

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