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Document 61992CJ0053

Acórdão do Tribunal de 2 de Março de 1994.
Hilti AG contra Comissão das Comunidades Europeias.
Recurso - Concorrência - Abuso de posição dominante - Conceito de mercado em causa.
Processo C-53/92 P.

Colectânea de Jurisprudência 1994 I-00667

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:77

61992J0053

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 2 DE MARCO DE 1994. - HILTI AG CONTRA COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - RECURSO - CONCORRENCIA - ABUSO DE POSICAO DOMINANTE - CONCEITO DE MERCADO EM CAUSA. - PROCESSO C-53/92 P.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-00667


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Recurso - Fundamentos - Apreciação errada dos factos - Inadmissibilidade - Controlo pelo Tribunal de Justiça dos elementos de prova - Exclusão excepto no caso de deformação

(Tratado CEE, artigo 168. -A; Estatuto do Tribunal de Justiça CEE, artigo 51. )

2. Concorrência - Processo administrativo - Decisão da Comissão que declara verificada uma infracção - Contestação - Natureza das provas a apresentar ao juiz comunitário

3. Recurso - Pedido apresentado pela primeira vez no âmbito do recurso - Inadmissibilidade

(Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, artigo 116. )

Sumário


1. Nos termos do artigo 168. -A do Tratado e do artigo 51. , primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, um recurso só pode basear-se em fundamentos relativos à violação, pelo Tribunal de Primeira Instância, das normas de direito, com exclusão de qualquer apreciação dos factos. A apreciação, pelo Tribunal de Primeira Instância, dos elementos de prova que lhe foram apresentados não constitui, excepto em caso de deformação desses elementos, uma questão de direito sujeita, como tal, ao controlo do Tribunal de Justiça.

2. Quando a Comissão tenha concluído no sentido da existência de uma infracção às regras da concorrência do Tratado com base em indícios e quando o seu raciocínio é baseado numa suposição, basta ao recorrente que contesta a infracção provar circunstâncias que forneçam uma visão diferente dos factos provados pela Comissão e permitam, assim, dar uma explicação dos factos diferente da considerada pela Comissão.

Em contrapartida, quando a Comissão fundamentou a sua conclusão através de um raciocínio construído a partir de elementos de facto precisos, compete ao recorrente demonstrar a inexactidão das apreciações da Comissão.

3. No âmbito de um recurso, um pedido apresentado pela primeira vez ao Tribunal de Justiça por uma parte, na resposta ao recurso, deve ser rejeitado por inadmissibilidade nos termos do artigo 116. do Regulamento de Processo.

Partes


No processo C-53/92 P,

Hilti AG, com sede em Schaan, Fuerstentum, Liechtenstein, representada por Oliver Axster, advogado no foro de Duesseldorf, e por John Pheasant, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Marc Loesch, 8, rue Zithe,

recorrente,

que tem por objecto um recurso em que se pede a anulação do acórdão proferido pelo Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias em 12 de Dezembro de 1991, Hilti/Comissão (T-30/89, Colect., p. II-1439),

sendo recorrida:

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Karen Banks, membro do seu Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistida por Nicholas Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Georgios Kremlis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

intervenientes voluntárias:

Bauco (UK) Ltd, com sede em Chessington, Reino Unido, representada por Clifford George Miller, solicitor, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger e Hoss, 15, côte d' Eich,

e

Profix Distribution Ltd, com sede em West Bromwich, Reino Unido, representada por Malcolm Titcomb, solicitor, e por Paul Lasok, barrister, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Falz et associés, 6, rue Heine,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. F. Mancini, presidente de secção, exercendo funções de presidente, J. C. Moitinho de Almeida e D. A. O. Edward, presidentes de secção, R. Joliet, F. A. Schockweiler, G. C. Rodríguez Iglesias, F. Grévisse (relator), M. Zuleeg, J. L. Murray e juízes,

advogado-geral: F. G. Jacobs

secretário: L. Hewlett, administradora

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 29 de Setembro de 1993,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 10 de Novembro de 1993,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 25 de Fevereiro de 1992, a Hilti AG (a seguir "Hilti") interpôs, ao abrigo do artigo 49. do Estatuto (CEE) do Tribunal de Justiça, recurso do acórdão de 12 de Dezembro de 1991, Hilti/Comissão (T-30/89, Colect., p. II-1439, a seguir "acórdão recorrido"), pelo qual o Tribunal de Primeira Instância julgou improcedente o seu recurso em que pede a anulação da Decisão 88/138/CEE da Comissão, de 22 de Dezembro de 1987, relativa a um processo de aplicação do artigo 86. do Tratado CEE (IV/30.787 e 31.488 - Eurofix-Bauco/Hilti, JO 1988, L 65, p. 19, a seguir "decisão em litígio").

2 A Hilti fabrica vários produtos destinados a fixar materiais: pistolas de pregos, carregadores, cartuchos e pregos. Por produtos "de consumo", devem-se entender os pregos e os carregadores. A expressão "sistema de fixação accionado a pólvora" (a seguir "sistemas FAP") designa o conjunto formado pela pistola de pregos, os pregos e os carregadores (n. 10 do acórdão recorrido).

3 O artigo 1. da decisão em litígio da Comissão dispõe nomeadamente que "a aplicação pela Hilti AG contra os produtores independentes de pregos para as pistolas de pregos Hilti de normas de conduta destinadas quer a impedir o seu acesso ao mercado e a penetração no mesmo dos pregos compatíveis com a Hilti, quer a prejudicar directa ou indirectamente a sua actividade, ou ambos, constitui abuso de posição dominante nos termos do artigo 86. do Tratado CEE" (n. 8 do acórdão recorrido). A decisão em litígio aplica à Hilti uma coima de 6 milhões de ecus e ordena-lhe que ponha termo às infracções.

4 Como observa o Tribunal de Primeira Instância (n.os 46 e 64 do acórdão recorrido), para determinar a posição da recorrente no mercado é necessário, previamente, definir o mercado dos produtos em causa.

5 Segundo a Hilti, a Comissão definiu mal esse mercado. Este não é constituído, como afirma a Comissão na decisão em litígio, por três mercados distintos, o das pistolas, o dos carregadores e cartuchos e, por último, o dos pregos, mas, formando o conjunto destes elementos um todo indissociável (n. 48 do acórdão recorrido), por um mercado único "englobando o conjunto dos sistemas de fixação alternativos aos sistemas FAP (incluindo, designadamente, sistemas de furar/aparafusar)" (n. 82. do acórdão recorrido).

6 O Tribunal de Primeira Instância, pelo contrário, concluiu no sentido de que "o mercado dos produtos em causa relativamente ao qual a posição da Hilti no mercado deve ser apreciada é o dos pregos destinados às pistolas de pregos por si fabricadas" (n. 77 do acórdão recorrido, v. igualmente o n. 94).

7 Resulta da definição que ela própria dá do objecto do seu recurso, que a Hilti pretende contestar os fundamentos do Tribunal de Primeira Instância para chegar à definição do mercado que lhe permitiu reconhecer o carácter dominante da posição da Hilti e igualmente contestar certos fundamentos relativos ao cumprimento do ónus da prova pela Comissão.

8 As conclusões do Tribunal de Primeira Instância quanto à delimitação do mercado em causa são justificadas por uma "apreciação jurídica" (n.os 64 a 78 do acórdão) que é essencialmente a seguinte:

- segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 21 de Fevereiro de 1973, Europemballage e Continental Can/Comissão, 6/72, Recueil, p. 215), o mercado dos produtos em causa define-se como o mercado que agrupa os produtos que, em função das suas características, estão aptos para satisfazer necessidades constantes e são pouco intermutáveis com outros produtos (n. 64 do acórdão recorrido); no caso em apreço, há que determinar se o mercado dos produtos em causa é o do conjunto dos sistemas de fixação destinados à indústria da construção ou se os mercados em causa são os dos sistemas FAP e os produtos de consumo adaptados a esses aparelhos, ou seja, os carregadores e os pregos (n. 65 do acórdão recorrido);

- as pistolas de pregos, os carregadores e os pregos constituem três mercados específicos. Sendo os carregadores e os pregos especificamente fabricados e adquiridos pelos utilizadores para uma marca de pistolas, existem mercados distintos de carregadores e de pregos compatíveis com as pistolas de pregos Hilti (n. 66 do acórdão recorrido);

- no que respeita, mais concretamente, aos pregos cuja utilização nos aparelhos Hilti constitui uma elemento essencial do litígio, existem, desde os anos sessenta, produtores independentes de pregos destinados às pistolas de pregos e mesmo produtores especializados unicamente no fabrico de pregos especificamente adaptados aos aparelhos da marca Hilti. Este facto constitui, por si só, um indício sério da existência de um mercado específico dos pregos compatíveis com as pistolas Hilti (n. 67 do acórdão recorrido);

- a argumentação da Hilti, segundo a qual as pistolas, os carregadores e os pregos formam um todo indissociável, traduz-se, na prática, em autorizar os fabricantes de pistolas de pregos a excluir a utilização, nos seus aparelhos, de produtos de consumo diferentes dos da sua própria marca, quando o direito comunitário da concorrência deixa aos produtores independentes a liberdade de fabricar esses produtos, na condição de não infringirem qualquer direito de propriedade industrial ou intelectual (n. 68 do acórdão recorrido);

- os sistemas FAP distinguem-se em vários aspectos importantes dos outros sistemas de fixação. As características próprias do sistema FAP, tais como são descritas na decisão em litígio, levam a que sejam escolhidos, sem hesitações, num certo número de casos. Resulta dos autos que não existe frquentemente alternativa realista aos sistemas FAP, nem para o operário qualificado que executa os trabalhos de fixação, nem para o técnico que determina os métodos de fixação a utilizar numa dada situação (n. 69 do acórdão recorrido);

- a descrição dessas características, tal como é feita pela Comissão na decisão em litígio, é suficientemente clara e convincente para justificar cabalmente as conclusões daí resultantes (n. 70 do acórdão recorrido);

- estas constatações não deixam subsistir qualquer dúvida séria quanto à existência, na prática, de toda uma diversidade de situações, umas privilegiando o sistema FAP, outras privilegiando os outros sistemas de fixação; o facto de diversos processos de fixação diferentes representarem cada um, desde há muito tempo, uma parte importante e estável da procura total em matéria de processos de fixação, demonstra que a substituibilidade entre os diferentes sistemas de fixação é relativamente fraca (n. 71 do acórdão recorrido);

- estas conclusões são corroboradas pelo estudo do professor Yarrow e pelo do Instituto Rosslyn Research. Em especial, estes estudos revelam que um grande número de utilizadores não vêem solução alternativa à utilização dos sistemas FAP nos casos em que os mesmos são utilizados (n. 73 do acórdão recorrido). Contrariamente à sua intenção, estes estudos não permitem demonstrar uma intermutabilidade económica elevada entre os produtos em causa. Em particular, não provam que a elasticidade cruzada dos preços dos produtos seja elevada (n. 75 do acórdão recorrido);

- estas constatações também não são enfraquecidas pelo estudo do professor Albach que só tem em conta o factor preço, ao passo que o estudo do Instituto Rosslyn Research revela que a escolha do consumidor depende, em larga medida, de circunstâncias não quantificáveis (n. 76 do acórdão recorrido);

- o Tribunal de Primeira Instância tira do conjunto das razões que apresentou a conclusão reproduzida no n. 6 do presente acórdão.

9 Em apoio do seu recurso, a Hilti invoca sete fundamentos baseados na violação do artigo 86. do Tratado. Os quatro primeiros fundamentos são igualmente baseados "numa má aplicação dos princípios económicos reconhecidos e... num erro manifesto de raciocínio lógico", o quinto fundamento baseado numa "violação dos princípios fundamentais do direito comunitário", o sexto fundamentado em "erros manifestos de raciocínio lógico", e o sétimo na "violação dos princípios jurídicos fundamentais relativos à aplicação (do artigo 86. )".

10 Antes de examinar os fundamentos da sociedade recorrente, convém recordar que, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um recurso só pode, nos termos do artigo 168. -A do Tratado CEE e do artigo 51. do Estatuto (CEE) do Tribunal de Justiça, basear-se em fundamentos relativos à violação das normas de direito, com exclusão de qualquer apreciação dos factos (v., nomeadamente acórdãos de 1 de Outubro de 1991, Vidrányi/Comissão, C-283/90 P, Colect., p. I-4339, n. 12, e de 8 de Abril de 1992, F./Comissão, C-346/90 P, Colect., p. I-2691, n. 7).

Quanto ao primeiro fundamento

11 O primeiro fundamento da Hilti é que o Tribunal de Primeira Instância concluiu pela existência de um mercado de pregos Hilti baseando-se unicamente no facto, não contestado, de que os pregos e os carregadores Hilti eram fabricados e vendidos especificamente para serem utilizados nos aparelhos Hilti (n.os 66 e 67 do acórdão recorrido), sem examinar, como exige a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 13 de Fevereiro de 1979, Hoffman-La Roche/Comissão, 85/76, Recueil, p. 461, n. 28), se os sistemas FAP eram ou não intermutáveis com outros produtos. Segundo a Hilti, para chegar à conclusão de que existia um mercado dos pregos Hilti, o Tribunal de Primeira Instância deveria aplicar as regras definidas pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 31 de Maio de 1979, Hugin/Comissão (22/78, Recueil, p. 1869), e provar que os compradores de pregos eram diferentes dos compradores de pistolas de pregos, o que os documentos dos autos infirmavam.

12 Segundo a Comissão, o Tribunal de Primeira Instância, depois de ter recordado os critérios aplicáveis à definição do mercado (n. 64 do acórdão recorrido), expôs, nos n.os 66 a 76 do acórdão recorrido, as razões pelas quais considerava que o mercado dos pregos Hilti correspondia a esses critérios. Os n.os 66 e 67 do acórdão recorrido constituem apenas o ponto de partida do seu raciocínio e o Tribunal de Primeira Instância examinou noutros pontos a questão da intermutabilidade dos sistemas FAP com os outros sistemas de fixação. A Comissão e a Bauco, parte interveniente, sustentam, além disso, que o acórdão Hugin/Comissão, já referido, não é pertinente para o presente processo.

13 Como alega a Comissão, o Tribunal de Primeira Instância recordou, no n. 64 do acórdão recorrido, que, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os produtos só pertencem a um mesmo mercado se apresentarem um grau suficiente de intermutabilidade. Nos n.os 66 e 67 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância limita-se a considerar que os aparelhos de fixação, os carregadores e os pregos constituem três mercados específicos. Em seguida, examinou, nos n.os 69 a 76 do acórdão recorrido, se os sistema FAP eram ou não intermutáveis com outros sistemas de fixação e, pelas razões indicadas, especialmente nos n.os 69 e 71 do acórdão recorrido, concluiu no sentido da falta de intermutabilidade dos produtos em causa.

14 Deste modo, a sociedade recorrente não tem fundamento para sustentar que o Tribunal de Primeira Instância não examinou a questão da intermutabilidade dos produtos em causa.

15 A Hilti também não tem fundamento para sustentar que o Tribunal de Primeira Instância não aplicou os critérios definidos pelo Tribunal de Justiça no acórdão Hugin/Comissão, já referido. Com efeito, como expôs o advogado-geral no n. 18 das suas conclusões, o Tribunal de Justiça não pretendeu, nesse acórdão, definir os critérios que permitem determinar se um mercado de produtos de consumo é diferente do dos aparelhos aos quais são destinados. O Tribunal de Justiça simplesmente verificou que, no caso que lhe era submetido, concretamente o das peças sobresselentes das caixas registadoras fabricadas pela Hugin, os compradores das peças sobresselentes, essencialmente empresas independentes de manutenção e de reparação de caixas registadoras, eram diferentes dos compradores de caixas registadoras, embora o mercado das peças sobresselentes constituísse um mercado específico, correspondendo às condições de oferta e de procura que lhe eram próprias.

16 Consequentemente, o primeiro fundamento da sociedade recorrente não deve ser acolhido.

Quanto ao segundo fundamento

17 O segundo fundamento da Hilti é que o simples facto de verificar, no n. 69 do acórdão recorrido, que certos utilizadores não tinham a possibilidade, na prática, de utilizar sistemas de fixação diferentes dos sistemas FAP, sem especificar o número desses utilizadores, não permitia considerar que os sistemas FAP não eram substituíveis por outros sistemas de fixação.

18 A Comissão sustenta que o fundamento é inadmissível, porque respeita à apreciação dos factos pelo Tribunal de Primeira Instância e que, de resto, não é procedente, porque o Tribunal de Primeira Instância, que precisou, no n. 69 do acórdão recorrido, que os utilizadores eram numerosos, não era obrigado a especificar o número exacto desses utilizadores. A Bauco sustenta também que o fundamento carece de base, pelos mesmos motivos que os da Comissão.

19 Em primeiro lugar, convém salientar que, ao considerar que resultava dos documentos dos autos que os utilizadores não tinham a possibilidade de utilizar sistemas de fixação diferentes dos sistemas FAP em numerosos casos, o Tribunal de Primeira Instância fez uma apreciação dos factos que não é susceptível de ser discutida no Tribunal de Justiça. Convém salientar, em seguida, que o Tribunal de Primeira Instância não fundamentou de modo insuficiente a sua decisão ao referir apenas, no n. 69 do acórdão recorrido, que os utilizadores declaravam estar na impossibilidade de utilizar outros sistemas diferentes dos sistemas FAP em numerosos casos, sem precisar o seu número.

20 Consequentemente, o segundo fundamento da Hilti não deve ser acolhido.

Quanto ao terceiro fundamento

21 O terceiro fundamento da Hilti é que só a existência de diferenças técnicas entre os diversos sistemas de fixação, salientada no n. 70 e no n. 71, primeiro período, no acórdão recorrido, não basta para provar a falta de intermutabilidade entre esses sistemas.

22 A Comissão propõe que se examine esse fundamento conjuntamente com o quarto. A Bauco sustenta que os diversos sistemas de fixação correspondem a necessidades diferentes e que como referiu o Tribunal de Primeira Instância não são substituíveis.

23 O Tribunal de Primeira Instância considerou que existia apenas uma intermutabilidade relativamente fraca da procura dos sistemas FAP e dos outros sistemas de fixação, baseando-se, no essencial, nos n.os 69 a 71 do acórdão recorrido, no facto de que as diferenças técnicas existentes entre os sistemas, tais como descritas na decisão em litígio, criavam condições de utilização e, assim, de procura de sistemas, nitidamente diferenciadas, e no facto de que certos sistemas representavam, durante longos períodos, uma parte estável da procura total de sistemas de fixação.

24 Contrariamente ao que sustenta a Hilti, o Tribunal de Primeira Instância não se limitou, portanto, a descrever as diferenças técnicas existentes entre os sistemas para concluir que não eram economicamente substituíveis.

25 O terceiro fundamento da Hilti deve igualmente ser afastado.

Quanto ao quarto fundamento

26 O quarto fundamento da Hilti é que a simples coexistência dos diversos sistemas de fixação durante longos períodos, salientada pelo Tribunal de Primeira Instância no n. 71, segundo período, do acórdão recorrido, não é suficiente para demonstrar que existia apenas uma intermutabilidade relativamente fraca dos diferentes sistemas de fixação.

27 A Comissão alega essencialmente que o Tribunal de Primeira Instância não se baseou unicamente, como pretende a Hilti, nas diferenças que caracterizam os sistemas de fixação e na coexistência desses sistemas durante longos períodos, para concluir pela falta de intermutabilidade destes sistemas, mas que se baseou também na estrutura da procura e da oferta desses produtos, bem como nas condições de concorrência do mercado. A Bauco alega que o Tribunal de Primeira Instância não se baseou unicamente na coexistência dos sistemas para concluir no sentido da falta de intermutabilidade.

28 Como resulta do acima referido, tanto no n. 8 como no n. 23 do presente acórdão, as declarações feitas pelo Tribunal de Primeira Instância no n. 71, segundo período, do acórdão recorrido são apenas um elemento de um conjunto de considerações nas quais se baseou para concluir no sentido da falta de intermutabilidade dos sistemas de fixação.

29 Consequentemente, o quarto fundamento da Hilti deve ser afastado.

Quanto ao quinto fundamento

30 O quinto fundamento da Hilti é essencialmente que o Tribunal de Primeira Instância procedeu a uma repartição irregular do ónus da prova entre as partes, ao exigir à sociedade que provasse que o mercado em causa era o mercado dos sistemas de fixação utilizados na construção.

31 A Hilti baseia-se principalmente no acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de Março de 1984, CRAM e Rheinzink/Comissão (29/83 e 30/83, Recueil, p. 1679), para sustentar que, tendo a Comissão definido o mercado em causa com base em presunções, lhe bastava provar que os factos considerados na decisão em litígio podiam dar origem a uma apreciação diferente para demonstrar que esta era irregular quanto a este aspecto.

32 A Comissão, pelo contrário, sustenta que compete à sociedade recorrente provar, eventualmente pela apresentação de novos elementos, que as apreciações contidas na decisão em litígio eram inexactas.

33 No acórdão CRAM e Rheinzink/Comissão, já referido, o Tribunal de Justiça teve que se pronunciar no âmbito de um recurso de anulação de uma decisão da Comissão relativa a um processo de aplicação do artigo 85. do Tratado CEE. O Tribunal de Justiça salientou que a Comissão tinha concluído no sentido da existência de concertação entre as sociedades recorrentes com base em indícios e que, deste modo, o seu raciocínio estava fundamentado numa suposição.

34 Considerou então, no n. 16 do acórdão referido, que, face a esse modo de raciocínio, bastava às sociedades recorrentes provar circunstâncias que fornecem uma visão diferente dos factos provados pela Comissão e permitissem, assim, dar uma explicação dos factos diferente da considerada na decisão da Comissão.

35 Embora os n.os 60 e 63 da decisão em litígio se refiram a uma elasticidade verosimilmente fraca da procura em relação aos preços dos diversos sistemas de fixação, estas afirmações inserem-se no âmbito de um raciocínio destinado a demonstrar que os sistemas FAP e os outros sistemas de fixação obedeciam a condições de oferta e de procura diferentes e não eram, assim, de modo algum intermutáveis.

36 No âmbito deste raciocínio, a Comissão baseou-se em elementos de facto precisos, expostos nos n.os 60 a 65 da decisão em litígio, tais como as características próprias da utilização dos sistemas FAP, a baixa incidência do custo dos aparelhos e dos produtos consumíveis nessa utilização.

37 Assim, a Comissão não se limitou, como pretende a sociedade recorrente, a determinar o mercado dos produtos com base em suposições.

38 Assim, ao exigir à sociedade recorrente que demonstrasse a razoabilidade da sua posição, o Tribunal de Primeira Instância não exigiu uma prova diferente da que é normalmente exigida aos recorrentes para provarem a razoabilidade dos seus fundamentos.

39 Daqui resulta que o quinto fundamento da sociedade recorrente deve ser afastado.

Quanto ao sexto fundamento

40 O sexto fundamento da Hilti consiste na censura ao Tribunal de Primeira Instância por ter apreciado erradamente, em primeiro lugar, o estudo de mercado realizado pelo Instituto Rosslyn Research, bem como a peritagem do professor Yarrow, no que diz respeito às possibilidades de substituição dos sistemas de fixação, em segundo lugar, o estudo econométrico do professor Albach no que diz respeito à da elasticidade da procura em relação aos preços dos diversos sistemas de fixação e, em terceiro lugar, o estudo do mercado do Instituto Rosslyn Research no que diz respeito ao carácter determinante do preço na escolha do processo de fixação seleccionando.

41 A Comissão sustenta que este fundamento é inadmissível porque pretende por em causa as apreciações de facto feitas pelo Tribunal de Primeira Instância, que o Tribunal de Justiça não tem o poder de controlar no âmbito do recurso. Subsidiariamente, sustenta que o fundamento não é procedente, porque o Tribunal de Primeira Instância não apreciou incorrectamente os elementos de prova em questão.

42 Convém referir que a apreciação, pelo Tribunal de Primeira Instância, dos elementos de prova que lhe foram apresentados não constitui, excepto em caso de deformação desses elementos, uma questão de direito sujeita, como tal, ao controlo do Tribunal de Justiça.

43 Tendo a sociedade recorrente contestado a apreciação feita pelo Tribunal de Primeira Instância de certos elementos de prova que lhe foram apresentados sem provar nem mesmo, na verdade, sustentar que o Tribunal de Primeira Instância tenha deformado esses elementos, o seu sexto fundamento é inadmissível e deve, por esta razão, ser afastado.

Quanto ao sétimo fundamento

44 A Hilti sustenta que o Tribunal de Primeira Instância não teve em consideração todos os elementos de prova que lhe apresentou, os quais demonstravam que os sistemas FAP e os outros sistemas de fixação apresentavam um elevado grau de intermutabilidade económica.

45 A Comissão sustenta que o Tribunal de Primeira Instância examinou todos os elementos de prova que lhe foram apresentados, como resulta do n. 74 do acórdão recorrido, e que a sociedade recorrente não pode contestar perante o Tribunal de Justiça a apreciação feita pelo Tribunal de Primeira Instância quanto ao seu valor probatório.

46 Contrariamente ao que sustenta a Hilti, não resulta dos autos que o Tribunal de Primeira Instância não tenha examinado certos elementos de prova apresentados por essa sociedade. O Tribunal de Primeira Instância, pelo contrário, indicou claramente que negava qualquer valor probatório aos elementos de prova apresentados pela Hilti em apoio das suas pretensões (n. 74 do acórdão recorrido) e, muito particularmente, à análise do professor Yarrow, ao estudo do Instituto Rosslyn Research (n. 75 do acórdão recorrido), bem como ao estudo econométrico do professor Albach (n. 76 do acórdão recorrido).

47 Do que precede resulta que o sétimo fundamento da sociedade recorrente deve ser afastado.

Quanto ao pedido da Bauco de aumento do montante da coima aplicada à Hilti

48 Na sua resposta, a Bauco solicita ao Tribunal de Justiça que considere a hipótese de aumentar o montante da coima aplicada à Hilti pela decisão em litígio, tendo em consideração o comportamento dilatório dessa sociedade.

49 Mesmo pressupondo que esse pedido possa ser considerado como destinado a que a Hilti seja condenada a pagar uma coima de um montante mais elevado, basta salientar que, nos termos do artigo 116. do Regulamento de Processo, os novos pedidos da parte interveniente ao Tribunal de Justiça são inadmissíveis. Ora, o pedido apresentado ao Tribunal de Justiça pela Bauco é novo, uma vez que esta sociedade não apresentou nenhum pedido nesse sentido ao Tribunal de Primeira Instância.

50 Daqui resulta que o pedido da Bauco deve, quanto a este aspecto, ser indeferido.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

51 Por força do artigo 69. , n. 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas da presente instância, incluindo as despesas relativas às intervenções da Bauco e da Profix.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

decide:

1) É negado provimento ao recurso.

2) O pedido da Bauco de aumento do montante da coima aplicada à Hilti pela Decisão 88/138/CEE da Comissão, de 22 de Dezembro de 1987, relativa a um processo de aplicação do artigo 86. do Tratado CEE, é indeferido.

3) A recorrente é condenada nas despesas.

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