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Document 62002TJ0193

Sumário do acórdão

Palavras-chave
Sumário

Palavras-chave

1. Processo – Intervenção – Excepção de inadmissibilidade não suscitada pelo recorrido – Inadmissibilidade – Fundamentos de inadmissibilidade de ordem pública – Exame oficioso pelo juiz

(Estatuto do Tribunal de Justiça, artigos 40.°, quarto parágrafo, e 53.°; Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigos 113.° e 116.°, n.° 3)

2. Recurso de anulação – Pessoas singulares ou colectivas – Actos que lhes dizem directa e individualmente respeito – Decisão que encerra o processo instaurado ao abrigo do Regulamento n.° 17 na sequência de uma denúncia – Autor da denúncia – Empresa terceira à qual foi reconhecido interesse legítimo em apresentar observações no quadro do procedimento administrativo – Admissibilidade

(Artigos 81.° CE, 82.° CE e 230.°, quarto parágrafo, CE; Regulamento n.° 17 do Conselho)

3. Concorrência – Normas comunitárias – Associações de empresas – Conceito – Federações nacionais de futebol – Inclusão

(Artigos 2.° CE e 81.° CE)

4. Concorrência – Normas comunitárias – Associações de empresas – Conceito – Federação internacional de futebol – Inclusão

(Artigo 81.° CE)

5. Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Decisões de associações de empresas – Conceito – Regulamento que rege a actividade dos agentes de jogadores adoptado pela Federação internacional de futebol – Inclusão

(Artigo 81.° CE)

6. Concorrência – Procedimento administrativo – Exame das denúncias – Denúncia que visa a regulamentação de uma actividade económica sem objecto desportivo Por um organismo de direito privado desprovido de delegação de uma autoridade pública – Decisão que encerra o procedimento administrativo – Controlo jurisdicional limitador às apreciações efectuadas pela Comissão à luz das normas de concorrência

(Regulamento n.° 17 do Conselho)

7. Concorrência – Procedimento administrativo – Exame das denúncias – Tomada em consideração do interesse comunitário ligado à instrução de um processo – Critérios de apreciação – Poder de apreciação da Comissão – Limites – Controlo jurisdicional

(Artigos 81.° CE, 82.° CE e 85.°, n.° 1, CE)

8. Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Proibição – Isenção – Regulamento que rege a actividade dos agentes de jogadores de futebol adoptado pela Federação internacional de futebol – Estabelecimento de uma licença que condiciona o exercício da profissão – Objectivo de profissionalização e de organização colectiva dos agentes – Admissibilidade

(Artigo 81.°, n.° 3, CE)

9. Concorrência – Posição dominante – Posição dominante colectiva – Conceito – Entidade colectiva – Condições

(Artigo 82.° CE)

10. Concorrência – Posição dominante – Posição dominante colectiva – Condições – Posição da Federação internacional de futebol sobre o mercado das prestações de serviços dos agentes de jogadores

(Artigo 82.° CE)

Sumário

1. As conclusões do um pedido de intervenção devem limitar‑se a sustentar as pretensões de uma das partes em litígio. Um interveniente não pode, portanto, suscitar uma excepção de inadmissibilidade que não foi suscitada pela parte em apoio da qual intervém.

Contudo, em virtude do artigo 113.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, o Tribunal pode, a todo o tempo, examinar oficiosamente os fundamentos de inadmissibilidade de ordem pública, incluindo os invocados pelos intervenientes.

(cf. n. os  35-37)

2. A recusa por parte da Comissão em prosseguir um processo desencadeado a partir de uma denúncia feita ao abrigo do Regulamento n.° 17 e a rejeição dessa denúncia causa prejuízo ao seu autor, o qual, segundo jurisprudência constante, deve dispor de uma via de recurso destinada a salvaguardar os seus legítimos interesses. Do mesmo modo, uma empresa terceira a que a Comissão reconheceu um interesse legítimo em apresentar observações no quadro desse processo tem legitimidade para interpor recurso contra a decisão que o dá definitivamente por concluído.

(cf. n.° 38)

3. As associações nacionais que agrupam clubes de futebol para os quais a prática do futebol constitui uma actividade económica e que são, por consequência, empresas na acepção do artigo 81.° CE, são associações de empresas na acepção da mesma disposição.

A circunstância de essas associações nacionais agruparem clubes ditos amadores, ao lado de clubes ditos profissionais, não é susceptível de pôr em causa esta apreciação. A este respeito, a qualificação unilateral, por uma associação ou uma federação desportiva, de atletas ou clubes como «amadores» não é, por si só, apta a excluir que estes exerçam actividades económicas na acepção do artigo 2.° CE.

(cf. n. os  69, 70)

4. A Fédération internationale de football (FIFA) constitui igualmente uma associação de empresas na acepção do artigo 81.° CE. Com efeito, agrupa associações nacionais que são, por sua vez, associações de empresas pois os seus membros são clubes que têm uma actividade económica e simultaneamente empresas, dado que exercem elas próprias uma actividade económica, devido ao facto de que, segundo os estatutos da FIFA, são obrigadas a participar nas competições por ela organizadas, estão obrigadas a pagar‑lhe uma percentagem da receita bruta de cada jogo internacional e são consideradas, segundo estes mesmos estatutos, proprietários, com a FIFA, dos direitos exclusivos de difusão e de transmissão das manifestações desportivas em causa.

Com efeito, o artigo 81.° CE aplica‑se às associações, na medida em que a sua actividade própria ou a das empresas que a elas aderem se destina a produzir os efeitos nele visados. O quadro jurídico em que são tomadas as decisões de empresas e a qualificação que é dada a esse quadro pelas diferentes ordens jurídicas nacionais não são relevantes para a aplicabilidade das regras comunitárias da concorrência.

(cf. n. os  71, 72)

5. O regulamento adoptados pela Fédération internationale de football (FIFA) para reger a actividade dos agentes de jogadores, actividade económica de prestação de serviços que não releva da especificidade desportiva tal como definida na jurisprudência do Tribunal de Justiça constitui uma decisão de associação de empresas na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE, que fica sujeita ao respeito das regras comunitárias da concorrência a partir do momento em que a mesma tenha efeitos na Comunidade.

Com efeito, por um lado, foi adoptado pela FIFA no exercício de uma autoridade própria e não em virtude de poderes normativos que lhe tenham sido delegados pelas autoridades públicas no quadro de uma missão de interesse geral tendo em vista a actividade desportiva e, por outro, visto o seu carácter obrigatório para as associações nacionais membros da Federação internacional, que são obrigadas a estabelecer uma regulamentação análoga sujeita a aprovação por parte dessa Federação, bem como para os clubes, para os jogadores e para os agentes de jogadores, este regulamento traduz a expressão da vontade da FIFA de coordenar o comportamento dos seus membros relativamente à actividade dos agentes de jogadores.

(cf. n. os  73-75)

6. Uma regulamentação que se enquadra nas funções de polícia de uma actividade económica e que afecta as liberdades fundamentais, é, em princípio, da competência das autoridades públicas. Com efeito, o próprio princípio da regulamentação de uma actividade económica, que não diga respeito à especificidade desportiva nem à liberdade de organização interna das associações desportivas, por um organismo de direito privado, que não dispõe de qualquer delegação de uma autoridade pública para tal, não pode ser imediatamente considerado compatível com o direito comunitário.

A fiscalização jurisdicional operada no quadro de um recurso relativo à legalidade de uma decisão tomada pela Comissão na sequência de um processo iniciado com base numa denúncia apresentada com base no Regulamento n.° 17, para o tratamento da qual a Comissão não podia utilizar outros poderes além daqueles de que dispõe neste quadro, está necessariamente circunscrita às regras da concorrência e à apreciação efectuada pela Comissão sobre as infracções a estas pela decisão controvertida. Esta fiscalização só pode, portanto, estender‑se ao respeito de outras disposições do Tratado na medida em que a sua eventual violação corresponda a uma violação concomitante das regras da concorrência. Também só pode incidir sobre a eventual violação de princípios fundamentais na medida em que isso se traduza numa infracção às regras da concorrência.

(cf. n. os  76-79)

7. Quando a Comissão examina uma denúncia em matéria de concorrência à luz do interesse comunitário, a avaliação deste último depende das circunstâncias factuais e jurídicas de cada caso concreto, que podem diferir consideravelmente de um processo para outro, e não de critérios predeterminados de aplicação obrigatória. Não se deve, pois, limitar o número dos critérios de apreciação a que a Comissão se pode referir, nem, inversamente, impor‑lhe a utilização exclusiva de determinados critérios.

Por outro lado, a Comissão, investida pelo artigo 85.°, n.° 1, CE da missão de velar pela aplicação dos artigos 81.° CE e 82.° CE, é chamada a definir e a pôr em prática a política comunitária da concorrência, dispondo para esse efeito de um poder discricionário para o tratamento das denúncias. Contudo, este poder não é ilimitado e a Comissão deve apreciar em cada caso a gravidade e a duração das infracções à concorrência e a persistência dos seus efeitos.

Além disso, a fiscalização do órgão jurisdicional comunitário sobre o exercício, pela Comissão, do poder discricionário que lhe é reconhecido nesta matéria não deve levá‑lo a substituir a apreciação do interesse comunitário da Comissão pela sua própria apreciação, antes se destinando a verificar que a decisão em litígio não se baseia em factos materialmente inexactos e que não está ferida de qualquer erro de direito nem de qualquer erro manifesto de apreciação ou de desvio de poder.

(cf. n. os  80, 81, 120)

8. A licença de agente de jogadores, imposta por um regulamento da Federação internacional de futebol (FIFA) e que condiciona o exercício da referida profissão, constitui uma barreira ao acesso a esta actividade económica e afecta necessariamente, por isso, o jogo da concorrência.

No entanto, atendendo a que, por um lado, a FIFA prossegue um duplo objectivo de profissionalização e de moralização da actividade de agente de jogadores, a fim de proteger estes últimos, cuja carreira é curta, e a que, por outro lado, a concorrência não é eliminada pelo sistema da licença, parecendo este levar mais a uma selecção qualitativa, apta a satisfazer o objectivo de profissionalização da actividade de agente de jogadores, do que a uma restrição quantitativa ao seu acesso, e que, por fim, as condições actuais do exercício da actividade de agente de jogadores, são caracterizadas por uma inexistência quase geral de regulamentações nacionais e pela falta de uma organização colectiva dos agentes de jogadores, as restrições que decorrem do carácter obrigatório da licença são susceptíveis de beneficiar de uma isenção com base no artigo 81.°, n.° 3, CE.

(cf. n. os  101-104)

9. O artigo 82.° CE visa o comportamento de um ou vários operadores económicos que explorem de forma abusiva uma situação de poder económico e que impede desta forma a manutenção de uma concorrência efectiva no mercado em causa, dando a esse operador a possibilidade de adoptar, numa medida apreciável, comportamentos independentes relativamente aos seus concorrentes, aos seus clientes e, finalmente, aos consumidores.

A expressão «mais empresas» que aí figura implica que uma posição dominante pode ser detida por duas ou mais entidades económicas, juridicamente independentes uma da outra, na condição de, do ponto de vista económico, se apresentarem ou actuarem em conjunto num mercado específico, como uma entidade colectiva.

A conclusão de que existe uma posição dominante colectiva depende da verificação de três condições cumulativas: em primeiro lugar, cada membro do oligopólio dominante deve poder conhecer o comportamento dos outros membros, a fim de verificar se eles adoptam ou não a mesma linha de acção; em segundo lugar, é necessário que a situação de coordenação tácita possa manter‑se no tempo, quer dizer, deve existir um incitamento a não se afastar da linha de conduta comum no mercado; em terceiro lugar, a reacção previsível dos concorrentes actuais e potenciais, bem como dos consumidores não põe em causa os resultados esperados da linha de acção comum.

(cf. n. os  109-111)

10. A Federação internacional de futebol (FIFA) detém uma posição dominante colectiva no mercado das prestações de serviços dos agentes de jogadores, uma vez que o seu regulamento que rege a sua actividade pode, ao ser aplicado, ter como consequência que empresas que operem no mercado em causa, ou seja, os clubes, se associem no sentido de concertar os respectivos comportamentos num mercado determinado, de modo que se apresentam nesse mercado como uma entidade colectiva em relação aos seus concorrentes, parceiros comerciais e consumidores.

Ora, devido ao carácter obrigatório do regulamento para as associações nacionais membros da FIFA e os clubes que as mesmas agrupam, essas instâncias ficam ligadas duradouramente quanto aos seus comportamentos por regras que aceitam e que os outros actores (jogadores e agentes de jogadores) não podem desafiar sob pena de sanções que podem levar, em especial no caso dos agentes de jogadores, à sua exclusão do mercado. Tal situação caracteriza, assim, uma posição dominante colectiva dos clubes no mercado das prestações de serviços dos agentes de jogadores, uma vez que os clubes, através da regulamentação a que aderem, impõem as condições em que se devem efectuar as prestações de serviços em causa.

A circunstância de a FIFA não ser, ela própria, um operador económico, adquirente das prestações de serviços dos agentes de jogadores no mercado em causa e de a sua intervenção proceder de uma actividade normativa, que ela própria se atribuiu o poder de exercer relativamente à actividade económica dos agentes de jogadores, é indiferente para a aplicação do artigo 82.° CE, uma vez que a referida Federação é a emanação das associações nacionais e dos clubes, adquirentes efectivos dos serviços dos agentes de jogadores e que, por consequência, actua neste mercado através dos seus membros.

(cf. n. os  112-116)

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