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Document 52015IR2700

    Parecer do Comité das Regiões Europeu — A dimensão local e regional do Acordo sobre o Comércio de Serviços (TiSA)

    JO C 51 de 10.2.2016, p. 39–42 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    10.2.2016   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 51/39


    Parecer do Comité das Regiões Europeu — A dimensão local e regional do Acordo sobre o Comércio de Serviços (TiSA)

    (2016/C 051/08)

    Relator:

    Helmuth MARKOV (DE-PSE), ministro da Justiça, dos Assuntos Europeus e da Proteção dos Consumidores do Estado federado de Brandeburgo

    RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

    O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU

    Observações preliminares

    1.

    O Acordo sobre o Comércio de Serviços (Trade in Services Agreement — TiSA) é um acordo comercial que está em negociações desde o início de 2013 entre os membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) (1), atualmente em número de cinquenta e um, incluindo a UE.

    2.

    As partes partilham o objetivo da liberalização do comércio de serviços, na medida em que estes constituem uma parte importante da economia mundial. Na UE, aproximadamente sessenta e oito por cento da mão de obra trabalha no setor dos serviços, estando dez milhões de postos de trabalho dependentes das exportações de serviços. A liberalização do comércio de serviços visa, em primeiro lugar, eliminar os obstáculos que se colocam aos prestadores de serviços para a prestação de serviços noutros países.

    3.

    Embora as negociações sobre o TiSA tenham lugar fora da OMC, este acordo tem de se coadunar com o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS), de modo que permita a eventual participação posterior de outros membros da OMC num acordo multilateral.

    Observações gerais

    4.

    O Comité das Regiões (CR), no seu parecer de 3 de julho de 2003 sobre as negociações do GATS da OMC, já declarava que as negociações sobre o comércio de serviços se revestiam de extrema importância por razões quer de economia regional (interesse das empresas, nomeadamente das PME, sedeadas na região num acesso facilitado aos mercados fora da UE), quer de interesse dos próprios órgãos de poder local e regional que amiúde regulam os serviços e, em determinados casos, também os prestam, e preocupava-se com o facto de as empresas sob a tutela das regiões e dos municípios não poderem vir a beneficiar do princípio de acesso mútuo ao mercado, devido à ligação à própria região.

    5.

    Estes pontos de vista também se aplicam às negociações do TiSA, bem como a observação de que os serviços públicos resultaram, no entendimento dos órgãos de poder local e regional, das suas tarefas e obrigações para com os cidadãos, devendo, por conseguinte, ser assegurada a perenidade do controlo democrático desses serviços, a sua continuidade, acessibilidade e qualidade.

    6.

    Acolhe favoravelmente a abordagem geral adotada no projeto de relatório do Parlamento Europeu que contém as recomendações à Comissão referentes às negociações relativas ao TiSA, segundo o qual o TiSA deverá proporcionar benefícios concretos aos consumidores e as partes interessadas devem ter acesso às negociações a fim de facilitar a futura multilateralização e, por conseguinte, «os serviços públicos e culturais, os direitos fundamentais à privacidade dos dados e as condições de trabalho justas, assim como o direito de legislar, não são negociáveis e devem ser inequivocamente excluídos do âmbito de aplicação do acordo». Acolhe igualmente com agrado as numerosas referências à dimensão local e regional das negociações sobre o TiSA feitas no projeto de relatório;

    7.

    sublinha que o Acordo sobre o Comércio de Serviços (TiSA) abrange apenas as disposições de acesso aos mercados e a não discriminação de prestadores estrangeiros, e não o direito da UE, dos Estados e dos respetivos poderes locais e regionais à autorregulação dos serviços;

    Recomendações gerais

    8.

    reconhece que os serviços são uma componente essencial da economia mundial e da economia da Europa e que uma maior liberalização do comércio de serviços, através do TiSA, deverá gerar múltiplas vantagens económicas em diversos países, sobretudo no setor privado;

    9.

    apoia o debate em curso sobre o TiSA e sublinha que importa encontrar um equilíbrio entre a necessidade de confidencialidade das partes nas negociações e a necessidade constante de transparência, de modo que assegure que se obtêm resultados legítimos, com o envolvimento de todas as partes interessadas; remete, neste contexto, para a prática atual da OMC em matéria de acesso do público aos documentos de negociação e espera que esta prática também seja aplicada em relação ao TiSA;

    10.

    louva os esforços da Comissão Europeia no sentido de lograr uma maior transparência nas negociações; salienta, contudo, que, apesar de a Comissão ter tornado acessível ao público o mandato de negociação, os representantes locais e regionais, representados a nível da UE pelo CR, devem ser convidados a participar nos diálogos da Comissão no início e no final de cada ronda de negociação;

    11.

    congratula-se com o facto de as diretrizes para a Comissão Europeia relativamente à negociação do acordo disporem que: «O acordo deve confirmar o direito da UE e dos seus Estados-Membros de regularem e introduzirem nova regulamentação sobre a prestação de serviços nos seus territórios, para cumprirem os objetivos das suas políticas públicas»;

    12.

    reitera, relativamente aos serviços públicos, a importância de uma referência aos artigos 14.o e 106.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) e ao Protocolo n.o 26 relativo aos serviços de interesse geral nas diretrizes de negociação do acordo e apela ao pleno respeito da autonomia a nível local e regional, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 2, do Tratado da União Europeia (TUE); lamenta, contudo, neste contexto, que, no domínio dos serviços públicos de interesse geral, se utilizem conceitos diferentes nos acordos de comércio atualmente em negociação pela UE (AECG, TTIP ou TiSA);

    13.

    recorda que as negociações sobre o TiSA não dizem respeito à privatização de serviços;

    14.

    sublinha a necessidade de recolher dados abrangentes e comparáveis sobre o impacto das disposições do TiSA a nível local e regional e de atualizar os relatórios estatísticos e as previsões económicas com base nesses dados e nas avaliações de impacto;

    15.

    manifesta a sua preocupação com o facto de a Avaliação de Impacto da Sustentabilidade constante das diretivas de negociação (2) da UE ainda não ter terminado. Apela para que, nesta avaliação, se tenha em conta o impacto do TiSA na coesão territorial (avaliação do impacto territorial);

    16.

    sublinha a obrigação, nos termos do artigo 11.o do TFUE, de que as exigências em matéria de proteção do ambiente sejam integradas na política de comércio externo da UE, em especial com o objetivo de promover um desenvolvimento sustentável;

    17.

    alerta a Comissão, no âmbito das negociações sobre o TiSA, para as necessidades específicas do nível local e regional. Esta tarefa poderia ganhar uma importância considerável se, com base no parecer do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) sobre o acordo de comércio livre entre a UE e Singapura, se confirmasse que o TiSA tem as características de um acordo de comércio misto, sujeito, em diversos Estados-Membros, à ratificação das câmaras que representam o nível regional;

    18.

    recorda que o artigo 3.o, n.o 1, do TFUE dispõe que a política comercial comum constitui um domínio da competência exclusiva da União. Contudo, tendo em conta o princípio da subsidiariedade, importa clarificar numa fase inicial a distribuição das competências nas negociações comerciais, nos casos em que as negociações em causa têm efeitos sobre domínios da competência dos Estados-Membros;

    Propostas

    19.

    apoia a abordagem segundo a qual, no que diz respeito à não discriminação, seria utilizada uma lista negativa com os domínios que devem ser excluídos do acordo e, no que diz respeito ao acesso aos mercados, uma lista positiva dos domínios de intervenção a que o Acordo sobre o comércio de serviços se deve aplicar;

    20.

    espera que, apesar de as estratégias baseadas em dados serem essenciais para a atividade empresarial e o crescimento, só sejam utilizadas se não prejudicarem o direito dos cidadãos a uma proteção adequada da privacidade (ou seja, uma proteção dos dados pessoais abrangente e incondicional); solicita, por conseguinte, uma exceção geral incondicional para as medidas de proteção da privacidade no tratamento e divulgação de dados pessoais e na proteção da confidencialidade de registos e contas pessoais, em conformidade e na continuação do artigo XIV do GATS; além disso, rejeita a aplicação do acordo a medidas de proteção de dados enquanto não existir na UE um quadro jurídico abrangente em matéria de proteção de dados que acompanhe a evolução digital;

    21.

    rejeita qualquer restrição da soberania regulamentar dos governos e dos órgãos de poder local e regional, nomeadamente nos domínios da educação, cultura, teatro, bibliotecas, museus e finanças, bem como no que se refere à saúde e segurança no trabalho, proteção do ambiente, proteção de dados, serviços sociais e de saúde financiados por fundos públicos, licenciamento de estabelecimentos de saúde e laboratórios, instalações de tratamento de resíduos e centrais elétricas, normas de defesa do consumidor, normas sobre a coesão social, escolas e serviços educativos com financiamento público e outros serviços educativos com financiamento privado, bem como regras aplicáveis aos contratos públicos;

    22.

    rejeita restrições ao financiamento cruzado de empresas pertencentes aos mesmos órgãos de poder local e regional, se estas restrições excederem as impostas pelo direito da União e pela legislação dos Estados-Membros;

    23.

    exorta à adoção de uma cláusula de revisão, que permita um eventual reexame do acordo e a inclusão no mesmo de uma regra, de modo que permita, a qualquer momento, anular decisões sobre a liberalização dos serviços;

    24.

    opõe-se à inclusão de cláusulas que obriguem as entidades a manter o statu quo atingido à data do acordo (cláusula de standstill), proíbam a restituição ao setor público de um serviço liberalizado (ajustamento — ratchet) e obriguem qualquer novo serviço à liberalização automática e total (salvaguarda do futuro);

    25.

    é de opinião que o TiSA deve estabelecer apenas as normas mínimas necessárias, sem limitar o direito a aplicar normas mais elevadas;

    26.

    exorta à introdução de um capítulo social no TiSA que, com base nas convenções pertinentes da OIT, estabeleça normas de proteção social, designadamente normas laborais, sem que este capítulo inviabilize a multilateralização do TiSA;

    27.

    solicita a garantia do princípio do país de destino em caso de normas diferentes, em especial no setor da modalidade 4 (livre circulação dos prestadores de serviços temporários e trabalhadores transferidos dentro de um grupo de empresas), para respeitar os requisitos de qualificação da mão de obra e o direito do trabalho e das convenções coletivas de trabalho do país de destino; a livre circulação dos prestadores de serviços temporários e trabalhadores transferidos dentro de um grupo de empresas não pode nem deve ser utilizada indevidamente para evitar greves nem contornar as convenções coletivas de trabalho (através da contratação temporária de trabalhadores);

    28.

    apela para que, no texto de negociação, seja plenamente reconhecido o direito de o governo regular no interesse público («direito de regular»), a nível europeu, nacional, regional e local, e parte do princípio de que a cooperação em matéria de regulamentação não poderá, em caso algum, comprometer a legislação ou a regulamentação democrática nem atrasar o processo da sua elaboração;

    29.

    exorta a que o TiSA contemple a possibilidade de fiscalizar judicialmente o respeito dos direitos humanos no comércio de serviços;

    30.

    apela a que os litígios relativos ao cumprimento deste acordo possam ser resolvidos por tribunais públicos da comarca a que pertence o demandado, bem como na língua do seu país e segundo a legislação aí em vigor, e que seja possível interpor recursos; o procedimento de resolução de litígios entre Estados deveria recorrer ao mecanismo atualmente existente a nível da OMC. Um mecanismo de resolução de diferendos entre investidores e Estados não é desejável neste acordo;

    31.

    propõe que se considere a inclusão de disposições sobre proteção dos consumidores em linha, nomeadamente no que respeita a atividades fraudulentas, bem como a um direito especial no contexto das vendas aos consumidores, seguindo o modelo do Regulamento Bruxelas I;

    32.

    espera a garantia da prestação do serviço universal, nomeadamente para garantir que os cidadãos em regiões remotas, fronteiriças, insulares, de montanha, etc. não tenham de suportar reduções da qualidade nem encargos financeiros mais pesados do que os cidadãos que se encontram em aglomerações urbanas;

    33.

    recusa que as disposições locais e regionais em matéria de ordenamento do território e de planeamento regional do desenvolvimento e do urbanismo sejam classificadas como obstáculos não pautais ao comércio;

    34.

    congratula-se por os serviços audiovisuais terem sido explicitamente excluídos das negociações; lamenta, no entanto, que esta regra não se aplique aos serviços culturais; está, por isso, preocupado com a dificuldade em distinguir entre serviços culturais e exige a salvaguarda da diversidade linguística e cultural local, tendo especialmente em conta os interesses das minorias, bem como os direitos de autor e a propriedade intelectual;

    35.

    rejeita compromissos no domínio dos serviços financeiros que sejam contrários às disposições da UE em matéria de regulação dos mercados e produtos financeiros;

    36.

    aguarda com expectativa uma segunda consulta pública sobre o Acordo sobre o Comércio de Serviços (TiSA) e insta a Comissão Europeia a ter em consideração os resultados desta consulta e da anterior na sua avaliação final das disposições do presente acordo;

    37.

    solicita que as negociações do TiSA sejam concebidas de forma aberta, permitindo aos países em desenvolvimento e aos países menos avançados associarem-se, se assim o pretenderem;

    38.

    realça a necessidade de uma abordagem multilateral para alcançar a convergência mundial;

    39.

    encoraja a negociação de regras comerciais que contribuam não só para um comércio justo e equitativo mas também para o desenvolvimento sustentável, e acolhe com agrado, neste contexto, o anúncio feito pela Comissão Europeia, na sua estratégia comercial, de que a política comercial europeia deve estar em consonância com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

    Bruxelas, 4 de dezembro de 2015.

    O Presidente do Comité das Regiões Europeu

    Markku MARKKULA


    (1)  Os membros que atualmente participam nas negociações do TiSA são: Austrália, Chile, Costa Rica, Hong Kong, Islândia, Israel, Japão, Canadá, Colômbia, Listenstaine, Maurícia, México, Nova Zelândia, Noruega, Paquistão, Panamá, Paraguai, Peru, Suíça, Coreia do Sul, Taiwan, Turquia, EUA e os 28 Estados-Membros da UE.

    (2)  Ver ponto 10 do documento: http://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-6891-2013-ADD-1-DCL-1/pt/pdf


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