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Document 62022TJ0112

Acórdão do Tribunal Geral (Quarta Secção alargada) de 17 de abril de 2024.
Ideella föreningen Svenska Bankföreningen med firma Svenska Bankföreningen, Näringsverksamhet e Länsförsäkringar Bank AB contra Comissão Europeia.
Auxílios de Estado — Legislação fiscal sueca — Imposto sobre o risco sistémico das instituições de crédito — Decisão de não levantar objeções — Caráter seletivo — Objetivo da medida — Derrogação do sistema de referência.
Processo T-112/22.

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2024:250

Processo T‑112/22

Ideella föreningen Svenska Bankföreningen med firma Svenska Bankföreningen, Näringsverksamhet
e
Länsförsäkringar Bank AB

contra

Comissão Europeia

Acórdão do Tribunal Geral (Quarta Secção Alargada) de 17 de abril de 2024

«Auxílios de Estado — Legislação fiscal sueca — Imposto sobre o risco sistémico das instituições de crédito — Decisão de não levantar objeções — Caráter seletivo — Objetivo da medida — Derrogação do sistema de referência»

  1. Auxílios concedidos pelos Estados — Exame pela Comissão — Fase preliminar e fase contraditória — Obrigação que incumbe à Comissão de abrir o procedimento contraditório em caso de dificuldades sérias — Circunstâncias que permitem comprovar a existência de tais dificuldades — Fiscalização jurisdicional — Ónus da prova

    (Artigos 107.° e 108.° TFUE; Regulamento 2015/1589 do Conselho, artigo 4.o, n.os 3 e 4)

    (cf. n.os 21‑26)

  2. Auxílios concedidos pelos Estados — Conceito — Caráter seletivo da medida — Medida que confere um benefício fiscal — Quadro de referência para determinar a existência de um benefício — Delimitação material — Medida que constitui o seu próprio quadro de referência — Requisitos — Regime fiscal claramente delimitado, que prossegue objetivos específicos

    (Artigo 107.o, n.o 1, TFUE)

    (cf. n.os 30‑32, 46, 47)

  3. Auxílios concedidos pelos Estados — Conceito — Caráter seletivo da medida — Medida que confere um benefício fiscal — Imposto sobre o risco sistémico das instituições de crédito — Imposto que visa fornecer uma margem orçamental para a gestão de futuras crises financeiras — Matéria coletável do imposto baseada nas dívidas das instituições de crédito — Matéria coletável do imposto determinada em coerência com o objetivo desse imposto — Possibilidade de a Comissão concluir pela inexistência de seletividade do imposto sem dar início ao procedimento formal de investigação

    (Artigo 107.o, n.o 1, TFUE)

    (cf. n.os 56‑61)

  4. Auxílios concedidos pelos Estados — Conceito — Caráter seletivo da medida — Medida que confere um benefício fiscal — Imposto sobre o risco sistémico das instituições de crédito — Imposto que visa fornecer uma margem orçamental para a gestão de futuras crises financeiras — Instituições sujeitas ao imposto — Instituições de crédito que acumularam um volume de dívidas que excede o limiar fixado na lei — Competências próprias do Estado‑Membro na identificação dos sujeitos passivos e na fixação do limiar de sujeição — Identificação dos sujeitos passivos e fixação do limiar de sujeição efetuadas em coerência com o objetivo do imposto — Possibilidade de a Comissão concluir pela inexistência de seletividade do imposto sem dar início ao procedimento formal de investigação

    (Artigo 107.o, n.o 1, TFUE)

    (cf. n.os 71‑82, 88‑99)

  5. Auxílios concedidos pelos Estados — Conceito — Caráter seletivo da medida — Medida que confere um benefício fiscal — Imposto sobre o risco sistémico das instituições de crédito — Imposto que visa fornecer uma margem orçamental para a gestão de futuras crises financeiras — Instituições sujeitas ao imposto — Instituições de crédito que acumularam um volume de dívidas que excede o limiar fixado na lei — Consideração das dívidas das sucursais para efeitos do controlo do referido limiar — Admissibilidade — Possibilidade de a Comissão concluir pela inexistência de seletividade do imposto sem dar início ao procedimento formal de investigação

    (Artigo 107.o, n.o 1, TFUE)

    (cf. n.os 103‑106)

  6. Auxílios concedidos pelos Estados — Conceito — Caráter seletivo da medida — Derrogação ao sistema fiscal geral — Diferenciação entre empresas numa situação factual e jurídica comparável — Critérios de apreciação — Comparação à luz do objetivo prosseguido pelo regime fiscal comum no seu todo

    (Artigo 107.o, n.o 1, TFUE)

    (cf. n.os 116‑124, 127)

Resumo

Pronunciando‑se em formação alargada, o Tribunal Geral nega provimento ao recurso de anulação apresentado contra a Decisão da Comissão Europeia mediante a qual esta decidiu que um imposto sueco sobre o risco sistémico devido pelas instituições de crédito não constitui um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE ( 1 ). Ao fazê‑lo, o Tribunal examina pormenorizadamente a conclusão da Comissão segundo a qual esse imposto não preenchia o critério de seletividade previsto por essa disposição.

Em 2021, o Reino da Suécia notificou à Comissão um projeto de lei relativo a um imposto sobre o risco sistémico das instituições de crédito (a seguir «imposto»), devido por todas as instituições de crédito suecas cuja soma das dívidas exceda o limiar de 150 mil milhões de coroas suecas (SEK) para os exercícios fiscais com início em 2022. Para os exercícios fiscais com início em 2023 ou mais tarde, este limiar é multiplicado por um fator. O projeto notificado prevê, além disso, a tributação das instituições de crédito estrangeiras quando tenham dívidas imputáveis às atividades comerciais exercidas a partir de uma sucursal sueca cuja soma ultrapasse o valor dos limiares referidos. No total, nove instituições de crédito apresentam um volume de dívidas superior aos limiares previstos.

Para o exercício fiscal de 2022, a taxa do imposto estava fixada em 0,05 % da soma das dívidas das instituições de crédito sujeitas a imposto. Para o exercício fiscal de 2023, esta taxa devia ser aumentada para 0,06 %.

Sem dar início ao procedimento formal de investigação, a Comissão entendeu que esse imposto não constituía um auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, uma vez que não preenchia o critério de seletividade.

Considerando que a Comissão tinha violado os seus direitos processuais ao adotar essa decisão sem dar início ao procedimento formal de investigação, uma associação sueca de banqueiros e uma entidade financeira membro dessa associação interpuseram no Tribunal Geral um recurso de anulação.

Apreciação do Tribunal Geral

Estando a Comissão obrigada a dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE se, à luz das informações obtidas durante a fase de investigação preliminar, continuar a ter dificuldades sérias de apreciação da medida notificada ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, as recorrentes alegam que a Comissão deveria ter tido tais dificuldades sérias no que concerne ao caráter seletivo do imposto.

Segundo jurisprudência constante, para qualificar uma medida fiscal nacional de seletiva na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, a Comissão deve identificar, num primeiro momento, o sistema de referência, a saber, o regime fiscal «normal» aplicável no Estado‑Membro em causa, e demonstrar, num segundo momento, que a medida fiscal em causa derroga este sistema de referência, visto que introduz diferenciações entre operadores económicos que se encontram, tendo em conta o objetivo prosseguido por este último, numa situação factual e jurídica comparável. Num terceiro momento, a Comissão deve verificar se a diferenciação introduzida é justificada por resultar da natureza ou da estrutura em que se insere.

No que respeita às duas primeiras etapas acima expostas, resulta da decisão impugnada que a Comissão definiu, de forma não contestada, o sistema de referência como estando limitado ao imposto.

Nesta base, concluiu, por um lado, que o sistema de referência não tinha sido concebido de modo manifestamente discriminatório e, por outro, que a não sujeição de certos tipos de operadores e de operadores cujas dívidas acumuladas eram inferiores ao limiar fixado no projeto de lei não constituía uma derrogação ao sistema de referência.

Em apoio do seu recurso, as recorrentes contestam esta conclusão da Comissão.

No que respeita, em primeiro lugar, à conclusão da Comissão de que o sistema de referência e, por conseguinte, o imposto não tinham sido concebidos de forma manifestamente discriminatória, o Tribunal Geral rejeita os diferentes argumentos das recorrentes segundo os quais a Comissão deveria ter encontrado dificuldades sérias quanto a este ponto na medida em que os parâmetros do imposto não eram manifestamente compatíveis com o seu objetivo.

A este respeito, o Tribunal Geral começa por precisar que resulta do projeto de lei sueco que o objetivo do imposto é reforçar as finanças públicas, a fim de fornecer uma margem para a gestão de futuras crises financeiras, impondo o pagamento do imposto às grandes instituições de crédito, cuja insolvência ou perturbação séria apresentaria, a título individual e devido à sua dimensão e à sua importância para o funcionamento do sistema financeiro, um risco sistémico e teria um impacto muito negativo no sistema financeiro e na economia em geral, provocando assim custos indiretos significativos para a sociedade.

Feita esta precisão, o Tribunal afasta, em primeiro lugar, os argumentos segundo os quais a opção do legislador sueco de basear a matéria coletável do imposto nas dívidas das instituições de crédito era contrária ao objetivo desse imposto. A este respeito, o Tribunal sublinha que o imposto visa reforçar as finanças públicas nacionais a fim de proporcionar uma margem para a gestão de futuras crises financeiras, sendo que quanto maior for o nível das dívidas de uma instituição de crédito, maior é o risco para o sistema financeiro. Daqui resulta que a definição da matéria coletável do imposto em função do nível da dívida das instituições que são sujeitos passivos, a fim de distinguir entre as instituições de crédito consoante o seu impacto no sistema financeiro seja mais ou menos forte, é coerente com o objetivo prosseguido.

Em segundo lugar, o Tribunal Geral rejeita os argumentos das recorrentes que contestam a determinação das instituições sujeitas ao imposto.

Tendo as recorrentes invocado, neste contexto, uma incoerência entre a identificação das instituições sujeitas ao imposto e os regimes instituídos, respetivamente, pela Diretiva 2014/59 ( 2 ) e pelo Regulamento n.o 575/2013 ( 3 ), o Tribunal Geral salienta que os objetivos prosseguidos por estes regimes são diferentes do objetivo prosseguido pelo imposto notificado.

Segundo o Tribunal Geral, as críticas à seleção das instituições sujeitos passivos baseadas no ambiente concorrencial do setor financeiro sueco e no facto de numerosas instituições financeiras não sujeitos ao imposto, que estão em concorrência com as instituições de crédito sujeitas ao imposto, estarem igualmente na origem de custos indiretos para a sociedade, também não são convincentes.

A este respeito, o Tribunal recorda, por um lado, que o Reino da Suécia tinha o direito de determinar, através do exercício das suas competências próprias em matéria de fiscalidade direta e no respeito da sua autonomia fiscal e do direito da União, o facto gerador do imposto e a matéria coletável desse imposto. Por outro lado, as recorrentes não puseram em causa a capacidade de só as grandes instituições de crédito provocarem, a título individual, com a sua insolvência, um risco sistémico e terem um impacto muito negativo no sistema financeiro e na economia em geral, provocando assim custos indiretos significativos para a sociedade. Por outro lado, também não demonstraram que a insolvência das instituições não sujeitas ao imposto, mesmo consideradas coletivamente, teria as mesmas consequências.

Em terceiro lugar, o Tribunal considera que as recorrentes também não apresentaram argumentos que permitam considerar que o limiar fixado para a sujeição das instituições de crédito ao imposto é manifestamente inadequado à luz dos objetivos deste último.

Uma vez que a determinação do nível do limiar de tributação e das modalidades de cálculo da base tributável se inserem na margem de apreciação do legislador nacional, o Reino da Suécia não pode ser impedido, por um lado, de aplicar um imposto com um limiar de tributação e, por outro, de estabelecer um dispositivo de modulação que vá até uma isenção das instituições de crédito que se encontrem abaixo do referido limite, desde que esses elementos não contrariem o objetivo do imposto. Ora, segundo o Tribunal Geral, o limiar de 150 mil milhões de SEK, que não é manifestamente discriminatório, é conforme com o objetivo do imposto, tanto mais que a aplicação deste limiar assegura que os sujeitos passivos do imposto representem 90 % do total do balanço agregado de todas as instituições de crédito na Suécia. Por outro lado, resulta dos autos que não existia nenhuma instituição de crédito não sujeita ao imposto cujo nível das dívidas estivesse próximo do limiar de 150 mil milhões de SEK.

Em quarto lugar, o Tribunal Geral afasta os argumentos das recorrentes que contestam o mecanismo de consolidação previsto para as situações intragrupos, em conformidade com o qual as dívidas das sucursais são tidas em conta para efeitos do cálculo do limiar de sujeição das instituições de crédito. Com efeito, uma vez que as sucursais de uma instituição de crédito sueca estão ligadas a esta última e que, portanto, a sua insolvência produz efeitos igualmente na Suécia, não há que considerar que a Comissão deveria ter tido dúvidas quanto a esse mecanismo.

No que respeita, em segundo lugar, à conclusão da Comissão de que a não sujeição ao imposto de certos tipos de operadores financeiros e de instituições de crédito cujas dívidas acumuladas eram inferiores ao limiar de 150 mil milhões de SEK não constituía uma derrogação ao sistema de referência, o Tribunal recorda que o caráter seletivo de um imposto não existe se as diferenças de tributação e os benefícios que daí podem decorrer resultarem da aplicação pura e simples, não derrogatória, do regime «normal», se as situações comparáveis forem tratadas de forma comparável e se esses dispositivos de modulação não violarem o objetivo do imposto em causa.

Ora, relativamente à não sujeição das instituições de crédito cujas dívidas não excediam o limiar de 150 mil milhões de SEK, o Tribunal salienta que as recorrentes não demonstraram a existência de um conjunto de indícios concordantes suscetível de demonstrar que as instituições de crédito cujas dívidas excediam esse limiar se encontravam, à luz do objetivo do imposto, numa situação factual e jurídica comparável à das instituições de crédito cujas dívidas não excediam esse limiar. Relativamente à não sujeição de outras instituições financeiras, como os fundos hipotecários, o Tribunal sublinha, além disso, que uma simples relação de concorrência não pode, por si só, levar à conclusão de que essas instituições se encontram, à luz do objetivo do imposto, numa situação factual e jurídica comparável à das instituições de crédito sujeitas a esse imposto.

Por conseguinte, os argumentos das recorrentes relativos à existência de derrogações ao sistema de referência não permitem demonstrar que a Comissão deveria ter encontrado dificuldades sérias no âmbito da sua apreciação a este respeito.

Tendo em conta todas as apreciações precedentes, o Tribunal Geral conclui que as recorrentes não demonstraram que a Comissão deveria ter tido dúvidas quanto à qualificação do imposto na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, que a devessem ter levado a dar início ao procedimento formal de investigação. Por conseguinte, nega provimento ao recurso na íntegra.


( 1 ) Decisão COM(2021) 8637 final da Comissão Europeia, de 24 de novembro de 2021, relativa à medida estatal SA.56348 (2021/N) — Suécia: imposto sueco sobre as instituições de crédito (a seguir «decisão impugnada»).

( 2 ) Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/UE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2014, L 173, p. 190).

( 3 ) Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1).

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