This document is an excerpt from the EUR-Lex website
Document 62019TJ0370
Acórdão do Tribunal Geral (Nona Secção) de 23 de setembro de 2020.
Reino de Espanha contra Comissão Europeia.
Relações externas — Cooperação técnica — Comunicações eletrónicas — Regulamento (UE) 2018/1971 — Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas — Artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento 2018/1971 — Participação das autoridades reguladoras de países terceiros neste organismo — Participação da autoridade reguladora nacional do Kosovo — Conceito de país terceiro — Erro de direito.
Processo T-370/19.
Acórdão do Tribunal Geral (Nona Secção) de 23 de setembro de 2020.
Reino de Espanha contra Comissão Europeia.
Relações externas — Cooperação técnica — Comunicações eletrónicas — Regulamento (UE) 2018/1971 — Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas — Artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento 2018/1971 — Participação das autoridades reguladoras de países terceiros neste organismo — Participação da autoridade reguladora nacional do Kosovo — Conceito de país terceiro — Erro de direito.
Processo T-370/19.
Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section
ECLI identifier: ECLI:EU:T:2020:440
Processo T‑370/19
Reino de Espanha
contra
Comissão Europeia
Acórdão do Tribunal Geral (Nona Secção) de 23 de setembro de 2020
«Relações externas — Cooperação técnica — Comunicações eletrónicas — Regulamento (UE) 2018/1971 — Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas — Artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento 2018/1971 — Participação das autoridades reguladoras de países terceiros neste organismo — Participação da autoridade reguladora nacional do Kosovo — Conceito de país terceiro — Erro de direito»
Acordos internacionais — Cooperação técnica — Comunicações eletrónicas — Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas — Participação das autoridades reguladoras de países terceiros neste organismo — País terceiro — Conceito — Entidades sujeitas ao direito internacional, que podem ter direitos e obrigações — Kosovo — Inclusão
(Artigos 212.° e 216.° a 218.° TFUE; Regulamento 2018/1971 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 35.o, n.o 2)
(cf. n.os 28‑30, 35, 36)
Acordos internacionais — Cooperação técnica — Comunicações eletrónicas — Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas — Participação das autoridades reguladoras de países terceiros neste organismo — «Acordo com a União para o efeito» — Conceito — Acordo celebrado entre a União e outro sujeito de direito internacional público — Acordo que contém disposições que servem de base à cooperação entre a União e o país terceiro em causa no domínio das comunicações eletrónicas — Acordo de Estabilização e de Associação entre a União e o Kosovo — Inclusão
(Regulamento 2018/1971 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 35.o, n.o 2; Acordo de Estabilização e de Associação entre a União e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Kosovo, por outro, artigo 111.o)
(cf. n.os 46‑48, 53, 54)
Acordos internacionais — Cooperação técnica — Comunicações eletrónicas — Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas — Participação das autoridades reguladoras de países terceiros neste organismo — Acordos de trabalho aplicáveis à referida participação — Procedimento de determinação — Exigência de conformidade com as disposições dos acordos celebrados com a União para essa participação — Competência da Comissão para fixar unilateralmente tais acordos de trabalho
(Artigo 17.o TUE; Regulamento 2018/1971 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 35.o, n.o 2, segundo parágrafo)
(cf. n.os 70, 72, 76, 77, 79, 81, 82)
Resumo
No Acórdão Espanha/Comissão (T‑370/19), proferido em 23 de setembro de 2020, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto pelo Reino de Espanha (a seguir «recorrente») ao abrigo do artigo 263.o TFUE, destinado a obter a anulação da Decisão da Comissão que determina que a autoridade reguladora nacional do Kosovo pode participar nos órgãos do Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas (ORECE) e do Gabinete do ORECE (a seguir «decisão impugnada») ( 1 ).
O ORECE, instituído pelo Regulamento n.o 1211/2009 ( 2 ), foi encarregado de contribuir para o desenvolvimento do mercado interno das redes e dos serviços de comunicações eletrónicas e para o seu melhor funcionamento. De acordo com este regulamento, cabia ao ORECE exercer as suas funções com independência e em cooperação com as autoridades reguladoras nacionais (a seguir «ARN») e a Comissão Europeia. Este regulamento foi revogado pelo Regulamento 2018/1971 ( 3 ), que, no artigo 35.o, prevê as modalidades de cooperação do ORECE com os órgãos da União, os países terceiros e as organizações internacionais. De 2001 a 2015, a União assinou com os países dos Balcãs Ocidentais acordos de estabilização e de associação (a seguir «AEA»), que contêm disposições específicas sobre a cooperação no domínio das comunicações eletrónicas. É o caso, nomeadamente, do Acordo de Estabilização e de Associação entre a União e a Comunidade Europeia da Energia Atómica, por um lado, e o Kosovo, por outro (a seguir «AEA Kosovo») ( 4 ). Em 18 de março de 2019, a Comissão adotou seis decisões, entre as quais a decisão impugnada sobre a participação das ARN dos seis países dos Balcãs Ocidentais no ORECE. Estas decisões foram tomadas, nomeadamente, com base no artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento n.o 2018/1971.
No que respeita à observância, pela Comissão, desta mesma disposição, posto que, segundo o recorrente, o Kosovo, que não é um Estado soberano dotado de uma organização de caráter estatal, não é um «país terceiro», o Tribunal Geral começou por salientar que este conceito de «país terceiro» não está definido nem no Regulamento 2018/1971 nem na regulamentação relevante da União. O Tribunal Geral notou igualmente que o Tratado FUE, por seu turno, utiliza tanto os termos «países terceiros», em especial em numerosas disposições que tratam de questões relativas às relações externas, como os termos «Estados terceiros». Assim, para o Tribunal Geral, as disposições do Tratado FUE relativas aos «países terceiros» visam permitir a celebração de acordos internacionais com entidades «que não sejam Estados», entre as quais entidades territoriais, incluídas no conceito flexível de «países». A este respeito, o Tribunal Geral considerou que o conceito de «país terceiro» visado no Tratado FUE, a fim de designar entidades sujeitas ao direito internacional que podem ter direitos e obrigações, não pode assumir uma aceção diferente quando esse mesmo conceito figura num diploma de direito secundário como o Regulamento 2018/1971. O Tribunal Geral concluiu que o conceito de «país terceiro» na aceção do artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento 2018/1971 não é equivalente ao de «Estado terceiro», mas tem um alcance mais amplo, que vai além apenas dos Estados soberanos. O Kosovo pode, assim, integrar este conceito de «país terceiro», sem prejuízo da posição da União ou da dos Estados‑Membros relativamente ao estatuto do Kosovo como Estado independente.
O recorrente sustentou, ainda, que a Comissão violou esta mesma disposição, porquanto, em seu entender, inexistia «acordo», na aceção desta disposição, para efeitos da participação da ARN do Kosovo no ORECE. O recorrente considerou, em especial, que o AEA Kosovo não constituía um tal acordo de participação no ORECE. A este respeito, o Tribunal Geral salientou que o n.o 2 do artigo 35.o do Regulamento 2018/1971 sujeitava a participação das ARN de países terceiros nos órgãos competentes do ORECE à dupla condição, por um lado, da existência de um «acordo» entre o país terceiro em causa e a União e, por outro, de que a celebração desse acordo fosse efetuada «para o efeito». Após ter verificado que a primeira destas condições estava preenchida, dado que o AEA Kosovo podia certamente constituir um acordo deste tipo enquanto acordo internacional celebrado entre dois sujeitos de direito internacional público, o Tribunal Geral analisou a expressão «para o efeito». A este título, mencionou o facto de esta expressão indicar que os acordos em causa devem conter disposições que sirvam de base à cooperação entre a União e o país terceiro em causa no domínio em questão, concretamente, o domínio das comunicações eletrónicas. No caso em apreço, o Tribunal Geral considerou que o artigo 111.o da ASA Kosovo, referindo‑se expressamente a um «reforço» da cooperação entre a União e o Kosovo, previa tal cooperação estreita, segundo várias modalidades. Em especial, o Tribunal Geral especificou que é, nomeadamente, a participação, com direitos limitados, visada no artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento 2018/1971 que corresponde à cooperação estreita visada no referido artigo 111.o do AEA Kosovo, sem, porém, equivaler a uma «integração» da ARN do Kosovo na estrutura do ORECE. O Tribunal Geral concluiu que o artigo 111.o do AEA Kosovo constitui um acordo «para o efeito», na aceção do artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento 2018/1971.
Por último, o recorrente sustentou, em substância, que a Comissão violou o artigo 35.o, n.o 2, do Regulamento 2018/1971, uma vez que fixou unilateralmente, na decisão impugnada, «acordos» de trabalho, na aceção desta disposição, para efeitos da participação da ARN do Kosovo nos órgãos do ORECE. Em seu entender, por um lado, esses acordos de trabalho vinculativos deviam ser estabelecidos nos próprios acordos de participação no ORECE e, por outro, a Comissão, tendo adotado a decisão impugnada, agiu sem base legal. Em primeiro lugar, o Tribunal Geral enunciou que a referência aos termos «disposições aplicáveis [dos] acordos», nessa disposição, acompanhada da locução «nos termos», visa indicar que a adoção dos «acordos» de trabalho deve ser efetuada «em conformidade» com as disposições desses acordos de participação. Assim, declarou que não é juridicamente necessário exigir que a «abertura para a participação» de uma ARN de um país terceiro esteja sujeita a uma autorização específica estabelecida num acordo internacional. Em segundo lugar, no que respeita aos poderes da Comissão, o Tribunal Geral salientou que, como nem o Regulamento 2018/1971 nem qualquer outra regulamentação da União conferiram expressamente ao Gabinete do ORECE ou a outro organismo a competência para estabelecer acordos de trabalho aplicáveis à participação das ARN de países terceiros, esta competência cabe à Comissão. Por último, o Tribunal Geral declarou que o artigo 17.o TUE, no qual se baseia, nomeadamente, a decisão impugnada, constitui uma base jurídica suficiente, declaração que não é posta em causa pelo facto de este artigo ser uma disposição geral.
Consequentemente, por um lado, o Tribunal Geral considerou que a Comissão era competente para fixar unilateralmente, na decisão impugnada, «acordos de trabalho» aplicáveis à participação das ARN de países terceiros no ORECE, referidos no artigo 35.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento 2018/1971. Por outro lado, afastou a acusação dirigida à Comissão da falta de base jurídica da referida decisão.
( 1 ) Decisão da Comissão, de 18 de março de 2019, relativa à participação da autoridade reguladora nacional do Kosovo no Organismo de Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas (JO 2019, C 115, p. 26)
( 2 ) Regulamento (CE) n.o 1211/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009, que cria o Organismo de Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas (ORECE) e o Gabinete (JO 2009, L 337, p. 1)
( 3 ) Regulamento (UE) 2018/1971 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, que cria o Organismo dos Reguladores Europeus das Comunicações Eletrónicas (ORECE) e a Agência de Apoio ao ORECE (Gabinete do ORECE), e que altera o Regulamento (UE) 2015/2120 e revoga o Regulamento n.o 1211/2009 (JO 2018, L 321, p. 1)
( 4 ) JO 2016, L 71, p. 3