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Document 52011AR0150

    Parecer do Comité das Regiões «Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral»

    JO C 259 de 2.9.2011, p. 40–47 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    2.9.2011   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 259/40


    Parecer do Comité das Regiões «Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral»

    2011/C 259/08

    O COMITÉ DAS REGIÕES

    reitera que a revisão deste pacote legislativo deve ser efectuada no estrito respeito pelo princípio da subsidiariedade e garantir a liberdade de escolha e de administração das colectividades territoriais no que se refere às modalidades de organização, financiamento e exercício das suas prerrogativas em matéria de serviço público;

    sublinha que o exercício da ampla margem de manobra de que os entes territoriais devem poder dispor em conformidade com o Tratado de Lisboa exige uma base jurídica de direito derivado que, com base num conjunto de definições, garanta a aplicação mais flexível possível das regras de concorrência relativas aos serviços de interesse económico geral;

    opõe-se à inclusão de uma avaliação da eficiência económica da compensação dos serviços de interesse económico geral pela Comissão;

    considera que convém, de igual modo, ter em consideração outros critérios objectivos que neutralizem de antemão qualquer risco de afectação das trocas comerciais intracomunitárias, tais como a competência territorial limitada de determinados operadores sujeitos a regimes de autorização, a competência de acção limitada de certos operadores, públicos ou privados, criados especificamente para prestar um determinado serviço público num dado território e que não exerçam qualquer actividade comercial no mercado, e o carácter sem fins lucrativos de certas empresas sociais;

    propõe à Comissão que o limiar de minimis seja aumentado, no caso específico da compensação de serviço público, para um montante anual de 800 000 euros, de modo a excluir do controlo dos auxílios estatais todos os serviços públicos de proximidade assentes no tecido associativo voluntário local e em microempresas.

    Relator-geral

    Karl-Heinz LAMBERTZ (BE-PSE), Ministro-Presidente da Comunidade Germanófona da Bélgica

    Texto de referência

    Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral

    COM(2011) 146 final

    I.   RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

    O COMITÉ DAS REGIÕES

    1.

    congratula-se com a decisão da Comissão de lançar um debate com os intervenientes e as instituições sobre a revisão do pacote legislativo em matéria de auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público, com base nas conclusões do seu relatório de avaliação apresentado após ampla consulta dos Estados-Membros e de um grande número de intervenientes;

    2.

    considera que esta revisão representa uma iniciativa política importante para as colectividades territoriais e para os cidadãos, porquanto deve visar definir novas regras, claras e proporcionais, da conformidade dos modos de financiamento dos serviços públicos com o mercado interno e, assim, proporcionar a segurança e a previsibilidade jurídicas necessárias ao desenvolvimento dos serviços públicos na UE, à satisfação efectiva das necessidades básicas dos cidadãos europeus;

    3.

    regista com interesse que a revisão deste pacote legislativo se inscreve no quadro dos objectivos mais amplos da Comissão no domínio dos serviços públicos e do mercado interno, e, nomeadamente, da proposta n.o 25 incluída na comunicação «Um Acto para o Mercado Único» (1), que aponta para a adopção, até ao fim de 2011, de uma comunicação acompanhada por um conjunto de acções sobre os serviços de interesse geral, sublinhando que a UE e os Estados-Membros devem garantir que os serviços públicos sejam mais fáceis de prestar ao nível adequado, obedeçam a regras claras de financiamento, ofereçam a mais elevada qualidade e sejam efectivamente acessíveis a todos;

    4.

    reitera que a revisão deste pacote legislativo deve ser efectuada no estrito respeito pelo princípio da subsidiariedade e garantir a liberdade de escolha e de administração das colectividades territoriais no que se refere às modalidades de organização, financiamento e exercício das suas prerrogativas em matéria de serviço público, em conformidade com as disposições das legislações nacionais ou regionais;

    5.

    afirma que os entes territoriais têm especial legitimidade para participar activamente neste processo de revisão do pacote legislativo, visto que actuam no terreno e estão implicados diariamente na definição, organização, financiamento e prestação de serviços públicos em resposta às necessidades básicas, cada vez mais evolutivas e diversificadas, expressas pelos cidadãos nos territórios onde vivem, quer sejam em matéria de habitação, transportes, educação, saúde, acolhimento de crianças na primeira infância e de pessoas idosas dependentes, ou de cultura, desporto, lazer, etc.;

    6.

    regozija-se com o facto de a Comissão reconhecer a posição fundamental que os serviços públicos ocupam entre os valores comuns da União, nos termos do artigo 14.o do TFUE. É igualmente essencial que os Estados-Membros, bem como o poder local e regional, possam garantir aos seus cidadãos determinados serviços de interesse geral em condições razoáveis. Esses serviços reforçam a coesão social e territorial, melhoram o bem-estar dos cidadãos, asseguram uma função redistributiva de luta contra as desigualdades e de justiça social e contribuem de forma importante para o desenvolvimento da União no sentido da Estratégia Europa 2020; a este propósito, a política europeia relativa aos serviços públicos faz igualmente parte da execução do artigo 9.o do TFUE;

    7.

    recorda, por conseguinte, que o desenvolvimento de serviços de interesse económico geral de qualidade deve ser uma prioridade constante e transversal da Comissão. Considera, a este propósito, que na Estratégia Europa 2020 a Comissão deveria ter insistido explicitamente nos serviços de interesse económico geral e, designadamente, nos serviços sociais de interesse geral, uma vez que eles são essenciais para atingir as metas anunciadas. Lamenta, além disso, que a Comissão não tenha feito deste ponto uma das doze prioridades para relançar o mercado único e, ao mesmo tempo, reconheça precisamente o papel essencial destes serviços para lutar contra o desinteresse dos cidadãos pelo mercado único;

    8.

    partilha do ponto de vista da Comissão de que a presente reforma das regras em matéria de auxílios estatais para os serviços de interesse económico geral deve ter como objectivo reforçar o contributo destes serviços para o relançamento da economia da UE em geral e para uma reconstituição do tecido social;

    9.

    recorda que os cidadãos precisam hoje, mais do que nunca, de serviços de interesse económico geral de qualidade e acessíveis para ultrapassar as consequências económicas e sociais da crise; considera, portanto, que os programas de reforma e de combate aos défices públicos dos Estados-Membros não deveriam resultar na restrição do âmbito e da qualidade dos serviços prestados ou financiados no quadro dos serviços de interesse económico geral;

    10.

    apela para que sejam adoptadas as disposições mais equilibradas e mais bem adaptadas à natureza do serviço público, à sua dimensão local, transfronteiriça ou comunitária, à diversidade das suas estruturas organizativas e do tecido dos seus actores, que sejam proporcionais ao nível efectivo de risco de afectar as trocas comerciais intracomunitárias e provocar verdadeira distorção da concorrência no mercado interno;

    Consideração das inovações do Tratado de Lisboa em matéria de serviços públicos no âmbito da revisão do pacote legislativo sobre os auxílios estatais

    11.

    concorda com a análise feita pela Comissão das novas disposições do Tratado de Lisboa em matéria de serviços públicos enquanto valores comuns da União, nomeadamente: um elevado nível de qualidade, de segurança e de acessibilidade de preços, a igualdade de tratamento e a promoção do acesso universal e dos direitos dos utilizadores, bem como o amplo poder de apreciação das autoridades nacionais, regionais e locais para prestar, mandar executar e organizar [SIEG];

    12.

    sublinha que o artigo 14.o do TFUE, que faz parte das disposições de aplicação geral do Tratado confere ao Parlamento e ao Conselho uma nova base jurídica para estabelecer, por regulamento, os princípios e as condições, nomeadamente económicas e financeiras, que permitam aos serviços de interesse económico geral cumprir a sua missão;

    13.

    recorda à Comissão que só ela pode propor ao Parlamento e ao Conselho que concretizem o importante avanço democrático do Tratado de Lisboa que representa o artigo 14.o do TFUE e que nela recai inteiramente a responsabilidade política de o não fazer;

    14.

    lamenta, por conseguinte, que a Comissão obrigue o Tribunal de Justiça da União Europeia a pronunciar-se, com base em casos concretos, sobre questões que deveriam ser esclarecidas pelo legislador em conformidade com o princípio da responsabilidade democrática e o espírito do Tratado de Lisboa;

    15.

    recorda que o Protocolo n.o 26 relativo aos serviços de interesse geral reconhece simultaneamente a especificidade e a diversidade dos serviços públicos, bem como a competência prioritária dos Estados-Membros e dos entes territoriais em matéria de prestação, execução, financiamento e organização destes serviços;

    16.

    sublinha, no entanto, que o exercício da ampla margem de manobra de que os entes territoriais devem poder dispor em conformidade com o Tratado de Lisboa exige uma base jurídica de direito derivado que, com base num conjunto de definições, garanta às colectividades territoriais a aplicação mais flexível possível das regras de concorrência relativas aos serviços de interesse económico geral;

    17.

    recorda que, nos termos do disposto no artigo 106.o, n.o 2, do TFUE, as empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral estão sujeitas ao disposto nos Tratados, designadamente às regras de concorrência e, em especial, às regras em matéria de proibição e de controlo dos auxílios estatais, desde que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada pelas autoridades públicas a nível nacional, regional e local;

    18.

    afirma que as condições de acesso à compensação dos custos líquidos de execução dos serviços públicos pelas empresas encarregadas da sua gestão constituem uma condição económica e financeira necessária para o cumprimento adequado das missões específicas que lhes são confiadas pelas autoridades públicas, mais ainda neste período de crise económica e financeira em que os serviços públicos desempenham um papel fundamental de estabilizador automático e de protecção dos cidadãos europeus mais vulneráveis, ajudando assim a limitar o impacto social da crise;

    Afectação eficiente dos recursos públicos, eficiência económica da compensação de serviço público e produtividade dos serviços públicos face à crise económica e orçamental

    19.

    faz questão de lembrar à Comissão que as colectividades territoriais sempre denotaram uma preocupação constante de atender às necessidades expressas pelos cidadãos a nível local e à sua evolução ao longo do tempo, procurando, para o efeito, na sua gestão diária, utilizar da melhor maneira possível os fundos públicos, de modo a garantir a qualidade, a acessibilidade, a segurança e a continuidade dos serviços públicos sob a sua esfera de competências; que a actual crise veio reforçar esta necessidade de eficiência decorrente da sua primeira responsabilidade política para com os cidadãos eleitores;

    20.

    sublinha, neste contexto, que o desenvolvimento da cooperação público-público, através da partilha de meios, encerra em si um elevado potencial de aumento da eficiência dos recursos públicos e de modernização dos serviços públicos em resposta às novas necessidades dos cidadãos nos territórios em causa;

    21.

    opõe-se à inclusão de uma avaliação da eficiência económica da compensação dos serviços de interesse económico geral pela Comissão; em seu entender nem o artigo 106.o ou uma decisão ou directiva unilateral da Comissão ao abrigo do seu n.o 3, nem o artigo 14.o do TFUE, constituem base jurídica suficiente para uma tal iniciativa legislativa;

    22.

    afirma, a este propósito, que a questão da eficiência económica das compensações de serviço público não poderá, de modo algum, fazer parte de um quadro mais geral de avaliação da qualidade dos serviços públicos, o qual deve integrar indicadores puramente quantitativos (acessibilidade, continuidade de serviço, prazo de reacção, satisfação dos utilizadores, etc.) e não apenas económicos, e que a eficiência também não pode, por si só, servir de justificação para reduzir o âmbito do serviço prestado;

    23.

    afirma claramente que o mandato da Comissão, na qualidade de autoridade europeia da concorrência, nada tem a ver com as condições de afectação eficiente dos recursos públicos pelas autoridades públicas dos Estados-Membros, nem com as condições para uma contribuição efectiva dos serviços públicos para a coesão económica, social e territorial da União e para o crescimento e o emprego, considerações que extravasam em muito o princípio da proibição de toda e qualquer sobrecompensação susceptível de falsear a concorrência no mercado interno;

    24.

    recorda que este mandato exclusivo da Comissão, exercido sob o controlo do Tribunal de Justiça da UE, se limita a velar pela conformidade das compensações do serviço público que não satisfaçam as condições estabelecidas pelo Tribunal no acórdão do processo Altmark e que sejam por isso abrangidas pelo regime de proibição e controlo dos auxílios estatais.

    Prosseguir o processo de clarificação dos conceitos fundamentais que levam à classificação das compensações de serviço público como auxílios estatais

    25.

    congratula-se com o facto de a Comissão considerar ser necessário prosseguir e formalizar o exercício de clarificação dos conceitos fundamental em matéria de aplicação do regime de controlo dos auxílios estatais aos serviços públicos, iniciado há vários anos a título informal, por não comprometer a Comissão, com a publicação dos documentos staff working relativos às perguntas mais frequentes (2), ao Guia relativo aos serviços de interesse económico geral (3) e à criação do sistema de informação interactivo sobre os serviços de interesse geral (4); solicita à Comissão que clarifique estas noções essenciais, que o Tratado não define, por meio de uma proposta de regulamento do Conselho e do Parlamento Europeu baseado no artigo 14.o do TFUE e não de uma comunicação interpretativa que a não vincularia;

    26.

    preocupa-o que o facto de não haver definições em matéria de serviços públicos consolidados em legislação leve a Comissão Europeia a incluir nas negociações do Acordo Geral sobre o Comércio dos Serviços a priori todos os serviços, sem atender à especificidade dos serviços de interesse geral;

    27.

    sugere que o sistema de informação interactivo sobre os serviços de interesse geral prevê igualmente um simulador informático que dá às colectividades territoriais a possibilidade de verificarem a categorização dos auxílios;

    28.

    considera que, para além dos custos de transacção que acarreta, uma das razões que fizeram com que a Decisão da Comissão de 2005 fosse pouco aplicada pelos entes territoriais reside na dificuldade de inscrever as realidades territoriais nas noções e nos conceitos comunitários constantes desta decisão, nomeadamente os conceitos pouco praticáveis de «actividade de natureza económica», «empresas», «afectação das trocas comerciais intracomunitárias», «vantagem económica», «mandato», «empresa média, bem gerida e adequadamente equipada em meios de transporte» ou «lucro razoável»;

    29.

    salienta que esta dificuldade real de apropriação destes conceitos pelas colectividades territoriais é agravada pelo facto de a sua aplicação a um determinado tipo de serviço público não ser uniforme, dependendo directamente das opções em matéria de organização e das modalidades de contratualização, que diferem de uma autarquia para outra, inclusivamente num mesmo Estado-Membro;

    30.

    solicita à Comissão que apresente, juntamente com o seu projecto de decisão revista, um registo europeu indicativo e não vinculativo dos serviços públicos definidos pelos Estados-Membros e pelas autarquias; propõe que este registo, que poderia ser desenvolvido em colaboração com o Comité das Regiões, especifique, em função das opções em matéria de organização, o seu carácter de actividade económica ou não económica, e seja actualizado anualmente, a fim de mostrar concretamente aos entes territoriais, o que pode ser abrangido por estes conceitos, as razões objectivas que levam à sua classificação como actividade de natureza económica ou não económica, bem como à evolução desta classificação ao longo do tempo;

    31.

    solicita à Comissão que estenda este exercício de clarificação aos valores comuns da UE em matéria de serviço público, tal como definidos pelo Tratado de Lisboa, nomeadamente, um elevado nível de qualidade, de segurança e de acessibilidade de preços, a igualdade de tratamento e a promoção do acesso universal e dos direitos dos utilizadores, e, designadamente, ao valor comum da União do acesso universal aplicado ao domínio dos serviços públicos de carácter social; neste contexto, lamenta a visão restritiva desenvolvida pela Comissão nas suas recentes decisões em matéria de compatibilidade dos auxílios estatais concedidos aos organismos de habitação social num número crescente de Estados-Membros e, em particular nos processos E2/2005 e N642/2009 sobre habitação social nos Países Baixos, em que a Comissão põe em causa o princípio da miscigenação social, recorrendo unicamente ao critério de limite de rendimentos muito baixo. Convida a Comissão a repensar a sua posição no âmbito do recurso actualmente pendente no Tribunal de Justiça da União Europeia;

    32.

    afirma, nesse sentido, que cabe aos Estados-Membros e às autarquias definir as missões específicas confiadas aos serviços públicos de carácter social, bem como a natureza e o conteúdo das respectivas obrigações de serviço público e que, consequentemente, a Comissão não tem competência para intervir nas condições de atribuição desses serviços sociais às famílias beneficiárias, nem na identificação das categorias de famílias cujas necessidades sociais básicas não são satisfeitas unicamente pelas forças do mercado;

    33.

    apela à Comissão para que integre, na sua reflexão e nas propostas de revisão, todas as formas que a compensação de serviço público pode assumir, tendo em conta o amplo poder discricionário das colectividades territoriais para financiar os serviços públicos, incluindo as compensações sob a forma de ajudas ao investimento de longo prazo necessárias ao financiamento das infra-estruturas locais de serviço público (hospitais, habitação social, centros de acolhimento, centros culturais, etc.); apela, ainda à Comissão para que não circunscreva a sua reflexão quanto à compatibilidade apenas aos subsídios anuais de exploração, transitáveis de um ano para o outro em caso de sobrecompensação, e especifique as condições de apreciação da ausência de sobrecompensação no caso de ajudas ao investimento a longo prazo, nomeadamente em infra-estruturas e bens imóveis;

    Dissociar a questão da prevenção e do controlo de uma eventual sobrecompensação da escolha do procedimento aplicável à selecção do operador pela autoridade pública organizadora

    34.

    solicita à Comissão que dissocie a questão da prevenção, controlo e reembolso de uma eventual sobrecompensação, abrangida pelo princípio da proibição dos auxílios estatais e do respeito pela garantia de uma concorrência leal, da questão das condições de contratualização e de selecção, por parte da autoridade pública, das empresas às quais pode ser confiada a gestão do serviço público e que, em função das opções em matéria de organização da autoridade pública, estarão subordinadas aos princípios gerais do Tratado relativos à não-discriminação, à igualdade de tratamento e à transparência, no caso, por exemplo, das concessões de serviços ou de direitos exclusivos ou especiais, ou às disposições da directiva relativa aos contratos públicos;

    35.

    reitera que o recurso a um processo de concurso público para seleccionar a ou as empresas encarregadas da gestão de um serviço público constitui uma de várias opções organizativas, que consiste num acto de aquisição pública de prestações externas de serviço público por um preço a pagar, e não uma modalidade exclusiva para contornar a classificação de auxílio estatal;

    36.

    apela à Comissão para que deixe bem claro que a execução de um processo de adjudicação conforme às regras europeias exclui sempre uma sobrecompensação à luz das regras dos auxílios estatais; realça, ao mesmo tempo, que um concurso público não integra em determinadas circunstâncias a evolução dos custos líquidos da execução do serviço público ao longo do tempo, pois o preço resulta de uma relação de força e de uma situação de mercado num momento específico. Devido às estratégias de penetração em certos mercados praticadas pelos operadores, as condições de formação do preço por concurso público podem, igualmente, dar origem a uma subcompensação estrutural que, a prazo, poderá pôr em causa os princípios da continuidade financeira e da acessibilidade de preços do serviço público;

    37.

    constata que, além dos custos de transacção acrescidos que o concurso público acarreta para as autarquias, determinados serviços públicos não se prestam à sua rigidez por razões de mutabilidade do serviço, de continuidade financeira ou de necessidade de interesse geral de enquadramento das empresas pelo regime de autorização, no caso de informação assimétrica entre o utente e o prestador do serviço, designadamente para efeitos de protecção de pessoas vulneráveis face à necessidade de satisfazer necessidades sociais de base como a saúde, a habitação e o emprego, de concessão de direitos especiais ou exclusivos, ou, simplesmente, devido à falta de interesse, a nível transfronteiriço, na execução de serviços públicos locais e sociais;

    38.

    propõe, nesse sentido, à Comissão que a revisão do pacote legislativo seja acompanhada de uma proposta de comunicação interpretativa, sob a forma de «caixa de ferramentas», destinada às colectividades territoriais e que especifique o direito aplicável às diferentes modalidades de execução de serviços públicos, indo, nomeadamente, da execução directa à execução sob a forma de cooperação público-público através da partilha de recursos, à execução directa por uma entidade interna, à aquisição pública de prestações de serviço público a um operador externo por um determinado preço, à transferência de um risco de exploração para um operador externo, com ou sem remuneração, à concessão de direitos exclusivos ou direitos especiais sob a forma de regimes de autorização ou, ainda, ao apoio financeiro prestado a um projecto de interesse geral no âmbito de uma iniciativa associativa sem fins lucrativos;

    39.

    congratula-se por o Tribunal de Justiça Europeu ter simplificado e clarificado as condições da execução directa dos serviços públicos e, mais recentemente ainda, da cooperação público-público entre autarquias locais; convida desde já a Comissão a propor uma alteração à legislação sobre contratos públicos para estabelecer uma definição da gestão directa adaptada à realidade da autonomia local e à exigência de eficiência dos recursos públicos face à crise económica e orçamental;

    40.

    recorda que a cooperação público-público entre as autoridades locais ou regionais encerra em si um grande potencial de eficiência económica, de afectação optimizada dos recursos públicos e de modernização dos serviços públicos em resposta à evolução das necessidades básicas dos cidadãos nos territórios em causa;

    41.

    solicita à Comissão que, no respeito pelos princípios do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, a cooperação administrativa entre colectividades territoriais e entre organismos de direito público seja tida como uma decisão organizacional interna de um Estado, não sujeita às disposições em matéria de contratos públicos;

    Uma resposta diferenciada e proporcionada à afectação efectiva das trocas comerciais intracomunitárias

    42.

    apoia a intenção da Comissão de reduzir a carga administrativa e orçamental imposta às autarquias e às empresas encarregadas da gestão do serviço público em matéria de controlos regulares de sobrecompensação, que condicionam actualmente a isenção de notificação e a compatibilidade a priori da compensação de serviço público;

    43.

    apoia o método proposto pela Comissão, em conformidade com o princípio da proporcionalidade enunciado no Tratado, para diversificar as modalidades de controlo de uma eventual sobrecompensação, dar uma resposta mais adequada ao carácter exclusivamente local de determinados serviços públicos de proximidade, nomeadamente os serviços públicos sociais que, no actual estado de desenvolvimento do mercado interno, não têm qualquer impacto ou têm um risco diminuto de impacto nas trocas comerciais intracomunitárias, e centrar a sua atenção nos serviços públicos de dimensão comunitária ou transfronteiriça com um impacto mais significativo no mercado interno, devido ao seu enquadramento por directivas de liberalização sectoriais ou à estruturação dos seus operadores a nível comunitário ou transfronteiriço;

    44.

    considera que, para esse efeito, convém distinguir 1. as situações em que as compensações de serviços públicos de minimis não afectam as trocas comerciais intracomunitárias e, por conseguinte, não podem ser equiparadas a auxílios estatais, 2. as compensações concedidas a serviços públicos de dimensão local para além dos limiares de minimis mas que, devido a características organizacionais específicas e ao actual estado de desenvolvimento do mercado interno, não afectam as trocas comerciais intracomunitárias de forma contrária ao interesse da União, 3. as compensações concedidas aos outros serviços públicos de dimensão comunitária ou transfronteiriça, regulados por directivas ou regulamentos sectoriais ou cujas empresas estejam estruturadas a nível supranacional;

    45.

    considera que convém, de igual modo, ter em consideração outros critérios objectivos que neutralizem de antemão qualquer risco de afectação das trocas comerciais intracomunitárias, distorção da concorrência ou subsídios cruzados, tais como a competência territorial limitada de determinados operadores sujeitos a regimes de autorização, a competência de acção limitada de certos operadores, públicos ou privados, criados especificamente para prestar um determinado serviço público num dado território e que não exerçam qualquer actividade comercial no mercado, e o carácter sem fins lucrativos de certas empresas sociais que reinvestem os seus resultados potenciais no financiamento do serviço público que estão encarregadas de prestar, para dedução de compensações futuras. Ligadas à natureza específica do operador e à sua implantação local, estas características objectivas neutralizam qualquer risco de distorção da concorrência e de afectação das trocas comerciais intracomunitárias;

    46.

    exorta a Comissão a, relativamente aos controlos regulares da sobrecompensação que condicionam actualmente a isenção de notificação das compensações de serviço público e à prevenção de uma eventual sobrecompensação, proceder a uma flexibilização da decisão, confiar às autoridades públicas competentes a responsabilidade de definir as modalidades práticas de prevenção e o ritmo dos controlos, e, em contrapartida, simplificar as vias de recurso das empresas em caso de sobrecompensação confirmada;

    47.

    solicita que se preste especial atenção à especificidade dos serviços públicos locais e sociais organizados pelas colectividades territoriais numa escala relativamente pequena e circunscrita e que não afecte o comércio entre os Estados-Membros; pede que, para estes casos, sejam estabelecidos procedimentos e regras simplificados de derrogação às normas relativas aos auxílios estatais, tendo em conta o carácter local e limitado desses serviços públicos, em especial nas regiões mais isoladas e afastadas, como é o caso das regiões ultraperiféricas, das ilhas e das regiões de montanha; considera que a verificação deste aspecto não pode centrar-se unicamente no critério da população de uma determinada colectividade, devendo antes assentar num conjunto de elementos que tenham em conta a sua situação geográfica e o número de utilizadores potenciais dos serviços públicos em questão;

    48.

    faz notar que os dois primeiros critérios do acórdão Altmark, ou seja, a obrigação de definir claramente a missão de serviço público que incumbe ao beneficiário do auxílio e de estabelecer previamente, de forma objectiva e transparente, os parâmetros subjacentes ao cálculo dos pagamentos de compensação, obrigam as autarquias a um esforço de explicitação das missões de serviço público; nota que os requisitos do acto de atribuição do contrato não devem criar obrigações indesejáveis relativamente à tributação do volume de negócios das autarquias, pelo que recomenda a adaptação dos critérios às normas da directiva europeia sobre o IVA;

    49.

    considera que este esforço irá decerto contribuir para uma maior transparência e responsabilidade democrática na gestão dos serviços públicos, desde que seja proporcionado e razoável, não acarrete uma carga administrativa excessiva para as autoridades públicas e as empresas e não lese o princípio da adaptabilidade dos serviços públicos à evolução das necessidades colectivas. Propõe à Comissão, em conformidade com o princípio da transparência inscrito no Tratado e perante a necessidade de tornar os serviços públicos mais compreensíveis para os cidadãos, que condicione cada uma destas decisões em matéria de compensação de serviço público à existência de um «contrato de serviço público», em vez do «mandato» actualmente em vigor, mas pouco claro para as autarquias ou os cidadãos;

    Propostas construtivas e equilibradas para garantir, no respeito pelos princípios da proporcionalidade e da transparência do Tratado, o desenvolvimento dos serviços públicos na União em condições de plena segurança jurídica para as autoridades públicas, as empresas deles encarregadas e os cidadãos seus beneficiários

    50.

    pretende apresentar à Comissão propostas concretas, construtivas e equilibradas para simplificar e clarificar as disposições em vigor e garantir a sua aplicação eficaz por parte das autoridades regionais e locais para fins de segurança e previsibilidade jurídicas, propostas que deverão basear-se nos princípios da proporcionalidade e da transparência previstos no Tratado;

    51.

    propõe à Comissão que o limiar de minimis  (5) de 200 000 euros para um período de três anos, abaixo do qual uma ajuda pública não é considerada auxílio estatal, seja aumentado, no caso específico da compensação de serviço público, para um montante anual de 800 000 euros (6), de modo a excluir do controlo dos auxílios estatais todos os serviços públicos de proximidade assentes no tecido associativo voluntário local e em microempresas sociais de bairro apostadas na revitalização do desenvolvimento social local, através, nomeadamente, da inclusão social, do combate à exclusão, da animação local, do desenvolvimento de actividades culturais, desportivas ou socioeducativas, etc. Esta proposta baseia-se na ausência de risco de distorção das trocas comerciais intracomunitárias por parte deste tipo de serviços públicos locais, bem como na impossibilidade material de as autarquias sujeitarem este tipo de actores de proximidade ao regime de controlo dos auxílios estatais, devido à densidade específica do seu tecido;

    52.

    propõe à Comissão que as compensações superiores a 800 000 euros anuais concedidas pelas colectividades territoriais a empresas encarregadas da gestão de serviços públicos locais, incluindo os serviços públicos de carácter social, sejam objecto de uma nova decisão simplificada de compatibilidade a priori com o regime dos auxílios estatais, baseada, no actual estado de desenvolvimento do mercado interno, no diminuto risco de distorção das trocas comerciais intracomunitárias. O baixo grau de risco de distorção das trocas comerciais intracomunitárias resulta do carácter exclusivamente local do serviço público, do seu modo de organização sectorial e, nomeadamente, das consequentes características específicas dos seus operadores em termos de implantação local e de ausência de dimensão comunitária ou transfronteiriça;

    53.

    considera que as características objectivas a seguir indicadas devem condicionar a aplicação da decisão simplificada, pois garantem, no actual estado de desenvolvimento do mercado interno, um diminuto risco de distorção das trocas comerciais intracomunitárias: a compensação é concedida por um órgão de poder local e/ou regional ou por um grupo de órgãos de poder local e/ou regional ou, ainda, por qualquer entidade autorizada a fazê-lo por um órgão de poder local e/ou regional; a compensação é concedida para a execução de um serviço público de dimensão regional ou local, limitado a um determinado território e destinado a satisfazer as necessidades específicas dos seus habitantes; a compensação é concedida a empresas detentoras, de direito ou de facto, de uma competência territorial limitada ao território de execução do serviço público, ou que exerçam exclusivamente actividades de serviço público e não qualquer outra actividade de natureza comercial que tenham sido criadas especificamente para satisfazer essas necessidades básicas ou que reafectem os seus eventuais resultados de exploração do serviço público ao financiamento do mesmo, para dedução de compensações futuras;

    54.

    propõe que, em conformidade com os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade inscritos no Tratado, a decisão simplificada de compatibilidade a priori da compensação de serviços públicos de dimensão local e/ou regional confie às autoridades públicas que concedem as compensações a tarefa de tomarem todas as medidas adequadas para prevenir, controlar e neutralizar qualquer situação possível de sobrecompensação, tendo em conta que é do interesse directo das autarquias evitar qualquer situação deste tipo. Em contrapartida, em caso de sobrecompensação confirmada, as vias de recurso devem ser simplificadas;

    55.

    propõe que, no caso dos serviços públicos de dimensão comunitária ou transfronteiriça regulados por directivas ou regulamentos da UE, como o regulamento relativo às obrigações de serviço público no sector dos transportes terrestres (7), bem como dos restantes serviços públicos não abrangidos pelo direito comunitário, mas cujas características não correspondam às definidas na nova decisão simplificada, devido, nomeadamente, à estruturação dos operadores a nível comunitário ou transfronteiriço, as questões ligadas à compatibilidade das compensações de serviço público, incluindo o nível dos custos líquidos da sua execução, a eficiência dos operadores e o eventual enquadramento de lucros razoáveis, sejam objecto de uma abordagem sectorial e não horizontal, adaptada à organização específica de cada serviço público, e sejam arbitradas por co-decisão entre o Parlamento Europeu e o Conselho. Enquanto se aguarda a revisão das directivas e regulamentos vigentes e a adopção de novas directivas ou regulamentos sectoriais, o enquadramento comunitário actualmente em vigor deve ser prorrogado, tendo em conta as simplificações propostas em matéria de compensação de serviço público de minimis e de revisão da decisão de compatibilidade a priori dos serviços públicos de dimensão local;

    56.

    propõe à Comissão, em conformidade com o princípio da transparência previsto no Tratado e com o disposto nos artigos 14.o e 106.o, n.o 2, do TFUE, que a aplicação destas três disposições seja condicionada, por um lado, à existência de um «contrato de serviço público» (8), isto é, de qualquer acto oficial: 1 – que reconheça o interesse geral da missão desempenhada pelo operador e a sua inclusão no âmbito dos artigos 14.o e 106.o, n.o 2, do TFUE e do artigo 2.o do Protocolo n.o 26; 2 – que especifique a natureza das obrigações específicas daí decorrentes e o território abrangido; 3 – que estabeleça os parâmetros de cálculo da compensação de serviço público concedida, e, por outro lado, à publicação desse «contrato de serviço público» no Jornal Oficial da UE, num registo específico criado para o efeito.

    Bruxelas, 1 de Julho de 2011

    A Presidente do Comité das Regiões

    Mercedes BRESSO


    (1)  Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões Um Acto para o Mercado Único - Para uma economia social de mercado altamente competitiva: 50 propostas para, juntos, melhor trabalhar, empreender e fazer comércio, COM(2010) 608 final.

    (2)  Perguntas mais frequentes sobre a Decisão da Comissão, de 28 de Novembro de 2005, relativa à aplicação do n.o 2 do artigo 86.o do Tratado CE aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público concedidos a certas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral, bem como ao Enquadramento comunitário dos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público. Documento que acompanha a Comunicação sobre «Os serviços de interesse geral, incluindo os serviços sociais de interesse geral: um novo compromisso europeu» COM(2007) 725 final SEC(2007) 1516.

    (3)  SEC (2010) 1545, 07.12.2010.

    (4)  http://ec.europa.eu/services_general_interest/index_fr.htm

    (5)  Regulamento (CE) n.o 1998/2006 da Comissão, de 15 de Dezembro de 2006, relativo à aplicação dos artigos 87.o e 88.o do Tratado aos auxílios de minimis.

    (6)  Correspondendo aos custos líquidos médios de prestação de um serviço público de proximidade excluído o lucro razoável de uma associação composta por 20 a 25 assalariados.

    (7)  Regulamento (CE) n.° 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.° 1191/69 e (CEE) n.° 1107/70 do Conselho.

    (8)  Na acepção do Regulamento (CE) n.° 1370/2007 supracitado.


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