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Document 61994TJ0334
Sumário do acórdão
Sumário do acórdão
1 Concorrência - Procedimento administrativo - Respeito dos direitos da defesa - Alcance do princípio
(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 19._, n._ 1; Regulamento n._ 99/63 da Comissão, artigos 2._ e 4._)
2 Concorrência - Cartéis - Participação em reuniões de empresas com objectivos anticoncorrenciais - Circunstância que, na falta de distanciação em relação às decisões tomadas, permite concluir pela participação no subsequente cartel
(Tratado CE, artigo 85._, n._ 1)
3 Concorrência - Cartéis - Consentimento na criação e na participação em reuniões de um órgão com um objectivo anticoncorrencial conhecido e aceite pelas empresas que estiveram na origem da sua criação - Circunstância que permite concluir pela participação no subsequente cartel
(Tratado CE, artigo 85._, n._ 1)
4 Concorrência - Cartéis - Acordos e práticas concertadas constitutivos de uma infracção única - Empresas que podem ser acusadas de uma infracção que consiste na participação num acordo global - Critérios
(Tratado CE, artigo 85._, n._ 1)
5 Concorrência - Procedimento administrativo - Cessação das infracções - Obrigações impostas às empresas - Proporcionalidade - Critérios
(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 3._, n._ 1)
6 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Gravidade das infracções - Circunstâncias agravantes - Dissimulação do cartel - Prova resultante da inexistência de notas sobre as reuniões das empresas participantes no cartel
(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)
7 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Critérios - Gravidade e duração das infracções - Elementos de apreciação - Possibilidade de elevar o nível das coimas para reforçar o seu efeito dissuasor
(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._, n._ 2)
8 Actos das instituições - Fundamentação - Obrigação - Alcance - Decisão que aplica coimas a diversas empresas por uma infracção às regras de concorrência
(Tratado CE, artigo 190._; Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)
9 Concorrência - Coimas - Montante - Determinação - Volume de negócios tomado em consideração - Volume de negócios comunicado à Comissão em resposta a um pedido de informações
(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)
10 Concorrência - Coimas - Montante - Métodos de cálculo - Conversão em ecus do volume de negócios do ano de referência das empresas com base na taxa de câmbio média do mesmo ano - Admissibilidade
(Regulamento n._ 17 do Conselho, artigo 15._)
11 Resulta da leitura combinada do n._ 1 do artigo 19._ do Regulamento n._ 17 e dos artigos 2._ e 4._ do Regulamento n._ 99/63 que a Comissão deve comunicar as acusações que tenciona formular às empresas e às associações interessadas, só podendo incluir nas decisões as acusações sobre as quais aquelas tiveram ocasião de dar a conhecer o seu ponto de vista. Do mesmo modo, o respeito pelos direitos da defesa num procedimento susceptível de conduzir à aplicação de sanções exige que seja dada a possibilidade, às empresas e associações de empresas em causa, desde a fase do procedimento administrativo, de dar a conhecer o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos, acusações e circunstâncias invocados pela Comissão.
12 O facto de uma empresa não respeitar os resultados de reuniões de carácter manifestamente anticoncorrencial em que tenha participado não a isenta de culpa decorrente da sua participação no cartel, uma vez que não se distanciou publicamente do respectivo conteúdo. Mesmo admitindo que o comportamento dessa empresa no mercado não tenha sido conforme ao comportamento acordado, isso em nada afecta a sua responsabilidade na violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado.
13 O facto de uma empresa ter aceite criar e participar nas reuniões de um órgão cuja finalidade anticoncorrencial, que consistia nomeadamente em discussões sobre futuros aumentos de preços, era conhecida e aceite pelas empresas na origem da sua criação, constitui razão suficiente para considerar que essa empresa é responsável por uma colusão em matéria de preços.
14 Para que a Comissão possa considerar cada uma das empresas visadas por uma decisão de aplicação das regras de concorrência responsável, durante determinado período, por um acordo global que compreende diversos comportamentos anticoncorrenciais, deve demonstrar que cada uma delas concordou com a adopção de um plano global que abrange os elementos constitutivos do cartel ou participou directamente, ao longo desse período, em todos esses elementos. Uma empresa pode igualmente ser considerada responsável por um acordo global, mesmo que se prove que apenas participou num ou em diversos elementos constitutivos desse acordo, desde que soubesse, ou tivesse necessariamente a obrigação de saber, por um lado, que a colusão na qual participava se inscrevia num plano global e, por outro, que esse plano global abrangia a totalidade dos elementos constitutivos do cartel. Quando assim é, o facto de a empresa em causa não ter participado directamente em todos os elementos constitutivos do acordo global não a isenta da responsabilidade pela infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Tal circunstância pode, porém, ser tomada em consideração ao apreciar a gravidade da infracção de que é acusada.
15 A aplicação do artigo 3._, n._ 1, do Regulamento n._ 17 pode compreender a proibição de continuar determinadas actividades, práticas ou situações cuja ilegalidade tenha sido declarada, mas também de adoptar um comportamento futuro semelhante. Além disso, na medida em que a aplicação desta disposição se deve fazer em função da infracção detectada às regras de concorrência, a Comissão tem o poder de especificar o alcance das obrigações que incumbem às empresas em causa para porem termo à referida infracção. Estas obrigações impostas às empresas não devem, porém, ir além dos limites do que é adequado e necessário para atingir a finalidade prosseguida, isto é, a reposição da legalidade em relação às regras que foram infringidas.
Não satisfaz as condições exigidas para a aplicação do artigo 3._, n._ 1, do Regulamento n._ 17 uma proibição que se destina a impedir o intercâmbio de informações puramente estatísticas sem a natureza de informações individuais ou individualizáveis, uma vez que não resulta da decisão que a Comissão tenha considerado o referido intercâmbio, por si só, uma infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado e que o simples facto de um sistema de intercâmbio de informações estatísticas poder ser utilizado para fins anticoncorrenciais não significa que seja contrário a esta disposição, uma vez que, em tais circunstâncias, há que verificar, em concreto, os efeitos anticoncorrenciais.
16 O facto de as empresas que participaram numa colusão sobre os preços terem orquestrado o anúncio dos aumentos de preços concertados e de terem sido dissuadidas de tomar notas sobre reuniões em que estas questões foram discutidas, prova que estavam conscientes da ilegalidade do seu comportamento e que adoptaram medidas de dissimulação da colusão. Ao apreciar a gravidade da infracção, a Comissão pode considerar estas medidas circunstâncias agravantes.
A este propósito, a inexistência de actas oficiais e a inexistência quase total de notas internas sobre as referidas reuniões podem constituir, atendendo ao seu número, à sua duração e à natureza das discussões em causa, uma prova suficiente do facto de que os participantes eram dissuadidos de tomar notas.
17 A determinação do montante da coima por infracção às regras comunitárias da concorrência é função da gravidade e da duração da infracção. A este propósito, a gravidade das infracções deve ser determinada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasor das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração.
Na sua apreciação do nível geral das coimas, a Comissão tem o direito de tomar em conta o facto de as infracções manifestas às regras comunitárias da concorrência serem ainda relativamente frequentes e, portanto, tem perfeitamente legitimidade para aumentar o nível das coimas a fim de reforçar o seu efeito dissuasor. Consequentemente, o facto de a Comissão ter aplicado, no passado, coimas de certo nível a determinados tipos de infracções, não a priva da possibilidade de aumentar esse nível, nos limites indicados no Regulamento n._ 17, se isso for necessário para assegurar a execução da política comunitária da concorrência.
Além disso, quando fixa o nível geral das coimas, a Comissão pode, nomeadamente, tomar em conta a longa duração e o carácter manifesto de uma infracção ao artigo 85._, n._ 1, do Tratado, que foi cometida apesar da advertência que deveria ter constituído a prática decisória anterior da Comissão.
18 O dever de fundamentar uma decisão individual tem por finalidade permitir ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização da legalidade da decisão e fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se a decisão é fundada ou se está eventualmente afectada por um vício que permita contestar a sua validade, esclarecendo-se que o alcance dessa obrigação depende da natureza do acto em causa e do contexto em que o mesmo foi adoptado.
No que respeita a uma decisão que aplica coimas a diversas empresas por uma infracção às regras comunitárias da concorrência, há que determinar o alcance da obrigação de fundamentação, tendo em conta, designadamente, que a gravidade das infracções deve ser apreciada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasor das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração.
Além disso, ao fixar o montante de cada coima, a Comissão dispõe de um poder de apreciação e não pode ser obrigada a aplicar, para esse efeito, uma fórmula matemática precisa.
Finalmente, a fundamentação de uma decisão deve figurar no próprio corpo dessa decisão e explicações posteriores fornecidas pela Comissão não podem, salvo circunstâncias excepcionais, ser tomadas em consideração.
Quando declara, numa decisão, uma infracção às regras de concorrência e aplica coimas às empresas que nela participaram, a Comissão deve, se tiver sistematicamente tomado em conta certos elementos de base para fixar o montante das coimas, indicar esses elementos no corpo da decisão, a fim de permitir aos destinatários desta verificar as razões que levaram à fixação do nível da coima e apreciar a existência de uma eventual discriminação.
19 No cálculo das coimas por infracção às regras comunitárias da concorrência, a Comissão pode legitimamente tomar em conta o volume de negócios fornecido pela empresa em causa em resposta a um pedido de informações e não o volume de negócios rectificado que lhe foi comunicado posteriormente. De facto, uma empresa que, no decurso do procedimento administrativo na Comissão, rectifica um valor como o volume de negócios, anteriormente comunicado à Comissão em resposta a um pedido de informações, deve explicar de forma circunstanciada as razões pelas quais o dado inicialmente transmitido deve deixar de ser utilizado neste procedimento.
20 Quando aplica coimas a várias empresas por violação das regras comunitárias da concorrência, nada impede a Comissão de expressar o montante da coima em ecus, unidade monetária convertível em moeda nacional. De resto, isso permite às empresas comparar mais facilmente os montantes das coimas aplicadas. Além disso, a conversão possível do ecu em moeda nacional diferencia esta unidade monetária da «unidade de conta» mencionada no artigo 15._, n._ 2, do Regulamento n._ 17, que, não sendo um meio de pagamento, implicava necessariamente a determinação do montante da coima em moeda nacional.
No cálculo da coima, a Comissão pode validamente utilizar um método que consiste em converter em ecus o volume de negócios do ano de referência de cada uma das empresas, com base nas taxas de câmbio médias do ano em causa e não com base na taxa de câmbio à data da adopção da decisão.
Em primeiro lugar, com efeito, a Comissão deve normalmente utilizar um único e mesmo método de cálculo das coimas aplicadas às empresas sancionadas por terem participado na mesma infracção. Em seguida, a fim de poder comparar os diferentes volumes de negócios comunicados, expressos nas moedas nacionais respectivas das empresas em causa, a Comissão deve converter esses volumes de negócios numa única e mesma unidade monetária, como o ecu, cujo valor é determinado em função do valor de cada moeda nacional dos Estados-Membros.
Além disso, por um lado, a tomada em consideração do volume de negócios realizado por cada uma das empresas no decurso do ano de referência, isto é, o último ano completo do período de infracção objecto da decisão, permite à Comissão apreciar a dimensão e o poder económico de cada empresa bem como a extensão da infracção cometida por cada uma delas, sendo estes elementos pertinentes para apreciar a gravidade da infracção cometida por cada empresa. Por outro lado, a tomada em consideração, para efeitos da conversão em ecus dos volumes de negócios em causa, das taxas de câmbio médias do ano de referência, permite à Comissão evitar que as eventuais flutuações monetárias ocorridas desde a cessação da infracção afectem a apreciação da dimensão e do poder económico relativos das empresas, bem como a extensão da infracção cometida por cada uma delas e, portanto, a apreciação da gravidade da infracção. A apreciação da gravidade da infracção deve ter em conta a realidade económica tal como existia na época em que a infracção foi cometida.
Consequentemente, o método de cálculo da coima que consiste em utilizar a taxa de câmbio média do ano de referência permite evitar os efeitos aleatórios das alterações dos valores reais das moedas nacionais que podem ocorrer entre o ano de referência e o ano de adopção da decisão. Se este método pode significar que determinada empresa deve pagar um montante, expresso em moeda nacional, nominalmente superior ou inferior ao que pagaria na hipótese de ser aplicada a taxa de câmbio da data de adopção da decisão, isso é apenas a consequência lógica das flutuações dos valores reais das diferentes moedas nacionais.