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Document 52001DC0416

Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social - Promover as normas laborais fundamentais e melhorar a governação social no contexto da globalização

/* COM/2001/0416 final */

52001DC0416

Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social - Promover as normas laborais fundamentais e melhorar a governação social no contexto da globalização /* COM/2001/0416 final */


COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO CONSELHO, AO PARLAMENTO EUROPEU E AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL - PROMOVER AS NORMAS LABORAIS FUNDAMENTAIS E MELHORAR A GOVERNAÇÃO SOCIAL NO CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO

Índice

1. Introdução

2. Evolução da promoção das normas laborais fundamentais a nível internacional

2.1. Para uma melhor governação social a nível internacional

2.1.1. Reconhecimento do carácter universal das normas laborais fundamentais: a Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Social de 1995

2.1.2. Reforço das normas laborais fundamentais na OIT: a Declaração de 1998 relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho

2.1.3. Proporcionar uma perspectiva mais alargada: criação de um grupo de trabalho da OIT sobre a dimensão social da globalização

2.1.4. Contexto comercial: a Declaração Ministerial da OMC de Singapura de 1996

2.1.5. Uma interligação complexa: o estudo da OCDE sobre o comércio internacional e as normas laborais fundamentais

2.1.6. Desenvolvimento de códigos de conduta internacionais tendo em vista uma responsabilização social das empresas

3. Princípios básicos da abordagem da UE

3.1. As normas laborais: um elemento essencial da política social da UE

3.2. Rejeição de quaisquer abordagens baseadas em sanções em matéria de política comercial

3.3. Redução da pobreza e respeito dos direitos fundamentais no âmbito da ajuda ao desenvolvimento e dos acordos bilaterais

4. A iniciativa da UE destinada a promover as acções internacionais

5. Elementos a integrar em futuras acções da UE e a nível internacional

5.1. Intensificação das acções a nível internacional

5.1.1. Conferir maior eficácia aos instrumentos da OIT

5.1.2. Aumentar o apoio à assistência técnica multilateral, inclusive no âmbito da OIT

5.1.3. Criar uma instância de diálogo internacional

5.2. Reunir os instrumentos políticos da UE

5.2.1. Aumentar os incentivos comerciais: o Sistema de Preferências Generalizadas (SPG)

5.2.2. Relações bilaterais: acordos, assistência e reforço das capacidades

5.2.3. Utilizar melhor as avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável

5.3. Regimes privados e voluntários para promover as normas laborais fundamentais: rotulagem social e códigos de conduta das empresas

6. Conclusões

ANEXO 1

1. Introdução [1]

[1] A presente comunicação complementa a análise efectuada na comunicação da Comissão de 1996 relativa à relação entre o sistema comercial e as normas laborais internacionalmente reconhecidas, COM(96)402 final/2, de 4 de Setembro de 1996.

A complexa interligação entre a globalização e a promoção das normas laborais fundamentais é alvo de crescente atenção. Os cidadãos começam a ter consciência de que um sistema económico global equitativo deve promover o desenvolvimento social e os direitos fundamentais, apercebendo-se de que o actual modelo de governação é incapaz de abordar convenientemente essas questões. O interesse do público europeu por esta questão continua a ser grande, o que revela uma maior consciência do impacto da globalização, um maior interesse em assegurar relações económicas proveitosas para todas as partes envolvidas e o reconhecimento de que os fluxos comerciais e de investimentos deveriam beneficiar a população em geral e apoiar aqueles que participam nos processos de produção e contribuem para o crescimento económico. O interesse crescente por parte do público advém do reconhecimento do carácter universal das normas laborais fundamentais e não pretende pôr em causa as vantagens comparativas dos países em desenvolvimento com baixos salários. Este objectivo básico de promoção dos direitos fundamentais e do desenvolvimento sustentável está reflectido na posição da UE delineada nas conclusões do Conselho de 1999 [2].

[2] As conclusões do Conselho figuram no Anexo 1 da presente comunicação.

Dentro da própria Europa, o reconhecimento de que o crescimento económico sustentável está intimamente ligado à coesão social - que pressupõe o respeito pelas normas laborais fundamentais - está subjacente aos objectivos estratégicos das políticas económica e social da UE. Com efeito, a noção de que as políticas económica e social se reforçam mutuamente encontra-se no centro da agenda da política social da UE adoptada pelo Conselho Europeu de Nice, realizado em Dezembro de 2000. Além disso, estas questões irão ser abordadas no âmbito da Estratégia de Desenvolvimento Sustentável da UE, nomeadamente na comunicação relativa ao contributo da União para o desenvolvimento sustentável mundial, que a Comissão deverá apresentar até Janeiro de 2002, tal como ficou acordado no Conselho Europeu de Gotemburgo.

As estruturas e as normas económicas e sociais internacionais existentes a nível global são desequilibradas [3]. A governação do mercado global desenvolveu-se mais rapidamente do que a governação social global. O mecanismo da OIT para fazer aplicar as normas tem uma eficácia limitada, visto estar circunscrito às convenções ratificadas. Em contrapartida, a Organização Mundial de Comércio (OMC), com o seu sistema assente em normas e com um mecanismo de resolução de litígios vinculativo, é uma organização forte e relativamente eficaz. Esta força relativa da OMC tem suscitado pedidos para que esta intervenha noutras áreas que não a do comércio, utilizando os seus instrumentos para reforçar a governação noutros domínios políticos como as normas laborais e o ambiente. Todavia, a organização competente em matéria de normas laborais é e deve continuar a ser a OIT, e o reequilíbrio do sistema global deveria procurar reforçar a componente social, tomando como ponto de partida os mecanismos da OIT e não os da OMC.

[3] No relatório que apresentou à Cimeira do Milénio, o Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, afirmou que nas últimas décadas surgiu um desequilíbrio entre os esforços bem sucedidos para elaborar normas rigorosas e bem aplicadas destinadas a facilitar a expansão dos mercados globais, deixando para trás o apoio a objectivos sociais igualmente válidos, sejam eles as normas laborais, o ambiente, os direitos humanos ou a redução da pobreza.

Embora estes aspectos mais genéricos da governação global, em si mesmos, ultrapassem o âmbito da presente comunicação, não deixam de afectar a promoção das normas laborais fundamentais. Estas considerações ajudam-nos a compreender a dinâmica dos desenvolvimentos internacionais ocorridos neste domínio durante a última década e a identificar formas de promover o desenvolvimento social no contexto de globalização. Concretamente, estes aspectos colocam em evidência a estreita interligação entre as trocas comerciais e os investimentos, o crescimento económico e o desenvolvimento social, bem como a necessidade de abordar estas questões de uma forma integrada, o que implica uma abordagem multidisciplinar da promoção das normas laborais fundamentais.

O objectivo da presente comunicação é traçar uma estratégia para melhorar a governação social e promover as normas laborais fundamentais, a fim de se reforçar o contributo da globalização para o desenvolvimento social e para o respeito dos direitos fundamentais. Na definição dessa estratégia, a presente comunicação propõe instrumentos no âmbito de diferentes domínios políticos, tanto a nível internacional como a nível europeu, procurando assim definir uma abordagem abrangente e multidisciplinar.

2. Evolução da promoção das normas laborais fundamentais a nível internacional

2.1. Para uma melhor governação social a nível internacional

Têm sido mantidas discussões de âmbito internacional sobre a interligação entre a globalização e o desenvolvimento social em diferentes instâncias, incluindo no âmbito da Cimeira do Milénio das Nações Unidas, as quais prosseguem a ritmos diferentes [4]. Estes debates revelam o apoio generalizado à promoção das normas laborais fundamentais e um maior reconhecimento do desenvolvimento social como componente indispensável do desenvolvimento sustentável. No entanto, colocam igualmente em evidência a dificuldade de se abordar a interacção entre o comércio e as questões sociais de uma forma que tenha devidamente em conta as preocupações de todas as partes. A maior preocupação a este respeito tem a ver com a possibilidade de a interligação entre o comércio e as questões sociais vir a ser utilizada de forma abusiva para fins proteccionistas ou abrir a porta a um recurso cada vez mais frequente às sanções comerciais. Importa igualmente assinalar que, nos últimos anos, se registou um aumento considerável das iniciativas voluntárias de carácter privado destinadas a promover a aplicação das normas laborais fundamentais, lançadas pelas próprias empresas ou destinadas a apoiar as suas actividades. Podemos considerar que esta evolução contribui para melhorar a governação social e promover as normas laborais fundamentais, a par de medidas que envolvam os governos e os outros poderes públicos. A Comissão lançou um debate sobre essas iniciativas no seu Livro Verde sobre a Promoção de um Enquadramento Europeu para a Responsabilidade Social das Empresas [5].

[4] O documento da OIT apresentado ao Grupo de Trabalho sobre a Dimensão Social da Globalização em Novembro de 2000, intitulado "Developments in other organisations: Overview of developments in other international organisations and bodies relevant to the work of Working Party", GB.279/WP/SDG/1, apresenta um panorama geral dos desenvolvimentos internacionais ocorridos e das actividades das outras organizações internacionais.

[5] COM(2001)x de 18 de Julho de 2001.

2.1.1. Reconhecimento do carácter universal das normas laborais fundamentais: a Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Social de 1995

A Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Social de 1995 abordou, pela primeira vez ao mais alto nível político, a dimensão social da globalização, tendo reconhecido plenamente a componente social do desenvolvimento sustentável.

Na Declaração de Copenhaga sobre o Desenvolvimento Social, os países participantes reconheceram que a globalização [6] pode criar oportunidades para um crescimento económico e para o desenvolvimento da economia mundial numa base duradoura, bem como para o intercâmbio de experiências e para o cruzamento de ideais, valores culturais e aspirações. Simultaneamente, reconheceram também que a pobreza, o desemprego e a desintegração social têm acompanhado com demasiada frequência as mudanças e os processos de ajustamento ocorridos. A Declaração de Copenhaga identificou o desafio de se gerir o processo de globalização de forma a aumentar os seus benefícios e a atenuar os seus potenciais efeitos negativos para as populações.

[6] Definida como "uma consequência do aumento da mobilidade humana, do reforço da comunicação, do forte incremento das trocas comerciais e dos fluxos de capitais, e do desenvolvimento tecnológico", Declaração de Copenhaga sobre o Desenvolvimento Social e Programa de Acção da Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Social, realizada em 12 de Março de 1995.

No Programa de Acção [7], os governos comprometeram-se "a garantir e a promover o respeito dos direitos básicos dos trabalhadores, incluindo a proibição do trabalho forçado e do trabalho infantil, a liberdade de associação e o direito de organização e de negociação colectiva, a igualdade de remuneração para homens e mulheres por trabalho de valor igual, bem como a não-discriminação no emprego, aplicando na íntegra as convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), no caso dos Estados que são partes nessas convenções, e tendo em conta os princípios nelas consignados, no caso dos países que não são partes, para dessa forma se conseguir assegurar um crescimento económico verdadeiramente sustentado, bem como um desenvolvimento sustentável. Desta forma, a Cimeira identificou pela primeira vez as normas laborais fundamentais, tendo reconhecido o seu carácter universal e transformando-as numa responsabilidade de todos os governos e não apenas daqueles que tenham ratificado as referidas convenções.

[7] Nº 54, alínea b): Expansão do emprego produtivo e redução do desemprego, melhoria da qualidade do trabalho e do emprego.

2.1.2. Reforço das normas laborais fundamentais na OIT: a Declaração de 1998 relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho

Graças ao impulso suplementar proporcionado pelo estudo da OCDE de 1996 e pela Declaração Ministerial de Singapura da OMC, a Cimeira de Copenhaga suscitou a adopção da Declaração da OIT de 1998 relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho [8]. Essa declaração representou um passo importante no reconhecimento universal das normas laborais fundamentais. De particular interesse é o acordo segundo o qual todos os membros da OIT, inclusive aqueles que não tenham ratificado as suas convenções, são obrigados, pelo facto de pertencerem à OIT, a promoverem e a aplicarem os princípios respeitantes aos direitos fundamentais consignados nas convenções desta organização. O principal objectivo da declaração consistia em assegurar o reconhecimento e a aplicação universal das normas laborais fundamentais enunciadas na Cimeira de Copenhaga e na própria Declaração.

[8] Aprovada em 18 de Junho de 1998 pela Conferência Internacional do Trabalho na sua 86ª Sessão. Este importante desenvolvimento foi reconhecido e apoiado na Conferência de Copenhaga +5, realizada em 2000 em Genebra, cujos participantes assumiram o compromisso de respeitar, promover e aplicar os princípios consignados na Declaração da OIT relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu Acompanhamento.

A Declaração de 1998 confirmou as quatro normas laborais fundamentais identificadas na Cimeira de Copenhaga:

1. Liberdade de associação e reconhecimento efectivo do direito de negociação colectiva

2. Eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório

3. Abolição efectiva do trabalho infantil

4. Eliminação da discriminação no domínio do emprego e da profissão

Estas quatro normas laborais fundamentais encontram-se actualmente abrangidas por oito convenções da OIT [9].

[9] As oito convenções da OIT, e o número actual de ratificações entre os membros desta organização são enumeradas no Anexo 2.

A Declaração de 1998 introduziu igualmente um mecanismo de acompanhamento destinado a promover a aplicação das normas laborais fundamentais e que é aplicável a todos os membros da OIT, inclusive os que não tenham ratificado as convenções pertinentes desta organização. Esse mecanismo de acompanhamento, que se destina a apoiar os esforços envidados pelos membros da organização, complementa os mecanismos de supervisão instituídos pela Constituição da OIT para assegurar a aplicação das convenções ratificadas, bem como o processo especial relativo à liberdade de associação, que já era aplicável aos Estados que não haviam ratificado as convenções.

Instrumentos à disposição da OIT para promover as normas laborais fundamentais

1. O mecanismo de supervisão

a) Relatórios periódicos sobre a aplicação das convenções da OIT ratificadas

De dois a cinco anos, os membros da OIT apresentam um relatório sobre as medidas adoptadas tendo em vista a aplicação das convenções por eles ratificadas. Esses relatórios são analisados por um Comité de Peritos, que pode identificar problemas específicos e solicitar informações suplementares. Embora estes relatórios abranjam todas as convenções da OIT, são cada vez mais numerosas as observações da Comité relacionadas com a aplicação das convenções fundamentais da OIT. Além disso, os outros parceiros na organização podem também exercer pressões no âmbito da conferência anual da OIT, através do Comité Tripartido para a Aplicação das Convenções e Recomendações.

b) Processo de apresentação de queixas

Para além dos instrumentos de supervisão periódica, a Constituição da OIT prevê procedimentos mais específicos. Assim, os membros da organização podem apresentar queixas nos termos do disposto no artigo 26º, enquanto as organizações de empregadores e de trabalhadores têm igualmente a possibilidade de reclamar oficialmente nos termos do artigo 24º. Este processo pode conduzir à criação de uma comissão de inquérito, composta por representantes dos empregadores, dos trabalhadores e da OIT. Se um país não acatar as recomendações de uma dessas comissões de inquérito, a organização poderá ser solicitada a aplicar o disposto no artigo 33º, segundo o qual, em caso de violação grave e persistente, o Conselho de Administração da OIT pode recomendar à Conferência a adopção de medidas tendentes a assegurar o cumprimento das recomendações da comissão de inquérito.

Em Junho de 2000, a Conferência da OIT adoptou medidas ao abrigo do artigo 33º pelo facto de a Birmânia/Myanmar não estar a cumprir as recomendações da OIT relativas à abolição efectiva do trabalho forçado. Esta foi a primeira vez, nos 81 anos de história desta organização, que a Conferência recorreu a tais medidas. A resolução recomendava aos membros da organização que analisassem, tendo em conta as conclusões da comissão de inquérito, as relações que eventualmente tivessem com o país membro em questão e tomassem medidas adequadas a fim de impedir que o referido membro beneficiasse dessas relações para perpetuar ou alargar o sistema de trabalho forçado ou obrigatório. As organizações internacionais foram igualmente convidadas a reconsiderar, no âmbito dos seus estatutos e atendendo às conclusões da comissão de inquérito, toda e qualquer cooperação que pudessem ter com o membro em questão e, se necessário, a cessar o mais rapidamente possível qualquer actividade susceptível de incentivar, directa ou indirectamente, a prática do trabalho forçado ou obrigatório. A relação entre uma eventual iniciativa de carácter comercial que os membros possam querer adoptar neste contexto e as normas da OMC - nomeadamente os artigos XX e XXI do GATT - necessita ainda de ser clarificada.

2. O acompanhamento da Declaração de 1998 relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho

a) Apresentação de relatórios sobre os princípios e direitos fundamentais no trabalho por parte dos países que não ratificaram as convenções

O acompanhamento da Declaração da OIT de 1998 levou à introdução de um requisito que exige que os países não ratificantes comuniquem as medidas por eles adoptadas a fim de promoverem os princípios consignados das convenções fundamentais da OIT. As informações assim prestadas são publicadas num relatório anual. Os vários grupos de empregadores e de trabalhadores podem formular observações sobre as informações prestadas. Um grupo de peritos pode igualmente apresentar observações sobre os relatórios nacionais. Até à data, apenas têm sido formuladas observações de carácter geral.

b) Relatório geral

De acordo com a Declaração de 1998, o Director-Geral da OIT apresenta anualmente um relatório geral, que engloba não só os países que ratificaram as convenções pertinentes mas também aqueles que o não fizeram, e que se centra na identificação de tendências relativamente a cada um dos referidos quatro princípios subjacentes às normas laborais fundamentais. O relatório de 2000 incidiu sobre a liberdade de associação e o relatório do corrente ano centrou-se no trabalho forçado.

3. Assistência técnica

A assistência técnica é um instrumento essencial da OIT que se destina a promover os princípios e os direitos enunciados na Declaração de 1998 e que já apresentou resultados concretos. A assistência prestada pela OIT abrange a consultoria sobre a reforma legislativa, o reforço das capacidades dos legisladores e administradores e a formação de funcionários públicos, a fim de reforçar as capacidades dos órgãos tripartidos. Essa assistência técnica é frequentemente associada a outros elementos - por exemplo, o acompanhamento, o apoio às estruturas educativas e à segurança social - no âmbito de programas integrados. Os esforços envidados no âmbito do Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC), nomeadamente no Paquistão, constituem um exemplo de um programa integrado bem sucedido (ver Anexo 3).

2.1.3. Proporcionar uma perspectiva mais alargada: criação de um grupo de trabalho da OIT sobre a dimensão social da globalização

O Conselho de Administração da OIT já havia criado, em 1994, o Grupo de Trabalho sobre a Dimensão Social da Globalização [10]. Esse grupo analisou uma grande variedade de aspectos da globalização económica no âmbito de três domínios principais: a) análise dos meios de intervenção disponíveis para alcançar os objectivos sociais da OIT no contexto da globalização (reforço da governação global), b) aprofundamento do conhecimento empírico do impacto social da globalização e c) discussão das actividades de outras organizações.

[10] Quando foi criado, este grupo de trabalho recebeu a designação de Grupo de Trabalho sobre as Dimensões Sociais da Liberalização do Comércio Internacional. Essa designação foi alterada em 2000.

Em Março de 2000, o referido grupo de trabalho decidiu alargar as suas atribuições, tendo definido assim as suas actividades futuras:

"O objectivo do exercício é aprofundar a base de conhecimentos da OIT no que se refere à interacção entre as diferentes dimensões das políticas económica e social no novo enquadramento de uma economia global, o que servirá de base para a definição de propostas políticas no sentido de se reforçar a capacidade dos países para melhor enfrentarem o impacto social da globalização. Os resultados deverão contribuir para estabelecer um diálogo e proceder a um intercâmbio de experiências com as outras organizações internacionais sobre questões de interesse comum."

Na sequência desta reformulação das suas atribuições, na reunião de Novembro de 2000, o grupo de trabalho analisou as questões pertinentes para compreender a forma como a globalização afecta o progresso social e, mais especificamente, a contribuição que a liberdade de associação e de negociação colectiva pode dar para o desenvolvimento.

Na reunião de Março de 2001 do grupo de trabalho, o director-geral da OIT, Juan Somavía, fez com que este trabalho desse um passo em frente ao propor um conjunto de meios para reforçar e modernizar o grupo de trabalho. Por ocasião da Conferência Internacional do Trabalho, realizada em Junho de 2001, o grupo de trabalho analisou propostas mais circunstanciadas apresentadas pelo director-geral sobre o modo de reforçar a sua acção. Chegou-se a acordo sobre a necessidade de reforçar as capacidades técnicas do grupo de trabalho e sobre o seu papel enquanto instância de diálogo e de intercâmbio a alto nível. Em Novembro de 2001, o Secretariado da OIT apresentará novas propostas sobre a forma concreta que deverá assumir o diálogo e o intercâmbio a alto nível no âmbito do grupo de trabalho. Por outro lado, o grupo de trabalho recebeu bem a ideia de reforçar o seu contributo para um enquadramento integrado da dimensão social da globalização. Juan Somavía pretende prosseguir as consultas sobre a proposta de eventual criação de uma comissão mundial, constituída por eminentes personalidades, a fim de preparar um relatório oficial sobre a dimensão social da globalização.

2.1.4. Contexto comercial: a Declaração Ministerial da OMC de Singapura de 1996

A relação entre o sistema comercial multilateral e as normas laborais foi um dos temas abordados na reunião ministerial de Marráquexe de Abril de 1994, na qual alguns dos participantes solicitaram que a OMC prestasse mais atenção a esta questão. Na primeira Conferência Ministerial da OMC, realizada em Singapura, em Dezembro de 1996, alguns membros da OMC, incluindo a CE, haviam sugerido a criação de um grupo de trabalho da OMC para estudar as relações entre o comércio internacional e as condições de trabalho. Esta posição foi defendida especialmente pelos países industrializados e foi alvo de uma feroz contestação por parte da maioria dos países em desenvolvimento, que consideraram a criação deste grupo como uma forma de proteccionismo e uma tentativa de introduzir restrições às trocas comerciais através das normas laborais. A discussão desta questão esteve na origem da adopção do nº 4 da Declaração Ministerial da OMC de Singapura de 1996, onde se afirma o seguinte:

"Reiteramos o nosso empenhamento na observância das normas laborais fundamentais internacionalmente reconhecidas. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) constitui a instância competente para definir e zelar pela aplicação dessas normas, e afirmamos o nosso apoio ao seu trabalho na promoção das mesmas. Estamos convictos de que o crescimento económico e o desenvolvimento fomentados pelo aumento das trocas comerciais e por uma maior liberalização comercial podem contribuir para a promoção dessas normas. Rejeitamos a utilização das normas laborais para fins proteccionistas e acordamos em que as vantagens comparativas de certos países, nomeadamente dos países em desenvolvimento com baixos salários, não deve de forma alguma ser posta em causa. A esse respeito, tomamos nota de que os secretariados da OMC e da OIT irão prosseguir a sua actual colaboração."

A interconexão entre o comércio e as questões sociais foi igualmente discutida no âmbito da terceira Conferência Ministerial da OMC, realizada em Seattle, em Novembro de 1999, tendo alguns países industrializados exigido a inclusão da temática "comércio e trabalho" na ordem de trabalhos da OMC [11]. A posição assumida pela CE na terceira Conferência Ministerial da OMC foi delineada nas conclusões do Conselho de Outubro de 1999 (que figuram no Anexo 1). A Conferência Ministerial de Seattle não permitiu formular quaisquer conclusões. Pode considerar-se que a problemática do comércio e do trabalho e o aparente desejo manifestado por pelo menos um dos principais membros da OMC de estabelecer uma ligação entre as normas laborais e as sanções comerciais contribuíram para o fracasso dessa conferência. De um modo geral, os debates na conferência ministerial confirmaram o carácter extremamente sensível de que se reveste esta questão para praticamente todos os países em desenvolvimento. Porém, apesar dessa sensibilidade, as discussões informais então levadas a cabo e mesmo posteriormente também contribuíram para facilitar o estabelecimento de um consenso internacional sobre o modo de se abordar a ligação entre a globalização, as trocas comerciais e o desenvolvimento social. Esse consenso terá muito provavelmente de assentar nos seguintes elementos:

[11] A segunda Conferência Ministerial da OMC realizada em Genebra em 1998 limitou-se a confirmar os compromissos assumidos e a análise efectuada em Singapura, não tendo efectuado qualquer referência específica à interligação entre o comércio e as normas laborais.

- um diálogo internacional permanente o sobre comércio e o desenvolvimento social;

- a participação da OIT, da OMC, da CNUCED e do Banco Mundial, bem como dos diversos governos e da própria sociedade civil;

- a análise e o intercâmbio de experiências sobre a interconexão entre comércio e desenvolvimento social e, simultaneamente,

- a rejeição clara de quaisquer abordagens que assentem em sanções.

2.1.5. Uma interligação complexa: o estudo da OCDE sobre o comércio internacional e as normas laborais fundamentais

O estudo da OCDE de 1996 sobre o comércio internacional e as normas laborais fundamentais proporcionou uma análise útil da relação existente entre as trocas comerciais, a competitividade, o crescimento e as normas laborais fundamentais. Esse estudo incidiu nas normas laborais fundamentais, as quais, quanto à sua substância e em termos de impacto económico, diferem das outras normas laborais. O estudo concluiu que:

- o incumprimento total ou parcial das normas fundamentais por um determinado país não constitui um factor determinante para aumentar as suas vantagens competitivas no comércio internacional ou para melhorar as suas capacidades de atracção de investimento directo estrangeiro, e que

- existe uma interacção positiva entre a liberalização do comércio internacional e a aplicação das normas laborais fundamentais.

A actualização desse estudo efectuada em 2000 apresenta um panorama geral dos desenvolvimentos ocorridos desde o estudo realizado em 1996, bem como da literatura mais recente. Este relatório de actualização confirmou amplamente as principais conclusões do estudo de 1996 (ver no Anexo 4 os aspectos mais importantes da actualização efectuada em 2000).

2.1.6. Desenvolvimento de códigos de conduta internacionais tendo em vista uma responsabilização social das empresas

As empresas multinacionais podem desempenhar um papel crucial para a adopção de um comportamento empresarial socialmente responsável no âmbito de um mercado laboral global. As consequências do comércio internacional nas normas laborais fundamentais dependem igualmente das políticas internas adoptadas pelos países em desenvolvimento. As empresas enfrentam o desafio de se desenvolverem no âmbito de mercados internacionais muito competitivos. Embora incentive fortemente as empresas a assumirem as suas responsabilidades sociais, a Comissão reconhece o carácter voluntário desse tipo de iniciativas. A Comissão acredita, além disso, que a responsabilidade social das empresas deve ser desenvolvida em parceria com todas as partes interessadas.

2.1.6.1. A Declaração de Princípios Tripartida da OIT sobre as Empresas Multinacionais e a Política Social

A OIT adoptou em 1977 uma Declaração de Princípios sobre as Empresas Multinacionais e a Política Social. Essa declaração foi actualizada em 2000, tendo em conta o teor da Declaração da OIT de 1998 relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho. O valor da declaração reside não só no seu conteúdo abrangente - que abarca todos os aspectos da política social, desde as relações laborais até à formação e ao emprego - mas também no facto de se destinar a um vasto leque de agentes económicos determinantes (empresas multinacionais, governos, organizações de empregadores e de trabalhadores).

2.1.6.2. As Directrizes da OCDE para as Empresas Multinacionais

As Directrizes da OCDE para as Empresas Multinacionais - adoptadas em 2000 - são de uma importância extrema. Formam um conjunto de recomendações dirigidas pelos governos às empresas multinacionais. Embora não sejam vinculativas, têm o apoio dos países da OCDE de onde é originária a maior parte dessas empresas. De acordo com a noção de responsabilidade social da empresa e a fim de incentivar a contribuição do mundo empresarial para o desenvolvimento social e a promoção do direitos fundamentais dos trabalhadores, as referidas directrizes definem princípios e normas facultativas para uma conduta empresarial responsável em áreas como o emprego, as relações laborais, os direitos humanos, o ambiente, a concorrência, a divulgação de informações e a fiscalidade, o combate à corrupção e a defesa do consumidor. A aplicação dessas directrizes deve ser apoiada a fim de limitar os custos da ausência de responsabilidade social por parte das empresas e as suas implicações em termos de ajuda ao desenvolvimento.

Segundo as referidas directrizes, as empresas multinacionais deverão contribuir para o progresso económico, social e ambiental, a fim de se alcançar o desenvolvimento sustentável e o respeito dos direitos humanos das pessoas afectadas pelas suas actividades, de acordo com as obrigações e os compromissos assumidos internacionalmente pelos governos de acolhimento. Mais propriamente no domínio social, as directrizes recomendam às empresas multinacionais que assumam os compromissos decorrentes das convenções fundamentais da OIT, especificando que essas empresas deverão:

- respeitar o direito dos trabalhadores a serem representados por sindicatos e encetar negociações construtivas com esses representantes;

- contribuir para a abolição efectiva do trabalho infantil;

- contribuir para a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório;

- não efectuar qualquer discriminação dos seus trabalhadores em matéria de emprego ou de profissão.

2.1.6.3. A iniciativa "Global Compact" das Nações Unidas

A iniciativa "Global Compact" da ONU constitui outro exemplo de um código de conduta internacionalmente recomendado para um comportamento empresarial socialmente responsável. Esta iniciativa foi proposta pela primeira vez em 1999 pelo Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, a fim de desafiar os empresários a promoverem e a aplicarem nove princípios decorrentes de instrumentos internacionais que visam promover os direitos humanos e as normas laborais e ambientais. A iniciativa foi lançada formalmente em Julho de 2000 por representantes do mundo empresarial e laboral e da sociedade civil, que acordaram em colaborar no âmbito desse enquadramento comum a fim de reforçar uma cidadania empresarial responsável e os pilares sociais da globalização, mediante o diálogo e determinadas actividades práticas.

O principal objectivo desta iniciativa - que associa pela primeira vez o mundo empresarial e a sociedade civil no âmbito da ONU - consiste em levar as empresas privadas a adoptar e a aplicar os nove princípios fundamentais nas respectivas práticas empresariais, e em prestar apoio às políticas dos poderes públicos nestes domínios. O Secretário-Geral da ONU apelou às empresas para que demonstrem uma liderança global no sector do trabalho, apoiando os valores que constituem a essência do conceito de "Trabalho Digno". Acrescentou ainda que estes princípios contribuem para o estabelecimento de relações construtivas no local de trabalho e na comunidade, bem como para a realização de investimentos mais estáveis, e que as empresas podem sair beneficiadas em termos de produtividade, de melhoria da sua reputação e de maior cooperação no ambiente de trabalho, aspectos esses que podem contribuir decisivamente para a melhoria dos seus resultados. Os princípios propostos no domínio laboral reflectem as oito convenções fundamentais da OIT (os princípios da iniciativa "Global Compact" são enumerados no Anexo 5).

3. Princípios básicos da abordagem da UE

É já de longa data o empenhamento da UE em promover as normas laborais fundamentais e o desenvolvimento social em geral. A própria União Europeia assenta no respeito dos direitos fundamentais. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [12], proclamada em Nice em Novembro de 2000, confirma o objectivo da UE de promover e integrar plenamente os direitos fundamentais - incluindo as normas laborais fundamentais - em todas as suas políticas e iniciativas.

[12] Neste contexto, assume especial relevância o Capítulo IV, relativo à solidariedade: artigo 27º sobre o direito à informação e à consulta dos trabalhadores na empresa, artigo 28º sobre o direito de negociação e de acção colectiva, artigo 30º sobre a protecção em caso de despedimento sem justa causa, artigo 31º sobre condições de trabalho justas e equitativas, artigo 32º sobre a proibição do trabalho infantil e a protecção dos jovens no trabalho, assim como o artigo 5º do Capítulo I sobre a dignidade, que proíbe a escravidão e o trabalho forçado.

3.1. As normas laborais: um elemento essencial da política social da UE

O progresso económico e a coesão social, juntamente com um elevado nível de protecção e de melhoria da qualidade do ambiente, constituem aspectos complementares do desenvolvimento sustentável e estão no centro do processo de integração europeia. A melhoria dos níveis de vida, a promoção de um elevado nível de emprego e de protecção social, a melhoria das condições de vida e de trabalho, bem como a promoção da qualidade de vida, encontram-se entre os principais objectivos da União Europeia. Mais recentemente, no Conselho de Nice, a UE aprovou uma agenda de política social que visa promover o conceito de qualidade - no emprego, nas relações laborais e nas condições de trabalho - como o motor de uma economia próspera e que previna a exclusão social, criando mais e melhores empregos.

O respeito das normas laborais faz parte integrante do modelo social europeu e representa uma parte importante da legislação comunitária - desde as normas em matéria de saúde e segurança no trabalho até às normas em matéria de igualdade de oportunidades e de não-discriminação - que tem vindo a ser adoptada desde os primórdios da Comunidade. Mais especificamente no que respeita às normas laborais fundamentais internacionais, é óbvio que os princípios e os direitos laborais fundamentais identificados pela Organização Internacional do Trabalho se aplicam na íntegra aos países da UE [13].

[13] Dado que a rápida ratificação por todos os Estados-Membros das oito convenções fundamentais da OIT está naturalmente associada ao compromisso na União de promover as normas laborais fundamentais, a Comissão emitiu em 15 de Setembro de 2000 uma recomendação aos Estados-Membros sobre a ratificação da mais recente convenção fundamental da OIT, a convenção nº 182 (1999).

O papel dos parceiros sociais no desenvolvimento da dimensão social da integração europeia tem sido crucial e o âmbito do diálogo social ao nível da União Europeia tem vindo a ser progressivamente alargado - de tal modo que os parceiros sociais na UE desempenham actualmente um importante papel institucional na elaboração de políticas e de legislação em matéria social e emprego para toda a UE. Dar aos próprios parceiros sociais a oportunidade de proporem regras sobre as questões que mais os preocupam no processo da integração europeia no domínio económico e social tem sido um elemento crucial dos esforços envidados pela Comunidade para gerir as dimensões sociais da mudança estrutural. Além disso, o Tratado prevê a consulta do Comité Económico e Social, que é composto por representantes das diferentes categorias da actividade económica e social, no âmbito do processo político a nível europeu. O Comité Económico e Social poderá desempenhar um importante papel na futura promoção do diálogo sobre as questões analisadas na presente comunicação.

3.2. Rejeição de quaisquer abordagens baseadas em sanções em matéria de política comercial

A posição da UE sobre o comércio e o trabalho é delineada nas conclusões do Conselho de Outubro de 1999 relativas à preparação da terceira Conferência Ministerial da OMC, as quais continuam a ser a base da posição da UE no que se refere ao comércio e ao desenvolvimento social [14]. Nessas conclusões, o Conselho acordou em que a UE deveria apoiar fortemente a protecção das normas laborais fundamentais. Outros elementos essenciais das referidas conclusões do Conselho são o apoio a prestar aos trabalhos da OIT, assim como à sua cooperação com a OMC, nomeadamente através de um diálogo permanente, o apoio à adopção de medidas positivas para incentivar o respeito das normas laborais fundamentais e a clara rejeição de qualquer abordagem assente na imposição de sanções.

[14] As conclusões do Conselho figuram no Anexo 1 da presente comunicação.

O Conselho reiterou a firme oposição da UE a quaisquer abordagens baseadas em sanções e afirmou que a UE irá combater e rejeitar toda e qualquer iniciativa que vise utilizar os direitos laborais para fins proteccionistas. O Conselho acordou, além disso, em que as vantagens comparativas de certos países, nomeadamente dos países em desenvolvimento com baixos salários, não deve de forma alguma ser posta em causa. De um modo mais geral, as conclusões do Conselho de Outubro de 1999 identificaram como objectivo global uma maior coerência na definição da política económica global. Os esforços destinados a abordar a interligação entre o comércio e o desenvolvimento social deverão ser encarados no contexto deste objectivo global, que responde às preocupações existentes relativamente ao desequilíbrio do sistema de governação global e confirma a necessidade de se reforçar o papel da OIT.

3.3. Redução da pobreza e respeito dos direitos fundamentais no âmbito da ajuda ao desenvolvimento e dos acordos bilaterais

A pobreza, a má governação e a existência de amplos sectores informais são muitas vezes a principal causa da aplicação deficiente das normas laborais fundamentais nos países em desenvolvimento. Em muitos desses países, uma grande parte da economia local é informal e não está regulamentada. As populações mais pobres estão fortemente dependentes do sector informal, não só enquanto trabalhadores mas também como consumidores, e, consequentemente, tendem a estar menos bem protegidas pelos acordos sobre as normas laborais fundamentais. Além do mais, há que ter em mente que o crescimento económico sustentado pode contribuir para o respeito e a aplicação efectiva das normas laborais e do enquadramento regulamentar social e vice-versa: o reforço das normas laborais fundamentais pode contribuir para o crescimento económico e para uma maior eficiência. Os instrumentos do desenvolvimento podem, portanto, desempenhar um papel importante na promoção das normas laborais fundamentais.

O principal objectivo da política de desenvolvimento da Comunidade é a redução da pobreza. O desenvolvimento social, incluindo o emprego, o acesso aos serviços sociais, a integração social e a regulação social, fazem parte integrante dos esforços destinados a lutar contra a pobreza. Por conseguinte, o objectivo da redução da pobreza no âmbito da política de desenvolvimento da CE implica o apoio ao desenvolvimento sustentável, tanto a nível económico, como a nível social e ambiental. Uma maior integração das normas laborais fundamentais estaria em conformidade com os objectivos globais da política de desenvolvimento da Comunidade, que radica no princípio do desenvolvimento humano e social sustentável, equitativo e participativo. A declaração do Conselho e da Comissão de Novembro de 2000 confirmou que os meios de acção à disposição da CE no âmbito das estratégias de redução da pobreza deveriam ser coordenados de forma a abranger os aspectos sociais do desenvolvimento [15].

[15] Declaração comum do Conselho e da Comissão sobre a política de desenvolvimento da Comunidade (Novembro de 2000).

Os acordos de cooperação celebrados entre a CE e países terceiros abrangem a cooperação económica e social. A natureza abrangente desses acordos permite que os diferentes instrumentos funcionem de forma complementar para alcançar os objectivos de crescimento económico e de desenvolvimento sustentável, incluindo a sua dimensão social. Esses objectivos passaram a figurar em todos os acordos de cooperação concluídos com países terceiros: a partir de 1992, todos os acordos celebrados entre a CE e países terceiros passaram a contemplar uma cláusula que define os direitos humanos como um elemento essencial desses acordos. Essa cláusula abrange também as normas laborais fundamentais tal como enunciadas nas oito convenções fundamentais da OIT. Além disso, desde a realização da Cimeira Mundial de Copenhaga para o Desenvolvimento Social em 1995, todos os acordos celebrados entre a CE e países terceiros incluem uma referência à declaração final desta Cimeira, em pé de igualdade com a cláusula que faz referência aos direitos humanos.

O Acordo de Cotonu celebrado em 2000 entre a CE e os 77 Estados ACP representou um passo em frente neste domínio, uma vez que inclui uma disposição específica sobre comércio e normas laborais, que confirma o compromisso das partes em respeitarem as normas laborais fundamentais [16]. O Acordo de Cotonu constitui um óptimo exemplo de uma abordagem abrangente que integra diferentes instrumentos políticos: comércio, desenvolvimento e diálogo político. O desenvolvimento social e a promoção das normas laborais fundamentais também fazem parte da estratégia de desenvolvimento global do referido acordo, que prevê que "a cooperação deve apoiar os esforços dos Estados ACP na definição de políticas e reformas gerais e sectoriais que contribuam para melhorar a cobertura, a qualidade e o acesso às infra-estruturas e aos serviços sociais de base ..." e que a cooperação deve ter por objectivo, nomeadamente, incentivar "a promoção de métodos participativos de diálogo social, bem como do respeito pelos direitos sociais fundamentais" [17].

[16] Título II: Cooperação económica e comercial, Capítulo 5: Áreas relacionadas com o comércio, artigo 50º: Comércio e normas do trabalho. O texto é reproduzido no Anexo 5.

[17] Título I: Estratégias de desenvolvimento, Secção 2: Desenvolvimento social e humano, Artigo 25º: Desenvolvimento do sector social.

4. A iniciativa da UE destinada a promover as acções internacionais

Tal como descrito anteriormente, os debates internacionais registaram grandes avanços - desde o simples reconhecimento do desenvolvimento social como um dos pilares do desenvolvimento sustentável e a confirmação da dimensão social da globalização na Declaração da Cimeira de Copenhaga para o Desenvolvimento Social realizada em 1995, passando pela Declaração Ministerial aprovada pela OMC em Singapura em 1996, até à adopção em 1998 da Declaração da OIT relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho.

Estes desenvolvimentos traduzem uma convergência crescente das opiniões a nível internacional quanto à necessidade de se assegurar o respeito integral das normas laborais fundamentais, evitando ao mesmo tempo eventuais riscos de abuso através da adopção de medidas proteccionistas unilaterais. Todavia, a comunidade internacional ainda não encontrou formas adequadas para abordar a interconexão entre a globalização, o comércio e o desenvolvimento social, nem esgotou todas as possibilidades de promover a aplicação efectiva das normas laborais fundamentais. A cuidadosa redacção da Declaração de Singapura e os acontecimentos de Seattle revelam a sensibilidade da problemática da interligação entre o comércio e as questões laborais. A adopção da Declaração da OIT de 1998 representa um importante avanço, inclusive do ponto de vista institucional, mas o desequilíbrio entre os pilares económico e social do sistema de governação global continua a dificultar a realização de progressos nas duas áreas.

Embora a discussão desta questão tenha registado alguns progressos - tendo-se chegado a acordo quanto ao carácter universal das normas laborais fundamentais - os instrumentos necessários para transformar esses direitos numa realidade universal desenvolveram-se apenas de forma dispersa e um tanto ou quanto esporádica. Para se assegurar uma aplicação efectiva das normas laborais fundamentais, parece ser possível utilizar mais eficazmente os instrumentos da OIT e, se necessário, considerar o seu eventual reforço.

A UE deverá procurar reforçar os instrumentos internacionais e europeus a fim de promover a aplicação universal das normas laborais fundamentais e reforçar a governação social global através de uma abordagem integrada, multidisciplinar, que rejeite simultaneamente e com firmeza a adopção de abordagens proteccionistas ou assentes na imposição de sanções.

5. Elementos a integrar em futuras acções da UE e a nível internacional

Os aspectos descritos nas secções que seguem, enquanto elementos de uma abordagem integrada, destinam-se a promover a aplicação universal das normas laborais fundamentais e a melhorar a governação social. Esta abordagem deverá compreender instrumentos e acções no âmbito de diferentes áreas políticas, tanto a nível da UE como a nível internacional, o que pressupõe a utilização e o reforço dos instrumentos existentes, assim como a introdução de novos instrumentos a fim de proporcionar uma forma progressiva de promover a aplicação universal das normas laborais fundamentais. Essa abordagem baseia-se nas políticas e nos princípios da UE expostos nas Conclusões do Conselho de Outubro de 1999, a saber, o carácter universal das normas laborais fundamentais, o apoio aos trabalhos da OIT e à sua colaboração com as outras organizações internacionais, bem como a rejeição de quaisquer abordagens baseadas em sanções.

5.1. Intensificação das acções a nível internacional

5.1.1. Conferir maior eficácia aos instrumentos da OIT

Nos últimos anos, a OIT reforçou muito consideravelmente os meios de que dispõe para promover o respeito das normas laborais fundamentais - muito especialmente através da sua declaração de 1998 relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho e ao seu acompanhamento, mas também através da utilização do processo de apresentação de queixas numa série de casos que conduziram à adopção de medidas a nível nacional e internacional. Além disso, tem-se recorrido com maior frequência à assistência técnica dirigida, como forma de incentivar o cumprimento das normas laborais fundamentais, como previsto na Declaração de 1998. Este desenvolvimento positivo tem de ser prosseguido e a UE poderá desempenhar aqui um papel importante, encorajando mais medidas tendentes a assegurar uma maior eficácia dos instrumentos da OIT. Neste contexto, é necessário prestar uma atenção especial às seguintes medidas:

* Procurar formas de conferir maior peso às observações formuladas nos relatórios do Comité de Peritos para a Aplicação das Convenções e Recomendações, sobretudo no que se refere às convenções fundamentais, bem como para assegurar um acompanhamento mais sistemático dessas observações. Para tal, é necessário melhorar a assistência técnica;

* Dar maior publicidade ao mecanismo de supervisão, nomeadamente no que se refere às convenções fundamentais, com vista a assegurar que as obrigações internacionais assumidas pelos países no âmbito da OIT em virtude da ratificação das convenções mereçam maior atenção em todo o sistema internacional.

* Adoptar medidas destinadas a aumentar a eficácia dos processos de apresentação de queixas. Vários países introduziram medidas autónomas a fim de suspender a cooperação para o desenvolvimento ou os benefícios do SPG em caso de violação grave e persistente das normas laborais fundamentais. Parece que seria mais vantajoso - para assegurar uma maior coerência - se essas medidas fossem adoptadas, não como resultado de uma avaliação unilateral, mas na sequência de um recurso ao processo de apresentação de queixas previsto pela OIT. Note-se, contudo, que o processo de apresentação de queixas é exclusivamente aplicável aos países que ratificaram as convenções fundamentais em causa.

Além de reforçar a eficácia do mecanismo de supervisão existente, poderia ponderar-se a possibilidade de utilizar novos meios promocionais para incentivar o cumprimento efectivo das normas laborais fundamentais. Neste contexto, poderão ser consideradas as seguintes ideias:

* Criar um sistema através do qual os Estados possam assumir mutuamente e a título voluntário o compromisso de respeitar as normas fundamentais da OIT. Esse sistema poderia implicar, nomeadamente, a assunção de um compromisso no sentido de assegurar que as convenções fundamentais serão efectivamente aplicadas no território do Estado em questão. A fim de proporcionar um incentivo de carácter comercial à participação num tal sistema, poderia prever-se a criação de um sistema de reconhecimento público para os países participantes. A ratificação das convenções pertinentes constituiria um primeiro passo, facilmente verificável. O enquadramento institucional específico desse sistema e a sua eventual integração numa organização internacional existente deveriam ser objecto de uma reflexão no futuro.

* Estudar a possibilidade de introdução de incentivos positivos num sentido mais amplo, os quais poderiam incluir a prestação de assistência técnica suplementar por parte da OIT destinada a apoiar a aplicação das convenções através da cooperação técnica no âmbito da Declaração.

Embora a aplicação universal dos direitos fundamentais seja indubitavelmente uma condição necessária, não é suficiente para assegurar simultaneamente o progresso económico e social. Coloca-se a questão de saber se é possível fazer mais a nível internacional para promover uma maior sinergia entre a globalização e o progresso em termos de desenvolvimento e justiça social num sentido mais lato. A OIT já deu um importante contributo para se compreender melhor a relação entre a globalização e as políticas sociais e de emprego a nível nacional [18]. Consequentemente, convém criar um enquadramento melhor definido e mais sistemático para essas actividades, tendo em vista a criação de um sistema interactivo para a avaliação periódica dos resultados das políticas sociais globais dos vários países. A OIT constitui a instância mais adequada para esse processo, atendendo não só à sua experiência internacionalmente reconhecida mas também à sua estrutura tripartida.

[18] Nomeadamente através dos seus estudos nacionais sobre a dimensão social da globalização (ILO Country Studies on the Social Dimension of Globalization) (Genebra, 2001).

| | A UE deverá promover, no âmbito da OIT, um debate sobre novas medidas destinadas a reforçar a eficácia da supervisão efectuada por esta organização, nomeadamente uma melhor publicidade, um acompanhamento mais efectivo e maneiras de reforçar o peso das conclusões do mecanismo de supervisão da OIT em todo o sistema internacional. A própria UE, nas suas relações bilaterais e multilaterais, deverá ter sistematicamente em conta os resultados da aplicação desse mecanismo de supervisão.

| | A UE deverá promover, e não só no âmbito da OIT, um debate sobre os novos mecanismos de promoção do respeito das normas laborais fundamentais. Para tal poderia ser tida em conta a possibilidade de criação de um novo sistema de compromissos recíprocos destinado a assegurar o cumprimento das convenções fundamentais da OIT, que contemple um mecanismo que garanta o adequado reconhecimento público desses compromissos.

| | A UE deverá promover, no âmbito da OIT, um debate sobre a criação de um novo mecanismo que assegure a análise periódica das políticas sociais a nível nacional.

5.1.2. Aumentar o apoio à assistência técnica multilateral, inclusive no âmbito da OIT

A CE e os seus Estados-Membros prestam ajuda financeira às actividades de assistência técnica da OIT. A Comissão, por seu turno, reiterou recentemente o seu compromisso de trabalhar conjuntamente com a OIT em questões como a promoção das normas laborais fundamentais, nomeadamente através de uma nova troca de cartas entre a Comissão e esta organização, efectuada em Maio de 2001. Não obstante, a CE irá considerar - e os Estados-Membros deverão fazer o mesmo - a possibilidade de aumentar a sua contribuição financeira para os programas da OIT em matéria de promoção das normas laborais fundamentais.

Além disso, a CE e os seus Estados-Membros deverão promover activamente o debate e a análise sobre desenvolvimento social e normas laborais fundamentais no âmbito de outras organizações de apoio ao desenvolvimento, nomeadamente as Instituições de Bretton Woods e a CNUCED, a fim de conferir coerência política ao apoio às normas laborais fundamentais e assegurar uma maior assistência na aplicação dessas normas como parte integrante dos programas de ajuda. Ao abordar a interligação entre a redução da pobreza e as normas laborais fundamentais, a promoção dessas normas e o desenvolvimento social deverão ser considerados como parte integrante do processo de elaboração dos documentos de estratégia para a redução da pobreza ou de instrumentos similares a nível nacional.

| | A CE e os Estados-Membros deverão prestar um maior apoio às actividades de assistência técnica da OIT enquanto meio de promoção das normas laborais fundamentais.

| | A CE e os Estados-Membros deverão promover activamente a análise e o debate sobre o desenvolvimento social e as normas laborais fundamentais no âmbito de outras organizações de apoio ao desenvolvimento, a fim de conferir coerência política ao apoio às normas laborais fundamentais e assegurar uma maior assistência à aplicação dessas normas como parte integrante dos programas de ajuda.

5.1.3. Criar uma instância de diálogo internacional

O estabelecimento e a prossecução de um diálogo permanente a nível internacional, com a participação do governos, das organizações internacionais e da sociedade civil, continua a ser a pedra angular da estratégia abrangente da UE destinada a melhorar a governação social no contexto da globalização e a promover as normas laborais fundamentais. Em conformidade com as conclusões do Conselho de 1999, a UE tem procurado encetar um diálogo permanente de âmbito internacional sobre o comércio e o desenvolvimento social e, nomeadamente, sobre as normas laborais fundamentais. O objectivo final desse diálogo é maximizar as interligações positivas entre o comércio e o desenvolvimento social, promovendo assim as normas laborais fundamentais.

Este processo deverá ser interinstitucional e basear-se nos resultados já alcançados em conferências internacionais e pelas outras organizações internacionais, tal como descrito na Parte 1 da presente comunicação. A OIT, enquanto instância competente para definir e fazer cumprir as normas laborais, deveria desempenhar um papel crucial nesse diálogo, através das suas actividades de assistência técnica, acompanhamento, apresentação de relatórios e análise. As actividades do Grupo de Trabalho sobre a Dimensão Social da Globalização poderiam proporcionar um bom ponto de partida para o subsequente processo construtivo. As discussões mantidas na reunião deste grupo de trabalho em Junho de 2001 apontam para que este se afirme ainda mais como uma instância de intercâmbio e de diálogo. A OMC, a CNUCED e o Banco Mundial - bem como as outras organizações internacionais - seriam os parceiros naturais da OIT nesse processo e deveriam trazer para o debate os resultados alcançados nas suas áreas de competência específicas.

Esse diálogo deverá ajudar a identificar os meios susceptíveis de maximizar as repercussões sociais positivas da liberalização das trocas comerciais e dos investimentos, nomeadamente através do intercâmbio de experiências concretas. As repercussões sociais devem ser entendidas num sentido amplo, com base nos processos de Copenhaga e do Rio, em matéria de desenvolvimento social e sustentável. Tendo em conta a estreita interligação entre o desenvolvimento económico e o desenvolvimento social, esse processo deverá abranger os aspectos do desenvolvimento sustentável relacionados com o desenvolvimento e a redução da pobreza, bem como analisar a relação existente entre o crescimento económico, o emprego, as desigualdades, a redução da pobreza e a protecção social. Para tal, será necessário proceder a uma análise das condições de trabalho, da competitividade, das políticas com implicações sociais destinadas a apoiar a reforma das trocas comerciais (incluindo a formação profissional), da educação, do impacto das trocas comerciais nas questões de género e das outras formas de discriminação. Essa análise poderia proporcionar um entendimento comum que contribuísse para que a liberalização das trocas comerciais e dos investimentos favorecesse o desenvolvimento social, nomeadamente o cumprimento das normas laborais fundamentais. Além disso, essa instância de diálogo internacional sobre comércio e desenvolvimento social deverá fomentar o intercâmbio de experiências sobre as consequências sociais da reforma das trocas comerciais, contribuindo assim para melhorar os métodos de avaliação prévia do impacto social da liberalização comercial.

| | A UE deve prosseguir os seus esforços para instituir um diálogo internacional permanente sobre comércio e desenvolvimento social e, nomeadamente, sobre o cumprimento das normas laborais fundamentais.

5.2. Reunir os instrumentos políticos da UE

5.2.1. Aumentar os incentivos comerciais: o Sistema de Preferências Generalizadas (SPG)

O regime do SPG da Comunidade prevê um acesso preferencial ao mercado por parte dos os países em desenvolvimento. Esse acesso preferencial é concedido de forma autónoma pela CE, sendo as modalidades de concessão de preferências no âmbito do SPG enunciadas num regulamento do Conselho. Os incentivos sociais no âmbito do regime do SPG constituem um importante instrumento de promoção das normas laborais fundamentais, devendo a CE reforçar a sua política neste domínio. O Regulamento do SPG [19] actualmente em vigor aborda a questão das normas laborais fundamentais a) prevendo um regime de incentivos positivos através do qual o cumprimento das normas laborais fundamentais dá direito à obtenção de preferências comerciais adicionais [20], e b) permitindo a suspensão total ou parcial dos seus benefícios sempre que os países beneficiários pratiquem qualquer forma de escravatura ou de trabalho forçado. No âmbito da proposta de revisão do regime do SPG, prevê-se a introdução de melhorias no regime de incentivos especiais, o que deverá originar um novo regime que entrará em vigor em 2002 [21]. Além disso, na próxima revisão do SPG, prevista para 2004, serão estudadas formas de reforçar ainda mais o impacto do SPG na promoção das normas laborais fundamentais.

[19] Regulamento (CE) nº 1256/96 do Conselho, de 20 de Junho de 1996, e Regulamento (CE) nº 3281/94 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1994.

[20] No âmbito dos incentivos especiais, podem ser concedidas preferências comerciais suplementares, mediante pedido, aos países que efectivamente apliquem as normas consagradas nas convenções nos 87 e 98 da OIT, relativas à liberdade de associação e ao direito de negociação colectiva, bem como na convenção nº 138, relativa à idade mínima.

[21] Ver documento COM(2001)293 final, adoptado pela Comissão em 12 de Junho de 2001.

Na revisão do SPG actualmente em curso, a Comissão propõe várias medidas de reforço, destinadas a incentivar os países a solicitarem incentivos especiais e a reforçarem a ligação com as normas laborais fundamentais:

- Tornar o regime mais atraente, mediante um alargamento das preferências comerciais suplementares no âmbito do regime de incentivos.

- Aumentar a transparência e racionalizar os procedimentos, por forma a ajudar os países a melhor utilizarem os incentivos especiais e as oportunidades de acesso aos mercados que lhes são oferecidas.

- Fazer do cumprimento efectivo das quatro normas laborais fundamentais, tal como enunciadas na Declaração da OIT de 1998, um requisito para a obtenção dos incentivos especiais. Além disso, no âmbito da revisão do regime do SPG actualmente em curso, a Comissão propôs a inclusão da violação grave e sistemática das normas laborais fundamentais entre os motivos que podem levar à suspensão total ou parcial dos benefícios do SPG. Deste modo, todos os países beneficiários poderão optar pelos incentivos suplementares, desde que satisfaçam o critério da aplicação efectiva das normas laborais fundamentais. Os países que apenas beneficiam de preferências gerais a título do SPG poderão perder temporariamente, na totalidade ou em parte, o benefício dessas preferências, unicamente quando se constate que infringem, de forma grave e sistemática, as normas laborais fundamentais.

- No contexto de uma futura revisão do Regulamento do SPG, a Comissão estudará a possibilidade de aperfeiçoar o regime de incentivos sociais e o vínculo com as convenções fundamentais da OIT, de modo a reforçar as possibilidades de utilização das medidas de incentivo previstas pelo SPG, tendo em vista a promoção das normas laborais fundamentais. Será concedida especial atenção à incorporação nas legislações nacionais das normas de direito substantivo contidas nas oito convenções fundamentais da OIT, bem como à eventual diferenciação entre produtos, sectores ou regiões

Para além das melhorias introduzidas no regime do SPG, mostra-se igualmente necessário definir um enquadramento da assistência técnica, a fim de ajudar os países beneficiários a melhor utilizarem os regimes especiais de incentivos, ou seja, aplicando efectivamente as normas laborais fundamentais, adaptando a sua produção e candidatando-se ao regime especial de incentivos, aumentando assim o impacto do regime do SPG. Para o efeito, seria necessário assegurar uma melhor ligação entre esses regimes de incentivo e os programas de desenvolvimento e ser tida em conta a integração das normas laborais fundamentais nos programas de desenvolvimento da CE (ver ponto 5.2.2.). De um modo mais geral, a CE deverá procurar maximizar o impacto global dos incentivos especiais, instando os outros países industrializados a adoptarem regimes especiais de incentivos semelhantes ao da CE.

| | No âmbito da revisão em curso do Regulamento do SPG da CE, o regime de incentivos sociais deverá ser reforçado, proporcionando mais e melhores oportunidades de acesso ao mercado, tornando o regime mais transparente e alargando a sua base às quatro normas laborais fundamentais previstas na Declaração da OIT de 1998. A disposição relativa à sua suspensão temporária deverá ser alargada, ampliando a sua base às violações graves e sistemáticas de qualquer das normas laborais fundamentais.

| | No contexto de uma futura revisão do regime do SPG da CE, deverá ser tida em conta a eventualidade de se aumentarem as possibilidades de utilização dos incentivos existentes no âmbito do SPG para promover a aplicação das normas laborais fundamentais.

| | A CE deve procurar maximizar o impacto global dos incentivos especiais, instando os outros países industrializados a adoptarem regimes especiais de incentivos semelhantes ao da CE.

5.2.2. Relações bilaterais: acordos, assistência e reforço das capacidades

O desenvolvimento social constitui uma das prioridades da ajuda ao desenvolvimento prestada pela Comunidade Europeia. A Comissão leva a cabo em todo o mundo uma grande variedade de projectos de desenvolvimento em matéria de direitos humanos, nomeadamente dos direitos sociais, mas deverá dar maior ênfase à promoção das normas laborais fundamentais na sua política de desenvolvimento global. Para o efeito, terá de atribuir prioridade à promoção das normas laborais fundamentais na programação da sua ajuda ao desenvolvimento.

Na sua recente comunicação "O papel da União Europeia na promoção dos direitos humanos e da democratização nos países terceiros", a Comissão propõe que, no âmbito do diálogo político com os países terceiros, as discussões incidam também sobre a forma de fazer avançar a ratificação dos instrumentos em matéria de direitos humanos fundamentais e de outros acordos internacionais baseados em direitos (nomeadamente as convenções da OIT), assim como sobre a forma de se proceder à sua aplicação efectiva. Com efeito, a Comissão acredita que o respeito dos direitos sociais e o cumprimento das normas laborais fundamentais podem contribuir para um desenvolvimento social e económico duradouro e equitativo.

O Acordo de Cotonu constituiu um importante progresso na promoção das normas laborais fundamentais no âmbito dos acordos bilaterais. A UE deverá seguir uma abordagem semelhante nos futuros acordos de comércio e de cooperação, inserindo neles disposições específicas sobre as normas laborais fundamentais. Deste modo, ajudará a integrar estas normas na cooperação económica e para o desenvolvimento, a fim de permitir uma melhor coordenação dos diferentes meios de acção e aumentar o efeito de sinergia entre os vários instrumentos políticos. Mais concretamente, o compromisso assumido quanto ao respeito das normas laborais fundamentais contidas nos acordos de cooperação fará destes instrumentos autónomos um complemento dos esforços desenvolvidos a nível multilateral para promover essas mesmas normas.

No que se refere à ajuda ao desenvolvimento, o Acordo de Cotonu oferece sem dúvida uma boa oportunidade para se debater com os países ACP a aplicação das normas laborais fundamentais. Esta oportunidade deve ser aproveitada aquando da elaboração dos documentos de estratégia por país e das discussões encetadas com os vários governos envolvidos quanto aos documentos de estratégia para a redução da pobreza.

Outros instrumentos alternativos consistem em medidas específicas de reforço das capacidades dos ministérios interessados, de modo a permitir que os governos possam formular, aprovar e fazer aplicar normas laborais nacionais que adaptem o consenso internacional sobre as convenções da OIT às realidades locais, facilitando assim a sua ratificação e aplicação, e a fim de criar mecanismos de acompanhamento realistas e capazes de reforçar o cumprimento da legislação tanto por parte dos empregadores nacionais como das empresas multinacionais. No entanto, essa ajuda não deverá ficar dependente de quaisquer novas condições impostas pela Comunidade.

O Acordo de Cotonu reconhece igualmente o potencial contributo de uma vasta gama de intervenientes não estatais. A CE deverá procurar reforçar a capacidade das organizações não governamentais locais e dos outros organismos da sociedade civil, a fim de sensibilizar os trabalhadores para os direitos consignados nas convenções da OIT e acompanhar o cumprimento das normas laborais fundamentais.

As medidas especificamente destinadas a eliminar o trabalho infantil visam, entre outras coisas: desenvolver programas efectivos e de duração limitada para eliminar as piores formas de trabalho infantil, mediante a prevenção, a protecção e a reabilitação; garantir o acesso a um ensino básico gratuito e de qualidade e, sempre que possível e adequado, à formação profissional para todas as crianças; dar maior visibilidade ao trabalho infantil, mediante a recolha, a análise e a divulgação de dados; bem como promover a sensibilização para o direito das crianças à protecção contra a exploração económica e para a necessidade de levar a cabo acções prioritárias de luta contra as piores formas de trabalho infantil.

| | A CE deverá assegurar uma melhor integração das normas laborais fundamentais na sua política de desenvolvimento, em conformidade com o objectivo global de redução da pobreza, nomeadamente através do reforço das capacidades dos países em desenvolvimento para porem em prática as normas laborais fundamentais.

| | A CE e os Estados-Membros deverão reforçar a ligação entre o regime do SPG e os programas de desenvolvimento, a fim de ajudar os países a utilizar da melhor forma os regimes de incentivos para a promoção das normas laborais fundamentais.

| | A UE deverá alargar a abordagem do Acordo de Cotonu a outros acordos, procurando incluir neles disposições específicas sobre as normas laborais fundamentais.

5.2.3. Utilizar melhor as avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável

As avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável são um instrumento relativamente novo no domínio da política comercial. Essas avaliações têm por objectivo avaliar e, consequentemente, ter em consideração o impacto da política comercial no desenvolvimento sustentável, nomeadamente na sua componente social. Os principais indicadores inicialmente utilizados pela Comissão nas avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável são os seguintes: o rendimento real médio; o emprego; a formação de capital fixo bruto; a equidade e a pobreza; a saúde e a educação; as desigualdades entre os géneros; a qualidade ambiental do ar, da água e dos solos; a biodiversidade e as outras reservas de recursos naturais. Estes indicadores de base podem sofrer ajustamentos à medida que este instrumento for evoluindo.

O recurso às avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável pode ajudar os responsáveis políticos a compreenderem mais claramente a forma como as trocas comerciais podem contribuir para o desenvolvimento social e a concentrar os seus esforços em objectivos que promovam o crescimento económico, apoiando simultaneamente o desenvolvimento sustentável. Pode ainda ajudar a identificar medidas para melhorar o impacto da reforma das trocas comerciais. As avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável podem também proporcionar uma base útil para a adopção de medidas noutras áreas políticas tendentes a promover o impacto positivo da reforma das trocas comerciais sobre o desenvolvimento social, nomeadamente no que respeita às normas laborais fundamentais e à regulamentação em matéria social. A Comissão está empenhada em utilizar essas avaliações como um contributo para a definição das políticas a adoptar no âmbito das importantes negociações comerciais multilaterais. As avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável serão aplicadas à agenda integrada da OMC bem como à futura ronda de negociações comerciais multilaterais no âmbito desta organização. As avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável serão também integradas nas negociações comerciais regionais ACP-CE, devendo ser igualmente aplicadas a futuros acordos bilaterais.

| | A Comissão utilizará as avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável no âmbito das futuras negociações de acordos comerciais e continuará a ajustar e a desenvolver a sua metodologia, sempre que necessário, de forma a aperfeiçoar este instrumento. Neste contexto, a Comissão estudará formas de melhor reflectir as consequências da política comercial no desenvolvimento social e na promoção das normas laborais fundamentais.

5.3. Regimes privados e voluntários para promover as normas laborais fundamentais: rotulagem social e códigos de conduta das empresas

Estando o público cada vez mais sensibilizado para as implicações sociais e ambientais dos padrões de consumo, verifica-se actualmente uma procura crescente de produtos e investimentos socialmente responsáveis. A procura desse tipo de produtos e o interesse do público pelo impacto social e pelas normas éticas do mundo empresarial levou muitas empresas, sobretudo as que produzem bens de consumo, a introduzirem códigos de conduta que regulamentam o seu comportamento social, em reconhecimento da responsabilidade social da empresa, ou seja, a agirem em conformidade com os princípios fundamentais reconhecidos nas áreas do trabalho, dos direitos humanos e do ambiente. Para a maior parte das empresas, as relações públicas são um elemento central da responsabilidade social da empresa, pois estão bem cientes dos custos de uma publicidade negativa em termos de perda de volume de negócios e de quotas de mercado. Por isso, é-lhes crucial assegurar o acompanhamento, a certificação e a divulgação, nomeadamente através de uma contabilidade ética, das directrizes sociais. Têm-se vindo a multiplicar os organismos de acompanhamento existentes. Os regimes privados ou voluntários de rotulagem ética são um dos aspectos da responsabilidade social das empresas e uma forma de conciliar o desenvolvimento social e o respeito das normas laborais fundamentais com uma competitividade acrescida. As iniciativas e os rótulos de comércio equitativo (fair trade) são exemplos de regimes de rotulagem estabelecidos e funcionais que contemplam elementos sociais [22].

[22] Ver também a comunicação da Comissão ao Conselho relativa ao comércio equitativo, COM(1999)619 final, de 29 de Novembro de 1999.

Os códigos de conduta, as directrizes e os regimes de rotulagem voluntários e privados constituem instrumentos importantes para promover o desenvolvimento social e as normas laborais fundamentais mediante o reforço da responsabilidade social das empresas. É de salientar que os regimes voluntários privados são complementares das iniciativas governamentais e não podem substituir a ratificação e a aplicação das normas laborais por parte dos governos. Saliente-se ainda que esses regimes privados devem respeitar as regras da concorrência em vigor. Simultaneamente, os regimes voluntários privados representam novas e excelentes oportunidades de acesso ao mercado, que podem revelar-se particularmente importantes para os produtores dos países em desenvolvimento. É crucial ajudar esses produtores a aproveitar estas oportunidades. Para tal, é necessário que:

- os regimes sejam objectivos, transparentes e não-discriminatórios, de modo a que os produtores tenham uma oportunidade equitativa de se familiarizarem com os requisitos e de os satisfazerem.

- os procedimentos para a obtenção desses rótulos sejam equitativos, proporcionais e não desnecessariamente dispendiosos, de modo a não excluir os produtores dos países em desenvolvimento.

- As necessidades dos produtores dos países em desenvolvimento sejam tidas em consideração nos programas de desenvolvimento, através de medidas de reforço das capacidades destinadas a ajudar os sectores ou regiões de países em desenvolvimento a adaptarem a sua produção de modo a satisfazerem os requisitos necessários à obtenção de um melhor acesso ao mercado.

A crescente importância de iniciativas privadas como os códigos de conduta e os rótulos sociais, assim como a necessidade de assegurar maior coerência e transparência relativamente a essas iniciativas, levaram a Comissão a elaborar o Livro Verde sobre a Promoção de um Enquadramento Europeu para a Responsabilidade Social das Empresas [23]. Esse documento aborda, entre outras coisas, a necessidade de coerência dos conteúdos dos diferentes códigos, bem como a necessidade de esses códigos se basearem nas normas fundamentais da OIT.

[23] Esta iniciativa foi adoptada na sequência das conclusões do Conselho Europeu de Nice, de Dezembro de 2000, nas quais o Conselho salientou a importância de se enfrentar as consequências sociais e em termos de emprego da integração económica e comercial, bem como de se adaptar as condições de trabalho à nova economia.

A utilização das convenções fundamentais da OIT em regimes privados e voluntários melhora claramente a transparência e torna mais fácil aos produtores o cumprimento dos requisitos necessários. Simultaneamente, a divulgação da verificação e da certificação dos regimes privados e voluntários constitui um motivo de grande preocupação, uma vez que esses regimes são cada vez mais utilizados. Com efeito, corre-se o risco de a proliferação de códigos e rótulos totalmente diferentes, sem normas comuns e obrigatórias relativamente ao seu conteúdo e aplicação, poder comprometer a sua credibilidade. Por conseguinte, é necessário reflectir aprofundadamente sobre os mecanismos internacionalmente reconhecidos ou sobre a definição de normas comuns para a verificação e a certificação dos regimes voluntários.

| | A CE e os Estados-Membros deverão ajudar os países em desenvolvimento a utilizar as excelentes oportunidades de acesso ao mercado oferecidas pelos regimes de rotulagem social, nomeadamente através do reforço das capacidades e do apoio aos esforços tendentes a aumentar a transparência, a disponibilidade e a não-discriminação dos regimes.

| | A Comissão é favorável a que as empresas e o sector do voluntariado apliquem regimes de rotulagem objectivos, transparentes e não-discriminatórios, que respeitem as obrigações internacionais da CE e as regras da concorrência em vigor e que se destinem a promover as normas laborais fundamentais, apoiando a utilização das convenções fundamentais da OIT como uma norma mínima comum para esses regimes.

| | A UE deverá promover a sensibilização do público e a realização de um debate sobre os instrumentos ou normas internacionais em matéria de certificação e de verificação dos regimes privados e voluntários, assegurando um controlo efectivo da sua qualidade.

| | A UE deverá continuar a apoiar os trabalhos da OIT no que respeita às iniciativas voluntárias privadas.

6. Conclusões

A interconexão entre a globalização, as trocas comerciais e o desenvolvimento social é extremamente complexa e diz respeito a uma série de áreas políticas que partilham do objectivo do desenvolvimento sustentável. Consequentemente, para melhorar a governação social e promover as normas laborais fundamentais no contexto da globalização e da liberalização das trocas comerciais, torna-se necessário adoptar uma abordagem abrangente. Para o efeito, a Comissão propõe que o Conselho adopte uma estratégia para melhorar a governação social global que promova as normas laborais fundamentais no contexto da globalização, tendo em consideração as posições do Parlamento Europeu e do Comité Económico e Social, que são igualmente destinatários da presente comunicação. O Conselho poderia começar por reafirmar os princípios básicos da posição da CE, delineada nas sua conclusões de Outubro de 1999, nomeadamente o carácter universal das normas laborais fundamentais, o apoio aos trabalhos da OIT e à sua colaboração com as outras organizações internacionais, bem como a rejeição de quaisquer abordagens assentes em sanções. Além disso, deveria ser encarada a possibilidade de se adoptar uma série de iniciativas, incluindo não só as acções a levar a cabo pela UE, que simultaneamente incitaria outros parceiros a fazer o mesmo, mas também iniciativas a adoptar a nível internacional. A este respeito,

A nível internacional

| | A UE deverá promover, no âmbito da OIT, um debate sobre novas medidas destinadas a reforçar a eficácia da supervisão efectuada por esta organização, nomeadamente uma melhor publicidade, um acompanhamento mais efectivo e maneiras de reforçar o peso das conclusões do mecanismo de supervisão da OIT em todo o sistema internacional. A própria UE, nas suas relações bilaterais e multilaterais, deverá ter sistematicamente em conta os resultados da aplicação desse mecanismo de supervisão.

| | A UE deverá promover, e não só no âmbito da OIT, um debate sobre os novos mecanismos de promoção do respeito das normas laborais fundamentais. Para tal poderia ser tida em conta a possibilidade de criação de um novo sistema de compromissos recíprocos destinado a assegurar o cumprimento das convenções fundamentais da OIT, que contemple um mecanismo que garanta o adequado reconhecimento público desses compromissos.

| | A UE deverá promover, no âmbito da OIT, um debate sobre a criação de um novo mecanismo que assegure a análise periódica das políticas sociais a nível nacional.

| | A CE e os Estados-Membros deverão prestar um maior apoio às actividades de assistência técnica da OIT enquanto meio de promoção das normas laborais fundamentais.

| | A CE e os Estados-Membros deverão promover activamente a análise e o debate sobre o desenvolvimento social e as normas laborais fundamentais no âmbito de outras organizações de apoio ao desenvolvimento, a fim de conferir coerência política ao apoio às normas laborais fundamentais e assegurar uma maior assistência à aplicação dessas normas como parte integrante dos programas de ajuda.

| | A UE deve prosseguir os seus esforços para instituir um diálogo internacional permanente sobre comércio e desenvolvimento social e, nomeadamente, sobre o cumprimento das normas laborais fundamentais.

A nível da UE

| | No âmbito da revisão em curso do Regulamento do SPG da CE, o regime de incentivos sociais deverá ser reforçado, proporcionando mais e melhores oportunidades de acesso ao mercado, tornando o regime mais transparente e alargando a sua base às quatro normas laborais fundamentais previstas na Declaração da OIT de 1998. A disposição relativa à sua suspensão temporária deverá ser alargada, ampliando a sua base às violações graves e sistemáticas de qualquer das normas laborais fundamentais.

| | No contexto de uma futura revisão do regime do SPG da CE, deverá ser tida em conta a eventualidade de se aumentarem as possibilidades de utilização dos incentivos existentes no âmbito do SPG para promover a aplicação das normas laborais fundamentais.

| | A CE deve procurar maximizar o impacto global dos incentivos especiais, instando os outros países industrializados a adoptarem regimes especiais de incentivos semelhantes ao da CE.

| | A CE deverá assegurar uma melhor integração das normas laborais fundamentais na sua política de desenvolvimento, em conformidade com o objectivo global de redução da pobreza, nomeadamente através do reforço das capacidades dos países em desenvolvimento para porem em prática as normas laborais fundamentais.

| | A CE e os Estados-Membros deverão ajudar os países em desenvolvimento a utilizar as excelentes oportunidades de acesso ao mercado oferecidas pelos regimes de rotulagem social, nomeadamente através do reforço das capacidades e do apoio aos esforços tendentes a aumentar a transparência, a disponibilidade e a não-discriminação dos regimes.

| | A CE e os Estados-Membros deverão reforçar a ligação entre o regime do SPG e os programas de desenvolvimento, a fim de ajudar os países a utilizarem da melhor forma os regimes de incentivos para a promoção das normas laborais fundamentais.

| | A UE deverá alargar a abordagem do Acordo de Cotonu a outros acordos, procurando incluir neles disposições específicas sobre as normas laborais fundamentais.

| | A Comissão utilizará as avaliações do impacto no desenvolvimento sustentável no âmbito das futuras negociações de acordos comerciais e continuará a ajustar e a desenvolver a sua metodologia, sempre que necessário, de forma a aperfeiçoar este instrumento. Neste contexto, a Comissão estudará formas de melhor reflectir as consequências da política comercial no desenvolvimento social e na promoção das normas laborais fundamentais.

| | A Comissão é favorável a que as empresas e o sector do voluntariado apliquem regimes de rotulagem objectivos, transparentes e não-discriminatórios, que respeitem as obrigações internacionais da CE e as regras da concorrência em vigor e que se destinem a promover as normas laborais fundamentais, apoiando a utilização das convenções fundamentais da OIT como uma norma mínima comum para esses regimes.

| | A UE deverá promover a sensibilização do público e a realização de um debate sobre os instrumentos ou normas internacionais em matéria de certificação e de verificação dos regimes privados e voluntários, assegurando um controlo efectivo da sua qualidade.

| | A UE deverá continuar a apoiar os trabalhos da OIT no que respeita às iniciativas voluntárias privadas.

ANEXO 1

Conclusões do Conselho de Outubro de 1999 sobre comércio e trabalho

O Conselho acordou em que a UE deverá apoiar fortemente a protecção das normas laborais fundamentais. Neste contexto, o Conselho debateu circunstanciadamente o papel que a OMC deverá desempenhar na promoção do cumprimento dessas normas, assim como as implicações de uma iniciativa desenvolvida para esse efeito pela UE no âmbito da OMC. O Conselho relembrou a importância da Declaração de Singapura e acordou em que deveriam ser tomadas iniciativas adicionais de acordo com as seguintes directrizes:

A OMC deverá, em cooperação com outras organizações internacionais pertinentes, encorajar a adopção de incentivos positivos para promover o cumprimento das normas laborais fundamentais. Para o efeito, a UE deverá manter um diálogo permanente com os seus parceiros no âmbito da OMC e da OIT, assim como com a sociedade civil, a fim de definir e de aprovar abordagens que defendam da melhor forma os interesses daqueles que são realmente afectados por estas questões.

A União Europeia defenderá as seguintes medidas para avançar na questão do comércio e dos direitos laborais:

- cooperação reforçada entre a OMC e a OIT e os respectivos secretariados;

- apoio aos trabalhos da OIT e ao seu papel de observador na OMC;

- criação de um Fórum de Trabalho Permanente Conjunto OIT/OMC sobre comércio, globalização e questões laborais destinado a promover uma melhor compreensão das questões envolvidas, através de um diálogo substantivo entre todas as partes interessadas (nomeadamente os governos, os empregadores, os sindicatos e as outras organizações internacionais interessadas). Esse diálogo deverá incluir uma análise da relação entre política comercial, liberalização das trocas comerciais, desenvolvimento e direitos laborais fundamentais. Esse Fórum deverá preparar uma reunião a nível ministerial, a realizar o mais tardar em 2001. A UE oferece-se para acolher essa reunião;

- prossecução e encorajamento da adopção de novas medidas positivas, com base nos incentivos já aplicados pela UE para reforçar os direitos laborais, nomeadamente através da introdução de novos melhoramentos no que respeita ao acesso ao mercado das exportações dos países em desenvolvimento, e nunca através de medidas restritivas do comércio.

O Conselho confirmou a firme oposição da UE a quaisquer abordagens assentes na imposição de sanções. O Conselho acordou igualmente em procurar obter um consenso internacional através de debates e de negociações com os seus parceiros. A UE opõe-se e rejeita toda e qualquer iniciativa que vise utilizar os direitos laborais para fins proteccionistas. O Conselho acordou ainda em que as vantagens comparativas de determinados países, nomeadamente dos países em desenvolvimento com baixos salários, não devem de forma alguma ser postas em causa.

ANEXO 2

Normas laborais fundamentais: as oito convenções fundamentais da OIT

Liberdade de associação e reconhecimento efectivo do direito de negociação colectiva:

* Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Protecção do Direito Sindical, 1948 (Convenção nº 87)

- ratificada por 137 países [24]

[24] O número de ratificações diz respeito à situação existente em 12 de Julho de 2001. A OIT é composta por 175 membros.

* Convenção sobre o Direito de Organização e de Negociação Colectiva, 1949 (Convenção nº 98)

- ratificada por 149 países

Eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório:

* Convenção sobre o Trabalho Forçado, 1930 (Convenção nº 29)

- ratificada por 158 países

* Convenção sobre a Abolição do Trabalho Forçado, 1957 (Convenção nº 105)

- ratificada por 156 países

Abolição efectiva do trabalho infantil:

* Convenção sobre a Idade Mínima, 1973 (Convenção nº 138)

- ratificada por 111 países

* Convenção sobre as Piores Formas de Trabalho de Menores, 1999 (Convenção nº 182)

- ratificada por 87 países

Eliminação da discriminação no domínio do emprego e da profissão:

* Convenção sobre a Igualdade da Remuneração, 1951 (Convenção nº 100)

- ratificada por 153 países

* Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), 1958 (Convenção nº 111)

- ratificada por 151 países

ANEXO 3

Um exemplo da assistência técnica da OIT: PROGRAMAS GLOBAIS PARA A ELIMINAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL

Programa-modelo para a indústria de bolas futebol do Paquistão

Em 1996, cerca de 7 000 crianças trabalhavam a coser bolas de futebol no distrito de Sialkot, no Paquistão. Sialkot é o centro da indústria de bolas de futebol deste país, que obtém elevados rendimentos em divisas fortes. Cerca de 20% da mão-de-obra era constituída por crianças. Graças à utilização de um modelo de prevenção, retirada, reinserção e acompanhamento, o IPEC conseguiu convencer toda uma indústria a evitar e a eliminar progressivamente o trabalho infantil, proporcionando simultaneamente alternativas para manter as crianças afastadas do trabalho.

Em 1997, a OIT, a UNICEF e a Câmara de Comércio e Indústria de Sialkot celebraram um acordo sobre um projecto conjunto destinado a prevenir e a eliminar o trabalho de crianças com menos de 14 anos de idade na indústria de bolas de futebol. Esse acordo:

* prevê um sistema de controlo interno, baseado nas empresas;

* cria um sistema externo, implementado pelo IPEC, para acompanhar o cumprimento do acordo;

* identifica e retira de forma faseada os menores que trabalham a tempo inteiro;

* proporciona oportunidades educativas e outros serviços de apoio às crianças e às respectivas famílias.

Resultados alcançados

* Cerca de 6 400 crianças frequentam actualmente os centros de ensino.

* As crianças continuam a trabalhar em casa a tempo parcial, a fim de auferirem uma remuneração, usufruindo simultaneamente dos serviços educativos e de reinserção.

* O número de fabricantes participantes no programa, que em 1997 era de 22, atingiu os 65 em Fevereiro de 2000.

* O IPEC controla 100% da produção em mais de 1 799 centros de confecção de bolas de futebol.

* Esta experiência foi reproduzida no Paquistão, na indústria de tapetes, e também na Índia, na indústria de confecção de bolas de futebol.

ANEXO 4

Estudo da OCDE sobre Comércio Internacional e Normas laborais fundamentais, 2000

Principais conclusões da análise da literatura existente neste domínio

* O reforço das normas laborais fundamentais pode contribuir para o crescimento económico e a eficiência, mediante o aumento dos níveis de qualificação da mão-de-obra e o incentivo à inovação e a uma maior produtividade.

* Os países com normas laborais fundamentais pouco exigentes não obtêm melhores resultados em termos de exportações do que os países que aplicam normas mais exigentes.

* Os países que possuem instituições democráticas - nomeadamente as que defendem os direitos laborais fundamentais - sobreviverão à transição para a liberalização das trocas comerciais, a qual terá para eles consequências menos negativas do que para os países que não possuam tais instituições.

* Continuam a ser divergentes as opiniões sobre o impacto do comércio nos padrões de emprego e/ou na desigualdade salarial em comparação com o impacto de outros aspectos. Muitos estudos confirmam que o comércio tem um certo impacto, embora limitado.

* Os receios quanto a um "nivelamento por baixo" das normas laborais são provavelmente exagerados.

* As intervenções de carácter comercial não são a melhor forma de abolir a exploração da mão-de-obra infantil e alargar a formação de capital humano. Em determinadas circunstâncias, a proibição do trabalho infantil pode revelar-se eficaz, mas existem limites para uma tal política, podendo a sua proibição absoluta piorar, de facto, as condições dos agregados familiares. A concessão de subsídios às famílias para manterem as crianças na escola pode vir a revelar-se uma política mais eficaz [25].

[25] Para conhecer os resultados do Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho (IPEC) na aplicação do seu programa-modelo aos países seleccionados, ver o ponto 2.2. supra.

ANEXO 5

Iniciativa "Global Compact": os nove princípios

O Secretário-Geral da ONU solicitou ao mundo empresarial que:

Direitos Humanos

1. Apoiem e respeitem a protecção dos direitos humanos internacionais no âmbito da respectiva esfera de influência;

2. Garantam que as sua próprias empresas não são cúmplices de violações dos direitos humanos.

Trabalho

3. Apoiem a liberdade de associação e o reconhecimento efectivo do direito de negociação colectiva;

4. Apoiem a eliminação de todas as formas de trabalho forçado e obrigatório;

5. Apoiem a abolição efectiva do trabalho infantil;

6. Apoiem a eliminação da discriminação no domínio do emprego e da profissão.

Ambiente

7. Adoptem uma abordagem prudente relativamente aos desafios ambientais;

8. Tomem iniciativas para promover uma maior responsabilidade ambiental;

9. Incentivem o desenvolvimento e a divulgação de tecnologias não prejudiciais para o ambiente.

ANEXO 6

Artigo 50º do Acordo de Cotonu

Comércio e normas do trabalho

1. As Partes reafirmam o seu compromisso de respeitar as normas fundamentais do trabalho internacionalmente reconhecidas e definidas nas convenções pertinentes da Organização Internacional do Trabalho, designadamente em matéria de liberdade de associação e de negociação colectiva, abolição do trabalho forçado e das formas mais duras de trabalho infantil, e não discriminação em matéria de emprego.

2. As Partes acordam em desenvolver a sua cooperação nesta matéria, nomeadamente nos seguintes domínios:

- intercâmbio de informações sobre a legislação e a regulamentação laboral;

- adopção de legislação laboral nacional e reforço da legislação em vigor;

- execução de programas de educação e de sensibilização;

- controlo da aplicação das disposições legislativas e regulamentares nacionais em matéria laboral.

3. As Partes acordam em que as normas laborais não serão utilizadas para fins de proteccionismo comercial.

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