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Document 52019IR0145

    Parecer do Comité das Regiões Europeu «Pastorícia»

    JO C 39 de 5.2.2020, p. 65–67 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    5.2.2020   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 39/65


    Parecer do Comité das Regiões Europeu «Pastorícia»

    (2020/C 39/14)

    Relator : Jacques Blanc (FR-PPE), residente do município de La Canourgue

    :

    Jacques Blanc (FR/EPP), Mayor of La Canourgue

    RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

    O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU

    1.

    considera que a manutenção da atividade pastoril é essencial para preservar a agricultura no conjunto dos territórios e conservar um tecido rural vivo, respondendo assim ao objetivo de coesão territorial consagrado no Tratado de Lisboa, mas também para atingir os objetivos ambientais, climáticos e de proteção da biodiversidade na UE;

    2.

    recorda que o futuro da atividade pastoril se encontra ameaçado por diversas dificuldades que não podem ser hierarquizadas e afetam de forma diferente as várias regiões, embora algumas delas possam, por si só, pôr em causa a sua sobrevivência: dificuldades na consideração da sua especificidade na atribuição das ajudas da política agrícola comum (pastagens arbustivas e arborizadas, mobilidade, pastagens comuns, etc.), dificuldades ligadas ao contexto económico, concorrência pelas terras, dificuldades na transmissão dos conhecimentos, condicionalismos associados aos desafios ambientais na organização da pastagem, concorrência com outros utilizadores das pastagens, nomeadamente para atividades de lazer, e a ameaça que representam os grandes carnívoros para os rebanhos e manadas;

    3.

    solicita que, no âmbito da reorientação do apoio da PAC, seja conferida mais atenção à pastorícia e à pecuária extensiva e sustentável, tendo em conta o seu papel benéfico no desenvolvimento equilibrado dos territórios, a fim de alcançar os objetivos ambientais e climáticos da UE, em conformidade com as recomendações do Parecer do Comité — Reforma da PAC;

    4.

    acolhe com agrado a proposta da Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (AGRI) do Parlamento Europeu sobre o regulamento que define regras para o apoio aos planos estratégicos a estabelecer pelos Estados-Membros no âmbito da política agrícola comum, que visa alterar o artigo 4.o do referido regulamento a fim de permitir o reconhecimento das superfícies de pastagem com componente arbustiva e arborizada como superfícies de produção agrícola elegíveis para o regime de pagamento de base; solicita, contudo, que a versão definitiva deste artigo seja revista, a fim de introduzir o conceito de superfície de pastagem que pode ou não incluir (por exemplo, sob as árvores) recursos herbáceos. Com efeito, a fim de clarificar o estatuto das superfícies de pastagem e a sua elegibilidade para apoio, estas superfícies devem ser reconhecidas como superfícies agrícolas distintas dos prados permanentes. A superfície de pastagem deveria ser definida separadamente dos prados permanentes, eliminando qualquer referência à necessária presença de recursos herbáceos na definição de superfícies de pastagem; o conjunto dos prados permanentes e das superfícies de pastagem poderia ser reagrupado sob a designação «pastagens permanentes»;

    5.

    recomenda que as superfícies de pastagem utilizadas possam ser plenamente reconhecidas como superfícies de produção agrícola num quadro regulamentar estável, seguro e que preveja um limite máximo efetivo ao apoio da PAC, como noutros setores;

    6.

    salienta que a pastorícia, que depende de ambientes naturais para alimentar os rebanhos e manadas com recursos espontâneos, precisa de margens de flexibilidade e de segurança para superar os riscos climáticos. Assim, os criadores precisam de superfícies denominadas «zonas-tampão», que podem não ser utilizadas todos os anos ou ser utilizadas como pastagem com intensidades muito variáveis, mas que são necessárias em caso de seca sazonal; trata-se geralmente de charnecas, zonas aluviais e bosques; as alterações climáticas em curso aumentam a necessidade de recorrer a estas superfícies; os mecanismos de reconhecimento das superfícies de pastagem no âmbito do primeiro pilar deveriam reconhecer e assegurar a segurança jurídica da utilização destas superfícies, que não tem lugar todos os anos e não pode ser prevista na data de apresentação dos processos da PAC. Além disso, a pastorícia desenvolve práticas agroecológicas de trocas de serviços ecossistémicos utilizando em complemento superfícies destinadas a outras utilizações, nomeadamente vinhas e pomares, o que favorece a redução dos insumos e das práticas mecanizadas; as políticas europeias deveriam reconhecer, encorajar e procurar soluções juridicamente seguras para permitir o desenvolvimento destas práticas, em que o criador utiliza superfícies declaradas por outro agricultor. A pastorícia desenvolve igualmente práticas associadas à silvicultura, denominadas «silvipastorícia», que proporcionam benefícios mútuos para o silvicultor e para o agricultor; as políticas públicas europeias deveriam reconhecer e incentivar a utilização mista destas superfícies e o recurso a estas práticas que, em determinadas condições, são particularmente favoráveis à proteção das florestas contra incêndios e à adaptação da pecuária às alterações climáticas, além de respeitarem as necessidades de regeneração e de produção silvícolas;

    7.

    apoia a proposta da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar (ENVI) do Parlamento Europeu sobre o regulamento que define regras para o apoio aos planos estratégicos a estabelecer pelos Estados-Membros no âmbito da política agrícola comum, que visa definir limites para a concentração de animais na exploração e limitar as subvenções às explorações agrícolas que ultrapassem esses limites;

    8.

    congratula-se com a proposta da Comissão da Agricultura e Desenvolvimento Rural (AGRI) do Parlamento Europeu que visa alterar o artigo 68.o do regulamento acima referido, para que o FEADER possa continuar a apoiar a aquisição de cães para a proteção do gado contra os grandes predadores protegidos pela Diretiva Habitats;

    9.

    solicita tornar obrigatória, para os Estados-Membros com zonas de montanha, a aplicação de uma política integrada para estas zonas, que utilize de forma específica uma parte significativa dos instrumentos disponibilizados (pagamentos para zonas com condicionantes naturais, apoios do segundo pilar para as zonas desfavorecidas, subprograma específico para as zonas de montanha) e que seja dotada de um orçamento adequado à importância destes territórios;

    10.

    solicita à UE que reconheça os serviços ecossistémicos prestados por criadores e por proprietários florestais nas zonas de montanha e nas zonas mediterrânicas, enquanto detentores de conhecimentos locais na aceção da Plataforma Intergovernamental Científica e Política sobre a Biodiversidade e os Serviços Ecossistémicos (IPBES), e que atribua uma compensação justa por estes serviços ecossistémicos que contribuem para o bem-estar de toda a população;

    11.

    espera que cada Estado-Membro tenha a possibilidade de aplicar determinadas medidas no âmbito do primeiro pilar (pagamentos por ecologização) e do segundo pilar em toda a superfície de pastagem, e não apenas na superfície elegível para apoio. Com efeito, algumas medidas (por exemplo, determinadas medidas «agroambiente e clima», como a prevenção de fogos florestais), devem poder aplicar-se à totalidade da superfície física;

    12.

    recomenda, a fim de apoiar a continuidade da atividade agrícola nas zonas desfavorecidas e com desvantagens naturais, que a indemnização compensatória por desvantagens naturais seja obrigatória para os Estados-Membros nos quais é aplicável;

    13.

    encoraja os Estados-Membros e os órgãos de poder local e regional a financiarem investimentos nas zonas de pastoreio, que muitas vezes não permitem o acesso a equipamento mecanizado. A criação de infraestruturas (alojamento para os pastores, recintos fechados, vedações, instalação de pontos de água, etc.) e a realização de trabalhos de manutenção ou de desmatação são essenciais para a gestão sustentável destes territórios;

    14.

    considera necessário apoiar as atividades nos terrenos destinados à agricultura e à pastorícia a nível local. Nos casos em que o terreno é partilhado por diversos proprietários, a criação de uma organização fundiária adequada constitui um fator indispensável para assegurar uma pastorícia dinâmica;

    15.

    exorta os Estados-Membros e os órgãos de poder local e regional a facilitarem o acesso dos criadores à terra, nomeadamente através de acordos plurianuais específicos que assegurem a utilização exclusivamente para fins de pastoreio para os criadores ou coletivos de utilizadores;

    16.

    insta os Estados-Membros e os órgãos de poder local e regional a criarem sistemas de apoio adequados às práticas de gestão coletiva. Para se dotarem das infraestruturas e dos recursos humanos necessários à utilização das superfícies de pastagem, os criadores foram obrigados a desenvolver, desde cedo, formas originais de organização coletiva centradas em modalidades de utilização que não danificam a propriedade. Estas modalidades de utilização permitem o agrupamento, para as atividades de pastorícia, de propriedades privadas e de terras municipais, dentro do mesmo perímetro e como uma única entidade de gestão, e asseguram a relação com a administração e os diferentes tipos de parceiros ou utilizadores;

    17.

    insta a UE a continuar a promover o desenvolvimento de produtos agrícolas com rótulos de qualidade e a criar valor acrescentado através da proteção dos produtos agroalimentares de qualidade provenientes da pastorícia. Importa, nomeadamente, encorajar os Estados-Membros a utilizar a menção facultativa de qualidade «produto de montanha», que nem sempre é aplicada na maioria dos países, apesar de ter sido adotada em 2014;

    18.

    solicita que a menção «leite, queijo e carne de pastagem» seja reservada aos produtos que garantem que mais de 80% da alimentação dos animais provém das pastagens durante o período de pastagem;

    19.

    observa que os criadores estão a sofrer a concorrência desleal das importações a baixo custo, que ameaçam a sobrevivência da pastorícia na Europa. Esta situação leva a UE a compensar esta concorrência mediante apoios à pastorícia, à semelhança do que é feito noutros setores; exorta a UE a usar toda a sua influência enquanto maior importador e exportador mundial de produtos alimentares para alterar as regras do comércio agrícola internacional (OMC, 1994) no sentido de relações comerciais mais justas e mais solidárias, em conformidade com o Parecer do Comité «A PAC após 2020»;

    20.

    acolhe com agrado o projeto-piloto lançado e apoiado pelo Parlamento Europeu destinado a criar plataformas regionais para a coexistência com os lobos, os ursos, os glutões e os linces, a fim de gerir as situações de conflito; solicita que as consequências da predação e a proteção dos rebanhos e manadas sejam plenamente reconhecidas no âmbito destas plataformas e abordadas em planos de gestão adequados, e que todos os dispositivos jurídicos sejam debatidos, incluindo os que autorizam capturas como medida dissuasiva, e observa que algumas regiões também criaram plataformas de debate por iniciativa própria;

    21.

    solicita que se aplique a cooperação transfronteiriça à pastorícia, de modo a evitar as instabilidades resultantes de medidas contraditórias e não adaptadas ao espaço europeu no seu conjunto;

    22.

    insta a que a estratégia em matéria de biodiversidade se apoie num novo fundo específico para a conservação das espécies. Este fundo deveria cobrir a indemnização pelos danos causados por grandes carnívoros, cujo custo está a aumentar de forma acentuada, bem como a proteção dos rebanhos e manadas, que pode absorver uma parte cada vez mais importante do FEADER, num momento em que o seu orçamento está a ser reduzido de forma significativa. Caso esse novo fundo não venha a ser criado, devem ser utilizados os instrumentos financeiros existentes a nível regional (se for caso disso), nacional e da UE (incluindo o FEADER);

    23.

    insta a Comissão a avaliar a necessidade de rever a Diretiva Habitats com base no próximo relatório sobre o estado da natureza em 2020, tendo em conta os resultados do Plano de Ação para a Natureza, a População e a Economia e a conservação das populações de diversas espécies e habitats. Uma eventual revisão da Diretiva Habitats deve analisar a oportunidade de prever que os anexos possam ser posteriormente alterados através do procedimento de comitologia, a fim de reagir mais rapidamente à evolução de determinadas populações e reduzir ou aumentar o estatuto de proteção por país ou entidade territorial, sempre que tal se justifique pelas tendências positivas ou negativas das populações de espécies protegidas e pela ameaça às atividades pastoris;

    24.

    insta a Comissão a integrar mais eficazmente as ciências agronómicas e zootécnicas nos estudos científicos, a fim de apoiar as decisões políticas. Estas devem basear-se nos melhores conhecimentos disponíveis no domínio das ciências naturais, agronómicas e sociais e numa experimentação suficientemente vasta e longa para orientar as políticas públicas. Mais concretamente, importa descrever de forma detalhada as situações específicas dos estudos de caso analisados relativos à pastorícia e aos grandes carnívoros, a fim de compreender as condições locais e examinar em que medida os exemplos de proteção de rebanhos e manadas e de gestão dos grandes carnívoros são eficazes e suscetíveis de enriquecer, ou não, a reflexão coletiva e as orientações noutros territórios, bem como retirar ensinamentos das dificuldades e dos fracassos para aumentar as possibilidades de adaptação dos textos europeus e das medidas necessárias às realidades no terreno, a fim de gerir mais eficazmente as espécies, nomeadamente o lobo;

    25.

    insta a Comissão a promover a investigação sobre o reconhecimento das propriedades organoléticas dos produtos da pastorícia e dos animais apascentados;

    26.

    solicita à UE que desenvolva uma política ambiciosa de defesa da floresta contra os incêndios, promovendo a presença de rebanhos e manadas nos bosques e charnecas, o que requer o seu reconhecimento prévio como zona de produção, como referido anteriormente;

    27.

    congratula-se com o projeto «Património e UE» da UNESCO, que visa utilizar o património mundial como instrumento para reforçar a sustentabilidade económica e social das zonas rurais na Europa, e incentiva as instituições europeias a apoiarem esta iniciativa. Com efeito, as paisagens pastoris figuram na lista do património mundial, não só como paisagens culturais, mas também como paisagens relíquias ou como objetos de representação nos sítios rupestres, o que aumenta a atratividade turística dos territórios;

    28.

    insta a UE a promover as atividades profissionais ligadas à pastorícia. Os Estados-Membros deveriam valorizar mais o trabalho tanto dos criadores como dos pastores assalariados e aumentar a visibilidade destas atividades profissionais no interior e no exterior do setor agrícola. Uma melhor formação, nomeadamente sobre a condução dos animais à pastagem e a sua gestão sanitária, mas também sobre a proteção dos rebanhos e manadas e a gestão dos cães de proteção, bem como a introdução de programas de mentorado com profissionais experientes, permitiria melhorar a transferência de conhecimentos. No que diz respeito aos pastores, importa desenvolver de forma mais ampla os seguintes incentivos: melhoria das suas condições de vida e de trabalho tanto nas pastagens de altitude como nas explorações agrícolas, em particular na zona mediterrânica, investimento em infraestruturas que lhes ofereçam condições de vida dignas e condições de trabalho adequadas, celebração de convenções coletivas e criação de bolsas de emprego para recrutar trabalhadores sazonais. No seu Parecer sobre «Inovação e modernização da economia rural», o Comité das Regiões recomendou, nomeadamente, a modernização da oferta de formação profissional nas zonas rurais, adequando-a às condições concorrenciais a nível mundial e às necessidades das empresas locais, bem como o aumento dos fundos do FSE afetados à formação profissional nas zonas rurais, que são atualmente muito reduzidos.

    Bruxelas, 9 de outubro de 2019.

    O Presidente

    do Comité das Regiões Europeu

    Karl-Heinz LAMBERTZ


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