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Document 62014TJ0817

    Acórdão do Tribunal Geral (Oitava Secção) de 17 de março de 2016.
    Zoofachhandel Züpke GmbH e o. contra Comissão Europeia.
    Responsabilidade extracontratual — Polícia sanitária — Luta contra a gripe aviária — Proibição de importação para a União de aves selvagens capturadas — Regulamento (CE) n.° 318/2007 e Regulamento de Execução (UE) n.° 139/2013 — Violação suficientemente caracterizada de normas jurídicas que conferem direitos aos particulares — Violação manifesta e grave dos limites do poder de apreciação — Proporcionalidade — Dever de diligência — Artigos 15.° a 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais.
    Processo T-817/14.

    Court reports – general

    Processo T‑817/14

    Zoofachhandel Züpke GmbH e o.

    contra

    Comissão Europeia

    «Responsabilidade extracontratual — Polícia sanitária — Luta contra a gripe aviária — Proibição de importação para a União de aves selvagens capturadas — Regulamento (CE) n.o 318/2007 e Regulamento de Execução (UE) n.o 139/2013 — Violação suficientemente caracterizada de normas jurídicas que conferem direitos aos particulares — Violação manifesta e grave dos limites do poder de apreciação — Proporcionalidade — Dever de diligência — Artigos 15.° a 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais»

    Sumário — Acórdão do Tribunal Geral (Oitava Secção) de 17 de março de 2016

    1. Responsabilidade extracontratual — Requisitos — Ilegalidade — Violação suficientemente caracterizada do direito da União — Regulamentação em matéria de polícia sanitária — Exigência de uma violação manifesta e grave pela instituição em causa dos limites do seu poder de apreciação

      (Artigos 43.° e 340.°, segundo parágrafo, TFUE)

    2. Direito da União Europeia — Princípios — Proporcionalidade — Alcance

      (Artigo 5.o, n.o 4, TUE)

    3. Direito da União Europeia — Princípios — Princípio da precaução — Alcance

      (Artigos 11.° TFUE, 168.°, n.o 1, TFUE, 169.°, n.os 1 e 2, TFUE, e 191, n.o 1 e 2, TFUE)

    4. Agricultura — Aproximação das legislações em matéria de polícia sanitária — Controlos veterinários e zootécnicos aplicáveis ao comércio intracomunitário de animais vivos e de produtos de origem animal — Diretiva 91/496 — Medidas de salvaguarda aplicáveis a importações provenientes de um país terceiro — Conceito — Regulamentos da Comissão que impõem restrições à importação de determinadas aves para a União sem indicar um país terceiro específico — Exclusão

      (Regulamentos da Comissão n.o 318/2007 e n.o 139/2013; Diretiva 91/496 do Conselho, artigo 18.o, n.o 1)

    5. Agricultura — Aproximação das legislações em matéria de polícia sanitária — Controlos veterinários e zootécnicos aplicáveis ao comércio intracomunitário de animais vivos e de produtos de origem animal — Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, que estabelecem uma proibição de importação de aves selvagens capturadas no seu meio natural — Limitação das importações às aves criadas em cativeiro num estabelecimento de reprodução aprovado — Violação dos princípios da proporcionalidade e da precaução — Inexistência

      (Artigo 43.o TFUE, Regulamentos da Comissão n.o 318/2007 e n.o 139/2013; Diretiva 92/65 do Conselho)

    6. Agricultura — Aproximação das legislações em matéria de polícia sanitária — Controlos veterinários e zootécnicos aplicáveis ao comércio intracomunitário de animais vivos e de produtos de origem animal — Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, que estabelecem uma proibição de importação de aves selvagens capturadas no seu meio natural — Não aplicação da proibição às aves criadas em cativeiro — Violação do princípio da proporcionalidade — Inexistência

      (Regulamentos da Comissão n.o 318/2007 e n.o 139/2013)

    7. Direito da União Europeia — Princípios — Princípio da boa administração — Dever de diligência — Alcance

    8. Agricultura — Aproximação das legislações em matéria de polícia sanitária — Controlos veterinários e zootécnicos aplicáveis ao comércio intracomunitário de animais vivos e de produtos de origem animal — Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, que estabelecem uma proibição de importação de aves selvagens capturadas no seu meio natural — Restrição desproporcionada dos direitos à liberdade profissional, à liberdade de empresa e de propriedade — Inexistência

      (Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigos 15.° a 17.°; Regulamentos do Conselho n.o 318 e n.o 139/2013)

    1.  Em matéria de responsabilidade extracontratual da União, o primeiro pressuposto, relativo ao comportamento ilegal censurado à instituição ou ao órgão em causa, exige a prova de uma violação suficientemente caracterizada de uma norma jurídica que tenha por objeto conferir direitos aos particulares. Esta exigência destina‑se a evitar, independentemente da natureza do ato ilícito em causa, que o risco de ter de suportar os prejuízos invocados pelas empresas afetadas entrave a capacidade da instituição em causa de exercer plenamente as suas competências no interesse geral, quer as abrangidas pela sua atividade normativa ou que implicam opções de política económica quer as da esfera da sua competência administrativa, sem, no entanto, fazer impender sobre terceiros o peso das consequências de incumprimentos flagrantes e indesculpáveis

      No que se refere a uma eventual violação suficientemente caracterizada das regras de direito em matéria de polícia sanitária, essa violação deve assentar numa violação manifesta e grave dos limites do lato poder de apreciação de que o legislador da União dispõe no exercício das competências em matéria de política agrícola comum nos termos do artigo 43.o TFUE. Com efeito, o exercício desse poder discricionário implica a necessidade de o legislador da União antecipar e avaliar evoluções em matéria ecológica, científica, técnica e económica de natureza complexa e incerta. A este respeito, embora os estudos e pareceres científicos tenham de ser tomados em consideração, a escolha política que constitui a fixação do nível de proteção adequado para a sociedade cabe às referidas instituições e não aos cientistas.

      (cf. n.os 41 a 43)

    2.  V. texto da decisão.

      (cf. n.o 50)

    3.  O princípio da precaução constitui um princípio geral do direito da União, decorrente do artigo 11.o TFUE, do artigo 168.o, n.o 1, TFUE, do artigo 169.o, n.os 1 e 2, TFUE e do artigo 191.o, n.os 1 e 2, TFUE, que impõem que as autoridades em causa tomem, no exercício concreto das competências que lhes são atribuídas pela regulamentação aplicável, as medidas apropriadas para prevenir certos riscos potenciais para a saúde pública, para a segurança e para o ambiente, fazendo prevalecer as exigências de proteção desses interesses sobre os interesses económicos. Assim, o princípio da precaução permite às instituições, quando subsistam incertezas científicas quanto à existência ou ao alcance de riscos para a saúde humana, adotarem medidas de proteção sem ter de esperar que a realidade e a gravidade de tais riscos sejam plenamente demonstradas ou que os efeitos adversos para a saúde se materializem. Além disso, quando for impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do risco alegado devido à natureza insuficiente, não conclusiva ou imprecisa dos resultados dos estudos levados a cabo, mas persista a probabilidade de um prejuízo real para a saúde pública na hipótese de o risco se realizar, o princípio da precaução justifica a adoção de medidas restritivas, sem prejuízo de as mesmas deverem ser não discriminatórias e objetivas.

      (cf. n.o 51)

    4.  Os Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, que fixam as condições de polícia sanitária aplicáveis às importações de determinadas aves para a Comunidade e as condições de quarentena que lhes são aplicáveis, não constituem medidas de salvaguarda fundadas no artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 91/496, que fixa os princípios relativos à organização dos controlos veterinários dos animais provenientes de países terceiros introduzidos na Comunidade, antes estabelecendo, de acordo com as suas bases jurídicas, para todos os países terceiros, exigências gerais de polícia sanitária para a importação de animais para a União. Com efeito, as bases jurídicas nas quais se baseiam estes regulamentos não contêm nenhuma referência a um país terceiro específico no qual exista um risco sanitário comprovado.

      (cf. n.os 60 e 61)

    5.  Uma regulamentação que condiciona a importação de aves para a União à sua proveniência de países terceiros que estejam em condições de prestar garantias equivalentes às que vigoram na União, como a prevista nos Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, que fixam as condições de polícia sanitárias aplicáveis às importações de determinadas aves para a Comunidade e as condições de quarentena que lhes são aplicáveis, é conforme aos fins e às disposições da Diretiva 92/65, que define as condições de polícia sanitária que regem o comércio e as importações na Comunidade de animais, sémenes, óvulos e embriões não sujeitos, no que se refere às condições de polícia sanitária, às regulamentações comunitárias específicas referidas na secção I do anexo A da Diretiva 90/425 bem como ao princípio da precaução, não sendo também desproporcionada.

      A este propósito, no que concerne à exigência prevista nos Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, segundo a qual os animais devem provir de um estabelecimento de reprodução aprovado, onde são criados em cativeiro, e não do meio natural, tendo em conta as incertezas sobre o estado sanitário das aves selvagens capturadas, há que constatar que esta exigência, combinada com a exigência de um sistema veterinário eficaz, constitui a condição indispensável de uma vigilância sanitária e de um controlo preventivo no país terceiro de origem, as quais, por seu turno, condicionam o respeito por esse país terceiro das garantias equivalentes às que vigoram na União e a sua inscrição na lista dos países terceiros a partir dos quais é autorizada a importação de animais para a União. Assim sendo, o princípio da autorização prévia, consagrado nos termos das bases jurídicas dos referidos regulamentos e em conformidade com o princípio da precaução, deve ser aplicado com base na obtenção de garantias quanto à vigilância sanitária das aves criadas num estabelecimento aprovado pelo país terceiro de origem e não em presunções quanto à situação sanitária geral nesse país. Estas garantias permitem designadamente determinar com suficiente certeza científica se esse país está livre de doenças, independentemente da sua localização geográfica e de tais presunções.

      Daqui decorre que, na medida em que uma proibição das importações para a União de aves selvagens capturadas constitui o corolário das garantias exigidas pelo princípio da autorização prévia de países terceiros, a Comissão, ao exigir essas garantias no Regulamento n.o 318/2007 e no Regulamento de Execução n.o 139/2013, no âmbito do seu amplo poder de apreciação, não cometeu nenhum erro manifesto nem qualquer violação caracterizada do princípio da proporcionalidade ou do princípio da precaução. Do mesmo modo, quanto ao caráter proporcionado do alcance geográfico da proibição de importação para a União de aves selvagens capturadas, a Comissão só poderia exceder o seu poder de apreciação e violar o princípio da proporcionalidade ao abster‑se de autorizar a importação dessas aves provenientes de zonas manifestamente livres de gripe aviária. No entanto, na falta de elementos que comprovem claramente e de maneira suficientemente convincente que determinados países ou continentes, em particular a América do Sul e a Oceânia, estão de forma duradoura indemnes e livres do vírus da gripe aviária, ou que, de modo geral, as aves selvagens capturadas não representam qualquer risco de propagação desse vírus, há que constatar que a incerteza científica relativa ao risco de propagação da gripe aviária na União pelas importações de aves selvagens capturadas provenientes de países terceiros do mundo inteiro subsiste num nível elevado.

      (cf. n.os 66, 68 a 72, 84 e 85)

    6.  No que respeita aos Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, que fixam as condições de polícia sanitárias aplicáveis às importações de determinadas aves para a Comunidade e as condições de quarentena que lhes são aplicáveis, não se pode acusar a Comissão de ter adotado uma medida manifestamente desproporcionada ao distinguir as aves selvagens das aves criadas em cativeiro. Com efeito, no que respeita à prevenção de riscos, as aves selvagens distinguem‑se das aves criadas em cativeiro na medida em que, no caso destas últimas aves, é possível impor um controlo sanitário estrito desde o seu nascimento, que pode chegar à sua criação em meio fechado ou incluir o seu confinamento relativamente às aves de capoeira.

      (cf. n.os 91 e 93)

    7.  V. texto da decisão.

      (cf. n.o 107)

    8.  A liberdade profissional, a liberdade de empresa e o direito de propriedade são direitos fundamentais consagrados nos artigos 15.° a 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais. Todavia, esses direitos não constituem prerrogativas absolutas, mas devem ser tomados em consideração atendendo à sua função social. Por conseguinte, podem ser introduzidas restrições ao exercício desses direitos, na condição de essas restrições corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral prosseguidos pela União e não constituírem, relativamente ao fim prosseguido, uma intervenção excessiva e intolerável que atente contra a própria substância dos direitos assim garantidos.

      No que respeita aos Regulamentos n.o 318/2007 e n.o 139/2013, que fixam as condições de polícia sanitárias aplicáveis às importações de determinadas aves para a Comunidade e as condições de quarentena que lhes são aplicáveis, estes prosseguem um objetivo legítimo de interesse geral, a saber, a proteção da saúde humana e da saúde animal face ao risco de propagação do vírus da gripe aviária, e não são manifestamente desproporcionados para o efeito. Assim, não podem ser consideradas uma intervenção desproporcionada e intolerável que tenha violado o núcleo dos direitos de propriedade e de livre exercício de uma atividade económica. A este respeito, uma eventual diminuição do volume de negócios ou uma eventual perda de rendimento ligadas a um diferencial de preço de custo entre aves criadas em cativeiro e aves capturadas no seu meio natural não podem constituir uma violação do conteúdo essencial dos direitos fundamentais, o qual excede largamente a oportunidade de negócio.

      (cf. n.os 126, 128, 129 e 132)

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