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Document 62020CJ0180

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 2 de setembro de 2021.
    Comissão Europeia contra Conselho da União Europeia.
    Recurso de anulação — Decisões (UE) 2020/245 e 2020/246 — Posição a tomar, em nome da União Europeia, no âmbito do Conselho de Parceria criado pelo Acordo de Parceria Abrangente e Reforçado entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República da Arménia, por outro — Acordo que inclui certas disposições que podem estar ligadas à política externa e de segurança comum (PESC) — Adoção dos Regulamentos Internos do Conselho de Parceria, do Comité de Parceria, dos subcomités e dos outros órgãos — Adoção de duas decisões distintas — Escolha da base jurídica — Artigo 37.° TUE — Artigo 218.°, n.° 9, TFUE — Regra de votação.
    Processo C-180/20.

    Court reports – general

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:658

    Processo C‑180/20

    Comissão Europeia

    contra

    Conselho da União Europeia

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 2 de setembro de 2021

    «Recurso de anulação — Decisões (UE) 2020/245 e 2020/246 — Posição a tomar, em nome da União Europeia, no âmbito do Conselho de Parceria criado pelo Acordo de Parceria Abrangente e Reforçado entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República da Arménia, por outro — Acordo que inclui certas disposições que podem estar ligadas à política externa e de segurança comum (PESC) — Adoção dos Regulamentos Internos do Conselho de Parceria, do Comité de Parceria, dos subcomités e dos outros órgãos — Adoção de duas decisões distintas — Escolha da base jurídica — Artigo 37.o TUE — Artigo 218.o, n.o 9, TFUE — Regra de votação»

    1. Acordos internacionais — Acordos da União — Negociação e celebração — Artigo 218.o TFUE — Repartição das competências — Processo unificado e de alcance geral

      (Artigo 218.o TFUE)

      (cf. n.o 27)

    2. Acordos internacionais — Acordos da União — Decisão do Conselho que define a posição a tomar, em nome da União, numa instância criada por um acordo internacional — Processo previsto no artigo 218.o, n.o 9, TFUE — Determinação da regra de votação aplicável

      (Artigos 218.°, n.os 6, 8, 9 e 10, TFUE)

      (cf. n.os 28‑30)

    3. Atos das instituições — Escolha da base jurídica — Critérios — Ato da União que prossegue uma dupla finalidade ou que tem duas componentes — Referência à finalidade ou à componente principal ou preponderante — Finalidades ou componentes indissociáveis — Cúmulo de bases jurídicas — Limites — Incompatibilidade dos procedimentos

      (cf. n.os 31‑34, 40)

    4. Atos das instituições — Escolha da base jurídica — Critérios — Decisão 2020/246 relativa à posição a tomar, em nome da União, no âmbito do Conselho de Parceria criado pelo Acordo de Parceria UE‑Arménia — Contexto da adoção do ato

      (Decisão 2020/246 do Conselho)

      (cf. n.os 38, 39, 54, 55)

    5. Atos das instituições — Escolha da base jurídica — Critérios — Ato da União que prossegue uma dupla finalidade ou que tem uma dupla componente — Referência à finalidade ou à componente principal ou preponderante — Decisões 2020/245 e 2020/246 relativas à posição a tomar, em nome da União, no âmbito do Conselho de Parceria criado pelo Acordo de Parceria UE‑Arménia — Adoção da Decisão 2020/246 com base no artigo 37.o TUE em conjugação com o artigo 218.o, n.o 8, segundo parágrafo, TFUE — Inadmissibilidade

      (Artigo 218.o, n.o 9, TFUE; Decisão 2020/246 do Conselho)

      (cf. n.os 41‑47, 56‑58)

    6. Cooperação para o desenvolvimento — Celebração de acordos internacionais pela União — Decisões 2020/245 e 2020/246 relativas à posição a tomar, em nome da União Europeia, no âmbito do Conselho de Parceria criado pelo Acordo de Parceria UE‑Arménia — Acordo que não inclui elementos cujo âmbito possa constituir a execução de outra política — Base jurídica — Artigos 21.° TUE e 208.° TFUE — Admissibilidade

      [Artigo 21.o, n.o 2, alínea c), TUE; artigo 208.o TFUE; Decisões do Conselho 2020/245 e 2020/246]

      (cf. n.os 49‑53)

    7. Recurso de anulação — Acórdão de anulação — Efeitos — Limitação pelo Tribunal de Justiça — Manutenção dos efeitos do ato impugnado até à substituição deste último num prazo razoável — Justificação baseada em motivos de segurança jurídica

      (Artigo 264.o, segundo parágrafo, TFUE)

      (cf. n.os 61‑64)

    Resumo

    O Tribunal de Justiça anula as decisões do Conselho relativas à aplicação do Acordo de Parceria com a Arménia

    O Tribunal declara que, embora o Acordo de Parceria apresente determinadas ligações com a PESC, os elementos ou as declarações de intenção que esse acordo inclui e que lhe estão associados não bastam para constituir uma componente autónoma desse acordo suscetível de dividir o ato do Conselho em duas decisões distintas

    O Acordo de Parceria Abrangente e Reforçado entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República da Arménia, por outro («Acordo de Parceria com a Arménia»), foi assinado em 24 de novembro de 2017 ( 1 ). Este acordo prevê a criação de um Conselho de Parceria e de um Comité de Parceria, bem como a possibilidade de criar subcomités e outros órgãos. O acordo prevê igualmente que o Conselho de Parceria adota o seu regulamento interno e define no mesmo as funções e o modo de funcionamento do Comité de Parceria.

    A Comissão Europeia e a Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança adotaram conjuntamente, em 29 de novembro de 2018, em conformidade com o artigo 218.o, n.o 9, TFUE, uma proposta de decisão do Conselho da União Europeia relativa à posição a tomar em nome da União no âmbito do Conselho de Parceria no que respeita à adoção de decisões sobre o regulamento interno desse Conselho de Parceria, bem como do Comité de Parceria e dos subcomités especializados ou de outros órgãos. Na sua proposta alterada de 19 de julho de 2019, a Comissão suprimiu a referência ao artigo 37.o TUE, relativa à celebração de acordos no domínio da política externa e de segurança comum (PESC), como base jurídica material. O Conselho dividiu a referida proposta de decisão em duas decisões distintas. Assim, adotou, por um lado, a Decisão 2020/245, destinada a assegurar a aplicação do Acordo de Parceria, com exceção do seu título II, e apoiando‑se nas bases jurídicas materiais constituídas pelos artigos 91.°, 207.° e 209.° TFUE, em matéria de transportes, de comércio e de desenvolvimento. Por outro lado, o Conselho adotou a Decisão 2020/246, destinada a assegurar a aplicação do título II desse acordo, relativo à cooperação no domínio da PESC, sendo a sua base jurídica material constituída apenas pelo artigo 37.o TUE. Enquanto a Decisão 2020/245 foi adotada por maioria qualificada, a Decisão 2020/246 foi adotada por unanimidade. A Comissão contestou, no Tribunal de Justiça, a divisão do ato do Conselho em duas decisões, a escolha do artigo 37.o TUE como base jurídica da Decisão 2020/246, bem como a regra de votação que daí tinha decorrido, e pediu, consequentemente, a anulação das duas decisões do Conselho.

    O Tribunal de Justiça, em formação de Grande Secção, anula as Decisões 2020/245 e 2020/246 do Conselho. O Tribunal declara que, embora o Acordo de Parceria apresente determinadas ligações com a PESC, os elementos ou declarações de intenção que esse acordo inclui e que lhe estão associados não bastam, no entanto, para constituir uma componente autónoma desse acordo suscetível de justificar que a Decisão 2020/246 se baseie no artigo 37.o TUE como base jurídica material e no artigo 218.o, n.o 8, segundo parágrafo, TFUE enquanto base jurídica processual. Considera igualmente que, nestas circunstâncias, nada justificava dividir em duas decisões o ato relativo à posição a tomar pela União no âmbito do Conselho de Parceria criado pelo Acordo de Parceria com a Arménia.

    Apreciação do Tribunal de Justiça

    A título preliminar, o Tribunal de Justiça recorda que, nos termos do artigo 218.o, n.o 8, TFUE, o Conselho delibera, regra geral, por maioria qualificada, e que só nos casos expostos no segundo parágrafo desta disposição delibera por unanimidade. Nestas condições, a regra de votação aplicável deve, em cada caso concreto, ser determinada consoante esteja ou não abrangida pelos casos previstos no artigo 218.o, n.o 8, segundo parágrafo, TFUE, devendo a escolha da base jurídica material da decisão em causa assentar em elementos objetivos suscetíveis de fiscalização jurisdicional, entre os quais figuram a finalidade e o conteúdo desse ato.

    O Tribunal de Justiça recorda a este respeito que, se o exame de um ato da União demonstrar que este último prossegue uma dupla finalidade ou tem duas componentes e uma delas for identificável como principal ou preponderante, ao passo que a outra é apenas acessória, o ato deve assentar numa única base jurídica, ou seja, a exigida pela finalidade ou pela componente principal ou preponderante. No caso em apreço, embora as decisões impugnadas digam formalmente respeito a títulos diferentes do Acordo de Parceria, o Tribunal de Justiça observa que o domínio a que pertencem e, assim, a base jurídica da ação externa da União em causa devem ser apreciados à luz do acordo no seu todo, uma vez que essas decisões dizem respeito, de modo geral, ao funcionamento das instâncias internacionais criadas com base no Acordo de Parceria com a Arménia. De resto, a adoção de duas decisões distintas do Conselho, assentes em bases jurídicas diferentes, mas que visam definir a posição única a tomar em nome da União sobre o funcionamento dos órgãos estabelecidos por esse acordo, só se pode justificar se o acordo, considerado no seu todo, contiver componentes distintas que correspondam às diferentes bases jurídicas utilizadas para a adoção das referidas decisões.

    A este respeito, o Tribunal de Justiça salienta que a qualificação de um acordo como acordo de cooperação para o desenvolvimento deve ser feita em consideração do objeto essencial do mesmo e não em função das suas cláusulas especiais. Ora, embora determinadas disposições do título II do Acordo de Parceria com a Arménia digam respeito a temas suscetíveis de serem abrangidos pela PESC e reafirmem a vontade das partes de colaborar entre si na matéria, essas disposições são, no entanto, pouco numerosas no acordo e limitam‑se, no essencial, a declarações de natureza programática que descrevem unicamente as relações existentes entre as partes contratantes e as suas intenções comuns para o futuro.

    O Tribunal de Justiça constata, em seguida, no que respeita às finalidades do acordo, que este visa principalmente estabelecer o quadro da cooperação em matéria de transportes, de comércio e de desenvolvimento com a Arménia. Neste contexto, o Tribunal de Justiça salienta que exigir que um acordo de cooperação para o desenvolvimento se baseie igualmente numa disposição diferente da relativa a essa política cada vez que respeite a uma matéria específica seria suscetível de esvaziar de conteúdo a competência e o processo previstos no artigo 208.o TFUE. No caso em apreço, embora alguns dos objetivos específicos que visam reforçar o diálogo político sejam certamente suscetíveis de estar associados à PESC, o Tribunal de Justiça observa que a enumeração desses objetivos específicos não é acompanhada de nenhum programa de ação ou de modalidades concretas de cooperação que possam demonstrar que a PESC constitui uma das componentes distintas desse mesmo acordo, à margem dos aspetos ligados ao comércio e à cooperação para o desenvolvimento.

    Por último, embora um elemento contextual em que um ato se insere, como, no caso em apreço, o conflito do Alto Carabaque, possa ser igualmente tomado em conta para efeitos da determinação da base jurídica do referido ato, o Tribunal de Justiça constata que o Acordo de Parceria com a Arménia não prevê nenhuma medida concreta ou específica destinada a fazer face a esta situação que põe em causa a segurança internacional.

    Tendo em conta as considerações precedentes, o Tribunal de Justiça anula a Decisão 2020/246, uma vez que esta foi erradamente assente numa base jurídica material composta pelo artigo 37.o TUE. Relativamente à Decisão 2020/245, o Tribunal de Justiça também a anula. Com efeito, resulta do seu considerando 10 e do seu artigo 1.o que esta decisão não diz respeito à posição a tomar, em nome da União, no âmbito do Conselho de Parceria criado pelo Acordo de Parceria com a Arménia, visto que essa posição se prende com a aplicação do título II deste acordo. Ora, as disposições que este título inclui não constituem uma componente distinta do referido acordo, que obrigasse o Conselho a basear‑se, designadamente, no artigo 37.o TUE e no artigo 218.o, n.o 8, segundo parágrafo, TFUE para tomar essa mesma posição. Por conseguinte, nada justificava que o Conselho excluísse do objeto da Decisão 2020/245 a posição em questão, na medida em esta diz respeito à aplicação do título II do mesmo acordo, e adotasse uma decisão distinta ao abrigo do artigo 218.o, n.o 9, TFUE, que tem por objeto definir a referida posição na medida em que diz respeito a essa mesma aplicação.

    No entanto, o Tribunal de Justiça decide, com um objetivo de segurança jurídica, manter os efeitos das decisões anuladas, enquanto se aguarda a adoção pelo Conselho de uma nova decisão conforme com o acórdão.


    ( 1 ) Decisão (UE) 2018/104 relativa à assinatura, em nome da União, e à aplicação provisória do Acordo de Parceria Abrangente e Reforçado entre a União Europeia e a Comunidade Europeia da Energia Atómica e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República da Arménia, por outro (JO L 2018, L 23, p. 1).

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