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Document 61995CJ0073

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 24 de Outubro de 1996.
Viho Europe BV contra Comissão das Comunidades Europeias.
Concorrência - Grupos de sociedades - Artigo 85., n. 1, do Tratado.
Processo C-73/95 P.

Colectânea de Jurisprudência 1996 I-05457

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1996:405

61995J0073

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 24 de Outubro de 1996. - Viho Europe BV contra Comissão das Comunidades Europeias. - Concorrência - Grupos de sociedades - Artigo 85., n. 1, do Tratado. - Processo C-73/95 P.

Colectânea da Jurisprudência 1996 página I-05457


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Concorrência ° Acordos, decisões e práticas concertadas ° Acordos entre empresas ° Conceito ° Acordos entre a sociedade-mãe e filiais sem autonomia ° Exclusão ° Aplicação eventual do artigo 86. do Tratado

[Tratado CE, artigos 2. e 3. , alíneas c) e g), artigos 85. , n. 1, e 86. ]

2. Recurso ° Fundamentos ° Simples repetição dos fundamentos e argumentos apresentados no Tribunal de Primeira Instância ° Inadmissibilidade ° Rejeição

[Estatuto do Tribunal de Justiça CE, artigo 49. ; Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, artigo 112. , n. 1, alínea c)]

Sumário


1. Quando uma sociedade-mãe e as suas filiais formam uma unidade económica no interior da qual as filiais não têm autonomia real na determinação da sua linha de acção no mercado, mas aplicam as instruções que lhe são impostas pela sociedade-mãe que as controla a 100%, a circunstância de a política implementada por essa empresa e que consiste principalmente em repartir diferentes mercados nacionais entre as suas filiais pode produzir efeitos no exterior da esfera do grupo, susceptíveis de afectar a posição concorrencial de terceiros, não pode tornar o artigo 85. , n. 1, do Tratado aplicável, mesmo interpretado em conjugação com os artigos 2. e 3. , alíneas c) e g), do Tratado. Em contrapartida, esse comportamento unilateral pode ser abrangido pelo artigo 86. do Tratado se as condições de aplicação que este impõe estiverem preenchidas.

2. Resulta do artigo 112. , n. 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que o recurso deve indicar de modo preciso os elementos criticados do acórdão do Tribunal de Primeira Instância cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos que apoiam especificamente esse pedido.

Não satisfaz esta exigência o recurso que se limita a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e os argumentos que foram já apresentados no Tribunal de Primeira Instância, inclusivamente os que foram baseados em factos expressamente rejeitados por esse órgão jurisdicional; com efeito, essa recurso constitui, na realidade, um pedido destinado a obter um simples reexame da petição apresentada no Tribunal de Primeira Instância, o que, nos termos do artigo 49. do Estatuto do Tribunal de Justiça, não é da sua competência.

Partes


No processo C-73/95 P,

Viho Europe BV, sociedade de direito neerlandês, com sede em Maastricht (Países Baixos), representada por Werner Kleinmann, advogado em Stuttgart, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Marc Loesch, 8 rue Zithe,

recorrente,

que tem por objecto um recurso do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Primeira Secção) de 12 de Janeiro de 1995, Viho/Comissão (T-102/92, Colect., p. II-17),

sendo recorrida:

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Bernd Langeheine, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

apoiada por

Parker Pen Ltd, sociedade de direito inglês, estabelecida em Newhaven (Reino Unido),

interveniente,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

composto por: G. F. Mancini, presidente de secção, C. N. Kakouris, e H. Ragnemalm (relator), juízes,

advogado-geral: C. O. Lenz,

secretário: R. Grass,

visto o relatório do juiz-relator,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 25 de Abril de 1996,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 14 de Março de 1995, a Viho Europe BV interpôs, nos termos do artigo 49. do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, recurso do acórdão de 12 de Janeiro de 1995, Viho/Comissão (T-102/92, Colect., p. II-17, a seguir "acórdão recorrido"), pelo qual o Tribunal de Primeira Instância negou provimento ao recurso de anulação da decisão da Comissão de 30 de Setembro de 1992, que rejeitou a denúncia de 22 de Maio de 1991 (a seguir "decisão impugnada").

2 Resulta da matéria de facto considerada provada pelo Tribunal de Primeira Instância no acórdão recorrido que:

"1 A recorrente, a sociedade de direito neerlandês Viho Europe BV (a seguir 'Viho' ), explora o comércio de venda por grosso de artigos de escritório, e sua importação e exportação.

...

4 A Parker Pen Ltd (a seguir 'Parker' ), sociedade de direito inglês, produz uma vasta gama de canetas e de outros artigos similares que vende em toda a Europa por intermédio de filiais ou de distribuidores independentes. A venda e a comercialização dos produtos Parker por intermédio das filiais, bem como a política das filiais em matéria de pessoal, são controladas por uma equipa regional composta por três directores, isto é, um director de zona, um director financeiro e um director de marketing. O director de zona é membro do conselho de administração da sociedade-mãe.

5 Depois de ter tentado sem sucesso estabelecer relações comerciais com a Parker e obter produtos Parker em condições equivalentes às concedidas às filiais e distribuidores independentes da Parker, a Viho apresentou, em 19 de Maio de 1988, uma denúncia nos termos do artigo 3. do Regulamento n. 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos 85. e 86. do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22, a seguir 'Regulamento n. 17' ), na qual acusava a Parker de proibir a exportação dos seus produtos pelos seus distribuidores, de partilhar o mercado comum em mercados nacionais dos Estados-Membros e de manter nos mercados nacionais preços artificialmente elevados dos produtos Parker.

6 Na sequência dessa denúncia, a Comissão deu início a um processo administrativo que se debruçou sobre a análise dos acordos que ligam a Parker e os seus distribuidores independentes.

7 Em 22 de Maio de 1991, a Viho apresentou uma nova denúncia, registada na Comissão em 29 de Maio de 1991, contra a Parker, na qual observava que a política de distribuição levada a cabo pela Parker, consistindo em obrigar as suas filiais a limitar a distribuição dos produtos Parker a territórios fixados, constituía uma infracção ao artigo 85. , n. 1, do Tratado CEE (actualmente Tratado CE, a seguir 'Tratado' ).

8 Após as observações formuladas pela Parker em 16 de Abril e 31 de Maio de 1991, em resposta à comunicação de acusações que lhe foi enviada pela Comissão em 21 de Janeiro de 1991, no âmbito da instrução relativa aos acordos que ligam a Parker e os seus distribuidores independentes, efectuou-se uma audição em Bruxelas em 4 de Junho de 1991 na qual participaram representantes da Viho, da API, da Herlitz e da Parker.

9 Nas observações complementares apresentadas em 21 de Junho de 1991, a pedido da Comissão, a Parker admitiu que, no interior do grupo Parker, os pedidos de fornecimento provenientes de clientes locais são remetidos para as filiais locais da Parker, estando estas últimas em melhores condições para satisfazer esses pedidos. Foi nestas condições que a Viho, sociedade neerlandesa, depois de ter pedido para ser abastecida pela filial alemã da Parker, teria sido remetida por esta última para a filial neerlandesa da Parker, encarregada de assegurar os fornecimentos solicitados.

10 Em 5 de Março de 1992, a Comissão informou a Viho, nos termos do artigo 6. do Regulamento n. 99/63/CEE da Comissão, de 25 de Julho de 1963, relativo às audições referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 19. do Regulamento n. 17 do Conselho (JO 1963, 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62), que considerava não se justificar dar seguimento à denúncia de 22 de Maio de 1991, porque as filiais da Parker são totalmente dependentes da Parker Pen UK e não gozam de qualquer autonomia real. Considerando que o sistema de distribuição implementado pela Parker está dentro dos limites definidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça para excluir a aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, a Comissão declarou não vislumbrar em que medida esse sistema de distribuição ultrapassaria uma repartição normal das tarefas no interior de um grupo de empresas. Referiu igualmente que, para se chegar eventualmente a uma conclusão diferente, haveria que, previamente, proceder a novos inquéritos e levar a cabo novas investigações.

11 Nas suas observações dirigidas à Comissão em 6 de Abril de 1992, a Viho contestou que a política de reenvio feita pelo grupo Parker possa constituir um acto puramente interno, na medida em que priva os terceiros da liberdade de se abastecer onde o desejam no interior do mercado comum e na medida em que lhes impõe o abastecimento exclusivamente na filial do lugar do seu estabelecimento. Se nada se opõe a que um grupo possa livremente organizar a sua distribuição confiando a uma filial a comercialização dos seus produtos num Estado-Membro, no entanto, não pode obrigar os compradores, sob pena de se tornar responsável de um comportamento abusivo, a abastecerem-se exclusivamente numa determinada filial.

12 Em 15 de Julho de 1992, a Comissão, respondendo à denúncia apresentada pela Viho em 19 de Maio de 1988, adoptou a Decisão 92/426/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo 85. do Tratado CEE (IV/32.725 ° Viho/Parker Pen, JO L 233, p. 27), em que, por um lado, declarou que a Parker e a Herlitz cometeram uma infracção ao disposto no artigo 85. , n. 1, do Tratado ao incluir uma proibição de exportação num acordo celebrado entre ambas e, por outro, aplicou uma coima de 700 000 ecus à Parker e uma de 40 000 ecus à Herlitz. Os recursos interpostos pela Herlitz e pela Parker, respectivamente em 16 e 24 de Setembro de 1992, dessa decisão, foram objecto de dois acórdãos proferidos pelo Tribunal de Primeira Instância em 14 de Julho de 1994, Herlitz/Comissão e Parker/Comissão (respectivamente T-66/92 Colect., p. II-531, e T-77/92, Colect., p. II-549), que, entretanto, transitaram em julgado.

A decisão impugnada

13 Em 30 de Setembro de 1992, a Comissão rejeitou a denúncia da Viho de 22 de Maio de 1991. Na sua decisão, a Comissão qualificou o sistema de distribuição integrado instaurado pela Parker para assegurar a venda dos seus produtos na Alemanha, França, Bélgica, Espanha e nos Países Baixos, por intermédio de filiais estabelecidas nesses países, como respeitando as condições fixadas pelo Tribunal de Justiça para a não aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, porque 'as filiais formam com a sociedade-mãe uma unidade económica em que as filiais não podem determinar de maneira autónoma o seu comportamento no mercado' e 'a atribuição de um determinado território de venda a cada uma das filiais Parker não ultrapassa o que é normalmente considerado como indispensável para assegurar uma distribuição correcta das funções no interior de um grupo' . A Comissão considerou também que a Parker tinha o direito de recusar à Viho preços e condições semelhantes aos concedidos aos seus distribuidores independentes, sem que tal constituísse uma violação da proibição dos acordos, decisões e práticas concertadas."

3 Resulta do acórdão recorrido que a recorrente tinha, nomeadamente, pedido a anulação pelo Tribunal de Primeira Instância da decisão impugnada, ao passo que a Comissão pedira que fosse negado provimento ao recurso.

4 Em apoio dos seus pedidos, a recorrente invocou três fundamentos. O primeiro consistia na violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, o segundo na violação do artigo 86. do Tratado e o terceiro na violação do artigo 190. do Tratado.

5 Quanto ao primeiro fundamento relativo à violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado, o Tribunal de Primeira Instância declarou a título preliminar que:

"31 O fundamento relativo à violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado articula-se em duas partes. A recorrente alega, em primeiro lugar, que o sistema de distribuição da Parker, que consiste em obrigar as suas filiais a remeter as encomendas provenientes de clientes situados noutros Estados-Membros à filial estabelecida no país do cliente, tem o mesmo objectivo que as proibições expressas de exportação feitas aos distribuidores exclusivos, isto é, a manutenção dos mercados nacionais e a sua separação para impedir, restringir ou falsear o jogo da concorrência no mercado comum. Sustenta, seguidamente, que este sistema constitui uma discriminação colectiva dos parceiros comerciais pelo facto da aplicação, em violação do artigo 85. , n. 1, alínea d), de condições diferentes a prestações equivalentes."

6 Quanto à primeira parte do primeiro fundamento relativo à proibição às filiais Parker de fornecer produtos Parker aos clientes estabelecidos nos outros Estados-Membros que não o da filial, o Tribunal decidiu:

"47 Há que recordar, liminarmente, que, quanto ao resultado, em relação ao artigo 85. , n. 1, do Tratado, dos acordos celebrados dentro de um grupo de sociedades, o Tribunal de Justiça decidiu que 'quando a filial não goza de uma autonomia real na determinação da sua linha de actuação no mercado, as proibições impostas pelo artigo 85. , n. 1, podem ser consideradas inaplicáveis nas relações entre ela e a sociedade-mãe, com a qual forma uma unidade económica' (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 1972, ICI/Comissão, 48/69, Recueil, p. 619, n. 134). Do mesmo modo, no acórdão Ahmed Saeed Flugreisen e o., já referido, o Tribunal de Justiça decidiu que 'não é o artigo 85. o aplicável quando a concertação em causa for realizada por empresas pertencentes ao mesmo grupo, na qualidade de sociedade-mãe e filial, e constituindo uma unidade económica no interior da qual a filial não beneficia de real autonomia na determinação do seu comportamento no mercado' , acrescentando que 'o comportamento dessa unidade económica no mercado é, no entanto, susceptível de cair no âmbito do artigo 86. ' Resulta também da jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância que o artigo 85. , n. 1, do Tratado só visa as relações entre as entidades económicas capazes de entrar em concorrência umas com as outras excluindo os acordos e práticas concertadas entre empresas pertencentes a um mesmo grupo que formam uma unidade económica (acórdão de 10 de Março de 1992, SIV e o./Comissão, T-68/89, T-77/89 e T-78/89, Colect., p. II-1403, n. 357).

48 Por um lado, está provado no caso em apreço que a Parker detém 100% do capital das suas filiais estabelecidas na Alemanha, em França, na Bélgica e nos Países Baixos. Resulta, por outro, da descrição fornecida pela Parker a respeito do funcionamento das sociedades filiais, não contestada pela recorrente, que as actividades de venda e de marketing das filiais são dirigidas por uma equipa regional designada pela sociedade-mãe e que controla, nomeadamente, os objectivos de venda, as margens brutas, as despesas de venda, o 'cash flow' e os 'stocks' . Esta equipa regional impõe também a gama dos produtos a vender, controla as actividades publicitárias e dá as directrizes no que diz respeito aos preços e às reduções.

49 O Tribunal de Primeira Instância daqui conclui que foi justificadamente que a Comissão, no ponto 2 da sua decisão, qualificou o grupo Parker de 'unidade económica em que as filiais não podem determinar de modo autónomo o seu comportamento no mercado' .

50 Há que recordar em seguida que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o conceito de empresa, 'colocado num contexto de direito da concorrência, deve ser compreendido como designando uma unidade económica do ponto de vista do objecto do acordo em causa mesmo que, do ponto de vista jurídico, essa unidade económica seja constituída por várias pessoas singulares ou colectivas' (acórdão de 12 de Julho de 1984, Hydrotherm, 170/83, Recueil, p. 2999, n. 11). Do mesmo modo, o Tribunal de Primeira Instância decidiu que 'o artigo 85. , n. 1, do Tratado dirige-se a entidades económicas constituídas cada uma por uma organização unitária de elementos pessoais, materiais e incorpóreos que prossegue, de forma duradoura, um objectivo económico determinado, organização esta que pode concorrer para a prática de uma das infracções previstas nesta disposição' (acórdão de 10 de Março de 1992, Shell/Comissão, T-11/89, Colect., p. II-757, n. 311). Assim, para efeitos da aplicação das regras de concorrência, a unidade do comportamento no mercado da sociedade-mãe e das suas filiais prima sobre a separação formal entre essas sociedades, resultante das suas personalidades jurídicas distintas.

51 Daqui resulta que, na falta de concurso de vontades economicamente independentes, as relações no seio de uma unidade económica não podem ser constitutivas de um acordo ou de uma prática concertada entre empresas, restritivos da concorrência na acepção do artigo 85. , n. 1, do Tratado. Quando, como no caso em apreço, a filial, embora tendo uma personalidade jurídica distinta, não determina de modo autónomo o seu comportamento no mercado, mas aplica as instruções que lhe são fixadas, directa ou indirectamente, pela sociedade-mãe que a controla a 100%, as proibições impostas pelo artigo 85. , n. 1, são inaplicáveis nas relações entre a filial e a sociedade-mãe com a qual ela forma uma unidade económica.

52 Na verdade, embora seja um facto que não se pode excluir que a política de distribuição implementada pela Parker, que consiste em proibir às suas filiais abastecer dos produtos Parker os clientes estabelecidos nos Estados-Membros que não o da filial, pode contribuir para manter e compartimentar os diferentes mercados nacionais, e, ao fazê-lo, impedir um dos objectivos fundamentais de realização do mercado comum, também não deixa de ser verdade que decorre da jurisprudência acima citada que tal política, seguida por uma unidade económica tal como o grupo Parker, no seio da qual as filiais não têm qualquer autonomia para determinar o seu comportamento no mercado, não é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado.

53 O Tribunal conclui daqui que foi justificadamente que a Comissão decidiu que 'o comportamento das filiais é, assim, atribuível à sociedade-mãe' e que 'o sistema de distribuição integrada que assegura a venda de produtos Parker em Espanha, França, Alemanha, Bélgica e nos Países Baixos por intermédio das filiais que possui a 100% estabelecidas nesses países, corresponde às condições fixadas pelo Tribunal de Justiça para a não aplicação do artigo 85. '

54 Deste modo, é em vão que a recorrente alega que os acordos em causa violam o artigo 85. , n. 1, pela razão de que ultrapassam uma repartição interna das funções no seio do grupo. Com efeito, é necessário observar que resulta dos seus próprios termos que o artigo 85. , n. 1, não visa comportamentos que são, na realidade, o facto de uma unidade económica. Ora, não compete ao Tribunal de Primeira Instância, sob pretexto que certos comportamentos, tais como os denunciados pela recorrente, podem escapar às regras de concorrência, desviar o artigo 85. da sua função para preencher uma eventual lacuna do controlo previsto pelo Tratado.

55 Conclui-se que a primeira parte do fundamento relativo à violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado não é fundamentada."

7 Quanto à segunda parte do primeiro fundamento relativo ao tratamento discriminatório aplicado à recorrente no que diz respeito aos preços e às condições de venda, o Tribunal de Primeira Instância decidiu:

"61 Há que recordar que o artigo 85. , n. 1, alínea d), do Tratado proíbe os acordos entre empresas, decisões de associações de empresas e práticas concertadas que consistam em aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência. A discriminação visada pela proibição do artigo 85. , n. 1, deve, assim, resultar de um acordo, de uma decisão ou de uma prática concertada entre entidades económicas independentes e autónomas e não ser o resultado de um comportamento unilateral de uma única empresa.

62 O Tribunal salienta, em primeiro lugar, que as relações mantidas pela Parker com os seus distribuidores independentes são irrelevantes para a solução do presente litígio. De qualquer forma, o Tribunal observa que, no caso em apreço, a recorrente não indicou em virtude de que acordo, decisão ou prática concertada entre a Parker e os seus distribuidores independentes teria sido discriminada.

63 Por outro lado, como o Tribunal já referiu (v. n. 51), a Parker e as suas filiais formam uma única entidade económica, cujo comportamento unilateral não releva da proibição do artigo 85. , n. 1, alínea d), do Tratado. Por conseguinte, não existe, no caso em apreço, uma discriminação contra a Viho susceptível de ser sancionada nos termos do artigo 85. , n. 1, alínea d).

64 Conclui-se que a segunda parte do fundamento relativo à violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado deve também ser afastada."

8 Quanto ao segundo fundamento relativo à violação do artigo 86. do Tratado, o Tribunal de Primeira Instância decidiu:

"68 ... nos termos do artigo 19. , primeiro parágrafo, do Protocolo relativo ao Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, aplicável ao Tribunal de Primeira Instância nos termos do artigo 46. , primeiro parágrafo, do referido Estatuto e do artigo 44. , n. 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a petição inicial deve conter uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Deve, por esse facto, explicitar em que consiste o fundamento em que o recurso se baseia, pelo que a sua simples enunciação abstracta não satisfaz as exigências do Estatuto e do Regulamento de Processo (acórdão Rendo e o./Comissão, já referido, n. 130).

69 O Tribunal de Primeira Instância verifica que, no caso em apreço, a recorrente, que se limita a afirmar, sem outra precisão, que os outros principais fornecedores de lápis e de canetas e de outros artigos de escritório praticam a mesma política de distribuição que a Parker, sustenta que é necessário indagar se o artigo 86. do Tratado não deveria ser aplicado devido à posição dominante colectiva que os grandes fabricantes ocupariam no mercado em causa.

70 Ora, a simples referência, na petição, ao artigo 86. do Tratado, na falta de alegações concretas relativas à posição no mercado das empresas em causa, ao seu eventual comportamento uniforme ou aos seus vínculos económicos, não pode ser considerada suficiente tendo em conta o Estatuto e o Regulamento de Processo.

71 Além disso, o Tribunal considera que a Comissão não era obrigada a proceder a instrução quanto a uma eventual posição dominante colectiva dos fabricantes de artigos de escritório, quando a denúncia da recorrente de 22 de Maio de 1991 não continha qualquer elemento susceptível de impor à Comissão a obrigação de proceder a uma instrução a este respeito.

72 Conclui-se que o segundo fundamento relativo à violação do artigo 86. do Tratado deve ser rejeitado."

9 Por último, quanto ao terceiro fundamento relativo à violação do artigo 190. do Tratado, o Tribunal de Primeira Instância decidiu:

"75 Há que recordar, em primeiro lugar, que resulta da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância (acórdãos do Tribunal de Justiça de 30 de Setembro de 1982, Roquette Frères/Conselho, 110/81, Recueil, p. 3159, n. 24, e do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Junho de 1993, Asia Motor France e o./Comissão, T-7/92, Colect., p. II-669, n. 30) que a fundamentação de uma decisão que afecte interesses legítimos deve permitir ao seu destinatário conhecer as justificações da medida tomada, a fim de poder defender os seus direitos, se for caso disso, e verificar se a decisão está ou não devidamente fundada, e permitir ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização.

76 Há que salientar, seguidamente, que a Comissão não é obrigada, na fundamentação das decisões que é levada a tomar para assegurar a aplicação das regras de concorrência, a tomar posição sobre todos os argumentos que os interessados invocam em apoio do seu pedido. Com efeito, basta à Comissão expor os factos e as considerações jurídicas que têm importância essencial na economia da decisão (v. acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Janeiro de 1992, La Cinq/Comissão, T-44/90, Colect., p. II-1, n. 35, e Asia Motor France e o./Comissão, já referido, n. 31).

77 Ora, o Tribunal de Primeira Instância verifica, perante o texto da decisão litigiosa, que esta refere os elementos essenciais de facto e de direito sobre os quais se baseou para não dar seguimento à denúncia da recorrente, permitindo assim à recorrente contestar o seu mérito e ao Tribunal de Primeira Instância exercer a fiscalização da legalidade. Conclui-se que a decisão litigiosa não está viciada por qualquer falta de fundamentação.

78 Resulta do conjunto das considerações precedentes que deve ser negado provimento ao recurso na sua totalidade."

10 No presente recurso, a recorrente pede a anulação do acórdão recorrido, a anulação da decisão impugnada, bem como a condenação da Comissão nas despesas, incluindo as da Parker. A Comissão conclui pedindo que seja negado provimento ao recurso e, a título subsidiário, que seja julgado improcedente o pedido inicial. Por último, a Comissão pede a condenação da recorrente nas despesas.

11 Em apoio do presente recurso, a recorrente invoca três fundamentos. O primeiro consiste na violação dos artigos 2. , 3. , alíneas c) e g), e 85. , n. 1, do Tratado CE, o segundo na violação do artigo 86. do Tratado CE e o terceiro relativo na violação do artigo 190. do Tratado CE.

Quanto ao primeiro fundamento do recurso

12 O fundamento relativo à violação do artigo 85. , n. 1, do Tratado articula-se em duas partes. Em primeiro lugar, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância decidiu erradamente que o sistema de distribuição implementado pela Parker, que consiste em proibir às suas filiais fornecer produtos Parker aos clientes estabelecidos nos Estados-Membros que não o da filial e obrigar essas filiais a remeter as suas encomendas à filial local competente, não é abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 85. , n. 1, do Tratado. Seguidamente, sustenta que o Tribunal de Primeira Instância também decidiu erradamente que o tratamento discriminatório que lhe é aplicado pela Parker e os seus distribuidores independentes também não era contrário ao artigo 85. , n. 1, alínea b).

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento

13 A recorrente sustenta que o facto de os comportamentos em questão se verificarem dentro de um grupo não se opõe à aplicação do artigo 85. , n. 1, uma vez que a repartição das competências entre as sociedades do grupo Parker teria por objectivo manter e compartimentar os mercados nacionais por meio de uma protecção territorial absoluta. Esse comportamento da empresa, que produziria efeitos nefastos na concorrência, não deveria, assim, ser apreciado de modo diferente consoante se produzisse dentro de um grupo ou entre a Parker e distribuidores independentes. A recorrente observa, nomeadamente, que essa protecção territorial impede terceiros, como ela, de abastecer-se livremente na Comunidade junto da filial que propusesse as melhores condições económicas e de poder, assim, repercutir essas vantagens no consumidor.

14 Por conseguinte, a recorrente considera que o artigo 85. , n. 1, interpretado à luz dos artigos 2. e 3. , alíneas c) e g) [anteriormente artigo 3. , alínea f), do Tratado CEE], do Tratado CE deve aplicar-se uma vez que a política de reenvio em causa vai além da simples repartição interna das tarefas dentro do grupo Parker.

15 Em primeiro lugar, há que precisar que está provado que a Parker detém 100% do capital das suas filiais estabelecidas na Alemanha, na Bélgica, na Espanha, na França e nos Países Baixos e que as actividades de venda e de marketing das filiais são dirigidas por uma equipa regional designada pela sociedade-mãe e que controla, nomeadamente, os objectivos de venda, as margens brutas, as despesas de venda, o "cash flow" e os stocks. Esta equipa regional impõe igualmente a gama dos produtos a vender, controla as actividades publicitárias e dá as directivas no respeitante aos preços e às reduções.

16 Assim, a Parker e as suas filiais formam uma unidade económica no interior da qual as filiais não têm autonomia real na determinação da sua linha de acção no mercado, mas aplicam as instruções que lhe são impostas pela sociedade-mãe que as controla (acórdãos ICI/Comissão, já referido, n.os 133 e 134; de 31 de Outubro de 1974, Sterling Drug, 15/74, Colect., p. 477, n. 41; Winthrop, 16/74, Colect., p. 501, n. 32; de 4 de Maio de 1988, Bodson, 30/87, Colect., p. 2479, n. 19, e de 11 de Abril de 1989, Ahmed Saeed Flugreisen e Silver Line Reisebuero, 66/86, Colect., p. 803, n. 35).

17 Nestas condições, a circunstância de a política de reenvio implementada pela Parker e que consiste principalmente em repartir diferentes mercados nacionais entre as suas filiais poder produzir efeitos no exterior da esfera do grupo Parker, susceptíveis de afectar a posição concorrencial de terceiros, não pode ser susceptível de tornar o artigo 85. , n. 1, aplicável, mesmo interpretado em conjugação com os artigos 2. e 3. , alíneas c) e g), do Tratado. Em contrapartida, esse comportamento unilateral pode ser abrangido pelo artigo 86. do Tratado se as condições de aplicação que este impõe estiverem preenchidas.

18 Assim, foi com razão que o Tribunal de Primeira Instância se baseou unicamente na existência de uma unidade económica para excluir a aplicação do artigo 85. , n. 1, ao grupo Parker.

Quanto à segunda parte do primeiro fundamento

19 A recorrente considera também que o Tribunal de Primeira Instância decidiu erradamente que o sistema de distribuição implementado pela Parker não era contrário ao artigo 85. , n. 1, alínea d), na medida em que não constituía um tratamento discriminatório aplicado à recorrente tanto pelo grupo Parker como pelos seus distribuidores independentes no que diz respeito aos preços e às condições de venda.

20 Relativamente ao tratamento discriminatório alegadamente aplicado pelo grupo Parker, já foi decidido acima que esse comportamento, mesmo pressupondo que estivesse provado, não pode ser abrangido pela proibição do artigo 85. , n. 1.

21 Em contrapartida, relativamente ao tratamento discriminatório que seria conjuntamente aplicado pela Parker e os seus distribuidores independentes à recorrente, esta última censura o Tribunal de Primeira Instância de ter decidido que as relações mantidas pela Parker com os seus distribuidores independentes eram irrelevantes para a solução do presente litígio.

22 Há que observar que o acórdão recorrido rejeita, no n. 62, o argumento da recorrente por duas razões. No presente recurso, a recorrente contesta unicamente a primeira razão baseando-se na relevância. Não impugna a segunda razão, segundo a qual a recorrente não indicou em virtude de que acordo, decisão ou prática concertada entre a Parker e os seus distribuidores independentes teria sido discriminada. Por conseguinte, não há que examinar o mérito deste argumento.

23 Resulta de tudo o que se disse que o primeiro fundamento deve se rejeitado.

Quanto ao segundo e terceiro fundamentos do presente recurso

24 A recorrente censura essencialmente o Tribunal de Primeira Instância por ter violado os artigos 86. e 190. do Tratado, mas não especifica, quanto a esses aspectos, as censuras contra o acórdão recorrido, limitando-se a remeter para a sua petição inicial, bem como para os anexos apresentados no Tribunal de Primeira Instância.

25 Há que recordar que, nos termos do artigo 112. , n. 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, o recurso deve especificar os fundamentos e argumentos jurídicos que sustentam os pedidos que a recorrente solicita ao Tribunal de Justiça de acolher. Daqui resulta que um recurso das decisões do Tribunal de Primeira Instância deve indicar de modo preciso os elementos criticados do acórdão cuja anulação é pedida, bem como os argumentos jurídicos que apoiam especificamente esse pedido.

26 Não satisfaz esta exigência o recurso que se limita a repetir ou a reproduzir textualmente os fundamentos e os argumentos que foram já apresentados no Tribunal de Primeira Instância, inclusivamente os que eram baseados em factos expressamente rejeitados por esse órgão jurisdicional; com efeito, esse recurso constitui, na realidade, um pedido destinado a obter um simples reexame da petição apresentada no Tribunal de Primeira Instância, o que, nos termos do artigo 49. do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, não é da sua competência (v., nomeadamente, o despacho de 26 de Setembro de 1994, X/Comissão, C-26/94 P, Colect., p. I-4379, n.os 10 a 13).

27 No caso em apreço, pelos dois fundamentos invocados, a recorrente limita-se a remeter para os fundamentos já apresentados em primeira instância e afastados por esse Tribunal.

28 Nestas condições, o segundo e terceiro fundamentos devem ser rejeitados por inadmissíveis.

29 Não tendo sido acolhido qualquer fundamento, deve ser negado provimento ao recurso na sua globalidade.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

30 Por força do artigo 69. , n. 2, do Regulamento de Processo, aplicável aos recursos das decisões do Tribunal de Primeira Instância nos termos do artigo 118. , a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas da presente instância.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)

decide:

1) É negado provimento ao recurso.

2) A recorrente é condenada nas despesas.

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