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Document 62020TJ0388
Acórdão do Tribunal Geral (Décima Secção alargada) de 14 de abril de 2021.
Ryanair DAC contra Comissão Europeia.
Auxílios de Estado — Mercado finlandês do transporte aéreo — Auxílio concedido pela Finlândia à Finnair no contexto da pandemia de COVID‑19 — Garantia do Estado associada a um empréstimo — Decisão de não levantar objeções — Quadro temporário das medidas de auxílio de Estado — Medida destinada a sanar uma perturbação grave da economia de um Estado‑Membro — Não ponderação dos efeitos benéficos do auxílio com os seus efeitos negativos nas condições das trocas comerciais e na manutenção de uma concorrência não falseada — Igualdade de tratamento — Liberdade de estabelecimento — Livre prestação de serviços — Dever de fundamentação.
Processo T-388/20.
Acórdão do Tribunal Geral (Décima Secção alargada) de 14 de abril de 2021.
Ryanair DAC contra Comissão Europeia.
Auxílios de Estado — Mercado finlandês do transporte aéreo — Auxílio concedido pela Finlândia à Finnair no contexto da pandemia de COVID‑19 — Garantia do Estado associada a um empréstimo — Decisão de não levantar objeções — Quadro temporário das medidas de auxílio de Estado — Medida destinada a sanar uma perturbação grave da economia de um Estado‑Membro — Não ponderação dos efeitos benéficos do auxílio com os seus efeitos negativos nas condições das trocas comerciais e na manutenção de uma concorrência não falseada — Igualdade de tratamento — Liberdade de estabelecimento — Livre prestação de serviços — Dever de fundamentação.
Processo T-388/20.
ECLI identifier: ECLI:EU:T:2021:196
(Processo T‑388/20
Ryanair DAC
contra
Comissão Europeia
Acórdão do Tribunal Geral (Décima Secção alargada) de 14 de abril de 2021
«Auxílios de Estado — Mercado finlandês do transporte aéreo — Auxílio concedido pela Finlândia à Finnair no quadro da pandemia de COVID‑19 — Garantia do estado associada a um empréstimo — Decisão de não levantar objeções — Quadro temporário relativo a medidas de auxílio de Estado — Medida destinada a sanar uma perturbação grave da economia do Estado‑Membro — Falta de ponderação dos efeitos benéficos do auxílio com os seus efeitos negativos nas condições das trocas comerciais e na manutenção de uma concorrência não falseada — Igualdade de tratamento — Liberdade de estabelecimento — Livre prestação de serviços — Dever de fundamentação»
Auxílios concedidos pelos Estados — Proibição — Derrogações — Auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado interno — Auxílios destinados a sanar uma perturbação grave da economia de um Estado‑Membro — Apreciação — Medida de auxílio a favor de uma companhia aérea importante para a economia finlandesa, no quadro da pandemia de COVID‑19 — Inclusão
[Artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE]
(cf. n.os 31‑34, 38‑63)
Auxílios concedidos pelos Estados — Proibição — Derrogações — Auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado interno — Apreciação à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE — Critérios — Ponderação dos efeitos benéficos do auxílio com os seus efeitos negativos nas condições das trocas comerciais e na manutenção de uma concorrência não falseada — Critério não necessário
[Artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE]
(cf. n.os 65‑71)
Auxílios concedidos pelos Estados — Proibição — Derrogações — Auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado interno — Auxílios destinados a sanar uma perturbação grave da economia de um Estado‑Membro — Garantia de empréstimo destinado a apoiar uma companhia aérea importante para a economia finlandesa, no quadro da pandemia de COVID‑19 — Auxílio compatível com o mercado interno a título do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE — Violação do princípio da não discriminação em razão da nacionalidade — Inexistência
[Artigos 18.°, primeiro parágrafo, e 107.°, n.o 3, alínea b), TFUE]
(cf. n.os 77, 81, 82, 92)
Auxílios concedidos pelos Estados — Proibição — Derrogações — Auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado interno — Auxílios destinados a sanar uma perturbação grave da economia de um Estado‑Membro — Garantia de empréstimo destinado a apoiar uma companhia aérea importante para a economia finlandesa, no quadro da pandemia de COVID‑19 — Apreciação da compatibilidade com o mercado interno — Critérios — Objetivo da medida de auxílio — Proporcionalidade da medida de auxílio
[Artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE]
(cf. n.os 83‑92)
Livre prestação de serviços — Disposições do Tratado — Âmbito de aplicação — Serviços nos domínios dos transportes na aceção do artigo 58.o, n.o 1, TFUE — Serviços de transportes aéreos — Regime jurídico especial
(Artigos 56.°, 58.°, n.o 1, e 100.°, n.o 2, TFUE)
(cf. n.os 99‑104)
Recurso de anulação — Pessoas singulares ou coletivas — Atos que lhes dizem direta e individualmente respeito — Decisão da Comissão que, sem abertura do procedimento formal de exame, declara a compatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado interno — Recurso dos interessados na aceção do artigo 108.o, n.o 2, TFUE — Identificação do objeto do recurso — Recurso destinado a salvaguardar os direitos processuais dos interessados — Fundamentos que podem ser invocados — Inexistência de conteúdo autónomo desse fundamento no caso vertente
(Artigos 108.°, n.o 2, e 263.°, n.o 4, TFUE)
(cf. n.os 105‑109)
Auxílios concedidos pelos Estados — Decisão da Comissão de não suscitar objeções a uma medida nacional — Dever de fundamentação — Alcance — Tomada em conta do contexto e de todas as regras jurídicas que regulam a matéria
[Artigos 107.°, n.o 3, alínea b), e 296.° TFUE]
(cf. n.os 112‑125)
Resumo
A garantia prestada pela Finlândia a favor da companhia aérea Finnair para a ajudar a obter, junto de um fundo de pensões, um empréstimo de 600 milhões de euros destinado a cobrir as suas necessidades em fundo de maneio na sequência da pandemia de COVID‑19 é conforme com o direito da União
A garantia era necessária para sanar a perturbação grave da economia finlandesa, tendo em conta a importância da Finnair para esta economia
Em 13 de maio de 2020, a Finlândia notificou à Comissão uma medida de auxílio sob a forma de uma garantia de Estado a favor da companhia aérea finlandesa Finnair Plc, destinada a ajudar esta última a obter, junto de um fundo de pensões, um empréstimo de 600 milhões de euros para cobrir as suas necessidades em fundo de maneio. A garantia, que devia cobrir 90 % do referido empréstimo, estava limitada a uma duração máxima de três anos e podia ser invocada em caso de incumprimento da Finnair para com o fundo de pensões.
Remetendo para a sua Comunicação sobre o quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal em apoio da economia no atual contexto do surto de Covid‑19 ( 1 ), a Comissão qualificou a garantia concedida à Finnair de auxílio de Estado compatível com o mercado interno em conformidade com o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE ( 2 ). Nos termos desta disposição, os auxílios destinados a sanar uma perturbação grave da economia de um Estado‑Membro podem ser considerados compatíveis com o mercado interno, sob certas condições.
A companhia aérea Ryanair interpôs um recurso de anulação da decisão da Comissão, ao qual, porém, foi negado provimento pela Décima Secção alargada do Tribunal Geral da União Europeia. Nesse contexto, esta secção confirmou pela primeira vez a legalidade de uma medida de auxílio de Estado individual adotada para responder às consequências da pandemia de COVID‑19 à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE ( 3 ).
Apreciação do Tribunal Geral
O Tribunal Geral procede, em primeiro lugar, à análise da legalidade da decisão impugnada à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE.
Por um lado, no que respeita às alegações de que um auxílio que beneficia apenas uma empresa individual não pode sanar uma perturbação grave da economia de um Estado‑Membro na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE, o Tribunal recorda que esta disposição se aplica tanto aos regimes de auxílios como aos auxílios individuais. Assim, um auxílio individual pode ser declarado compatível com o mercado interno desde que seja necessário, adequado e proporcionado para sanar uma perturbação grave da economia do Estado‑Membro em causa.
Seguidamente, o Tribunal precisa que um eventual incumprimento da Finnair teria tido graves consequências para a economia finlandesa, pelo que a garantia do Estado, na medida em que visa manter as atividades da Finnair e evitar que a sua eventual insolvência perturbe ainda mais a economia finlandesa, é adequada para sanar a grave perturbação da economia finlandesa causada pela pandemia de Covid‑19.
Esta conclusão do Tribunal baseia‑se no facto de a Finnair:
— ser a principal transportadora aérea na Finlândia, com cerca de 15 milhões de passageiros transportados em 2019, ou seja, 67 % de todos os passageiros transportados para, de e dentro da Finlândia;
— ser o principal operador de frete aéreo na Finlândia, responder às necessidades de várias empresas situadas no território finlandês, tanto para a exportação como para a importação de produtos, e dispor de uma rede asiática alargada;
— empregar 6800 pessoas, elevando‑se as suas compras junto dos fornecedores, na maioria finlandeses, a 1,9 mil milhões de euros em 2019;
— levar a cabo importantes esforços no domínio da investigação na Finlândia e representar a décima sexta empresa mais importante devido à sua contribuição para o PIB deste país.
Por outro lado, no que respeita às alegações de que a Comissão não efetuou uma ponderação dos efeitos benéficos do auxílio com os seus efeitos negativos, o Tribunal considera que o artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE não impõe essa análise, contrariamente ao que é prescrito no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Essa ponderação também não pode ser exigida com fundamento na Comunicação sobre o quadro temporário.
Em segundo lugar, o Tribunal examina a pretensa violação do princípio da não discriminação. A este respeito, começa por observar que, pela sua natureza, um auxílio individual cria uma diferença de tratamento, ou até uma discriminação, que é inerente ao caráter individual da medida. Sustentar que esse auxílio é contrário ao princípio da não discriminação equivaleria, em substância, a pôr sistematicamente em causa a compatibilidade de todos os auxílios individuais com o mercado interno, quando o direito da União permite aos Estados‑Membros concederem esses auxílios desde que as condições previstas no artigo 107.o TFUE.
Além disso, mesmo admitindo que possa ser equiparada a uma discriminação, cabe verificar se a diferença de tratamento criada pela garantia concedida à Finnair se pode justificar por um objetivo legítimo e se é necessária, adequada e proporcionada para o alcançar.
Segundo o Tribunal, as modalidades de concessão da garantia à Finnair são de natureza a alcançar o objetivo visado, uma vez que a existência de uma perturbação grave da economia finlandesa devido à pandemia de COVID‑19 e os importantes efeitos negativos desta pandemia no mercado finlandês do transporte aéreo ficaram suficientemente demonstrados. A medida de auxílio é, além disso, necessária perante o risco de insolvência da Finnair em razão da erosão súbita da sua atividade causada pela pandemia e da impossibilidade de cobrir as suas necessidades de liquidez recorrendo aos mercados de crédito. Por último, atendendo à importância da Finnair para a economia finlandesa, a concessão da garantia do Estado unicamente a esta última não ultrapassa os limites do que é adequado e necessário para a realização dos objetivos prosseguidos pela Finlândia.
Em terceiro lugar, no que respeita às alegações relativas à violação da livre prestação de serviços e da liberdade de estabelecimento, o Tribunal constata que a Ryanair não demonstrou de que modo o caráter exclusivo da concessão da garantia do Estado é suscetível de dissuadi‑la de se estabelecer na Finlândia ou de efetuar prestações de serviços a partir deste país ou com destino a ele. Precisa que a Ryanair não identificou os elementos de facto ou de direito que poderiam fazer com que o auxílio individual em causa produzisse efeitos restritivos que fossem além daqueles que desencadeiam a proibição do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, embora sejam necessários e proporcionados para sanar a perturbação grave da economia finlandesa causada pela pandemia de COVID‑19, em conformidade com as exigências do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE.
Por último, o Tribunal julga improcedentes os fundamentos relativos a uma pretensa violação do dever de fundamentação e constata que não é necessário examinar o mérito do fundamento relativo a uma violação dos direitos processuais decorrentes do artigo 108.o, n.o 2, TFUE.
( 1 ) Comunicação da Comissão sobre o quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal em apoio da economia no atual contexto do surto de COVID‑19 (JO 2020, C 91 I, p. 1), alterada em 3 de abril de 2020 (JO 2020, C 112 I, p. 1).
( 2 ) Decisão C(2020) 3387 final da Comissão, de 18 de maio de 2020, relativa ao auxílio de Estado SA.56809 (2020/N) — Finlândia — COVID‑19: garantia de Estado concedida à Finnair.
( 3 ) No seu Acórdão de 17 de fevereiro de 2021, Ryanair/Comissão, T‑238/20 (ver igualmente Comunicado de imprensa n.o 16/21), o Tribunal Geral precedeu a um exame análogo da legalidade de um regime de auxílios de Estado adotado pela Suécia para responder às consequências da pandemia de COVID‑19 no mercado sueco do transporte aéreo. Nos seus Acórdãos de 14 de abril de 2021, Ryanair/Comissão, T‑378/20 e Ryanair/Comissão, T‑379/20, o Tribunal Geral procedeu ao exame de duas medidas distintas de auxílio individual com base no artigo 107.o, n.o 2, alínea b), TFUE.