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Document 62022CJ0540

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 20 de junho de 2024.
    SN e o. contra Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid.
    Reenvio prejudicial — Livre prestação de serviços — Artigos 56.° e 57.° TFUE — Destacamento de nacionais de países terceiros por uma empresa de um Estado‑Membro para trabalhar noutro Estado‑Membro — Período superior a 90 dias num período de 180 dias — Obrigação de os trabalhadores destacados nacionais de países terceiros serem titulares de uma autorização de residência no Estado de destacamento em caso de prestação superior a três meses — Limitação do período de validade das autorizações de residência concedidas — Montante das taxas relativas ao pedido de autorização de residência — Restrição à livre prestação de serviços — Razões imperiosas de interesse geral — Proporcionalidade.
    Processo C-540/22.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:530

    Processo C‑540/22

    SN
    e
    AS
    e
    RA

    contra

    Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid

    (pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Rechtbank Den Haag)

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 20 de junho de 2024

    «Reenvio prejudicial — Livre prestação de serviços — Artigos 56.° e 57.° TFUE — Destacamento de nacionais de países terceiros por uma empresa de um Estado‑Membro para trabalhar noutro Estado‑Membro — Período superior a 90 dias num período de 180 dias — Obrigação de os trabalhadores destacados nacionais de países terceiros serem titulares de uma autorização de residência no Estado de destacamento em caso de prestação superior a três meses — Limitação do período de validade das autorizações de residência concedidas — Montante das taxas relativas ao pedido de autorização de residência — Restrição à livre prestação de serviços — Razões imperiosas de interesse geral — Proporcionalidade»

    1. Livre prestação de serviços — Disposições do Tratado — Alcance — Limites — Direito à livre prestação de serviços dos empregadores — Direito de residência derivado dos trabalhadores destacados nacionais de países terceiros — Inadmissibilidade

      (Artigos 56.° e 57.° TFUE)

      (cf. n.os 49‑55, disp. 1)

    2. Livre prestação de serviços — Disposições do Tratado — Âmbito de aplicação — Trabalhadores por conta de outrem nacionais de países terceiros legalmente empregados num Estado‑Membro e destacados noutro Estado‑Membro para prestar um serviço — Regulamentação nacional que tem por objeto o direito de residência de tais trabalhadores — Inclusão

      [Artigos 56.° e 57.° TFUE; Regulamento n.o 1030/2002 do Conselho, artigo 1.o, n.o 2, alínea a); Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho 96/71, considerando 20, e 2006/123, artigo 17.o, ponto 9; Diretiva 2003/109 do Conselho, artigo 3.o, n.o 2, alínea e); Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, artigo 21.o, n.o 1]

      (cf. n.os 59‑66)

    3. Livre prestação de serviços — Restrições — Empresa estabelecida num Estado‑Membro que presta serviços noutro Estado‑Membro cuja duração é superior a três meses — Regulamentação do Estado‑Membro da prestação dos serviços que impõe a tal empresa a obrigação de obter uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro por ela destacado no seu território — Autorização em causa que pressupõe a notificação prévia às autoridades competentes, por parte dessa empresa, da prestação de serviços a que o destacamento diz respeito e a comunicação de certos documentos justificativos — Inadmissibilidade — Justificação — Melhoria da segurança jurídica dos trabalhadores destacados e facilitação dos controlos da administração — Proteção da ordem pública — Proporcionalidade — Verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio

      (Artigo 56.o TFUE)

      (cf. n.os 67‑76, 78‑103, disp. 2)

    4. Livre prestação de serviços — Restrições — Regulamentação de um Estado‑Membro que limita o período de validade da autorização de residência que pode ser concedida a um trabalhador nacional de um país terceiro destacado no seu território — Período que pode ser inferior ao necessário para a realização da prestação que deu origem ao destacamento — Período de validade limitado ao período de validade da autorização de trabalho e de residência do interessado no Estado‑Membro onde está estabelecido o prestador — Emissão da referida autorização que exige o pagamento de taxas de montante superior às devidas pela emissão de um atestado de residência legal a um cidadão da União — Admissibilidade — Requisitos

      (Artigo 56.o TFUE)

      (cf. n.os 112‑122, disp. 3)

    Resumo

    Chamado a pronunciar‑se a título prejudicial pelo rechtbank Den Haag, zittingsplaats Middelburg (Tribunal de Primeira Instância de Haia, lugar da audiência em Midelburgo, Países Baixos), o Tribunal de Justiça especifica as condições em que, no que respeita ao seu direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento, os nacionais de países terceiros podem ser destacados para um Estado‑Membro por uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro.

    Os recorrentes, nacionais ucranianos, são titulares de uma autorização de residência temporária emitida pelas autoridades eslovacas. Trabalham para a sociedade de direito eslovaco ROBI spol s.r.o., que os destacou para uma sociedade de direito neerlandês para efetuar uma missão no porto de Roterdão (Países Baixos). Para o efeito, a ROBI notificou as autoridades neerlandesas competentes da natureza das atividades exercidas durante o seu destacamento e a duração deste.

    Posteriormente, a ROBI informou essas autoridades de que as referidas atividades excederiam a duração do direito de circulação de 90 dias durante um período de 180 dias de que gozam os estrangeiros com um título de residência emitido por um Estado‑Membro, prevista no artigo 21.o, n.o 1, da Convenção de aplicação do Acordo de Schengen ( 1 ). Para o período de duração desta prestação, a ROBI apresentou então às autoridades neerlandesas pedidos de autorização de residência para cada um dos recorrentes, tendo sido cobradas taxas pelo respetivo tratamento. A autoridade competente, atuando em nome do Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Secretário de Estado da Justiça e da Segurança, Países Baixos), emitiu as autorizações de residência solicitadas, limitando, no entanto, o seu prazo de validade ao período de validade das autorizações de residência temporária eslovacas, ou seja, uma duração inferior à do seu destacamento.

    Em abril de 2021, as reclamações apresentadas pelos recorrentes contra cada uma das decisões que lhes concederam uma autorização de residência foram julgadas improcedentes pelo Secretário de Estado da Justiça e da Segurança. Chamado a conhecer de um recurso das decisões tomadas em abril de 2021, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça sobre a conformidade com a livre prestação de serviços, consagrada nos artigos 56.° e 57.° TFUE, de uma regulamentação nacional que impõe a obrigação, no âmbito de uma prestação de serviços transfronteiriça, de os trabalhadores nacionais de países terceiros empregados por um prestador de serviços estabelecido num Estado‑Membro serem titulares, além de uma autorização de residência nesse Estado‑Membro, de uma autorização de residência no Estado‑Membro em que a prestação é realizada, após o termo do período de 90 dias previsto na referida disposição da CAAS, podendo a duração dessa autorização ser limitada. Pede igualmente ao Tribunal de Justiça que examine a conformidade com o direito da União da imposição de taxas por cada pedido de autorização de residência no Estado‑Membro de realização da prestação.

    Apreciação do Tribunal de Justiça

    Com o seu acórdão, em primeiro lugar, o Tribunal de Justiça declara que os artigos 56.° e 57.° TFUE não impõem o reconhecimento automático de um «direito de residência derivado» a favor dos trabalhadores nacionais de países terceiros destacados num Estado‑Membro, no Estado‑Membro onde trabalham ou no Estado‑Membro para onde são destacados.

    Em segundo lugar, no que respeita à obrigação, imposta à empresa prestadora pela regulamentação controvertida, de notificar a prestação de serviços às autoridades nacionais competentes e de obter uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro que pretenda destacar para o território desse Estado‑Membro, o Tribunal de Justiça constata, antes de mais, que, no caso em apreço, a regulamentação em causa, embora indistintamente aplicável, impõe, no caso de prestações de serviços realizadas pelas empresas estabelecidas noutro Estado‑Membro que excedam três meses, formalidades suplementares a essas empresas relativamente àquelas a que já estão sujeitas no Estado‑Membro onde estão estabelecidas, nos termos da Diretiva 2009/52 ( 2 ), para empregar nacionais de países terceiros. Por conseguinte, tal legislação institui uma restrição à livre prestação de serviços, na aceção dos artigos 56.° e 57.° TFUE.

    Examinando em seguida se essa restrição pode ser justificada por uma razão imperiosa de interesse geral, o Tribunal de Justiça salienta, nomeadamente, que é certo que a preocupação de evitar perturbações no mercado de trabalho constitui uma razão imperiosa de interesse geral. Todavia, essa razão não pode justificar uma regulamentação nacional que se aplica aos nacionais de países terceiros que são destacados por uma empresa prestadora de serviços estabelecida noutro Estado‑Membro para prestar, sob o seu controlo e a sua autoridade, um serviço diferente da cedência de trabalhadores, uma vez que esses trabalhadores destacados não são considerados ativos no mercado de trabalho do Estado‑Membro em que estão destacados.

    Todavia, o Tribunal de Justiça recorda que o objetivo de garantir a segurança jurídica dos trabalhadores destacados, permitindo‑lhes provar facilmente que estão legalmente destacados no território do Estado‑Membro em que o serviço é prestado e, por conseguinte, que aí residem regularmente, constitui igualmente uma razão imperiosa de interesse geral. Ora, no que respeita à proporcionalidade de tal medida, por um lado, obrigar os prestadores de serviços estabelecidos noutro Estado‑Membro a pedir uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro destacado, para que estes disponham de um documento seguro, constitui uma medida apta a atingir o objetivo de melhoria da segurança jurídica de tais trabalhadores, uma vez que essa autorização prova o seu direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento. Por outro lado, não se afigura que a regulamentação em causa exceda o que é necessário para a realização de tal objetivo, uma vez que as obrigações impostas à empresa prestadora são, nomeadamente, necessárias para provar a regularidade do destacamento. Por conseguinte, a regulamentação em causa no processo principal é suscetível de ser justificada pelo objetivo de melhorar a segurança jurídica dos trabalhadores destacados e de facilitar os controlos da Administração e, no caso em apreço, deve ser considerada proporcionada.

    O Tribunal de Justiça admite igualmente que o objetivo relativo à necessidade de controlar se o trabalhador em causa não representa uma ameaça para a ordem pública deve ser considerado suscetível de justificar uma restrição à livre prestação de serviços. No caso em apreço, a medida controvertida afigura‑se apta a realizar esse objetivo e, além disso, não se pode considerar que vá além do que é necessário para esse efeito, desde que leve a recusar a permanência apenas a pessoas que representem uma ameaça real e suficientemente grave para um interesse fundamental da sociedade. Com efeito, uma vez que a avaliação da ameaça que uma pessoa pode representar para a ordem pública pode variar de um país para outro, a existência potencial de um controlo análogo no Estado‑Membro de estabelecimento do prestador não pode tornar irrelevante a realização de tal controlo no Estado‑Membro no qual deve ser prestado o serviço. Além disso, contrariamente ao procedimento de notificação, que se baseia num controlo a partir de informações recebidas ou já detidas, o procedimento de autorização de residência, na medida em que exige que o interessado se apresente fisicamente nas instalações de uma autoridade competente, é suscetível de permitir uma verificação aprofundada da sua identidade, particularmente importante em matéria de luta contra as ameaças à ordem pública.

    Assim, o objetivo de proteção da ordem pública pode justificar que um Estado‑Membro exija que os prestadores de serviços estabelecidos noutro Estado‑Membro que pretendam destacar trabalhadores nacionais de países terceiros obtenham, após um período de residência de três meses no primeiro Estado‑Membro, uma autorização de residência para cada um desses trabalhadores. Tal objetivo justificaria igualmente que, nessa ocasião, esse Estado‑Membro subordine a emissão dessa autorização à verificação de que o interessado não representa uma ameaça para a ordem pública e para a segurança pública, visto que os controlos efetuados para esse efeito não puderam ser realizados de forma fiável com base nas informações que o referido Estado‑Membro exige ou poderia razoavelmente ter exigido que fossem comunicadas no procedimento de notificação, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

    Por conseguinte, o Tribunal de Justiça declara que o artigo 56.o TFUE não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que prevê que, na hipótese de uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro prestar no primeiro Estado‑Membro serviços cuja duração é superior a três meses, essa empresa está obrigada a obter no Estado‑Membro de acolhimento uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro que aí pretenda destacar, e que, para obter essa autorização, tem de notificar previamente às autoridades competentes do Estado‑Membro de acolhimento a prestação de serviços em relação à qual esses trabalhadores serão destacados e tem de comunicar a essas autoridades as autorizações de residência de que esses trabalhadores dispõem no Estado‑Membro em que está estabelecida, bem como os seus contratos de trabalho.

    Por último, no que respeita ao facto de as taxas devidas pela concessão de uma autorização de residência a um trabalhador nacional de um país terceiro destacado para um Estado‑Membro por uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro serem superiores ao montante das taxas devidas pela concessão de um atestado de residência a um cidadão da União, o Tribunal de Justiça recorda que, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, para que uma medida que exige o pagamento de taxas em contrapartida da emissão, por um Estado‑Membro, de uma autorização de residência possa ser considerada compatível com o artigo 56.o TFUE, o montante dessas taxas não pode ser excessivo ou desmedido. O caráter proporcionado das taxas devidas deve ser apreciado à luz do custo gerado pelo tratamento do pedido que o Estado‑Membro deve suportar. Quanto a este aspeto, o Tribunal de Justiça salienta que a circunstância de as taxas pedidas para a emissão de uma autorização de residência para trabalhador destacado nacional de um país terceiro serem superiores às pedidas para um atestado de residência para um cidadão da União não basta, em princípio, para demonstrar, por si só, que o montante dessas taxas viola o artigo 56.o TFUE. No entanto, esta circunstância pode constituir um indício sério do caráter desproporcionado desse montante, se as tarefas que a administração deve desempenhar para conceder essa autorização de residência, bem como os custos de produção do documento seguro correspondente, forem equivalentes aos custos necessários para a concessão de um atestado de residência a um cidadão da União, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar.

    Por conseguinte, o Tribunal de Justiça conclui que o artigo 56.o TFUE não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro nos termos da qual a validade da autorização de residência que pode ser concedida a um trabalhador nacional de um país terceiro destacado nesse Estado‑Membro não pode, seja como for, exceder um período determinado pela regulamentação nacional em causa, a qual pode assim ser inferior à necessária para a realização da prestação para a qual esse trabalhador está destacado. Este artigo também não se opõe a que o período de validade dessa autorização de residência seja limitado ao da autorização de trabalho e de residência do interessado no Estado‑Membro no qual o prestador de serviços está estabelecido. Por último, segundo este mesmo artigo, para a emissão da referida autorização de residência pode ser necessário proceder ao pagamento de taxas de montante superior às taxas devidas pela emissão de um atestado de residência legal a um cidadão da União, desde que, antes de mais, o período inicial de validade dessa mesma autorização não seja manifestamente demasiado curto para responder às necessidades da maioria dos prestadores de serviços, em seguida, que seja possível obter a renovação dessa autorização sem ter de cumprir formalidades excessivas e, por último, que esse montante corresponda aproximadamente ao custo administrativo do tratamento de um pedido de obtenção dessa autorização.


    ( 1 ) Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985, entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, assinada em Schengen, em 19 de junho de 1990, e entrada em vigor em 26 de março de 1995 (JO 2000, L 239, p. 19), conforme alterada pelo Regulamento (UE) n.o 265/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de março de 2010 (JO 2010, L 85, p. 1), e pelo Regulamento (UE) n.o 610/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013 (JO 2013, L 182, p. 1) (a seguir «CAAS»). Nos termos do artigo 21.o, n.o 1, da CAAS: «[o]s cidadãos estrangeiros detentores de um título de residência válido emitido por um dos Estados‑Membros podem circular livremente, ao abrigo desse título e de um documento de viagem válido, por um período máximo de 90 dias num período de 180 dias no território dos outros Estados‑Membros, desde que preencham as condições de entrada a que se referem as alíneas a), c) e e) do n.o 1 do artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 562/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, que estabelece o código comunitário relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) […] e não constem da lista nacional de pessoas indicadas do Estado‑Membro em causa».

    ( 2 ) Diretiva 2009/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho de 2009, que estabelece normas mínimas sobre sanções e medidas contra os empregadores de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2009, L 168, p. 24).

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