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Document 32000D0521

2000/521/CE: Decisão da Comissão, de 26 de Julho de 2000, nos termos do n.o 3 do artigo 86.o do Tratado CE [notificada com o número C(2000) 2267] (Texto relevante para efeitos do EEE) (Apenas faz fé o texto em língua espanhola)

JO L 208 de 18.8.2000, p. 36–46 (ES, DA, DE, EL, EN, FR, IT, NL, PT, FI, SV)

Legal status of the document In force

ELI: http://data.europa.eu/eli/dec/2000/521/oj

32000D0521

2000/521/CE: Decisão da Comissão, de 26 de Julho de 2000, nos termos do n.o 3 do artigo 86.o do Tratado CE [notificada com o número C(2000) 2267] (Texto relevante para efeitos do EEE) (Apenas faz fé o texto em língua espanhola)

Jornal Oficial nº L 208 de 18/08/2000 p. 0036 - 0046


Decisão da Comissão

de 26 de Julho de 2000

nos termos do n.o 3 do artigo 86.o do Tratado CE

[notificada com o número C(2000) 2267]

(Apenas faz fé o texto em língua espanhola)

(Texto relevante para efeitos do EEE)

(2000/521/CE)

A COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS,

Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia e, nomeadamente, o n.o 3 do seu artigo 86.o e o artigo 82.o,

Após ter dado às autoridades espanholas, à AENA (Aeropuertos Españoles y Navegación Aérea), à Iberia, (Iberia Líneas Aéreas de España); à Aviaco (Aviación y Comercio SA) e à Binter (Binter Canarias SA) a oportunidade de apresentarem as suas observações relativamente às objecções da Comissão em relação ao sistema de descontos sobre as taxas de aterragem aplicado nos aeroportos espanhóis,

Considerando o seguinte:

I. OS FACTOS

a) A medida estatal em causa

(1) Em 1999, os aeroportos espanhóis registaram um movimento de 63 milhões de passageiros (partidas), dos quais 32 milhões com destinos intracomunitários e 25 milhões com destinos domésticos. Todos os 41 aeroportos espanhóis, que são exclusivamente responsáveis pelo tráfego aéreo comercial, são geridos pela AENA.

(2) Segundo a constituição espanhola, o Governo espanhol é responsável pelos aeroportos comerciais que sejam de "interesse público". Este "interesse público" foi considerado aplicável a todos os aeroportos comerciais existentes em Espanha.

(3) As taxas de aterragem nos aeroportos espanhóis e a respectiva diferenciação estão estabelecidas nos Decretos Reais 1064/1991(1), e 1268/1994(2) e n.o 3 do artigo 83.o da Lei 41/1994(3) (lei do orçamento geral do Estado).

(4) O artigo 7.o do Decreto Real 1064/1991, com a redacção que lhe foi dada pelo artigo 11.o do Decreto Real 1268/94 distingue três categorias de aeroportos geridos pela AENA consoante a importância do seu tráfego.

Quadro 1

Categorias de aeroportos espanhóis

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(5) O artigo 1.o do Decreto Real 1064/91 estipula que "a taxa de aterragem constitui um imposto estatal que é calculado consoante a utilização das pistas pelas aeronaves e a prestação de serviços específicos para a referida utilização diferentes da assistência em terra (...)".

(6) O artigo 7.o do Decreto Real 1064/91 estabelece o montante das respectivas taxas. Relativamente aos voos nacionais, as taxas de aterragem são calculadas em função do peso máximo de descolagem como referido no quadro infra:

Quadro 2

Taxas de aterragem em Espanha no ano 2000

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(7) O artigo 7.o distingue entre voos domésticos, intracomunitários e extracomunitários. As taxas de aterragem actualmente em vigor para os voos internacionais são as seguintes:

Quadro 3

Taxas de aterragem em Espanha no ano 2000

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(8) Como segunda medida, o artigo 7.o do Decreto Real 1064/91 concede descontos consoante o número de aterragens por mês num dado aeroporto. As primeiras 50 aterragens não beneficiam de desconto. A partir da 51.a até à 100.a aterragem é concedido um desconto de cerca de 9 %. O desconto é proporcional ao número de operações de aterragem mensais. Como se pode depreender do quadro infra, os descontos mais substanciais só estão ao alcance das companhias que efectuam mais de 200 operações de aterragem por mês.

Quadro 4

Descontos sobre as taxas de aterragem em aeroportos espanhóis no ano 2000

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(9) Por fim, em 1998, o Governo espanhol introduziu um desconto de 15 a 70 % para os voos regulares com destino às Canárias, Baleares e Melilla.

(10) O artigo 9.o do Decreto Real 1268/94 estipula o seguinte: "A AENA, organismo público a quem compete a exploração e a gestão dos aeroportos, será o órgão gestor da taxa estabelecida neste Decreto Real.".

(11) O n.o 3 do artigo 83.o da Lei 41/1994 (lei do orçamento geral do Estado) fixa o nível actual das taxas de aterragem cobradas às companhias aéreas.

b) As empresas e os serviços em causa

(12) A AENA é uma empresa pública criada ao abrigo do artigo 82.o da lei do orçamento geral do Estado de 1990. Esta lei concede à AENA o direito exclusivo de administrar as infra-estruturas aeroportuárias de 41 aeroportos situados em território espanhol. Compete igualmente à AENA o controlo do tráfego aéreo.

(13) A AENA cobra taxas aeroportuárias como contrapartida pelos serviços de aterragem e de descolagem prestados às aeronaves que utilizam as infra-estruturas geridas pela AENA.

(14) A Iberia é uma companhia aérea espanhola detida em 84,74 % pelo Estado. A sua principal actividade consiste no transporte de passageiros entre as 10 principais cidades espanholas, 24 cidades europeias e 34 cidades situadas fora da Comunidade. A Iberia transportou aproximadamente 21,8 milhões de passageiros em todo o mundo e 6,2 milhões de passageiros na Europa.

(15) A Iberia detém 100 % do capital da companhia aérea Binter, 99,9 % da Aviaco e 99,5 % da Viva Air.

c) As taxas de aterragem

(16) A OACI (Organização Internacional da Aviação Civil), no seu manual sobre a economia dos aeroportos(4), recomenda aos seus membros que calculem as taxas de aterragem em função do peso máximo de descolagem, apresentando a seguinte definição de taxa de aterragem:

"Direitos e taxas cobrados pela utilização das pistas, circulação no solo e áreas de tráfego, incluindo a correspondente iluminação, assim como pelos serviços de controlo de aproximação e de aeródromo."

(17) A taxa corresponde à imputação dos "custos de exploração e de manutenção e encargos administrativos imputáveis a estas áreas, bem como aos veículos e ao respectivo equipamento, incluindo as despesas relativas à mão-de-obra, ao veículo de manutenção, à electricidade e combustíveis"(5).

d) Principais argumentos das autoridades espanholas e da AENA

(18) Em 28 de Abril de 1997, a Comissão Europeia enviou às autoridades espanholas, uma carta de notificação em que assinalava que o sistema de desconto vigente e a diferenciação das taxas consoante a origem do voo favoreciam as companhias aéreas nacionais. Em 21 de Outubro de 1997, as autoridades espanholas contestaram que o sistema de desconto se aplicava a todas as companhias aéreas, independentemente da sua nacionalidade e que os descontos eram inferiores aos examinados na Decisão 95/364/CE da Comissão(6), relativa ao sistema de descontos sobre as taxas de aterragem no Aeroporto Nacional de Bruxelas (Zaventem). Segundo as autoridades espanholas, a maioria dos descontos concedidos às companhias espanholas correspondiam a voos domésticos, não afectando, por conseguinte, o comércio entre os Estados-Membros.

(19) As autoridades espanholas comprometeram-se a reduzir gradualmente a diferença entre as taxas de aterragem para voos nacionais e intracomunitários, até à sua completa supressão em 1999.

(20) Contudo, em 1997 as taxas de aterragem para os voos domésticos e intracomunitários aumentaram em média cerca de 8 %. Enquanto que em 1998 as taxas para os voos intracomunitários aumentaram um pouco menos do que as taxas para voos domésticos, em 1999 e 2000 não se procedeu a qualquer harmonização.

(21) Em 23 de Junho de 1999, as autoridades espanholas propuseram a supressão da discriminação em função da origem do voo, desmantelando gradualmente o sistema de desconto a partir de 1 de Janeiro de 2000. Assim, a partir de 1 de Janeiro de 2002, os descontos seriam completamente suprimidos, com excepção das ilhas Canárias.

(22) As autoridades espanholas solicitaram um período de transição para suprimir gradualmente o sistema de desconto, alegando que a supressão imediata do sistema teria graves consequências para todo o sistema de transporte aéreo espanhol. Além disso, as autoridades espanholas requereram uma excepção para as ilhas Canárias, ao abrigo do disposto no artigo 299.o do Tratado CE, por motivos de coesão económica e social e que se justificaria como compensação pelo grande afastamento destas ilhas e como apoio ao desenvolvimento económico, nomeadamente ao turismo.

(23) Como se depreende dos quadros 1 a 4, até à data mantém-se em vigor a diferenciação das taxas de aterragem consoante a origem dos voos. Além disso, não se deu ainda início ao desmantelamento do sistema de desconto anunciado para 1 de Janeiro de 2000.

II. APRECIAÇÃO JURÍDICA

a) Disposições jurídicas e regulamentos processuais aplicáveis

(24) O Regulamento n.o 141 do Conselho(7), com a última redacção que lhe foi dada pelo Regulamento n.o 1002/67/CEE(8), estabelece a inaplicabilidade do Regulamento n.o 17: primeiro regulamento de execução dos artigos 85.o e 86.o do Tratado(9), com a última redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n.o 1216/1999(10), ao sector dos transportes, a fim de tomar em conta os aspectos específicos do sector dos transportes. Portanto, o âmbito de aplicação do Regulamento n.o 141 e, por conseguinte, os regulamentos processuais específicos ao sector dos transportes cobrem apenas as práticas anticoncorrenciais que relevam do mercado dos transportes.

(25) O Regulamento (CEE) n.o 3975/87 do Conselho(11), com a última redacção que lhe foi dada pelo Regulamento n.o 2410/92(12) determina as regras de aplicação dos artigos 81.o e 82.o do Tratado aos serviços de transportes aéreos.

(26) Porém, os serviços associados ao acesso às infra-estruturas aeroportuárias não fazem directamente parte do serviço de transporte aéreo prestado aos passageiros. Por conseguinte, estas actividades não são abrangidas pelo âmbito de aplicação dos regulamentos processuais específicos ao sector dos transportes, relevando antes do Regulamento n.o 17 no que se refere à aplicação dos artigos 81.o e 82.o do Tratado CE ou dos artigos 53.o e 54.o do Acordo EEE.

b) N.o 1 do artigo 86.o

(27) O n.o 1 do artigo 86.o estabelece que "no que respeita às empresas públicas e às empresas a que concedam direitos especiais ou exclusivos, os Estados-Membros não tomarão nem manterão qualquer medida contrária ao disposto no Tratado, designadamente ao disposto nos artigos 12.o e 81.o a 89.o, inclusive".

(28) A AENA é uma empresa pública na acepção do n.o 1 do artigo 86.o do Tratado CE.

(29) Os Decretos Reais 1064/1991 e 1268/1994 e a Lei 41/1994 (n.o 3 do artigo 85.o), que estabelecem as taxas de aterragem e os descontos a que se refere o ponto 3, constituem uma medida estatal na acepção do n.o 1 do artigo 86.o

c) Artigo 82.o

(30) Não há dúvida que a AENA, cuja actividade fundamental consiste na prestação de serviços de acesso às infra-estruturas aeroportuárias civis, cobrando as devidas taxas, é, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma empresa na acepção do artigo 82.o do Tratado.

O mercado relevante

(31) Tal como indicado pelo Tribunal de Justiça no processo "Porto de Génova"(13), a organização de operações portuárias, por conta de terceiros, num único porto, pode constituir um mercado relevante na acepção do artigo 82.o De igual modo, o Tribunal de Justiça considerou que os serviços de pilotagem no porto de Génova constituíam o mercado relevante no processo "Corsica Fernes II"(14).

(32) O Tribunal baseava o seu raciocínio no facto de, sempre que um operador pretendesse oferecer um serviço de transporte numa dada rota marítima, o acesso às instalações portuárias situadas de um lado e de outro desta ligação constituía uma condição indispensável para a concretização desse serviço.

(33) Esse raciocínio pode facilmente ser transposto para o sector dos transportes aéreos e acesso aos aeroportos. O mercado relevante é o dos serviços de acesso às infraestruturas aeroportuárias relativamente aos quais a taxa é paga. Mais concretamente, trata-se dos serviços associados à exploração e à manutenção das pistas, à utilização das vias de circulação e áreas de tráfego e ao encaminhamento para aproximação à pista. Trata-se de uma definição de mercado semelhante à subjacente à Decisão 95/364/CE relativa ao aeroporto de Bruxelas e às Decisões 1999/198/CE(15), sobre as taxas de aterragem aplicadas pelas autoridades aeroportuárias finlandesas e 1999/199/CE(16) sobre as taxas de aterragem nos aeroportos portugueses.

(34) Por outro lado, os mercados do transporte de passageiros e de mercadorias nas ligações aéreas de média e curta distância no EEE constituem um mercado vizinho, porém distinto, que é afectado pelos efeitos de um comportamento abusivo da empresa no mercado dos serviços necessários à aterragem e descolagem. Por conseguinte, também se podem fazer sentir neste mercado os efeitos da exploração abusiva da posição dominante detida pela AENA.

(35) Dificilmente existem alternativas aos 41 aeroportos geridos pela AENA, pelo que cada um deles constitui um mercado geográfico distinto.

(36) De facto, as companhias aéreas que oferecem serviços aéreos regulares ou serviços de charters domésticos e dentro do EEE, com destino ou partida de Espanha vêem-se na obrigação de utilizar os aeroportos geridos pela AENA. As distâncias entre estes aeroportos são consideráveis, tendo cada um uma zona de influência bem delimitada. Um dos poucos aeroportos internacionais não geridos pela AENA susceptível de servir a mesma zona geográfica é o de Lisboa que se situa a várias centenas de quilómetros de Madrid, o aeroporto espanhol com maior tráfego, e de outros aeroportos espanhóis e, além disso, não dispõe de acessibilidades adequadas por via ferroviária, de modo que não constitui uma alternativa realista.

(37) Todavia pode considerar-se que Lisboa e Madrid estão em concorrência quando uma companhia aérea utiliza um destes aeroportos como aeroporto central (hub). Contudo, no caso em apreço, é desnecessário analisar este aspecto, dado que este tipo de voos representa uma percentagem insignificante do movimento global do aeroporto de Madrid.

(38) Assim, na opinião de inúmeros passageiros procedentes de ou com destino a Espanha, os voos domésticos ou intra-EEE que utilizam os aeroportos geridos pela AENA não são substituíveis por serviços de outros aeroportos do EEE.

(39) As companhias aéreas que oferecem voos domésticos ou intra-EEE procedentes de ou com destino a Espanha só têm, por conseguinte, como alternativa os aeroportos geridos pela AENA e os serviços de acesso às infra-estruturas aeroportuárias proporcionados nestes aeroportos.

Posição dominante

(40) Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma empresa que beneficia de um monopólio legal numa parte substancial do mercado comum pode ser considerada como ocupando uma posição dominante, na acepção do artigo 82.o do Tratado(17).

(41) Todos os aeroportos administrados pela AENA ocupam uma posição dominante já que normalmente só há um aeroporto comercial em cada mercado geográfico e os entraves à entrada neste mercado (nomeadamente mediante a construção de novos aeroportos) são muito consideráveis. A AENA administra todos os 41 aeroportos comerciais de Espanha que cobrem a maior parte do tráfego aéreo civil deste país. A AENA é uma empresa pública que, na sequência da posição dominante dos aeroportos que administra e do direito exclusivo de administração desses aeroportos, ocupa uma posição dominante no mercado dos serviços de aterragem e de descolagem, pelos quais são cobradas as taxas em questão.

Uma parte substancial do mercado comum

(42) Em 1999, os aeroportos administrados pela AENA registaram um movimento total de 63 milhões de passageiros, dos quais 32 milhões aproximadamente correspondiam a voos intracomunitários. Por estes aeroportos transitaram mais de 584000 toneladas de carga. O quadro infra refere dados sobre o movimento dos aeroportos com mais de 2 milhões de passageiros por ano, que representam aproximadamente 82 % do tráfego total:

Quadro 5

Volume de tráfego nos aeroportos espanhóis

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(43) A legislação espanhola prevê para todos os aeroportos espanhóis a mesma estrutura tarifária. Devido ao importante volume de tráfego internacional dos 16 aeroportos incluídos na primeira e na segunda categorias do quadro 1, importa considerar cada um destes aeroportos como uma parte substancial do mercado comum(18).

(44) Contudo, não é necessário analisar este aspecto, dado que a AENA ocupa uma posição dominante no mercado dos serviços de aterragem e de descolagem nos 41 aeroportos comerciais de Espanha e, por conseguinte, nos mercados geográficos que cobrem em conjunto a totalidade de Espanha, que é uma parte substancial do mercado comum.

Abuso de posição dominante

(45) O sistema de taxas de aterragem e dos respectivos descontos tem por efeito que sejam aplicadas às companhias aéreas condições desiguais relativamente a prestações equivalentes para os serviços necessários à aterragem e descolagem, colocando-as assim numa situação de desvantagem concorrencial.

(46) Tal decorre da argumentação do Advogado-Geral Van Gerven no processo Corsica Ferries(19), que pode aplicar-se tanto ao sistema de descontos como à diferenciação dos preços consoante a origem dos voos:

"O que é importante é que não existe qualquer nexo entre estas diferenças tarifárias e a natureza do serviço de pilotagem que é proposto e que é exactamente idêntico nos dois casos (...). Considero que estamos aqui claramente em presença de um caso de aplicação da figura de abuso de posição dominante que é prevista pelo artigo 86.o(20) do Tratado CEE e que consiste em 'aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência'. Quanto a este aspecto, pode efectivamente estabelecer-se um paralelo com a situação que estava em causa no processo United Brands (acórdão de 14 de Fevereiro de 1978, 27/76, Col., p. 207): o Tribunal de Justiça considerou que a política de preços discriminatórios da UBC, que facturava aos amadurecedores-distribuidores preços diferentes de Estado-Membro para Estado-Membro, relativamente ao fornecimento de quantidades e de tipos de bananas essencialmente idênticos, constituía um abuso de posição dominante, 'uma vez que esses preços discriminatórios, consoante os Estados-Membros, constituíam, nessa medida, obstáculos à livre circulação de mercadorias (n.o 232)' e que 'deste modo era criada uma compartimentação rígida dos mercados nacionais a níveis de preços artificialmente diferentes, ocasionando para certos amadurecedores-distribuidores uma desvantagem na concorrência assim falseada em relação àquilo que deveria ser (n.o 233)'. O mesmo raciocínio pode ser aplicado mutatis mutandis ao presente processo: as tarifas diferenciadas aplicadas pela corporação constituem um obstáculo à livre prestação de serviços intracomunitários de transporte marítimo e colocam as companhias que asseguram esses serviços numa posição de concorrência desvantajosa."

a) Reduções concedidas em função do número de aterragens

(47) O desconto mais baixo é concedido entre a 51.a e a 100.a aterragens efectuadas num mês. Este limiar é suficientemente baixo para permitir que um elevado número de companhias aéreas, tanto nacionais como estrangeiras, possam beneficiar do desconto. Contudo, os descontos mais elevados beneficiam especialmente as companhias espanholas, como a Iberia, a Binter Canarias, a Spanair, a Air Europa e a Air Nostrum, que gozam todas sem excepção dos descontos mais elevados. O quadro seguinte apresenta dados sobre o desconto médio aplicado às principais companhias em 1999:

Quadro 6

Taxa média para as principais companhias aéreas em 1999

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(48) Cada aterragem após 200 aterragens beneficia de uma redução de 35 %, sem quaisquer limites em termos de número de aterragens, motivo pelo qual as companhias aéreas que efectuam um número mensal de aterragens muito superior a 200, como a Iberia, beneficiam de uma taxa média de redução proporcionalmente mais elevada. Numa dada ligação em que a Iberia está em concorrência com outras transportadoras e para o mesmo tipo de avião, esta beneficia respectivamente de uma redução média de 25 % sobre os seus custos de aterragem, o que coloca as restantes transportadoras numa situação de desvantagem concorrencial. Os descontos médios de que beneficiam as companhias concorrentes para uma prestação equivalente à da AENA são bastante inferiores. Assim, este sistema beneficia de facto as companhias aéreas nacionais, isto é, a Spanair, a Binter, a Air Europa, a Air Nostrum e a Iberia. Em 1999, só a Iberia recebeu aproximadamente 62 % de todos os descontos sobre as taxas de aterragem concedidos pela AENA.

(49) Existem descontos muito diferentes apesar de o serviço prestado pela AENA exigir o mesmo trabalho para qualquer uma das companhias aéreas. Esta diferença de tratamento relativamente a um serviço (orientação da aproximação e circulação nas áreas de tráfego) que exige a mesma prestação, independentemente da companhia aérea em causa, não é justificada por qualquer motivo objectivo.

(50) As práticas comerciais consideradas normais podem constituir abusos na acepção do artigo 82.o do Tratado se forem imputáveis a uma empresa em situação de posição dominante. Uma diferença de tratamento por parte de uma empresa em posição dominante relativamente a vários clientes deve ser justificada por motivos objectivos.

(51) Um aeroporto ocupa uma posição dominante em relação a uma grande parte do seu tráfego se for de passagem obrigatória para uma transportadora que pretende servir uma dada cidade. Assim, dado que a companhia aérea não tem alternativa, existe um risco mínimo de que a companhia se proponha mudar de aeroporto para beneficiar de uma taxa menos elevada proposta por outro aeroporto. Nestas circunstâncias, os aeroportos, a menos que possam apresentar razões objectivas, não têm o direito de favorecer determinadas companhias aéreas em detrimento de outras.

(52) A existência de economias de escala, o objectivo de reduzir a poluição sonora ou o congestionamento aéreo poderiam, por exemplo, ser considerados como razões objectivas. Contudo, nos serviços de aterragem e de decolagem não existem economias de escala. Os serviços prestados não dependem da identidade do proprietário da aeronave nem do facto de serem fornecidos ao primeiro ou ao décimo avião da mesma companhia aérea.

(53) Assim, o facto de a AENA ter aplicado condições desiguais aos seus clientes do sector comercial para prestações equivalentes, colocando-os assim numa posição competitiva desvantajosa, constitui um abuso de posição dominante na acepção da alínea c) do n.o 2 do artigo 82.o

b) Taxas diferenciadas em função da natureza dos voos (domésticos ou internacionais)

(54) A diferenciação das taxas em função da natureza dos voos, ou seja de voos nacionais ou intracomunitários, também é contrária ao Tratado.

(55) A este propósito, o acórdão proferido no processo Corsica Ferries(21) é muito claro, tendo o Tribunal de Justiça declarado que:

"O n.o 1 do artigo 90.o e o artigo 86.o(22) do Tratado CE proíbem uma autoridade nacional, ao aprovar as tarifas adoptadas por uma empresa, titular do direito exclusivo de oferecer serviços de pilotagem obrigatória numa parte substancial do mercado comum, levar esta a aplicar tarifas diferentes às empresas de transporte marítimo, consoante estas últimas efectuem transportes entre Estados-Membros ou entre portos situados no território nacional."

(56) Transpondo este raciocínio do advogado-geral referido no ponto 46 para o sector dos aeroportos, verifica-se que este sistema de taxas diferenciadas de aterragem tem por efeito a aplicação de condições diferentes para o fornecimento às companhias aéreas de serviços equivalentes de aterragem e de descolagem. É óbvio que este sistema coloca as companhias aéreas que asseguram voos no EEE numa situação de desvantagem concorrencial face às que fornecem serviços domésticos. A diferenciação das taxas de aterragem consoante a origem dos voos constitui, assim, um abuso de posição dominante na acepção da alínea c) do n.o 2 do artigo 82.o

Efeitos no comércio entre os Estados-Membros

(57) No seu acórdão Corsica Fernes, o Tribunal reconheceu que a existência de práticas discriminatórias "é susceptível de afectar o comércio entre os Estados-Membros na medida em que afectam empresas que efectuam transportes entre dois Estados-Membros".

(58) A parte do tráfego intracomunitário nos aeroportos espanhóis distribui-se do seguinte modo:

Quadro 7

Tráfego de passageiros nos aeroportos espanhóis

>POSIÇÃO NUMA TABELA>

(59) O movimento aéreo entre Espanha e outros Estados-Membros da Comunidade, considerando todos os aeroportos excede com 32 milhões de passageiros o tráfego doméstico (25 milhões de passageiros). No caso das ilhas Canárias, o tráfego intracomunitário representa mais do dobro do tráfego espanhol.

(60) O tráfego entre Espanha e os países do EEE é igualmente importante. Em 1998, cerca de 871000 passageiros utilizaram voos directos entre a Noruega e Espanha.

(61) Tendo em conta o volume de tráfego entre Espanha e a Comunidade e o EEE, o impacte das medidas em causa sobre o comércio transfronteiriço é considerável.

d) Análise do n.o 1 do artigo 86.o

(62) A AENA é uma empresa pública na acepção do n.o 1 do artigo 86.o Pelos Decretos Reais 1064/91 e 1268/94 e pela Lei 41/1994, o Estado espanhol obriga a AENA a aplicar taxas de aterragem nos aeroportos espanhóis que variam consoante a origem do voo e que beneficiam de descontos em função do número de operações de aterragem por mês. Esta medida é incompatível com o artigo 82.o do Tratado CE e com o artigo 54.o do Acordo EEE. Dado que esta medida é aplicada pelo Estado espanhol, este viola o n.o 1 do artigo 86.o do Tratado CE em articulação com o artigo 82.o do referido Tratado bem como o n.o 1 do artigo 59.o do Acordo EEE em articulação com o artigo 54.o do referido acordo.

e) N.o 2 do artigo 86.o: justificação da medida

(63) Na sua resposta à carta de notificação da Comissão, as autoridades espanholas sublinharam que o sistema de descontos se aplicava a todas as companhias aéreas, quer estas fossem espanholas ou estrangeiras, não sendo assim discriminatório. Contudo, se é verdade que este sistema não discrimina de jure as companhias estrangeiras, já foi explicado supra que na prática favorece as companhias espanholas ao reduzir as suas taxas de aterragem. Não há qualquer justificação económica (por exemplo, a obtenção de economias de escala) para este sistema de descontos.

(64) As autoridades espanholas alegaram ainda que a maioria dos descontos concedidos às companhias aéreas espanholas correspondem a tráfico nacional ou extracomunitário de modo que não afectariam o tráfego intra-EEE. Contudo, esta justificação não se aplica ao principal beneficiário dos descontos, a Iberia, que recebe quase um quarto dos seus descontos com base em voos intracomunitários, isto é, 55 % de descontos dos voos domésticos, e 22 % dos voos extra-comunitários e 23 % dos voos intracomunitários. Além disso, este sistema de descontos conduz a taxas nacionais inferiores enquanto que impõe taxas mais elevadas ao tráfego intra-EEE para serviços equivalentes. Dada a importância dos voos intracomunitários no volume total de tráfego dos aeroportos espanhóis, o sistema de descontos afecta o comércio entre os Estados-Membros.

(65) As autoridades espanholas haviam aceite em princípio a supressão do sistema de descontos após um período de transição que se estenderia até 2002. Este período de transição não parece ter justificação. As autoridades espanholas não apresentaram quaisquer elementos que demonstrassem que uma supressão mais rápida do sistema de descontos seria tecnicamente impossível ou excessivamente onerosa. Além disso, tendo em conta as Decisões 95/364/CE, 1999/198/CE e 1999/199/CE, as autoridades espanholas tinham conhecimento há já algum tempo da posição da Comissão nesta matéria. Não parece assim justificar-se a concessão de um período de transição.

(66) As autoridades espanholas tencionam continuar a aplicar o sistema de descontos actual para as ilhas Canárias por razões de desenvolvimento regional e de coesão e a fim de promover as ilhas enquanto destino turístico.

(67) Estas justificações não podem ser aceites. Seria igualmente possível promover as ilhas Canárias enquanto destino turístico, aplicando descontos não discriminatórios que seriam oferecidos a todas as companhias aéreas que utilizam os aeroportos das ilhas Canárias.

(68) Além disso, não é óbvio que o sistema actual de taxas de aterragem contribua efectivamente para o desenvolvimento das ilhas Canárias enquanto destino turístico. No caso das ilhas Canárias, o tráfego intracomunitário representa mais do dobro do tráfego espanhol. O sistema de descontos actual representa de facto uma discriminação contra as companhias aéreas europeias (não espanholas). Ao impor às companhias aéreas europeias custos mais elevados, o sistema de descontos faz aumentar igualmente os custos de viagem da principal clientela turística das Canárias, ou seja, os turistas europeus não provenientes de Espanha.

f) Obrigações de serviço público

(69) As autoridades espanholas não invocaram a derrogação prevista no n.o 2 do artigo 86.o do Tratado para justificar a instauração e manutenção do sistema de descontos das taxas de aterragem.

(70) Além disso, a Comissão considera que no caso em apreço a aplicação das regras de concorrência não constitui obstáculo ao cumprimento da missão particular de serviço público confiada à AENA, isto é, a manutenção e a exploração dos aeroportos espanhóis. Do mesmo modo, também não constituiria obstáculo a uma missão particular de serviço público eventualmente confiada a uma companhia aérea. De facto, as condições e as modalidades em que um Estado-Membro pode impor obrigações de serviço público aos serviços aéreos regulares intracomunitários estão definidas de forma precisa no artigo 4.o do Regulamento (CEE) n.o 2408/92 do Conselho, de 23 de Julho de 1992, relativo ao acesso das transportadoras aéreas comunitárias às rotas aéreas(23).

(71) Assim, a derrogação prevista no n.o 2 do artigo 86.o não se aplica.

g) Conclusão

(72) A análise anterior estabelece que o sistema de taxas de aterragem aplicado pela AENA implica, para o mesmo serviço de utilização das pistas, circulação no solo e áreas de tráfego e de controlo de aproximação, o pagamento de taxas diferentes consoante o número de aterragens mensais ou a origem do voo (doméstico ou intra-EEE) sem justificação objectiva.

(73) Tendo em conta o que precede, a Comissão considera que a medida estatal referida nos pontos 1 a 11, no que diz respeito à sua aplicação nos aeroportos espanhóis, na medida em que obriga a empresa pública AENA a aplicar o referido sistema, constitui uma infracção ao n.o 1 do artigo 86.o do Tratado em articulação com o artigo 82.o bem como ao n.o 1 do artigo 59.o do Acordo sobre o EEE em articulação com o artigo 54.o do referido acordo,

ADOPTOU A PRESENTE DECISÃO:

Artigo 1.o

O sistema de descontos sobre as taxas de aterragem e a diferenciação das taxas de aterragem em função da origem do voo introduzidos pelos Decretos Reais 1064/91 e 1268/94 e pela Lei 41/1994, constitui uma medida incompatível com o n.o 1 do artigo 86.o do Tratado em articulação com o artigo 82.o do referido Tratado e o artigo 59.o do Acordo sobre o EEE em articulação com o artigo 54.o do referido acordo.

Artigo 2.o

A Espanha porá termo à infracção referida no artigo 1.o e informará a Comissão das medidas tomadas para esse efeito, no prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão.

Artigo 3.o

O Reino de Espanha é o destinatário da presente decisão.

Feito em Bruxelas, em 26 de Julho de 2000.

Pela Comissão

Mario Monti

Membro da Comissão

(1) BOE (Jornal Oficial espanhol) n.o 163 de 9.7.1991, p. 22730.

(2) BOE (Jornal Oficial espanhol) n.o 157 de 2.7.1994, p. 21317.

(3) BOE (Jornal Oficial espanhol) n.o 312 de 30.12.1994, p. 37510.

(4) Manual sobre a economia dos aeroportos - Documento 9562.1991. ICAO.

(5) Ibidem.

(6) JO L 216 de 12.9.1995, p. 8.

(7) JO 124 de 28.11.1962, p. 2751/62.

(8) JO L 148 de 15.6.1999, p. 5.

(9) JO 306 de 16.12.1967, p. 1/67.

(10) JO L 13 de 21.2.1962, p. 204/62.

(11) JO L 374 de 31.12.1987, p. 1.

(12) JO L 240 de 24.8.1992, p. 18.

(13) Processo C-179/90: Porto di Genova SpA v Siderurgica Gabrielli SpA, (1991) Col. p. I-5889.

(14) Processo C-18/93: Corsica Ferries Italia Srl v Corpo dei Piloti del Porto di Genova, (1994) Col. p. I-1783.

(15) JO L 69 de 16.3.1999, p. 24.

(16) JO L 69 de 16.3.1999, p. 31.

(17) Processo C-41/90: Höfner e Elser v Macrotron (1991) Col. p. I-1979, ponto 28; Processo C-260/89 ERT v DRP (1991) Col. p. I-2925, ponto 31.

(18) Processo C-179/90: Porto di Genova, Col. 1991, p. I-5889 e C-266/96 Corsica Ferries, Col. 1998 p. I-3949.

(19) Ver ponto 34 das conclusões.

(20) Actualmente artigo 82.o

(21) Ver ponto 45.

(22) Actualmente artigos 86.o, n.o 1 e artigo 82.o

(23) JO L 240 de 24.8.1992, p. 8.

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