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Document 52004IE0668

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As repercussões da política comercial sobre as mutações industriais,em particular no sector siderúrgico»

    JO C 117 de 30.4.2004, p. 58–63 (ES, DA, DE, EL, EN, FR, IT, NL, PT, FI, SV)

    30.4.2004   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 117/58


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «As repercussões da política comercial sobre as mutações industriais,em particular no sector siderúrgico»

    (2004/C 117/15)

    Em 17 de Julho de 2003, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre «As repercussões da política comercial sobre as mutações industriais, em particular no sector siderúrgico».

    A Comissão Consultiva das Mutações Industriais foi incumbida da elaboração dos correspondentes trabalhos.

    Na 408.a reunião plenária de 28 e 29 de Abril de 2004 (sessão de 29 de Abril), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 46 votos a favor, 16 contra e 8 abstenções, o seguinte parecer.

    1.   Introdução. Objectivo e âmbito do parecer. Definições

    1.1

    O sector siderúrgico, o seu processo de reforma contínua e o impacto da política comercial nesse processo proporcionam um tema de análise extremamente profícuo para outros sectores industriais.

    1.2

    Para efeitos deste parecer de iniciativa, o «sector siderúrgico» é definido como o conjunto das actividades industriais relacionadas com a produção e a distribuição de aço, tendo em conta a sua importância para as indústrias europeias que o consomem. O âmbito do parecer e as recomendações nele contidas ultrapassam, assim, de muito os limites da simples indústria do aço.

    1.3

    No presente parecer, «mutação industrial» designa a reacção permanente e regular de um sector industrial à evolução contínua do ambiente comercial em que está inserido de forma a manter a competitividade e a criar oportunidades de crescimento. Mais do que um objectivo desse processo, a reforma estrutural do sector é considerada como um resultado da reacção a esta evolução. A «reestruturação» designa uma forma específica de mutação industrial que consiste geralmente num processo extraordinário e de adaptação (muitas vezes forçada) às condições do contexto comercial com vista a recuperar a competitividade, gerando uma descontinuidade na actividade comercial. O objectivo principal da reestruturação é alterar profundamente as estruturas de um sector industrial particular.

    1.4

    É inquestionável que as mutações industriais se devem em grande parte às flutuações estruturais no contexto económico global, e em particular à mutabilidade das necessidades do mercado. Também as políticas (nacionais ou comunitárias) em diversos domínios (jurídico, financeiro, ambiental, energético e social) afectam significativamente as mutações industriais, por vezes de forma decisiva. Isso pode ver-se claramente na evolução do sector siderúrgico comunitário nos últimos 20 anos. Mas o presente parecer foca apenas a política comercial da UE, por definição um factor externo, e define o quadro político para os fluxos comerciais entre a UE e outros países ou zonas económicas.

    1.5

    Por conseguinte, convém ter presente que o parecer não tem por objectivo descrever as mutações industriais no sector siderúrgico comunitário incluindo todas as políticas (internas) anteriormente referidas, mas apenas a inter-relação entre o sector siderúrgico e a política comercial (externa).

    1.6

    Refira-se ainda que o processo de alargamento da UE já não é uma questão de política comercial como foi, em grande medida, nas fases iniciais das negociações de adesão com os então países candidatos. Em Maio do corrente ano o mercado único será alargado, fazendo com que quaisquer novas políticas comunitárias destinadas a auxiliar as mutações industriais, e em particular a urgente reestruturação do sector do aço, nos futuros Estados-Membros terão de ser integradas no quadro político da UE.

    2.   Importância da política comercial para o sector siderúrgico

    2.1

    As empresas concorrem numa economia cada vez mais global e as condições que enfrentam nos mercados mundiais são determinantes essenciais da sua competitividade e das suas oportunidades de crescimento. Essas condições dependem, em boa medida, do enquadramento comercial criado pelos legisladores: normas em matéria de concorrência e do funcionamento do mercado interno, regras internacionais de comércio e regras ou acordos específicos para certos sectores comerciais. Esse enquadramento resulta das políticas comerciais a nível nacional e internacional. O enquadramento ideal deve estimular e facilitar um processo permanente de mutação industrial que reflicta a evolução da economia global. Não deve, em qualquer caso, influir negativamente nas mutações industriais e entravar a concorrência internacional em condições equitativas e livres. Efectivamente, a política comercial deve procurar antes de mais garantir a abertura do comércio mundial e assegurar condições equitativas para todos.

    2.2

    Assim sendo, a política comercial torna-se um aspecto extremamente importante do enquadramento político da UE, por ser esta uma economia voltada para a exportação com um saldo comercial francamente positivo. Por conseguinte, a política comercial é um importante motor do crescimento económico. A existência da DG Comércio e de um comissário europeu responsável directamente pela matéria reflectem o interesse vital que a gestão da política comercial assume para a UE. É certo que a estratégia de Lisboa de apoio à competitividade da economia europeia dá prioridade à melhoria das condições internas; mas o seu êxito revelar-se-á sobretudo nos mercados globais, os quais, como é óbvio, só podem ser conquistados através de uma política comercial relevante e bem sucedida.

    2.3

    A política comercial tem especial importância no sector siderúrgico. O aço, juntamente com o petróleo, é o produto industrial mais frequentemente comercializado entre nações. Actualmente, cerca de um terço da produção total mundial de aço é vendida além-fronteiras, quase o dobro de há trinta anos. As condições em que decorre o comércio internacional de aço representam, por isso, um dos factores decisivos para a competitividade neste sector. O mesmo se aplica à enorme variedade de indústrias que dependem do aço, como a indústria automóvel, a construção naval e a indústria de equipamentos mecânicos. A política comercial afecta directamente o modo como o sector siderúrgico e os seus diferentes segmentos reagem à concorrência nos seus mercados domésticos e como podem conseguir acesso a mercados estrangeiros. A política comercial ajuda a definir o sistema de regras do comércio mundial e a sua capacidade de reagir às mudanças estruturais.

    2.4

    A importância do comércio internacional de aço manifesta-se no facto de mais de 40 % dos actuais litígios na OMC estarem relacionados com o aço. Essa percentagem reflecte os desafios com que o sector se vê permanentemente confrontado devido à produção excessiva, muitas vezes promovida por ajudas estatais, que distorce os fluxos comerciais, e revela que existem lacunas fundamentais na aplicação dos actuais acordos de comércio internacional entre membros da OMC.

    2.5

    Por último, recorde-se que o sector siderúrgico da UE é um componente essencial da economia europeia e contribui profundamente para o desenvolvimento económico. O aço continua a ser o material industrial mais importante, com um volume global de mercado de mais de 350 mil milhões de euros (mais do que dez vezes superior ao de qualquer outro material industrial), e a ser essencial para o desenvolvimento das infra-estruturas e para a maior parte dos sectores transformadores. A eficiente produção de aço na UE tem capacidade para satisfazer todas as necessidades de mercado que possam surgir, assistida por sistemas igualmente eficientes de distribuição que organizam cerca de dois terços do fornecimento do mercado e prestam serviços cada vez mais importantes ao consumo de aço. Sem a sua própria produção de aço altamente competitiva, a UE não poderia contar com os seus recursos e conhecimentos próprios para promover a competitividade das industrias comunitárias dependentes do aço nos mercados mundiais. Manter um sector siderúrgico dinâmico deve, pois, ser uma prioridade política da UE.

    3.   Mutações industriais na produção de aço e na política comercial da UE

    3.1

    A produção de aço da UE dos 15 tem vindo a atravessar uma fase de profunda reestruturação desde o início dos anos 80: uma redução de 50 milhões de toneladas na capacidade de produção de aço comerciável, o encerramento de mais de 50 % dos locais de produção e a redução do número de trabalhadores na indústria siderúrgica de 900 000 para 250 000. A Europa dos 15 é o segundo maior produtor mundial depois da China, produzindo cerca de 160 milhões de toneladas de aço bruto por ano (cerca de 20 % da produção mundial). As receitas estão calculadas em cerca de 80 mil milhões de euros.

    3.2

    Hoje em dia, o sector comunitário da produção de aço (Europa dos 15) encontra-se entre os melhores do mundo a nível das capacidades de transformação, do equipamento, da qualidade de produção, das cadeias de distribuição e serviços e da inovação. O sector caracteriza-se pela coexistência de um reduzido número de grandes produtores realmente globais, de vários produtores menores e mais especializados e de numerosos distribuidores e centros de serviços altamente eficientes. O difícil processo de reestruturação dos anos 80 e da primeira metade dos anos 90, seguido por um processo de privatização e de consolidação, deu lugar a um sector moderno e competitivo que pode com razão sentir-se confiante quanto ao futuro e quanto à sua capacidade de superar os desafios da mutação contínua em condições equitativas.

    3.3

    Com efeito, num mercado verdadeiramente aberto e sujeito a condições verdadeiramente equitativas, a produção comunitária de aço seria ainda mais competitiva do que actualmente. Contudo, a competitividade internacional da produção de aço da UE vê-se seriamente ameaçada por medidas proteccionistas e por práticas de distorção do mercado em países terceiros, tais como as medidas de salvaguarda S. 201 tomadas pelo governo dos EUA, as quais foram julgadas incompatíveis com as normas da OMC por esta organização. Além disso, o excesso de produção viável a nível mundial continua a desestabilizar o equilíbrio entre a oferta e a procura e, logo, os preços do aço, especialmente nos mercados mais vulneráveis.

    3.4

    A política comercial assumiu um papel de relevo na profunda reestruturação da produção de aço na Europa nos anos 80 e 90. Como resposta ao aumento de importações de países terceiros, e com base no Tratado CECA (Comunidade Europeia do Carvão e do Aço), a Comunidade Europeia deu início à sua «estratégia externa»: uma série de medidas proteccionistas que consistiram essencialmente em acordos bilaterais com os principais países exportadores de aço com vista à restrição voluntária das suas exportações para a Comunidade, em complemento das medidas internas já tomadas para controlar as ajudas estatais, promover a reestruturação e regulamentar temporariamente o mercado. As medidas estiveram em vigor durante o período de crise e mantiveram as importações a cerca de 10 % do consumo aparente.

    3.5

    A produção de aço nos futuros Estados-Membros da UE a partir de Maio de 2004 encontra-se ainda num processo de reforma estrutural cujos elementos principais são a supressão de capacidades excedentárias menos viáveis, a introdução das últimas tecnologias, o reforço da cooperação económica e comercial através de uma estratégia de consolidação, a adaptação da produção aos mercados e a reorientação das empresas para os consumidores. A Europa dos 15 apoiou este processo através de uma série de acordos bilaterais com os países candidatos durante a fase de pré-adesão que impuseram a aplicação das normas comunitárias com base nos instrumentos da CECA. Estes acordos chegaram mesmo a autorizar a Comissão Europeia a controlar e aprovar os planos de reestruturação nacionais nos países candidatos.

    3.6

    Por conseguinte, a produção de aço na UE alargada terá uma posição diferente no mercado mundial. Por um lado, essa posição será reforçada pela adesão de novos Estados-Membros, fazendo da União um exportador líquido mais importante. Mas por outro lado, as estruturas de produção de aço da UE serão enfraquecidas pelo facto de as empresas desses países estarem ainda em reestruturação. As políticas comerciais terão de ter em conta essas circunstâncias, embora no respeito do sistema de regras.

    4.   Desafios futuros para a política comercial e as mutações industriais

    Actualmente, a produção de aço comunitária aparenta uma enorme vulnerabilidade às políticas e práticas que violem as normas internacionais de comércio. O mercado comunitário do aço é o mais aberto do mundo. Na sequência do acordo sobre o aço concluído na ronda de negociações do Uruguai, as tarifas impostas às importações de aço para a UE serão eliminadas em 2004. As importações de aço para a Europa têm crescido muito rapidamente nos últimos anos, aumentando de 14,5 milhões de toneladas em 1997 para 24,6 milhões de toneladas em 2002 — um crescimento de 70 % —, tornando a UE, que fora um exportador líquido durante décadas, num importador líquido de aço em 1998. (Em 2003 as exportações voltaram a ser ligeiramente superiores às importações.)

    O futuro anuncia uma série de desafios claros que informarão o contexto da política comercial na perspectiva das mutações em curso no sector do aço nos próximos anos:

    As antigas repúblicas soviéticas da Rússia, da Ucrânia e do Cazaquistão (membros da OMC) representam uma região em que a política comercial da UE é ainda especificamente orientada para o aço dados os acordos bilaterais que regem o comércio de produtos do aço com esses países. Estes acordos constituem uma resposta madura e pragmática aos desafios colocados por essas economias em transição: permitem um desenvolvimento controlado do comércio e evitam grandes flutuações comerciais e as reacções de anti-dumping numa altura em que as indústrias destes países procuram ajustar as suas capacidades e desenvolver o seu consumo interno. A possível adesão da Rússia à OMC é um outro aspecto importante para a indústria siderúrgica da UE.

    Em comparação com outros sectores industriais, o aço continua a estar altamente fragmentado à escala mundial; o processo de consolidação tem tido lugar em poucas regiões, como a UE. É de esperar, porém, que no futuro os produtores de aço procurarão cada vez mais fomentar fusões e alianças transregionais na esteira do processo de globalização e de consolidação dos seus mercados industriais. Os acordos comerciais multilaterais devem ter conta desta evolução dinâmica, suprimindo os entraves ao investimento estrangeiro e às trocas comerciais dentro da mesma empresa.

    Numa economia global, o conceito de «mercado doméstico» deixa de fazer sentido. Várias empresas produtoras ou distribuidoras de aço têm já operações noutras regiões, considerando os consumidores como fornecedores locais. As futuras políticas comerciais terão não só de reflectir esta tendência para a internacionalização como de reagir à dinâmica da indústria e ao surgimento de novas regiões produtoras em busca de uma posição no mercado mundial. Muitas empresas do sector situadas em países em vias de desenvolvimento são já modernas e competitivas, pelo que o tratamento preferencial que lhes é conferido no sistema comercial mundial não tem razão de ser.

    5.   Observações do CESE sobre questões essenciais da política comercial no sector siderúrgico

    Dada a sua posição actual, e em face dos desafios futuros, o sector siderúrgico da UE, se pretende reagir com êxito à evolução do seu ambiente comercial, terá de assegurar que os mercados mundiais de aço respeitam a mesma abertura e as mesmas regras equitativas que são aplicadas às importações de aço para a UE. Apesar do fracasso das negociações da OMC em Cancun em Setembro de 2003, a Cimeira de Doha abre ainda uma oportunidade para bons progressos no sentido da abertura total dos mercados entre membros da OMC. Permitirá igualmente o debate sobre como melhorar as regras vigentes, nomeadamente no que diz respeito ao dumping. Numa perspectiva mais alargada, o lançamento efectivo das negociações sobre as chamadas «questões de Singapura», como a abertura ao comércio ou comércio e concorrência, traria benefícios reais ao sector siderúrgico na Europa e em todo o mundo.

    Sem excluir totalmente a possibilidade de melhorar o acesso aos mercados através de acordos bilaterais ou regionais com os países ou regiões de maior interesse comercial para a UE, os interesses do sector siderúrgico da UE serão mais bem servidos através de um sistema comercial multilateral (OMC). Este sistema deve basear-se em normas regularmente transpostas para o direito nacional por todos os países membros, aplicadas objectivamente sem interferência política e de maneira igual por todos. Em vista das práticas políticas comerciais de certos países nos últimos anos no que ao aço diz respeito, os esforços da UE devem concentrar-se nos pontos seguintes:

    melhorar o acesso ao mercado e suprimir os entraves ao comércio;

    reforçar as regras em matéria de comércio livre: anti-dumping, subsídios, salvaguardas;

    utilizar responsavelmente os instrumentos da OMC: medidas de correcção rápidas, moderadas e proporcionais apenas para combater importações desleais;

    pôr cobro, antes de mais, ao abuso dos mecanismos comerciais por motivos nacionalistas ou proteccionistas e julgar os litígios comerciais pelas suas características técnicas ou económicas e não pelo seu interesse político;

    As disparidades entre os padrões sociais e ambientais nas diferentes partes do mundo afectam os fluxos comerciais no que respeita não só ao aço mas também a outros sectores. As diferenças entre regiões económicas a nível das garantias dos direitos sociais fundamentais e da protecção do ambiente provocam distorções económicas a concorrência mundial e devem ser encaradas como problemas que se colocam tanto aos sectores industriais em causa como a todos os responsáveis políticos, mormente os responsáveis pela política comercial.

    Os elementos mais importantes destes pontos essenciais podem ser mais aprofundados à luz dos seguintes aspectos:

    5.1   Acesso ao mercado

    5.1.1

    Como se disse, o mercado europeu do aço é o mais aberto do mundo e a produção comunitária de aço é extremamente vulnerável a políticas e a práticas que violem as normas internacionais. Assim, o êxito do sector siderúrgico europeu requer uma idêntica abertura dos outros mercados mundiais. Os mecanismos da política comercial tanto comunitários como multilaterais devem, pois, continuar a ser utilizados para suprimir os entraves ao acesso aos mercados de países terceiros e para impedir que o mercado comunitário seja vítima das práticas comerciais desleais de outros países. O emprego eficaz dos mecanismos da política comercial serve os interesses legítimos da indústria siderúrgica.

    5.1.2

    A prioridade para a UE é que as negociações em Doha permitam melhorar o acesso aos mercados graças a reduções pautais, a par da supressão dos obstáculos não pautais. Quanto ao tratamento especial e diferenciado aos países em desenvolvimento, deve ser aplicado apenas em casos específicos e em função do grau de competitividade de cada país ou sector. O tratamento especial e diferenciado não deve, em qualquer caso, impedir a eliminação das tarifas pautais pelos países em desenvolvimento com indústrias do aço competitivas.

    5.1.3

    Um melhor acesso aos mercados só será possível se as reduções pautais forem acompanhadas pela eliminação dos obstáculos não pautais. Além disso, a aplicação das actuais normas da OMC poderá constituir um entrave ao acesso aos mercados. A Cimeira de Doha dará aos governos a oportunidade de clarificar as normas em vigor e de harmonizar a sua aplicação com base nas melhores práticas.

    5.2   Anti-dumping

    5.2.1

    As medidas anti-dumping continuam a ser necessárias para defender a indústria europeia contra práticas comerciais desleais, mas devem ser aplicadas de forma imparcial e não discriminatória sem excepção, excepto quando as normas da OMC dispuserem de outro modo. Para este efeito, importa encetar negociações no sentido de uma aplicação mais uniforme do actual acordo da OMC sobre anti-dumping, de preferência aproximando-a dos padrões comunitários.

    5.2.2

    Os objectivos principais de uma aplicação uniforme e do reforço do acordo anti-dumping devem concentrar-se acima de tudo no aumento da eficácia deste instrumento: prazos curtos e justos, determinação rápida e provisória dos prejuízos, adopção obrigatória da regra do «direito mais reduzido», para referir apenas os mais importantes.

    5.2.3

    Se o objectivo central de uma adaptação global às normas da UE não for alcançado, a UE deve optimizar a sua aplicação do anti-dumping, aumentando a sua eficácia, transparência e objectividade. O sector siderúrgico comunitário deve estar capacitado para lutar eficazmente contra importações subsidiadas ou a preços artificialmente baixos originárias de países terceiros. A legislação comunitária em matéria de anti-dumping e contra a concessão de subsídios é muito mais liberal do que o estipulado pela OMC ou do que a de outros países, em particular dos EUA. É o caso, por exemplo, da cláusula do «interesse comunitário» e da regra do «direito mais reduzido». A aplicação na prática na UE também tem algumas falhas em comparação com outros países, nomeadamente porque a Comissão Europeia se recusa a tomar medidas preventivas e exige a apresentação de provas de que foram já causados prejuízos. Além disso, a Comissão usa até ao limite os prazos para a investigação previstos na legislação comunitária, causando ainda maiores atrasos. A UE necessita igualmente de um acompanhamento mais rápido e eficaz dos fluxos comerciais. Importa corrigir estas e outras lacunas.

    5.3   Subsídios

    5.3.1

    A questão dos subsídios será debatida na Cimeira de Doha e no âmbito da OCDE, tendo esta como objectivo principal a conclusão de um acordo específico sobre os auxílios à produção de aço. Os futuros debates na OCDE serão de extraordinária importância. Um acordo internacional sobre a proibição geral de qualquer forma de auxílio estatal (directo ou indirecto) às empresas do sector siderúrgica, com um número muito limitado de excepções, teria um impacto assaz positivo nas relações comerciais internacionais. O acordo sobre subsídios deve analisar antes de mais as causas profundas dos litígios relacionados com a produção de aço: abuso de subsídios e produção excessiva. Essa sobreprodução exacerba os problemas comerciais do sector, inundando os mercados internacionais, e sobretudo os mercados mais abertos, como o da UE, de uma oferta excessiva.

    5.3.2

    Na base de um acordo internacional deve estar a interdição de todo e qualquer subsídio específico, à parte um número limitado de isenções como previsto no Código Europeu dos Auxílios à Siderurgia, sendo os mais importantes os auxílios ao encerramento permanente das instalações, incluindo auxílios estatais para mitigar o impacto social. Devem ser autorizados todos os subsídios genéricos, à excepção dos que contribuem para criar novas capacidades de produção ou manter capacidades pouco viáveis. Pode ser contemplado um tratamento especial e diferenciado para os países em vias de desenvolvimento cujo sector do aço tenha de ser reestruturado. As derrogações temporárias para esses países e sectores devem ter como condição a viabilidade a longo prazo dos beneficiários e uma redução de capacidade proporcional aos subsídios recebidos.

    5.3.3

    As negociações devem procurar ainda estabelecer regras mais eficazes de (pré-)notificação para permitir a prevenção e criar um sistema dissuasivo de sanções, incluindo sanções automáticas em caso de não cumprimento da obrigação de pré-notificar.

    5.3.4

    Tendo em conta, porém, o número de participantes e as suas posições até aqui irreconciliáveis, há receios bem-fundados de que as negociações da OCDE se saldem por um acordo de compromisso que em nada melhore as regras actuais. Um tal compromisso não deve ter o apoio da UE.

    5.4   Política comercial, mutações industriais e a dimensão social

    5.4.1

    A reestruturação do sector siderúrgico europeu nos anos 80 e 90 teve consequências nefastas para o emprego. Em parte, os mecanismos da política comercial activados pela Comissão Europeia nesse período destinaram-se a apoiar o processo de reestruturação. Hoje como então a política de emprego e a política social contribuem para uma aplicação equilibrada das políticas comerciais no contexto das mutações industriais, assegurando que a competitividade e o crescimento não são os únicos aspectos a ter em conta. Através da promoção das qualificações dos trabalhadores e da qualidade do trabalho, contribuem em grande medida para o êxito das mutações industriais e para atenuar o impacto destas, em benefício de todos os interessados.

    5.4.2

    Da mesma forma, a tendência sempre crescente para a responsabilização social das empresas poderá acabar por ter efeitos positivos sobre a competitividade do sector siderúrgico comunitário no âmbito do modelo económico e social europeu.

    5.4.3

    Aos trabalhadores interessa uma indústria capaz de vingar sozinha, sem precisar de se apoiar no seu governo nacional para fazer face à concorrência. Um bom nível de emprego, condições de trabalho favoráveis e boas perspectivas de futuro são objectivos que o comércio livre e equitativo não pode senão ajudar a concretizar. O sector siderúrgico reconhece hoje em dia que o processo de mutações industriais deve ser gerido de forma a antecipar a evolução e a evitar mudanças bruscas com consequências sociais inaceitáveis.

    6.   Conclusões do CESE

    Baseando-se nas reflexões do seu parecer de iniciativa sobre as repercussões da política comercial nas mutações industriais, e em particular no sector siderúrgico, o CESE conclui o seguinte:

    6.1

    O sector siderúrgico tem um interesse estratégico vital para a União Europeia dados os conhecimentos científicos e tecnológicos altamente competitivos de que depende e a sua importância para o desenvolvimento das infra-estruturas comunitárias e para a maior parte das indústrias transformadoras.

    6.2

    As mutações industriais no sector da siderurgia da UE têm sido favorecidas pelo recurso aos instrumentos da CECA no processo de restruturação, e em particular ao diálogo social, que tem sido parte integrante desse processo. Apesar de não ter sido possível evitar que o processo de restruturação implicasse repercussões profundas no emprego, estas foram, no entanto, substancialmente atenuadas, em comparação com outros sectores, mercê de múltiplas medidas sociais. A política comercial, de que trata o presente parecer, tem desempenhado um papel crucial na restruturação graças às medidas da política comercial tomadas para apoiar outros instrumentos. O sector siderúrgico poderá, assim, constituir um modelo para os outros sectores industriais no que diz respeito às consequências das mutações industriais e à influência da política comercial no potencial êxito da gestão das mutações industriais.

    6.3

    A política comercial é um elemento essencial das condições de mercado definidas pelos responsáveis políticos e deve garantir o mesmo tratamento para todos os intervenientes sob pena de comprometer a competitividade e as oportunidades de crescimento futuro do sector.

    6.4

    O sector siderúrgico da UE revela a contínua interacção entre as mutações industriais destinadas a manter, atingir ou recuperar a competitividade e as estratégias da política comercial adoptadas para garantir o êxito dessas mutações nos mercados internos e externos. Por conseguinte, o CESE faz as seguintes recomendações para que a futura política comercial continue a promover as mutações industriais:

    Enquanto economia voltada para as exportações, a União Europeia deve continuar a preconizar uma política geral de abertura dos mercados, contanto que sejam respeitadas normas consensuais de comércio equitativo.

    A União Europeia deve apoiar o desenvolvimento das normas que regem o comércio multilateral, como por exemplo o acordo previsto sobre os auxílios à siderurgia, sem prejuízo dos actuais padrões comunitários.

    A União Europeia deve continuar a concluir acordos bilaterais com parceiros comerciais importantes sempre que as normas multilaterais não protejam os interesses comunitários.

    Nos casos de práticas comerciais desleais, a União Europeia deve pôr em prática os mecanismos disponíveis de defesa do seu comércio e encorajar o recurso aos mecanismos de resolução de litígios da OMC.

    Bruxelas, 29 de Abril de 2004.

    O Presidente

    do Comité Económico e Social Europeu

    Roger BRIESCH


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