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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62004TJ0048

    Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) de 19 de Junho de 2009.
    Qualcomm Wireless Business Solutions Europe BV contra Comissão das Comunidades Europeias.
    Concorrência - Concentrações - Mercado dos sistemas de telemática rodoviária - Decisão que declara a concentração compatível com o mercado comum - Compromissos - Erro de apreciação manifesto - Desvio de poder - Dever de fundamentação.
    Processo T-48/04.

    Colectânea de Jurisprudência 2009 II-02029

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:T:2009:212

    ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

    19 de Junho de 2009 ( *1 )

    «Concorrência — Concentrações — Mercado dos sistemas de telemática rodoviária — Decisão que declara a concentração compatível com o mercado comum — Compromissos — Erro de apreciação manifesto — Desvio de poder — Dever de fundamentação»

    No processo T-48/04,

    Qualcomm Wireless Business Solutions Europe BV, com sede em Waarle (Países Baixos), representada por G. Berrisch, advogado, e D. Hull, solicitor,

    recorrente,

    contra

    Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por K. Mojzesowicz e A. Whelan, e em seguida por K. Mojzesowicz e X. Lewis, na qualidade de agentes,

    recorrida,

    apoiada por:

    República Federal da Alemanha, representada inicialmente por C.-D. Quassowski e S. Flockermann, na qualidade de agentes, e em seguida por M. Lumma, na qualidade de agente, assistido por U. Karpenstein e A. Rosenfeld, advogados,

    e por

    Deutsche Telekom AG, com sede em Bona (Alemanha),

    Daimler AG, anteriormente DaimlerChrysler AG, com sede em Estugarda (Alemanha),

    e

    Daimler Financial Services AG, anteriormente DaimlerChrysler Services AG, com sede em Berlim (Alemanha),

    representadas por J. Schütze e A. von Graevenitz, advogados,

    intervenientes,

    que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 2003/792/CE da Comissão, de 30 de Abril de 2003, que declara uma operação de concentração compatível com o mercado comum e com o Acordo EEE (Processo COMP/M.2903 — DaimlerChrysler/Deutsche Telekom/JV) (JO L 300, p. 62),

    O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

    composto por: J. Azizi (relator), presidente, E. Cremona e S. Frimodt Nielsen, juízes,

    secretário: K. Andová, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 1 de Julho de 2008,

    profere o presente

    Acórdão

    Quadro jurídico

    1

    Nos termos do artigo 2.o, n.o 2, do Regulamento (CEE) n.o 4064/89 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas (versão rectificada no JO 1990, L 257, p. 13), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1310/97 do Conselho, de 30 de Junho de 1997 (JO L 180, p. 1) (a seguir «regulamento relativo às concentrações»), devem ser declaradas compatíveis com o mercado comum as operações de concentração que não criem ou não reforcem uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste.

    2

    O artigo 8.o, n.o 2, desse mesmo regulamento prevê que, se verificar que uma operação de concentração notificada, eventualmente após as alterações introduzidas pelas empresas em causa, preenche o critério do n.o 2 do artigo 2.o, a Comissão tomará a decisão de declarar a concentração compatível com o mercado comum. Esta decisão pode ser acompanhada de condições e obrigações destinadas a garantir que as empresas em causa respeitem os compromissos assumidos perante a Comissão para tornar a concentração compatível com o mercado comum. A decisão que declara a concentração compatível abrange igualmente as necessárias restrições directamente relacionadas com a realização da concentração.

    3

    O artigo 20.o, n.o 1, do referido regulamento dispõe que a Comissão publica no Jornal Oficial das Comunidades Europeias as decisões que toma nos termos dos n.os 2 a 5 do artigo 8.o

    Factos na origem do litígio

    4

    A recorrente, Qualcomm Wireless Business Solutions Europe BV (a seguir «Qualcomm»), fornece na Europa um sistema de gestão de frotas de camiões por satélite denominado «EutelTRACS». Por intermédio de uma rede via satélite, recolhe as informações transmitidas a partir dos camiões, tais como dados relativos à sua localização, informações sobre o motor e mensagens dos condutores, e transmite-as à central de ligação desses camiões, que é cliente da Qualcomm. Por outro lado, transmite as mensagens das centrais aos condutores dos camiões. Para este efeito, fornece o hardware e a infra-estrutura de serviços necessários. Também tem como actividades o fabrico desse hardware e o desenvolvimento do software necessário ao funcionamento do referido sistema.

    5

    Em 2002, o Ministério Federal dos Transportes, das Obras Públicas e da Habitação organizou, por conta do Governo alemão, um concurso público para a criação e a gestão de um sistema de cobrança automática e manual das portagens devidas pelos veículos com um peso igual ou superior a 12 toneladas (a seguir «veículos pesados») que utilizam as auto-estradas alemãs. O anúncio do concurso não exigia a utilização de uma tecnologia específica.

    6

    O contrato público foi adjudicado ao consórcio composto pelas empresas DaimlerChrysler Services AG, Deutsche Telekom AG e Compagnie financière et industrielle des autoroutes SA (Cofiroute) (a seguir, em conjunto, «empresas envolvidas na concentração»).

    7

    A Daimler Financial Services AG, anteriormente DaimlerChrysler Services, é uma filial da Daimler AG, anteriormente DaimlerChrysler AG, que opera no sector dos serviços financeiros e da gestão da mobilidade. As suas actividades abrangem a gestão de frotas compostas por veículos que cobrem todas as marcas de veículos da Daimler. Esta última concebe, constrói e comercializa veículos ligeiros, camiões, autocarros e motores diesel.

    8

    A Deutsche Telekom é uma empresa de telecomunicações que presta, designadamente, serviços de telefonia móvel na Europa.

    9

    A Cofiroute é uma empresa que opera no domínio da cobrança de portagens de auto-estradas.

    10

    O consórcio composto por essas empresas criou em seguida a Toll Collect GmbH para que esta criasse e gerisse o sistema de cobrança das portagens devidas pelos veículos pesados que utilizam as auto-estradas alemãs.

    11

    A Toll Collect desenvolveu assim uma solução telemática para a cobrança automática das portagens. Esta solução consiste em instalar unidades de bordo nos veículos pesados que pretendem recorrer à cobrança automática das portagens. Estas unidades de bordo funcionam com um receptor GPS (Global Positioning System) e um emissor GSM (Global System for Mobile Communications). O receptor GPS determina a localização actual do veículo pesado, que é registada na unidade de bordo. O emissor GSM procede a seguir ao intercâmbio desses dados entre a unidade de bordo e uma central de serviços de utilização. A central processa os dados, isto é, com base na localização determinada e na parte da auto-estrada utilizada, calcula a portagem devida e factura-a ao proprietário ou ao utilizador do veículo pesado. A unidade de bordo é fornecida gratuitamente pela Toll Collect às empresas contra uma caução sob a forma de um crédito de portagens. Porém, o proprietário ou o utilizador do veículo pesado suportam os custos de instalação da unidade de bordo. Além da sua função de cobrança automática das portagens devidas, as unidades de bordo da Toll Collect podem ser utilizadas para outros serviços telemáticos, designadamente os que permitem a gestão de uma frota de veículos à distância. A utilização das unidades de bordo da Toll Collect por outro prestador para o fornecimento de serviços telemáticos só é, porém, possível após a República Federal da Alemanha, na qualidade de entidade adjudicante, a ter autorizado.

    12

    Em 11 de Novembro de 2002, a DaimlerChrysler Services e a Deutsche Telekom notificaram à Comissão, em conformidade com o artigo 4.o do regulamento relativo às concentrações, um projecto de concentração mediante o qual adquiririam, através da compra de participações, o controlo conjunto da Toll Collect.

    13

    Na sequência desta notificação, a Comissão deu início à primeira fase do processo de fiscalização da operação de concentração. Durante esta primeira fase, as empresas envolvidas na concentração transmitiram-lhe uma primeira proposta de compromissos. Esta proposta foi apresentada a outras empresas que operavam no mercado relevante, entre as quais a Qualcomm, para que dessem o seu parecer sobre a mesma.

    14

    Por decisão de 20 de Dezembro de 2002, a Comissão considerou que a operação de concentração suscitava dúvidas sérias quanto à sua compatibilidade com o mercado comum e com o funcionamento do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) e deu início à segunda fase do processo, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, alínea c), do regulamento relativo às concentrações.

    15

    Por carta de 28 de Fevereiro de 2003, Comissão dirigiu às empresas notificantes uma comunicação de objecções, na qual indicava que a primeira proposta de compromissos era insuficiente para resolver os problemas de concorrência resultantes da concentração notificada.

    16

    Em 11 de Março de 2003, as empresas envolvidas na concentração apresentaram uma segunda proposta de compromissos à Comissão.

    17

    Em 19 e 20 de Março de 2003, a Comissão realizou uma audição, na qual participou a Qualcomm. Nesta audição, a Comissão afirmou que a segunda proposta de compromissos era insuficiente para resolver os problemas de concorrência gerados pela operação de concentração notificada.

    18

    Em 3 de Abril de 2003, as empresas envolvidas na concentração apresentaram à Comissão uma terceira e última proposta de compromissos.

    19

    Através da Decisão 2003/792/CE, de 30 de Abril de 2003, a Comissão declarou a operação de concentração compatível com o mercado comum e com o Acordo EEE (Processo COMP/M.2903 — DaimlerChrysler/Deutsche Telekom/JV) (JO L 300, p. 62; a seguir «decisão impugnada»), sob reserva do respeito integral dos compromissos assumidos pelas empresas envolvidas na concentração.

    20

    Na decisão impugnada, a Comissão considerou que, no mercado afectado pela operação de concentração, mais precisamente o mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária — incluindo o hardware, o software e os serviços — destinados às empresas de transportes e de logística, a operação de concentração suscitava problemas de concorrência, na medida em que a infra-estrutura para a cobrança das portagens, que devia ser criada pela Toll Collect, podia ser utilizada para o fornecimento de outros serviços telemáticos pelas empresas envolvidas na concentração. Esta utilização da infra-estrutura da Toll Collect para o fornecimento de serviços de telemática rodoviária permitiria à DaimlerChrysler adquirir, por intermédio da Toll Collect, uma posição dominante no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária, da qual resultariam entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum.

    21

    Em particular, a combinação do fornecimento gratuito das unidades de bordo da Toll Collect e das reduzidas margens de lucro das empresas de transportes levaria à criação de uma plataforma dominante no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária vocacionados para as empresas de transportes e de logística. Uma vez que a DaimlerChrysler era o maior construtor de camiões na Alemanha e um importante fornecedor de sistemas telemáticos e que teria a possibilidade de controlar o acesso aos dados gerados pelas unidades de bordo da Toll Collect que podem ser utilizados pelos serviços de telemática rodoviária, estaria em condições de bloquear o acesso ao mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária e de adquirir desta forma uma posição dominante neste mercado da qual poderiam resultar entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum.

    22

    No entanto, a Comissão considerou que a terceira e última proposta de compromissos apresentada pelas empresas envolvidas na concentração era suficiente para impedir a criação dessa posição dominante da DaimlerChrysler.

    23

    Nesta terceira proposta, as empresas envolvidas na concentração comprometeram-se, em primeiro lugar, a criar um portal telemático central, gerido por uma sociedade independente, a Telematics Gateway GmbH (a seguir «TGG»), que deve permitir aos fornecedores de serviços telemáticos um acesso não discriminatório às funcionalidades e aos dados básicos das unidades de bordo da Toll Collect (a seguir «compromisso relativo ao portal da TGG»), em segundo lugar, a desenvolver uma interface GPS para as unidades de bordo da Toll Collect, que deve permitir aos outros prestadores de serviços telemáticos aceder à funcionalidade GPS das unidades de bordo (a seguir «compromisso relativo à interface GPS»), e, em terceiro lugar, a desenvolver um módulo que pudesse ser integrado no equipamento de terceiros para que estes pudessem criar os seus próprios aparelhos de cobrança de portagens (a seguir «compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens»).

    24

    Em quarto e último lugar, as empresas envolvidas na concentração comprometeram-se a, uma vez obtida a autorização da República Federal da Alemanha para a prestação de serviços de telemática rodoviária através das unidades de bordo da Toll Collect, não prestar esses serviços antes de a Comissão autorizar essa prestação. Esta autorização só será concedida pela Comissão quando as empresas envolvidas na concentração tiverem criado uma interface tecnicamente viável para o acesso à função GPS das unidades de bordo em causa e tiverem permitido a terceiros interessados o desenvolvimento de aparelhos próprios que possam ser utilizados para a cobrança de portagens uma vez ligados aos módulos de cobrança de portagens criados pelas empresas envolvidas na concentração (a seguir «moratória qualitativa»).

    25

    Por telecópia de 23 de Maio de 2003, a Qualcomm recebeu a versão não confidencial da decisão impugnada, adoptada pela Comissão em língua alemã. Em 18 de Novembro de 2003, a versão não confidencial da decisão impugnada foi publicada, em inglês e nas outras línguas oficiais, no Jornal Oficial da União Europeia (JO L 300, p. 62), em aplicação do artigo 20.o, n.o 1, do regulamento relativo às concentrações.

    Tramitação processual

    26

    Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Fevereiro de 2004, a Qualcomm interpôs o presente recurso.

    27

    Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 28 de Maio de 2004, a República Federal da Alemanha pediu para intervir no processo em apoio da Comissão. Este pedido foi deferido por despacho do presidente da Terceira Secção de 16 de Julho de 2004.

    28

    Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Novembro de 2004, a Daimler AG, a Daimler Financial Services AG e a Deutsche Telekom pediram para intervir no processo em apoio da Comissão. Este pedido foi deferido por despacho de 21 de Janeiro de 2005 do presidente da Terceira Secção. Tendo o pedido de intervenção destas empresas sido apresentado após a expiração do prazo referido no artigo 116.o, n.o 6, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, estas empresas só foram autorizadas a apresentar as suas observações, com base no relatório para audiência que lhes foi comunicado, na fase oral.

    29

    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) decidiu dar início à fase oral e convidou as partes, nos termos do artigo 64.o do seu Regulamento de Processo, a responderem a uma série de questões escritas. As partes satisfizeram estes pedidos nos prazos fixados.

    30

    Na audiência de 1 de Julho de 2008, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Primeira Instância.

    Pedidos das partes

    31

    A Qualcomm conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    anular a decisão impugnada;

    condenar a Comissão nas despesas.

    32

    A Comissão, apoiada pela República Federal da Alemanha, pela Deutsche Telekom, pela Daimler e pela Daimler Financial Services, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

    negar provimento ao recurso;

    condenar a Qualcomm nas despesas.

    Questão de direito

    I — Quanto à admissibilidade

    A — Argumentos das partes

    1. Argumentos da Comissão e da República Federal da Alemanha

    a) Quanto à notificação da decisão impugnada

    33

    A título principal, a Comissão, apoiada pela República Federal da Alemanha, alega que o recurso da Qualcomm é intempestivo, dado que a decisão impugnada lhe foi notificada em 23 de Maio de 2003 e só interpôs o seu recurso de anulação em 10 de Fevereiro de 2004, isto é, muito tempo após o termo do prazo de recurso de dois meses e dez dias previsto no Regulamento de Processo.

    34

    A Comissão considera que, muito embora a Qualcomm não seja a destinatária da decisão impugnada, a transmissão da decisão impugnada à Qualcomm realizada em 23 de Maio de 2003 constitui uma notificação na acepção do artigo 230.o, quinto parágrafo, CE. Segundo a Comissão, resulta da jurisprudência que uma decisão pode ser notificada a uma pessoa que não é a sua destinatária, mas que é directa e individualmente por ela afectada (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, BP Chemicals/Comissão, T-11/95, Colect., p. II-3235, n.o 52; e, a contrario, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 2000, Alitalia/Comissão, T-296/97, Colect., p. II-3871, e de 27 de Novembro de 2003, Regione Siciliana/Comissão, T-190/00, Colect., p. II-5015, n.o 31), e que, para que a notificação de uma decisão seja regular, basta que esta tenha sido comunicada a uma pessoa a que diga directa e individualmente respeito de forma a que esta última tenha podido tomar conhecimento da mesma (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Fevereiro de 1973, Europemballage e Continental Can/Comissão, 6/72, Colect., p. 109, n.o 10; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Maio de 1991, Bayer/Comissão, T-12/90, Colect., p. II-219, e de 7 de Julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T-43/92, Colect., p. II-441, n.o 25). Ora, a transmissão da decisão impugnada realizada em 23 de Maio de 2003 tem todas as características de uma notificação e a Qualcomm é, enquanto concorrente das empresas notificantes, directa e individualmente afectada pela decisão impugnada.

    35

    A redacção do artigo 254.o, n.o 3, CE não exclui uma notificação a pessoas diferentes do destinatário. Pelo contrário, essa notificação é conforme com o sistema de vias de recurso instaurado pelo Tratado, segundo o qual as pessoas que não são as destinatárias de uma decisão podem pedir a sua anulação quando a decisão lhes diga directa e individualmente respeito. Por outro lado, de acordo com o artigo 20.o, n.o 2, do regulamento relativo às concentrações, a Comissão não está obrigada a publicar o texto completo das decisões que tomar nos termos do artigo 8.o, n.o 2, do referido regulamento, mas apenas o nome das partes e os elementos essenciais das referidas decisões. A Comissão precisa ainda que, desde 1 de Maio de 2004, a versão não confidencial dessas decisões deixou de ser publicada na íntegra e em todas as línguas comunitárias e que limita a publicação das decisões que toma nos termos do artigo 8.o, n.o 2, do regulamento relativo às concentrações aos elementos essenciais mencionados no artigo 20.o, n.o 2, do mesmo regulamento. O artigo 230.o, quinto parágrafo, CE faz referência à notificação ao recorrente e não ao destinatário. Além disso, a Qualcomm não pode ignorar essa notificação prévia à publicação da decisão impugnada com o intuito de adiar o início do prazo de interposição do recurso de anulação e colocar-se assim, de facto, numa posição mais vantajosa que outros terceiros com legitimidade para interpor recurso ou os destinatários da decisão. A Comissão recorda que os prazos de recurso foram instituídos com o objectivo de assegurar a clareza e a segurança das situações jurídicas e de evitar qualquer discriminação ou tratamento arbitrário na administração da justiça.

    36

    Por fim, interrogada pelo Tribunal de Primeira Instância sobre a pertinência do seu acórdão de 15 de Junho de 2005, Olsen/Comissão (T-17/02, Colect., p. II-2031), a Comissão afirmou que o processo em que foi proferido esse acórdão se distingue do presente processo, por um lado, na medida em que dizia respeito à matéria dos auxílios de Estado, cujas regras precisam expressamente que as decisões são notificadas aos Estados-Membros interessados, e, por outro, na medida em que a comunicação da decisão aí em causa precisava expressamente que não existia qualquer garantia de que a decisão enviada correspondia à decisão notificada ao seu destinatário. Todavia, a Comissão observa que o exame realizado pelo Tribunal da comunicação em causa no processo em que foi proferido o acórdão Olsen/Comissão, já referido, para determinar se esta comunicação constituía uma notificação, demonstra que uma decisão pode ser notificada a uma pessoa que não é a sua destinatária. Além disso, diferentemente da situação em causa nesse outro processo, o artigo 6.o, n.o 5, e o artigo 8.o, n.o 8, do Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho, de 20 de Janeiro de 2004, relativo ao controlo das concentrações de empresas (JO L 24, p. 1), prevêem a notificação obrigatória aos Estados-Membros e às «empresas em causa», sem que estes tenham de ser os destinatários das medidas em questão, e isto apesar de este regulamento prever a publicação das decisões no Jornal Oficial da União Europeia.

    37

    A Comissão salienta que nenhuma disposição do Tratado ou do regulamento relativo às concentrações proíbe que uma decisão seja notificada a terceiros interessados. Por outro lado, essa notificação é efectuada no interesse da segurança jurídica das partes envolvidas numa concentração e no interesse da continuidade da acção comunitária quando do controlo das concentrações.

    b) Quanto à tomada de conhecimento

    38

    A título subsidiário, a Comissão, apoiada pela República Federal da Alemanha, considera que, mesmo supondo que a decisão impugnada não tenha sido notificada à Qualcomm, esta tomou, pelo menos, conhecimento da existência desta decisão e do seu conteúdo preciso em 23 de Maio de 2003, pelo que o prazo para a interposição do recurso de anulação começou a correr a partir desta data e o presente recurso é intempestivo.

    39

    A jurisprudência segundo a qual o critério da data de tomada de conhecimento do acto impugnado, enquanto termo inicial do prazo de recurso, tem um carácter subsidiário relativamente aos critérios da publicação ou da notificação do acto só se aplica à situação em que os recorrentes não tenham podido tomar conhecimento do texto preciso da decisão impugnada antes da sua notificação ou da sua publicação (acórdãos BP Chemicals/Comissão, referido no n.o 34 supra, n.o 47; Alitalia/Comissão, referido no n.o 34 supra, n.o 61; e Regione Siciliana/Comissão, referido no n.o 34 supra, n.o 30). Além disso, foi apenas em combinação com a circunstância de o acto ter sido publicado menos de dois meses após a sua adopção que o Tribunal de Justiça concluiu que a data da publicação fazia correr o prazo de recurso (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Março de 1998, Alemanha/Conselho, C-122/95, Colect., p. I-973, n.o 38). Por último, no acórdão de 9 de Março de 1994, TWD Textilwerke Deggendorf (C-188/92, Colect., p. I-833, n.os 15 a 18), o Tribunal de Justiça considerou que as partes que tenham manifestamente legitimidade para pedir a anulação de um acto não o podem pôr indefinidamente em questão, invocando outras regras processuais. Segundo a Comissão, este raciocínio, que se baseia na finalidade do prazo previsto no artigo 230.o, quinto parágrafo, CE, aplica-se por analogia a uma situação em que um terceiro que tenha manifestamente legitimidade activa tenha sido individualmente informado do conteúdo preciso de uma decisão.

    2. Argumentos da Qualcomm

    40

    A Qualcomm alega que o recurso foi interposto no prazo previsto no artigo 230.o, quinto parágrafo, CE, uma vez que a decisão impugnada foi publicada em 18 de Novembro de 2003 no Jornal Oficial da União Europeia, por imposição do artigo 20.o, n.o 1, do regulamento relativo às concentrações. Segundo a Qualcomm, a publicação das decisões em matéria de operações de concentração de empresas em tempo útil permite garantir a segurança jurídica.

    41

    Por outro lado, a Qualcomm considera que a transmissão da decisão impugnada realizada em 23 de Maio de 2003 não é uma notificação, dado que só os destinatários de uma decisão podem ser dela notificados. Esta interpretação é confirmada pelos acórdãos Europemballage e Continental Can/Comissão e Dunlop Slazenger/Comissão, acima referidos no n.o 34. A Qualcomm alega ainda que o facto de ter tomado conhecimento da decisão impugnada em 23 de Maio de 2003 não a pode privar do prazo de recurso que começa a correr com a publicação desta decisão no Jornal Oficial da União Europeia.

    42

    Por último, a Qualcomm observa que o acórdão Olsen/Comissão, acima referido no n.o 36, confirma a admissibilidade do seu recurso, indicando que só os destinatários de uma decisão podem ser dela notificados.

    B — Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

    1. Observações preliminares

    43

    Nos termos do artigo 230.o, quinto parágrafo, CE, um recurso de anulação deve ser interposto no prazo de dois meses a contar, conforme o caso, da publicação do acto, da sua notificação ao recorrente ou, na falta desta, do dia em que o recorrente tenha tomado conhecimento do acto.

    44

    Em conformidade com o disposto no artigo 102.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, quando um prazo para a interposição de recurso de um acto de uma instituição começar a correr a partir da data de publicação do acto, esse prazo deve ser contado a partir do termo do décimo quarto dia subsequente à data da publicação do acto no Jornal Oficial da União Europeia. Em conformidade com o artigo 102.o, n.o 2, do mesmo regulamento, esse prazo deve ainda ser acrescido de um prazo de dilação fixo, em razão da distância, de dez dias.

    45

    No presente caso, a decisão impugnada foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia em 18 de Novembro de 2003. Todavia, uma versão não confidencial da decisão impugnada foi enviada pela Comissão à Qualcomm em 23 de Maio de 2003. O recurso interposto pela Qualcomm da decisão impugnada deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Fevereiro de 2004, isto é, dentro do prazo fixado se o prazo de recurso for contado a partir da data da publicação da decisão impugnada no Jornal Oficial da União Europeia.

    2. Quanto à publicação ou à notificação da decisão impugnada

    46

    Cumpre recordar que, no acórdão Olsen/Comissão, acima referido no n.o 36, foi declarado que, na própria acepção do artigo 230.o, quinto parágrafo, CE, a notificação é a operação pela qual o autor de um acto de alcance individual o comunica aos seus destinatários e estes têm a possibilidade de dela tomar conhecimento. Esta interpretação resulta igualmente do artigo 254.o, n.o 3, CE, nos termos do qual as decisões são notificadas aos respectivos destinatários produzindo efeitos mediante essa notificação (acórdão Olsen/Comissão, referido no n.o 36 supra, n.o 74).

    47

    No caso em apreço, só a DaimlerChrysler e a Deutsche Telekom são referidas na decisão impugnada como as suas destinatárias (v. artigo 4.o da decisão impugnada). Uma vez que a Qualcomm não é um dos destinatários da decisão impugnada, o critério da notificação do acto não lhe é aplicável. Por conseguinte, a Comissão não pode alegar que o recurso da Qualcomm é inadmissível com o fundamento de que foi interposto após o termo do prazo de recurso, que teria começado a correr na data em que lhe foi «notificada» a decisão impugnada, apesar de a Qualcomm não ser uma das destinatárias formalmente identificadas enquanto tal nesta decisão.

    48

    Esta apreciação não é posta em causa pelos argumentos invocados pela Comissão para defender que, em conformidade com o artigo 230.o, quinto parágrafo, CE, uma decisão pode ser notificada não apenas aos destinatários identificados na decisão recorrida, nos termos do artigo 254.o, n.o 3, CE, mas também a pessoas diferentes desses destinatários. Importa recordar, a este respeito, que o artigo 20.o, n.o 1, do regulamento relativo às concentrações impõe a publicação no Jornal Oficial da União Europeia das decisões tomadas nos termos deste regulamento, pelo que, relativamente às pessoas que não são os destinatários identificados na decisão impugnada, o cálculo do prazo de recurso deve ser feito de acordo com a primeira alternativa referida no artigo 230.o, quinto parágrafo, CE, mais precisamente a contar da publicação.

    49

    A aceitação da interpretação extensiva, proposta pela Comissão, do conceito de destinatário, segundo a qual este conceito abrange tanto o ou os destinatários identificados numa decisão como qualquer outra pessoa designada como tal pela Comissão sem que o tenha sido nessa decisão, conduziria a pôr em causa o efeito útil da obrigação prevista no artigo 20.o, n.o 1, do regulamento relativo às concentrações e, simultaneamente, a conferir à Comissão um poder discricionário para identificar, entre as pessoas que não são nominalmente referidas como destinatárias numa decisão, as que poderão interpor recurso a partir da notificação desta decisão e não a partir da sua publicação. Ora, a concessão de tal poder discricionário pode conduzir à violação do princípio da igualdade de tratamento, na medida em que, entre as pessoas que não são nominalmente referidas como destinatárias numa decisão, algumas pessoas às quais esta decisão foi «notificada» poderão impugná-la a partir da sua «notificação», ao passo que outras pessoas às quais a decisão não tenha sido «notificada» poderão impugná-la a partir da sua publicação. Ora, qualquer pessoa a quem a decisão adoptada pela Comissão diga directa e individualmente respeito tem, em princípio, legitimidade para a impugnar. Além disso, nem sempre é possível à Comissão identificar a priori as pessoas que podem interpor recurso a partir da notificação de uma decisão, dado que, por exemplo, é difícil identificar todos os actuais e potenciais concorrentes que poderão ser afectados pela operação de concentração que é objecto da decisão impugnada.

    50

    Essa discriminação não pode ser justificada pelo objectivo de garantir o mais rapidamente possível a segurança jurídica, limitando a possibilidade de pôr em causa a decisão impugnada através de um recurso contencioso dessa decisão. Com efeito, a realização desse objectivo não pode ser assegurada pela interpretação extensiva proposta pela Comissão, uma vez que esta não poderá identificar a priori e de forma sistemática as pessoas a quem a decisão impugnada diz directa e individualmente respeito. Além disso e em qualquer caso, a realização desse objectivo é perfeitamente assegurada pela obrigação de publicação no Jornal Oficial da União Europeia que incumbe à Comissão por força do artigo 20.o, n.o 1, do regulamento relativo às concentrações.

    51

    Além disso, não é pertinente o argumento da Comissão de que existe um tratamento discriminatório entre, por um lado, as partes que notificam uma concentração, que só podem interpor recurso de anulação da decisão que lhes foi notificada a partir desta notificação, e, por outro, terceiros que participaram no processo administrativo que conduziu a esta decisão e aos quais a mesma foi «notificada», mas cujo prazo de recurso só começaria a correr na data da publicação desta decisão. Com efeito, esse argumento assenta na premissa de que a Comissão pode notificar a sua decisão a pessoas diferentes dos notificantes da concentração. Ora, pelas razões acima expostas nos n.os 49 e 50, esse não pode ser o caso.

    52

    Deve igualmente observar-se que a jurisprudência acima invocada pela Comissão no n.o 34 não se pronuncia expressamente sobre a questão de saber se uma decisão pode ser considerada notificada a uma pessoa que não é a sua destinatária, mesmo que a publicação dessa decisão esteja prevista na regulamentação aplicável.

    53

    Também há que rejeitar o argumento da Comissão relativo à circunstância de o artigo 20.o, n.o 2, do regulamento relativo às concentrações apenas prever uma obrigação de publicação dos nomes das partes e dos elementos essenciais da decisão e de, desde 1 de Maio de 2004, a versão não confidencial das decisões em causa já não ser publicada na íntegra e em todas as línguas comunitárias. Com efeito, importa observar a este respeito que, no caso em apreço, a versão não confidencial da decisão impugnada foi publicada na íntegra no Jornal Oficial da União Europeia e estava disponível em todas as línguas oficiais, incluindo na da Qualcomm, na data da sua publicação, enquanto que a única versão não confidencial da decisão impugnada que foi comunicada à Qualcomm foi a versão em língua alemã, isto é, uma língua distinta da dos estatutos da Qualcomm. A publicação no Jornal Oficial da União Europeia garantiu assim à Qualcomm o acesso a todas as informações essenciais necessárias para poder interpor recurso de anulação da decisão impugnada.

    54

    Por último, no que se refere ao Regulamento n.o 139/2004, importa observar que este regulamento não é pertinente para o presente litígio, uma vez que entrou em vigor em 1 de Maio de 2004, isto é, após a adopção da decisão impugnada.

    3. Quanto à tomada de conhecimento da decisão impugnada

    55

    Decorre da própria redacção do artigo 230.o, quinto parágrafo, CE que o critério da data de tomada de conhecimento do acto impugnado enquanto termo inicial do prazo de recurso tem um carácter subsidiário relativamente aos critérios da data da publicação ou da notificação do acto (v. acórdão Regione Siciliana/Comissão, referido no n.o 34 supra, n.o 30 e jurisprudência aí referida).

    56

    Por conseguinte, a tomada de conhecimento pela Qualcomm, em 23 de Maio de 2003, da decisão impugnada não pode ser considerada o termo inicial do prazo de recurso previsto no artigo 230.o, quinto parágrafo, CE, uma vez que, em 18 de Novembro de 2003, esta decisão foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia, por imposição do artigo 20.o, n.o 1, do regulamento relativo às concentrações. Só esta última data faz correr o prazo de recurso de que a Qualcomm dispõe para pedir a anulação da decisão impugnada nos termos do artigo 230.o CE.

    57

    Esta apreciação não é posta em causa pela jurisprudência invocada pela Comissão no n.o 39 do presente acórdão. Com efeito, contrariamente à interpretação que a Comissão faz desta jurisprudência, não é possível inferir da mesma que, em caso de tomada de conhecimento antes da publicação da decisão impugnada, o prazo de recurso começa a correr na data desta tomada de conhecimento.

    4. Conclusão

    58

    Tendo em conta todas as considerações que precedem, há que concluir que, no presente caso, o prazo de recurso referido no artigo 230.o, quinto parágrafo, CE começou a correr na data da publicação da decisão impugnada no Jornal Oficial da União Europeia, mais precisamente em 18 de Novembro de 2003, sem que a Comissão possa validamente prevalecer-se do facto de ter transmitido, em 23 de Maio de 2003, a versão não confidencial da decisão impugnada a uma pessoa que não era a sua destinatária para pôr em causa o termo inicial desse prazo de recurso e estabelecer assim uma distinção entre as diferentes pessoas que não são as destinatárias desse acto consoante a Comissão decida ou não notificá-las. Por conseguinte, o presente recurso não é intempestivo e há que rejeitar a objecção suscitada pela Comissão quanto à admissibilidade do presente recurso.

    II — Quanto ao mérito

    A — Introdução

    59

    As diferentes objecções formuladas pela recorrente podem ser reconduzidas a três fundamentos. O primeiro fundamento é relativo a um erro de apreciação manifesto, a um apuramento errado dos factos e a um raciocínio contraditório no que diz respeito ao carácter adequado dos compromissos para resolver os problemas de concorrência no mercado relevante. O segundo fundamento é relativo a desvio de poder, enquanto o terceiro é relativo à falta de fundamentação.

    B — Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de apreciação manifesto, a um apuramento errado dos factos e a um raciocínio contraditório no que diz respeito ao carácter adequado dos compromissos para resolver os problemas de concorrência no mercado relevante

    1. Argumentos das partes

    a) Argumentos da Qualcomm

    — Introdução

    60

    A Qualcomm considera que os compromissos referidos na decisão impugnada não permitem afastar as dúvidas quanto ao respeito das regras em matéria de concorrência. Em particular, o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens não colocam em pé de igualdade as empresas que propõem sistemas telemáticos sem recorrer ao portal da TGG, por um lado, e as empresas prestadoras de serviços telemáticos que operam através do portal da TGG e da unidade de bordo da Toll Collect, por outro.

    61

    A Qualcomm sustenta que as empresas de transportes não utilizarão uma plataforma diferente da unidade de bordo da Toll Collect, porque podem obter todos os principais serviços telemáticos se utilizarem esta unidade de bordo. Em sua opinião, o facto de o compromisso relativo ao portal da TGG prever que, para utilizarem a unidade de bordo em causa com vista ao fornecimento de serviços telemáticos, as empresas envolvidas na concentração e qualquer outro prestador de serviços telemáticos devem operar por intermédio do portal da TGG não altera esta conclusão, porque esses prestadores podem oferecer serviços idênticos àqueles que as empresas envolvidas na concentração, nomeadamente a DaimlerChrysler, teriam podido oferecer se tivessem sido autorizadas a prestar directamente serviços telemáticos através da unidade de bordo da Toll Collect. Assim, nem o compromisso relativo à interface GPS nem o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens eliminam a vantagem em termos de preço da unidade de bordo da Toll Collect.

    62

    A Qualcomm alega que é inadmissível e errada a observação da República Federal da Alemanha segundo a qual as unidades de bordo da Toll Collect distribuídas em conformidade com o contrato de gestão celebrado entre a República Federal da Alemanha e a Toll Collect para a gestão de um sistema de cobrança das portagens devidas pelos veículos pesados que utilizam as auto-estradas alemãs não podem ser imediatamente utilizadas no âmbito do fornecimento de serviços telemáticos. Esta observação é inadmissível, na medida em que se baseia na evolução ocorrida após a adopção da decisão impugnada. Além disso, é errada, uma vez que, através das unidades de bordo em causa, a Toll Collect pode fornecer serviços telemáticos de base sem necessidade de uma actualização ou de memória ou software adicionais. Na opinião da Qualcomm, o argumento da República Federal da Alemanha segundo o qual a Toll Collect não pode prestar serviços telemáticos porque ainda não obteve a autorização da República Federal da Alemanha é igualmente inadmissível, porque conduz a pôr em causa a hipótese, devidamente fundamentada e não contestada durante o processo de adopção da decisão impugnada, de a República Federal da Alemanha autorizar a Toll Collect a prestar serviços telemáticos. Além disso, a Qualcomm salienta que a República Federal da Alemanha não alega que, na época em que a decisão impugnada foi adoptada, não era razoável considerar que autorização necessária seria concedida, mas unicamente que ainda não foi concedida. O argumento da República Federal da Alemanha não é verdadeiro, na medida em que esta não afirma que a autorização não será concedida, mas apenas que ainda não a concedeu.

    63

    A Qualcomm alega ainda que a Comissão violou o regulamento relativo às concentrações na medida em que considerou na decisão impugnada que era suficiente que os compromissos «limitassem» ou impedissem «em larga medida» que a unidade de bordo da Toll Collect se transformasse numa plataforma dominante (v. considerandos 71 e 72 da decisão impugnada).

    — Quanto ao compromisso relativo à interface GPS

    64

    A Qualcomm afirma que a Comissão não explica como é que as poupanças susceptíveis de serem realizadas devido ao compromisso relativo à interface GPS, orçadas entre 150 euros e 200 euros por aparelho, permitiriam a terceiros competir com a unidade de bordo da Toll Collect e «limitar ainda mais» a posição dominante que iria ocupar a plataforma constituída pelas unidades de bordo da Toll Collect. A apreciação realizada pela Comissão do compromisso relativo à interface GPS baseia-se em factos errados e está manifestamente errada.

    65

    Em primeiro lugar, a Qualcomm observa que o compromisso relativo à interface GPS não gera uma poupança de 150 euros a 200 euros por aparelho. Indica, a este respeito, que lhe foi possível comprar unidades GPS destinadas a equipar os seus aparelhos telemáticos a preços que oscilam entre 30 euros e 50 euros. Observa ainda que a Comissão supõe que as poupanças que podem ser realizadas graças a esse compromisso são idênticas aos custos de uma unidade GPS. Ora, terceiros que utilizem a interface GPS de uma unidade de bordo da Toll Collect suportarão custos suplementares que não suportariam se desenvolvessem o seu próprio sistema.

    66

    Esses custos suplementares são os seguintes: os custos de desenvolvimento para a adaptação necessária do seu hardware e do seu software com vista à conexão do seu sistema à interface GPS, o reembolso das despesas relacionadas com o desenvolvimento da interface, o pagamento de uma licença nos termos do ponto B.III.3 dos compromissos e as despesas resultantes da necessidade de desenvolver duas linhas de produtos paralelas, concretamente um sistema «conectável» destinado ser utilizado na Alemanha e um sistema operacional com uma funcionalidade GPS destinado a ser utilizado fora deste território.

    67

    A Qualcomm defende que, apesar de actualmente esses custos não poderem ser quantificados com um grau suficiente de precisão porquanto os detalhes técnicos da interface GPS ainda não são conhecidos, é provável que o montante total desses custos elimine a totalidade das poupanças realizadas graças ao compromisso relativo à interface GPS. Em sua opinião, é economicamente mais interessante fabricar e vender um aparelho telemático com uma unidade GPS.

    68

    Em segundo lugar, a Qualcomm afirma que o compromisso relativo à interface GPS não elimina a vantagem concorrencial da unidade de bordo da Toll Collect, mesmo que esse compromisso gere poupanças de 150 euros a 200 euros por aparelho. A Qualcomm recorda que a Comissão declarou, no considerando 62 da decisão impugnada, que o preço dos aparelhos telemáticos que se encontram actualmente no mercado relevante varia entre 1000 euros e 2500 euros. Por conseguinte, mesmo que o compromisso relativo à interface GPS gere poupanças de 150 euros a 200 euros por aparelho e supondo que permite economizar os montantes indicados pela Comissão na sua contestação, terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos estarão sempre numa situação de grande desvantagem em termos de preço relativamente à unidade de bordo da Toll Collect, que é fornecida gratuitamente. Com efeito, além do preço de compra dos aparelhos telemáticos alternativos, as empresas de transportes terão igualmente de pagar despesas de instalação e despesas de imobilização dos seus camiões, o que é reconhecido pela Comissão no considerando 72 da decisão impugnada. Estas últimas despesas ascendem a cerca de 100 euros a 120 euros por camião. Além disso, a Qualcomm alega que a Comissão não fornece nenhuma explicação ou prova sobre a maneira como terceiros prestadores podem competir nestas condições com a unidade de bordo da Toll Collect.

    69

    Em terceiro lugar, a Qualcomm dá a entender que terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos que podem ser conectados às unidades de bordo da Toll Collect através da sua interface GPS devem fornecer um segundo aparelho que ocupa espaço na cabine do camião.

    — Quanto ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens

    70

    Em primeiro lugar, a Qualcomm opõe-se à afirmação, realizada no considerando 71 da decisão impugnada, de que é esperado que os construtores de veículos pesados e os fabricantes dos respectivos equipamentos desenvolvam e fabriquem aparelhos para a cobrança automática de portagens e o fornecimento de serviços telemáticos. A Qualcomm entende que, com excepção de uma referência imprecisa a um estudo de mercado, a Comissão não fornece nenhuma explicação quanto às considerações e às provas que sustentam a sua afirmação.

    71

    Em segundo lugar, a Qualcomm considera que o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens também não elimina o problema de o sistema de terceiros custar sempre dinheiro, enquanto que a unidade de bordo da Toll Collect é gratuita, pelo que nenhuma empresa de transportes comprará o sistema de terceiros. O compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens não permite, portanto, a realização de nenhuma poupança por terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos equipados com o referido módulo, dado que devem pagar, no mínimo, entre 1000 euros e 2500 euros, ao passo que podem obter gratuitamente a unidade de bordo da Toll Collect. Acresce que terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos não têm acesso aos dados gerados pela unidade de bordo da Toll Collect, pelo que devem gerar eles próprios todos os dados destinados aos serviços telemáticos e fabricar o hardware necessário (GPS, ecrã, sistema de mensagens, sistema de comunicação móvel, etc.) e o software.

    72

    Por fim, a Qualcomm afirma que as empresas que criem o seu próprio módulo de cobrança de portagens na sequência do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens incorrerão em despesas adicionais. Referindo-se, designadamente, ao ponto B.IV.2.4 dos compromissos, a Qualcomm explica que não se trata de custos insignificantes, dado que terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos suportarão, entre outros, os seguintes custos:

    custos de desenvolvimento ligados à adaptação necessária do seu sistema, para permitir a integração do módulo de cobrança de portagens;

    custos de desenvolvimento ligados ao desenvolvimento pelos sócios da empresa comum do módulo de cobrança de portagens e/ou a taxa cobrada pela licença a terceiros fornecedores;

    os custos ligados ao fornecimento a título oneroso dos módulos de cobrança das portagens;

    os custos de certificação dos seus sistemas.

    73

    Dado que os detalhes técnicos do módulo de cobrança de portagens ainda não são conhecidos, é actualmente impossível fornecer estimativas precisas desses custos adicionais.

    74

    Em terceiro lugar, a Qualcomm considera que a garantia dada pela República Federal da Alemanha de que terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos equipados com um módulo de cobrança de portagens não seriam discriminados em termos de custos de exploração do sistema de portagens (considerando 70 da decisão impugnada) não elimina a vantagem em matéria de preço da unidade de bordo da Toll Collect, uma vez que, para eliminar esta vantagem, a República Federal da Alemanha deveria ter-se comprometido a cobrir todos os custos em que terceiros incorrem para fornecer gratuitamente aparelhos telemáticos equipados com um módulo de cobrança de portagens.

    75

    Em quarto e último lugar, a Qualcomm opõe-se a que a Comissão invoque pela primeira vez na sua contestação que os construtores de veículos pesados podem integrar o módulo de cobrança de portagens nos aparelhos telemáticos por eles montados em série nos seus veículos, pelo que não comprarão as unidades de bordo da Toll Collect. A este respeito, a Qualcomm começa por afirmar que todos os veículos pesados actualmente em circulação e todos aqueles que serão construídos dentro dos próximos dois a cinco anos estarão equipados com um «terminal telemático» instalado no âmbito de uma segunda montagem, o que significa que os clientes poderão optar entre a unidade de bordo gratuita da Toll Collect e um aparelho telemático pago que oferecerá serviços suplementares. Em seguida, alega que, segundo a sua experiência, os gestores de frotas não são apologistas da montagem em série de terminais telemáticos em veículos pesados, dado que utilizam, em regra, diferentes marcas de veículos. Sustenta igualmente que, se diferentes aparelhos telemáticos forem montados em série em cada marca de veículo, os veículos não podem comunicar entre si. Além disso, a central do gestor da frota não está equipada para comunicar com diferentes tipos de aparelhos telemáticos e a formação dos condutores tornar-se-á mais complicada. Por fim, a Qualcomm observa que a Comissão não explica por que razão a montagem em série de aparelhos telemáticos equipados com um módulo de cobrança de portagens impede necessariamente a unidade de bordo da Toll Collect de se tornar a plataforma dominante. Mesmo que os clientes venham a preferir os terminais telemáticos montados em série, a Comissão não demonstrou que esta tendência impediria a unidade de bordo da Toll Collect de se tornar na plataforma dominante.

    — Quanto ao carácter infundado dos argumentos apresentados pela Comissão no processo contencioso

    76

    A Qualcomm contesta o argumento da Comissão segundo o qual, uma vez que o compromisso relativo ao portal da TGG é suficiente para preservar a concorrência efectiva no mercado relevante no seu todo, o impacto dos outros compromissos nesse mercado tem pouca importância. A este respeito, precisa que, embora na decisão impugnada a Comissão tenha efectivamente identificado o mercado relevante como o mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária, analisou o impacto da Toll Collect neste mercado em duas secções diferentes do mesmo (v. pontos IV.D.2.1 e IV.D.2.2 da decisão impugnada). Ao proceder deste modo, a Comissão deu a entender que existem diferentes problemas de concorrência no mercado relevante, que devem ser resolvidos através de compromissos adequados. Por conseguinte, a Qualcomm concentrou-se no compromisso relativo à interface GPS e no compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, dado que os mesmos se destinam a abrir à concorrência o segmento do mercado relevante que lhe interessa enquanto fornecedora de sistemas telemáticos. A Qualcomm acrescenta que, mesmo supondo que o compromisso relativo ao portal da TGG é suficiente para garantir uma concorrência efectiva no que se refere aos serviços telemáticos, isto não basta para preservar a concorrência no mercado relevante no seu todo, visto que, conforme é afirmado no considerando 30 da decisão impugnada, a maioria dos operadores no mercado relevante são, como ela, fornecedores de «soluções globais».

    77

    Por outro lado, a Qualcomm contesta a justeza do argumento de defesa da Comissão segundo o qual terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos ou de soluções integradas podem competir com a unidade de bordo gratuita da Toll Collect propondo serviços telemáticos adicionais. Nada nos considerandos 71 a 73 da decisão impugnada indica que essa consideração permite à Comissão concluir que o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens são capazes de impedir que a unidade de bordo da Toll Collect se torne a plataforma telemática dominante. Além disso, a Comissão declarou nos considerandos 62 e 63 da decisão impugnada que os serviços telemáticos que podem ser prestados através da actual geração das unidades de bordo da Toll Collect constituem as funções telemáticas de base necessárias e que as empresas de transportes não comprarão serviços telemáticos adicionais se isto implicar despesas adicionais. Portanto, a própria Comissão considerou que a possibilidade de propor serviços telemáticos adicionais não elimina a desvantagem em termos de preço.

    78

    Segundo a Qualcomm, é igualmente inexacto considerar, como faz a Comissão, que existe um preço que os clientes estão dispostos a pagar por um segundo terminal telemático, com vista à obtenção de serviços suplementares de que não necessitam. Além do facto de a Comissão não apresentar qualquer prova em apoio do seu argumento e, sobretudo, nenhuma indicação relativamente ao preço, a Qualcomm refere que a Comissão não tentou explicar a contradição entre, por um lado, a conclusão formulada nos considerandos 54 e 63 da decisão impugnada, segundo a qual as empresas de transportes não estarão dispostas a pagar o que quer que seja por um aparelho telemático se a unidade de bordo da Toll Collect for colocada à disposição gratuitamente, e, por outro, a afirmação, no considerando 72 da decisão impugnada, de que uma poupança de 150 euros a 200 euros por aparelho permitirá a terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos competir com os serviços prestados por intermédio das unidades de bordo da Toll Collect. Com efeito, ainda que as suposições da Comissão acerca das poupanças de custos estivessem correctas, existiria sempre uma diferença de preço de 800 euros a 2300 euros entre a unidade de bordo da Toll Collect e um aparelho telemático que utilizasse a interface GPS.

    79

    Por último, a Qualcomm alega que o estudo de mercado contido no relatório da Frost & Sullivan de 2002, intitulado European Commercial Vehicle Telematics Markets (a seguir «relatório Frost & Sullivan), no qual a Comissão se baseia, indica que, actualmente, poucos clientes estão interessados em serviços que vão além dos fornecidos através da unidade de bordo da Toll Collect e que é provável que esta situação não se altere num futuro próximo. Com efeito, esse estudo de mercado distingue os sistemas telemáticos «de base», os sistemas telemáticos «intermédios» e os sistemas telemáticos «avançados». Segundo esse estudo, a unidade de bordo em causa deve ser qualificada de sistema telemático «intermédio», sobretudo devido às suas capacidades de transmissão de mensagens. Esse mesmo estudo indica ainda que, em 2001, as quotas de mercado eram as seguintes: 90% para os sistemas telemáticos de base, 9% para os sistemas telemáticos intermédios e 1% para os sistemas telemáticos avançados. O referido estudo previa ainda que, em 2009, as quotas de mercado seriam as seguintes: 78% para os sistemas telemáticos de base, 12% para os sistemas telemáticos intermédios e 10% para os sistemas telemáticos avançados. A Qualcomm salienta que esta previsão se baseia no pressuposto de uma concorrência leal e sem distorções de preços entre os diferentes tipos de sistemas e não numa situação em que, como no presente caso, as empresas de transportes podem obter gratuitamente as unidades de bordo da Toll Collect, isto é, um sistema telemático de base, ou mesmo intermédio, ao passo que têm de pagar se quiserem obter um sistema telemático avançado. Em todo o caso, as provas apresentadas pela Comissão demonstram que o mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária avançados era muito pequeno. A Qualcomm contesta ainda a interpretação feita pela Comissão do referido estudo de mercado. Alega que, mesmo que o referido estudo fosse interpretado no sentido preconizado pela Comissão, não foi demonstrado que a unidade de bordo da Toll Collect não viria a ser plataforma dominante, dado que os sistemas telemáticos de base representariam 78% do mercado em termos de volume e 45% do mercado em termos de valor. A Qualcomm observa ainda que a unidade de bordo da Toll Collect é um sistema telemático intermédio e que, em 2009, as quotas de mercado somadas dos sistemas telemáticos de base e dos sistemas telemáticos intermédios ascenderiam, segundo as previsões do estudo contido no relatório Frost & Sullivan, a 90% em termos de volume e a 68% em termos de valor. Além do mais, estes números mais não são do que previsões para 2009. Segundo o relatório Frost & Sullivan, em 2004, que constitui o ano relevante para a decisão impugnada, a quota de mercado dos sistemas telemáticos de base seria de 94% em termos de volume e de 82% em termos de valor.

    b) Argumentos da Comissão e da República Federal da Alemanha

    80

    A título principal, a Comissão, apoiada pela República Federal da Alemanha, alega que o primeiro fundamento invocado pela Qualcomm resulta de uma incompreensão profunda da decisão impugnada, dado que esta não identifica um mercado dos equipamentos telemáticos e um mercado dos serviços telemáticos, mas unicamente um mercado dos sistemas de telemática rodoviária, que abrange o hardware, o software e os serviços.

    81

    Por outro lado, a Comissão defende que os argumentos da Qualcomm são intrinsecamente insuficientes para pôr em causa a sua análise global dos efeitos que os compromissos no seu conjunto terão no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária. Com efeito, mesmo supondo que o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens não são suficientes para resolver o problema de concorrência identificado na decisão impugnada, a Qualcomm não demonstrou que a concorrência entre equipamentos de telemática rodoviária seria totalmente eliminada e nada disse a respeito do facto de o compromisso relativo ao portal telemático, combinado com a moratória qualitativa, impedir a DaimlerChrysler de dominar no seu todo o mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária, garantindo um acesso não discriminatório a essa plataforma.

    82

    Neste contexto, a Comissão confirma que lhe interessa, em conformidade com o regulamento relativo às concentrações, impedir a criação de uma posição dominante e não limitá-la. Segundo a Comissão, embora, no caso em apreço, o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens limitem o carácter dominante da plataforma Toll Collect, os compromissos, considerados no seu todo, impedem a criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, por intermédio da plataforma Toll Collect, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária.

    83

    A título subsidiário, a Comissão, apoiada pela República Federal da Alemanha, contesta as alegações da Qualcomm atinentes ao compromisso relativo à interface GPS e ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens.

    84

    No que toca ao compromisso relativo à interface GPS, a Comissão considera que podia deduzir do acolhimento favorável dado a essa interface, durante o procedimento administrativo, pela Qualcomm e por outros concorrentes das empresas envolvidas na concentração, que a interface permitiria a essas empresas realizar importantes poupanças em termos de custos. Por outro lado, as informações recolhidas durante o procedimento administrativo atestam que a poupança susceptível de ser realizada por essas empresas graças a esse compromisso, que não pode ser unicamente calculada com base no preço de compra de um módulo GPS, antes incluindo outros custos, estava compreendida entre 150 euros e 200 euros por aparelho, segundo uma estimativa prudente. Em último lugar, a Comissão alega que a vantagem proporcionada pelo compromisso relativo à interface GPS permitirá a terceiros fornecedores de sistemas telemáticos, não obstante a instalação de um aparelho distinto, competir melhor com os serviços telemáticos prestados através das unidades de bordo da Toll Collect, dado que poderão prestar serviços mais avançados e diversificados. A existência de um mercado futuro para uma oferta de serviços mais avançados e diversificados é confirmada pelo relatório Frost & Sullivan, independentemente da classificação das unidades de bordo da Toll Collect como sistemas telemáticos intermédios ou sistemas telemáticos avançados.

    85

    No que se refere ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, a Comissão, apoiada pela República Federal da Alemanha, reafirma que esse compromisso é capaz de impedir que a unidade de bordo da Toll Collect, que é fornecida gratuitamente, se torne a plataforma dominante. Segundo a Comissão, o relatório Frost & Sullivan confirma que são principalmente os construtores de veículos pesados e os fabricantes dos respectivos equipamentos que desenvolverão e fabricarão tais aparelhos telemáticos susceptíveis de ser utilizados para a cobrança de portagens. Os aparelhos telemáticos equipados com um módulo de cobrança de portagens conferirão aos construtores de veículos pesados e aos fabricantes dos respectivos equipamentos a vantagem de poderem oferecer um leque de funções e de serviços claramente mais alargado do que os sistemas instalados quando de uma segunda montagem pela Toll Collect. Além disso, conferirão aos construtores de veículos pesados e aos fabricantes dos respectivos equipamentos a vantagem de integrarem o aparelho telemático no sistema electrónico modular dos veículos.

    2. Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

    a) Introdução

    86

    Para apreciar as diferentes objecções formuladas pela Qualcomm no quadro do seu primeiro fundamento, há que começar por recordar, por um lado, o alcance da fiscalização da Comissão quando tem de tomar decisões sobre operações de concentração, em particular quando tem de tomar decisões na sequência de compromissos, e, por outro, a apreciação realizada pela Comissão, na decisão impugnada, da operação de concentração e dos compromissos. A seguir, serão analisadas as objecções relativas ao critério de apreciação dos compromissos. Por último, serão apreciadas as objecções relativas ao carácter pretensamente inadequado dos compromissos relativos ao módulo de cobrança de portagens e à interface GPS.

    b) Considerações de princípio

    87

    Nos termos do artigo 8.o, n.o 2, do regulamento relativo às concentrações, a Comissão tomará uma decisão declarando a compatibilidade da operação de concentração com o mercado comum se verificar que uma operação de concentração notificada, eventualmente após as alterações introduzidas pelas empresas em causa, preenche o critério do n.o 2 do artigo 2.o do referido regulamento, isto é, se esta operação não criar ou não reforçar uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste.

    88

    Essa fiscalização das operações de concentração exige, portanto, uma análise prospectiva, que consiste em examinar de que modo uma operação dessa natureza poderá alterar os factores que determinam a situação da concorrência num dado mercado, para verificar se daí resultará um entrave significativo a uma concorrência efectiva. Esta análise prospectiva exige que se imaginem os vários encadeamentos de causa e efeito possíveis, a fim de ter em conta aquele cuja probabilidade é maior (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Fevereiro de 2005, Comissão/Tetra Laval, C-12/03 P, Colect., p. I-987, n.o 43).

    89

    Assim, foi decidido que, no quadro do artigo 8.o, n.o 2, do regulamento relativo às concentrações, a Comissão apenas está habilitada a declarar compatível com o mercado comum uma operação de concentração que envolva compromissos se estes compromissos lhe permitirem concluir que a operação de concentração não criará ou reforçará uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Março de 1999, Gencor/Comissão, T-102/96, Colect., p. II-753, n.o 318, e de 23 de Fevereiro de 2006, Cementbouw Handel & Industrie/Comissão, T-282/02, Colect., p. II-319, n.o 294; v., igualmente, neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Setembro de 2005, EDP/Comissão, T-87/05, Colect., p. II-3745, n.o 63). Por conseguinte, incumbe à Comissão demonstrar, com um grau suficiente de probabilidade, na sua decisão que declara uma operação de concentração compatível com o mercado comum que esta operação, conforme alterada pelos compromissos propostos pelas partes envolvidas na operação, não irá criar ou reforçar uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste. Este ónus da prova que incumbe à Comissão não prejudica, porém, o seu poder de apreciação no quadro de apreciações económicas complexas (v., neste sentido, acórdão EDP/Comissão, já referido, n.o 63 e jurisprudência aí referida).

    90

    Assim, incumbe ao terceiro interessado que tenha interposto recurso de anulação de uma decisão que declara uma operação de concentração que envolve compromissos compatível com o mercado comum demonstrar que a Comissão apreciou erradamente esses compromissos, de modo a pôr em causa a compatibilidade da operação de concentração com o mercado comum.

    91

    Por outro lado, deve observar-se que, a priori, o juiz comunitário fiscaliza na íntegra a aplicação feita pela Comissão das regras em matéria de concentrações. Todavia, foi decidido que as regras materiais do regulamento relativo às concentrações, em especial o seu artigo 2.o, conferem à Comissão um certo poder discricionário, designadamente no que respeita às apreciações de ordem económica. Consequentemente, o controlo pelo juiz comunitário do exercício desse poder, que é essencial na definição das regras em matéria de concentrações, deve ser efectuado tendo em conta a margem de apreciação subjacente às normas de carácter económico que fazem parte do regime das concentrações (acórdãos do Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1998, França e o./Comissão, dito «Kali & Salz», C-68/94 e C-30/95, Colect., p. I-1375, n.os 223 e 224, e Comissão/Tetra Laval, referido no n.o 88 supra, n.o 38; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Dezembro de 2005, General Electric/Comissão, T-210/01, Colect., p. II-5575, n.o 60).

    92

    Embora o juiz comunitário reconheça à Comissão uma margem de apreciação, designadamente, em matéria económica, tal não implica que deva abster-se de fiscalizar a interpretação que a Comissão faz de dados de natureza económica. Com efeito, o juiz comunitário deve, nomeadamente, não só verificar a exactidão material, a fiabilidade e a coerência dos elementos de prova invocados mas também fiscalizar se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são susceptíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram (acórdão Comissão/Tetra Laval, referido no n.o 88 supra, n.o 39).

    93

    É à luz destes princípios que regem os requisitos e o ónus da prova em matéria de operações de concentração, bem como o grau de controlo que deve ser exercido pelo juiz comunitário neste domínio, que há que apreciar os argumentos apresentados pelas partes no presente processo.

    c) Análise efectuada pela Comissão da operação de concentração e dos compromissos

    94

    Nos considerandos 19 e seguintes da decisão impugnada, é precisado que a Toll Collect foi criada pelas empresas envolvidas na concentração, na sequência da adjudicação de um contrato público, para cobrar, por conta da República Federal da Alemanha, as portagens devidas pelos veículos pesados que utilizam as auto-estradas alemãs. Nesta qualidade, a Toll Collect não tem como concorrentes quaisquer outros prestadores de serviços privados.

    95

    Todavia, a unidade de bordo da Toll Collect destinada à cobrança de portagens tem a capacidade de registar e disponibilizar dados para serviços telemáticos. Esta utilização das unidades de bordo não era objecto do concurso para a adjudicação do contrato relativo ao sistema de cobrança das portagens devidas pelos veículos pesados que utilizam as auto-estradas alemãs, mas o contrato de gestão celebrado com a Toll Collect na sequência desse concurso prevê que a Toll Collect pode prestar outros serviços telemáticos após ter sido autorizada a fazê-lo pela República Federal da Alemanha. As empresas envolvidas na concentração indicaram pretender fazer uso desta possibilidade, para prestarem serviços telemáticos através da unidade de bordo da Toll Collect. Por esta razão, a Comissão considerou que, uma vez que a prestação de serviços telemáticos por via da unidade de bordo da Toll Collect contribuirá para o objectivo de interesse geral de reduzir situações de estrangulamento no tráfego rodoviário, a República Federal da Alemanha não se oporia à prestação desses serviços através da unidade de bordo da Toll Collect e, por conseguinte, que a operação de concentração terá repercussões no domínio do desenvolvimento, do fabrico e da comercialização dos sistemas de telemática rodoviária (considerandos 20 a 22 e 47 a 49 da decisão impugnada).

    96

    Esses sistemas de telemática rodoviária, que foram identificados pela Comissão como o mercado de produtos relevante, abrangem o hardware, o software e os serviços destinados às empresas de transportes e de logística. Do ponto de vista da parte dos clientes composta pelas empresas de transportes, esse mercado engloba os «fornecedores de soluções globais», isto é, os fornecedores de hardware, de software e de serviços telemáticos, os «fornecedores de hardware», ou seja, os fornecedores que só produzem terminais, incluindo software, e os «fornecedores de serviços», isto é, os fornecedores que só prestam serviços de telemática rodoviária (considerandos 23 a 32 da decisão impugnada).

    97

    Após ter definido o mercado geográfico relevante como o território da Alemanha, a Comissão procedeu à apreciação da concentração à luz do direito da concorrência, abstraindo dos compromissos das empresas envolvidas na concentração (considerandos 33 a 36 da decisão impugnada).

    98

    A Comissão começou por observar que a operação de concentração uniria, por um lado, o construtor de veículos pesados que lidera o mercado alemão, a DaimlerChrysler, que, de acordo com as suas próprias declarações, é além disso uma das maiores empresas prestadoras de serviços nos domínios da mobilidade e da telemática, e, por outro, a Deutsche Telekom, uma das mais importantes empresas de comunicações móveis na Alemanha. Por esta razão, a Comissão considerou que estas duas empresas se encontram numa posição privilegiada para prestar serviços de telemática rodoviária (considerandos 39 e 40 da decisão impugnada).

    99

    Em seguida, a Comissão recordou, por um lado, que a DaimlerChrysler tinha confirmado a sua intenção de prestar serviços de telemática rodoviária através da unidade de bordo da Toll Collect e, por outro, que podia assumir-se que a República Federal da Alemanha daria a autorização exigida pelo contrato de gestão para a prestação de serviços de telemática rodoviária (considerandos 43 a 50 da decisão impugnada).

    100

    Como a unidade de bordo da Toll Collect será fornecida gratuitamente e tem interesse prático para as empresas de transportes, a Comissão pensa que esta unidade de bordo será instalada na maioria dos veículos pesados que utilizam regularmente as auto-estradas alemãs. O facto de estas unidades de bordo que servem para prestar serviços telemáticos serem entregues gratuitamente aos devedores da portagem fará com que a grande maioria dos veículos pesados equipados com a unidade de bordo da Toll Collect a venham igualmente a utilizar para usufruir de serviços de telemática rodoviária. Em contrapartida, a Comissão considera que não é economicamente viável para os transportadores a instalação, às suas próprias custas, de uma segunda unidade de bordo, por forma a acederem a serviços de telemática rodoviária de operadores concorrentes. Segundo a Comissão, isto explica-se pelas reduzidas margens de lucro das empresas de transportes que operam na Alemanha e nos outros países europeus (considerandos 51 a 54 da decisão impugnada).

    101

    Por conseguinte, a Comissão defende que as unidades de bordo da Toll Collect irão cobrir praticamente todos os veículos pesados na Alemanha, pelo que serão a plataforma dominante no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária (considerando 56 da decisão impugnada).

    102

    No entendimento da Comissão, a criação dessa plataforma dominante vedará o acesso ao mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária para empresas de transportes e de logística. Em particular, os prestadores de serviços de telemática rodoviária ficarão dependentes da utilização da unidade de bordo da Toll Collect, devido à criação de uma plataforma dominante de serviços de telemática rodoviária. As unidades de bordo da Toll Collect, enquanto sistema protegido e fechado, permitirão à DaimlerChrysler, por intermédio da Toll Collect, controlar o acesso ao futuro mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária (considerandos 57 a 59 da decisão impugnada). Além disso, a plataforma Toll Collect levará à exclusão do mercado dos fornecedores de sistemas telemáticos actualmente nele presentes. Visto que essas unidades de bordo dispõem de funções essenciais que estão igualmente disponíveis nos sistemas de telemática rodoviária actualmente propostos no mercado e que serão fornecidas gratuitamente, a Comissão considera que as empresas de transportes cujos veículos pesados já estejam equipados com uma unidade de bordo da Toll Collect não adquirirão «nenhum terminal telemático adicional por forma a beneficiarem da oferta, por parte de fornecedores de sistemas alternativos, de serviços que vão além dos que são prestados através das unidades de bordo Toll Collect». Assim, o anúncio da gratuitidade da solução telemática desenvolvida pela Toll Collect tornou muito difícil para os fornecedores de sistemas de telemática rodoviária presentes no mercado a conquista de novos clientes e põe em risco a sua existência económica. A segunda geração de unidades de bordo que será desenvolvida pela Toll Collect intensificará esta exclusão do mercado, por força das funções adicionais destas unidades (considerandos 60 a 65 da decisão impugnada).

    103

    Em face dos motivos expostos, a Comissão entende que, sem compromissos, a operação de concentração notificada conduzirá à criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, através da empresa comum Toll Collect, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária destinados a empresas de transportes e de logística, o que afectará significativamente a concorrência efectiva numa parte substancial do mercado comum (considerando 66 da decisão impugnada).

    104

    Todavia, a Comissão considerou que os compromissos propostos pelas empresas envolvidas na concentração eram suficientes para afastar as reservas por ela colocadas (considerando 69 da decisão impugnada).

    105

    No que se refere, em especial, ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, a Comissão afirma, no considerando 70 da decisão impugnada, que o compromisso proposto pelas partes de desenvolvimento de um módulo de cobrança de portagens para aparelhos de terceiros, de acompanhamento da adaptação desses aparelhos ao módulo das portagens e de concessão das necessárias licenças de utilização dos aparelhos irá permitir a terceiros o fabrico dos seus próprios aparelhos telemáticos dotados de uma função de cobrança de portagens. A Comissão precisa que o Ministério Federal dos Transportes, das Obras Públicas e da Habitação lhe garantiu que terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos equipados com um módulo de cobrança de portagens não serão discriminados em termos de custos face ao gestor do sistema de portagens para veículos pesados.

    106

    No considerando 71 da decisão impugnada, a Comissão declarou que serão sobretudo «os construtores de veículos pesados e os respectivos fabricantes de aparelhos que mais irão tirar partido da possibilidade de desenvolvimento e de fabrico [de outros] aparelhos [telemáticos], dotados de [um módulo de] cobrança d[e] portagens». Nestas condições, e com base no estudo de mercado, a Comissão observa que «[se] espera[…] que esta possibilidade dada a terceiros de integração de um módulo para portagens nos seus próprios aparelhos[…] impeça em grande medida que o sistema Toll Collect se torne a plataforma dominante e que a Toll Collect [se torne a] guardiã do mercado alemão dos sistemas telemáticos destinados a transitários e a empresas de logística».

    107

    No que diz respeito ao compromisso relativo à interface GPS, a Comissão sustentou que, segundo o seu estudo de mercado, a possibilidade de utilizar a função GPS da unidade de bordo da Toll Collect permite a terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos economizar cerca de 150 euros a 200 euros por aparelho e competir, não obstante a necessidade de instalação de um novo terminal no veículo, com os serviços telemáticos prestados através da unidade de bordo da Toll Collect (considerando 72 da decisão impugnada).

    108

    No que se refere ao compromisso relativo ao portal da TGG, a Comissão concluiu que o mesmo permitiria a terceiros prestadores de serviços telemáticos um acesso não discriminatório às funcionalidades básicas e aos dados elementares das unidades de bordo da Toll Collect através de um portal telemático central, que seria gerido de forma neutra e independente relativamente às partes envolvidas na concentração (considerandos 73 e 74 da decisão impugnada).

    109

    Em último lugar, a Comissão frisou a importância da moratória qualitativa, que impedia que a plataforma Toll Collect se tornasse a plataforma dominante no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária enquanto o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens não tivessem sido cumpridos (considerando 76 da decisão impugnada).

    110

    Em face destes elementos, a Comissão considerou que, no seu todo, os compromissos garantem que o mercado alemão dos serviços de telemática rodoviária permanecerá aberto e que as partes e as empresas terceiras continuarão a beneficiar de condições concorrenciais idênticas. Assim, a Comissão concluiu que, na condição de que as partes respeitem os compromissos, a operação de concentração notificada não conduzirá à criação, através da Toll Collect, de uma posição dominante da DaimlerChrysler no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária (considerando 77 da decisão impugnada).

    d) Quanto ao critério de apreciação dos compromissos

    111

    A Qualcomm censura a Comissão, no essencial, de ter apreciado os compromissos com base num critério errado, quando afirmou que o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo cobrança de portagens apenas limitam o carácter dominante da plataforma da Toll Collect.

    112

    A este respeito, o Tribunal recorda que, no quadro do regulamento relativo às concentrações, não compete à Comissão apreciar se os compromissos permitem limitar o impacto sobre a concorrência de uma concentração, mas apreciar se os compromissos permitem excluir a criação ou o reforço de uma posição dominante de que resultem entraves significativos à concorrência efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste (v. n.o 89 supra).

    113

    Contudo, há que ter em conta no presente caso que o facto de a Comissão ter considerado que o compromisso relativo à interface GPS «limita[va] ainda mais a posição dominante que a Toll Collect poderia vir a assumir enquanto plataforma» e que o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens «impe[diria] em grande medida que o sistema Toll Collect se torn[asse] a plataforma dominante e que a Toll Collect [se tornasse a] guardiã do mercado alemão dos sistemas telemáticos destinados a transitários e a empresas de logística» (considerandos 72 e 71 da decisão impugnada) não permite considerar que a Comissão apreciou a operação de concentração à luz de um critério errado.

    114

    Com efeito, contrariamente ao que a Qualcomm parece alegar, as reservas do ponto de vista da concorrência formuladas pela Comissão relativamente à operação de concentração não têm por objectivo declarar incompatível com o mercado comum uma eventual posição dominante da plataforma composta pelas unidades de bordo da Toll Collect (a seguir «plataforma Toll Collect») enquanto tal, antes dizendo respeito à circunstância de a DaimlerChrysler poder adquirir, através das unidades de bordo da Toll Collect, uma posição dominante no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária (considerandos 38 e 66 da decisão impugnada).

    115

    Os compromissos das partes envolvidas na concentração, que a Comissão considerou suficientes para afastar as reservas por si colocadas, visam excluir a posição dominante da DaimlerChrysler no mercado relevante, em primeiro lugar, limitando a posição dominante da plataforma Toll Collect através do compromisso relativo à interface GPS e do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, em segundo lugar, garantindo, por meio do compromisso relativo ao portal da TGG, o livre acesso à plataforma Toll Collect com vista à prestação de serviços de telemática rodoviária e, em terceiro lugar, condicionando a prestação de serviços de telemática rodoviária através das unidades de bordo da Toll Collect ao respeito da moratória qualitativa (considerandos 70 a 76 da decisão impugnada).

    116

    Foi apenas com base numa apreciação dos referidos compromissos no seu todo que a Comissão chegou à conclusão de que o respeito dos mesmos pelas empresas envolvidas na concentração impedirá a criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, por intermédio da Toll Collect, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária (considerando 77 da decisão impugnada).

    117

    Neste contexto, importa recordar, por um lado, que a Toll Collect só está encarregada de conceber e gerir, por conta da República Federal da Alemanha, o sistema de cobrança das portagens devidas pelos veículos pesados que utilizam as auto-estradas alemãs, pelo que não opera no mercado relevante (considerandos 7 e 19 da decisão impugnada), e, por outro, que o fornecimento gratuito das unidades de bordo da Toll Collect (considerando 17 da decisão impugnada) era uma exigência imposta pela República Federal da Alemanha para a gestão, pela Toll Collect, do sistema de portagens nas auto-estradas. Daqui resulta que a criação da Toll Collect e o fornecimento gratuito das unidades de bordo em causa não podiam, em si mesmos, ser apreciados pela Comissão no âmbito do procedimento regido pelo regulamento relativo às concentrações.

    118

    Tendo em conta as considerações que precedem, há que rejeitar a objecção da Qualcomm de que a Comissão teria apreciado os compromissos com base num critério errado.

    e) Quanto ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens e ao compromisso relativo à interface GPS

    Introdução

    119

    A título liminar, cumpre recordar que o problema de concorrência identificado pela Comissão na sequência da notificação da operação de concentração consiste na criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, por intermédio da Toll Collect, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária, que abrange tanto o fornecimento de serviços de telemática rodoviária como o fornecimento de equipamentos que permitem a prestação desse tipo de serviços.

    120

    Os compromissos das empresas envolvidas na concentração dizem respeito quer ao fornecimento de serviços de telemática rodoviária quer ao fornecimento de equipamentos que permitem a prestação desses serviços. Assim, o compromisso relativo ao portal da TGG, que garante um acesso não discriminatório dos prestadores de serviços telemáticos às funcionalidades básicas e aos dados elementares das unidades de bordo da Toll Collect, diz exclusivamente respeito à oferta de serviços de telemática rodoviária. Por seu turno, o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens dizem respeito à oferta de equipamentos que permitem a prestação dos referidos serviços.

    121

    As objecções da Qualcomm referem-se apenas aos compromissos respeitantes ao fornecimento de equipamentos que permitem a prestação de serviços de telemática rodoviária. Com efeito, a Qualcomm não contesta a apreciação do compromisso relativo ao portal da TGG.

    122

    Finalmente, há que frisar que foi tomando em conta esses compromissos no seu todo que a Comissão concluiu que os mesmos permitiriam manter aberto o mercado dos sistemas de telemática rodoviária e prevenir a criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, por intermédio da empresa comum, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária (considerando 77 da decisão impugnada).

    Quanto ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens

    — Introdução

    123

    No tocante às objecções levantadas pela Qualcomm ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, resulta dos considerandos 70 e 71 da decisão impugnada, tal como são reproduzidos nos n.os 105 e 106 do presente acórdão, que este compromisso garante, a priori, a terceiros fornecedores de sistemas de telemática rodoviária, inclusive os construtores de veículos pesados, a possibilidade de criar e de colocar no mercado uma unidade de bordo que possa ser utilizada, à semelhança da unidade de bordo da Toll Collect, para a cobrança de portagens. Este compromisso evita que as empresas de transportes que pretendam utilizar serviços de telemática rodoviária distintos dos fornecidos através das unidades de bordo da Toll Collect tenham de proceder a uma segunda instalação.

    124

    Todavia, a Qualcomm alega que este compromisso não permitirá a terceiros fornecedores de sistemas telemáticos competir com a unidade de bordo de Toll Collect, porquanto, por um lado, não elimina a vantagem em termos de preço da unidade de bordo da Toll Collect, que é fornecida gratuitamente, e, por outro, a criação por terceiros da sua própria unidade de bordo com uma função de cobrança de portagens os faria incorrer em despesas suplementares. Além disso, a Qualcomm questiona a afirmação da Comissão de que os fabricantes de camiões desenvolverão terminais telemáticos dotados de funções de cobrança de portagens.

    — Quanto à vantagem resultante da gratuitidade da unidade de bordo da Toll Collect

    125

    É pacífico que as unidades de bordo da Toll Collect serão fornecidas gratuitamente às empresas de transportes contra uma caução. Este fornecimento gratuito constitui uma exigência imposta pela República Federal da Alemanha à Toll Collect após ter adjudicado o contrato público em causa às empresas envolvidas na concentração.

    126

    Também é pacífico que, por força da moratória qualitativa, as unidades de bordo da Toll Collect só poderão ser utilizadas para prestar serviços de telemática rodoviária a partir do momento em que a República Federal da Alemanha autorizar essa utilização. Esta autorização só será concedida quando as empresas envolvidas na concentração tiverem cumprido todos os compromissos, designadamente o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens.

    127

    No âmbito do procedimento administrativo que precedeu a adopção da decisão impugnada, a República Federal da Alemanha afirmou numa carta dirigida à Comissão que qualquer apoio financeiro por si concedido às empresas envolvidas na concentração não iria além das despesas necessárias à implementação do sistema de cobrança das portagens. A República Federal da Alemanha confirmou esta posição nas suas observações escritas e na audiência.

    128

    Por outro lado, no que se refere aos custos da unidade de bordo da Toll Collect, a República Federal da Alemanha comprometeu-se a não tratar de maneira diferente terceiros fornecedores de aparelhos telemáticos equipados com um módulo de cobrança de portagens e o gestor do sistema de portagens para veículos pesados (considerando 70 da decisão impugnada). Este compromisso é comprovado pela carta dirigida pela República Federal da Alemanha à Comissão em 2 de Abril de 2003 e foi confirmado pela República Federal da Alemanha na audiência.

    129

    Assim, o fornecimento gratuito da unidade de bordo da Toll Collect não gera nenhuma vantagem concorrencial para a DaimlerChrysler no que diz respeito aos custos de exploração da Toll Collect. O compromisso da República Federal da Alemanha de compensar de forma não discriminatória o produtor das unidades de bordo em causa e terceiros fornecedores dos seus próprios sistemas de telemática rodoviária que podem ser utilizados para a cobrança de portagens, pelas despesas em que incorram para efeitos da cobrança de portagens através dos respectivos aparelhos, evita a criação de uma vantagem concorrencial para a Toll Collect ou para a DaimlerChrysler em relação a esses terceiros. A igualdade de tratamento entre as empresas envolvidas na concentração, que incumbiram a Toll Collect de desenvolver a unidade de bordo em causa, e terceiros que concebam outras unidades de bordo na sequência do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens está assim garantida no que se refere ao financiamento pela República Federal da Alemanha dos custos dessas unidades de bordo.

    130

    Assim, a Comissão podia legitimamente considerar que esse compromisso dava resposta à desvantagem concorrencial identificada na decisão impugnada, que consistia no facto de as empresas de transportes não estarem dispostas a pagar por uma segunda unidade de bordo. Com efeito, por força do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, terceiros construtores poderão propor sistemas telemáticos dotados de um módulo de cobrança de portagens beneficiando do mesmo apoio financeiro de que a Toll Collect beneficia para fornecer gratuitamente as suas unidades de bordo.

    131

    Por último, e a título acessório, deve frisar-se que, embora, quando da apreciação do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens na decisão impugnada, a Comissão não refira expressamente a diferença qualitativa existente entre os serviços de telemática rodoviária que podem ser prestados através da unidade de bordo da Toll Collect e os que podem ser prestados através dos aparelhos de terceiros, resulta da decisão impugnada, considerada globalmente, que essa diferença qualitativa é relevante para a apreciação do impacto sobre a concorrência da operação de concentração.

    132

    Com efeito, ao apreciar, à luz das regras de concorrência, a operação de concentração na ausência dos compromissos, a Comissão faz referência a essa diferença qualitativa (considerandos 62 a 65 da decisão impugnada). Assim, a Comissão observou que os serviços de telemática rodoviária acessíveis através da unidade de bordo da Toll Collect não cobrem toda a gama de serviços prestados através dos terminais telemáticos existentes no mercado, antes «constitu[indo] funções fundamentais que fazem igualmente parte dos demais sistemas actualmente comercializados». A Comissão precisou ainda, relativamente ao fornecimento gratuito das unidades de bordo da Toll Collect, que «[era], pois, de esperar que os operadores de frotas, cujos veículos pesados se encontram equipados com uma unidade de bordo [da Toll Collect], não v[iessem] a adquirir nenhum terminal telemático adicional por forma a beneficiarem da oferta, por parte de fornecedores de sistemas alternativos, de serviços que vão além dos que são prestados através das unidades de bordo Toll Collect».

    133

    Ora, esta diferença qualitativa confirma a justeza da análise feita pela Comissão do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens.

    134

    Com efeito, o relatório Frost & Sullivan, invocado pela Comissão em apoio da sua argumentação, indica que, à data em que a operação de concentração foi apreciada, existia na Europa uma procura para os sistemas que permitissem a oferta de serviços de telemática rodoviária mais avançados e confirma a existência de um crescimento desta procura nos anos subsequentes.

    135

    Por conseguinte, a Comissão podia legitimamente considerar que, à data em que a operação de concentração foi apreciada, existia na Europa uma procura para os sistemas que permitissem a oferta de serviços de telemática rodoviária mais avançados e que esta procura estava votada a crescer nos anos subsequentes. Por outro lado, é facto assente que, inicialmente, a unidade de bordo da Toll Collect só poderia ser utilizada para serviços telemáticos pouco sofisticados (considerando 62 da decisão impugnada). Assim sendo, é legítimo considerar que os fornecedores de soluções globais que prestem, através dos seus sistemas, além de serviços de cobrança de portagens, serviços telemáticos mais sofisticados do que os que podem ser prestados por via da unidade de bordo da Toll Collect têm uma vantagem concorrencial em relação aos prestadores de serviços que operam através da unidade de bordo em causa.

    136

    Esta vantagem qualitativa, combinada com a não discriminação ao nível dos custos de terceiros que tirem partido do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, permitia à Comissão considerar, sem cometer qualquer erro de apreciação manifesto, que o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens «impe[diria] em grande medida que o sistema Toll Collect se torn[asse] a plataforma dominante e que a Toll Collect [se tornasse a] guardiã do mercado alemão dos sistemas telemáticos destinados a transitários e a empresas de logística».

    — Quanto às despesas adicionais

    137

    A Qualcomm considera que terceiros fornecedores de sistemas telemáticos incorrerão em despesas adicionais, incluindo as despesas de adaptação do seu sistema com vista à integração do módulo de cobrança de portagens, as despesas de participação no desenvolvimento e no fornecimento do módulo (v. cláusulas do ponto B.IV.2.4 dos compromissos) e as despesas de certificação do seu sistema com o módulo integrado (v. cláusulas do ponto B.IV.2.4 dos compromissos).

    138

    A este respeito, o Tribunal observa que resulta dos compromissos assumidos pelas empresas envolvidas na concentração que as unidades de bordo da Toll Collect não poderão inicialmente prestar serviços telemáticos. Com efeito, nos termos dos pontos A.3 e B.II.16.1 desses compromissos, haverá que instalar um software adicional nas unidades de bordo em causa para que esses serviços possam ser prestados. O ponto A.3 dos compromissos prevê, no seu segundo parágrafo, que «[s]ó é possível prestar serviços de valor acrescentado directamente através das funcionalidades [das unidades de bordo em causa] dotando [as referidas unidades de bordo] de um software de controlo adicional (o que exige uma intervenção central)». Resulta do exposto que a exploração das unidades de bordo em causa gerará igualmente algumas despesas de adaptação para que as empresas as possam utilizar como sistema de telemática rodoviária. No que diz respeito às despesas de participação no desenvolvimento e no fornecimento do módulo e às despesas de certificação do seu sistema com o módulo integrado, tal como são descritas nas cláusulas do ponto B.IV.2.4 dos compromissos, cumpre observar que a Qualcomm não demonstra que essas despesas são superiores àquelas em que a Toll Collect incorreu para desenvolver o seu próprio módulo de cobrança de portagens. Por fim, cumpre assinalar que, em qualquer caso, a Qualcomm não quantifica, nem mesmo por alto, essas alegadas despesas adicionais.

    139

    Por conseguinte, a Qualcomm não demonstrou suficientemente, de forma a pôr em causa a apreciação da Comissão, que terceiros fornecedores de sistemas telemáticos incorrerão em despesas adicionais se tirarem partido do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens.

    — Quanto ao desenvolvimento, pelos fabricantes de camiões, de terminais telemáticos dotados de uma função de cobrança de portagens

    140

    A Qualcomm também questiona a afirmação da Comissão de que é provável que os fabricantes de camiões façam uso da possibilidade de desenvolver terminais telemáticos dotados de funções de cobrança de portagens.

    141

    A este respeito, o Tribunal observa que resulta do relatório Frost & Sullivan que, a partir do ano 2000, os fabricantes de equipamentos de origem na Europa passaram a instalar sistemas telemáticos nos seus veículos pesados quando da sua construção (v. gráficos 3-10 e 3-14 do relatório Frost & Sullivan). Além disso, esse relatório indica que os construtores de veículos têm a intenção de desenvolver e liderar o mercado da telemática para veículos comerciais e que a combinação da cobrança electrónica das portagens com os sistemas telemáticos constitui uma oportunidade importante (v. relatório Frost & Sullivan, p. 2-12). É ainda afirmado no mesmo relatório que é de esperar que os construtores de veículos façam da montagem de origem de sistemas de telemática rodoviária uma prioridade (v. relatório Frost & Sullivan, p. 3-11). Por último, os autores desse relatório prevêem que, em 2009, os fabricantes de equipamentos de origem terão alcançado na Europa uma taxa de penetração próxima dos 80% no mercado da telemática rodoviária para veículos comerciais pesados (com um peso superior a 16 toneladas) e superior a 50% no mercado combinado dos veículos comerciais pesados e médios (v. gráficos constantes das páginas 3-20, 3-21 e 3-22 do relatório Frost & Sullivan).

    142

    Assim sendo, a Comissão podia legitimamente inferir desse relatório que os construtores de veículos pesados e os fabricantes dos respectivos equipamentos desenvolverão os seus próprios sistemas de telemática rodoviária. Acresce que, tendo em conta a oportunidade importante que constitui a combinação dos sistemas automáticos de cobrança de portagens com os sistemas telemáticos, não é manifestamente errado concluir que os construtores de veículos pesados e os fabricantes dos respectivos equipamentos integrarão o sistema automático de cobrança de portagens nos seus sistemas de telemática rodoviária devido ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens.

    143

    Todavia, a Qualcomm afirma que, segundo a sua experiência, os gestores de frotas não são apologistas da montagem em série de terminais telemáticos em veículos pesados, dado que utilizam diferentes marcas de veículos e que a montagem em série criaria problemas de interoperabilidade entre os sistemas montados em série dos diferentes construtores, em particular ao nível da central do gestor da frota. A isto acresce que a instalação de diferentes terminais tornaria a formação dos condutores mais complicada.

    144

    Essas alegações devem, porém, ser rejeitadas. Com efeito, é indicado no relatório Frost & Sullivan que os construtores de veículos pesados estão a desenvolver sistemas independentes dos veículos para dar resposta ao problema dos operadores que possuem uma frota de veículos pesados de diferentes marcas (v. relatório Frost & Sullivan, p. 3-21). Segundo este relatório, o «standard FMS» constitui um passo na direcção dos sistemas que podem operar em todos os veículos com um maior grau de sofisticação. Por outro lado, nada impede os proprietários de frotas compostas por diferentes marcas de instalar, num parte da sua frota, equipamentos adicionais compatíveis com os seus veículos. Além disso, e em todo o caso, cumpre constatar que a Qualcomm não apresenta nenhum meio de prova que demonstre que os gestores de frotas não são apologistas da montagem em série de terminais telemáticos em veículos pesados e que a maioria deles utiliza diferentes marcas de veículos.

    145

    Consequentemente, a Comissão podia validamente considerar que era de esperar que fossem essencialmente os construtores de veículos pesados e os fabricantes dos respectivos equipamentos a desenvolver e a produzir os equipamentos telemáticos a que se refere o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens.

    — Conclusão

    146

    Em face de todas as considerações que precedem, o Tribunal conclui que há que rejeitar a objecção da Qualcomm referente a um erro de apreciação manifesto do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens. Com efeito, a Qualcomm não demonstrou que este compromisso não permitia dar resposta às preocupações da Comissão no que respeita aos equipamentos que permitem a oferta de serviços de telemática rodoviária no mercado dos sistemas de telemática rodoviária.

    Quanto ao compromisso relativo à interface GPS

    147

    A Qualcomm alega que a apreciação feita pela Comissão do compromisso relativo à interface GPS é manifestamente errada, visto que esta interface GPS não gera nenhuma poupança e que, em qualquer caso, esta vantagem não elimina a vantagem concorrencial da unidade de bordo da Toll Collect.

    148

    Todavia, o Tribunal considera que, tomada no seu todo, a decisão impugnada dá uma resposta suficiente às preocupações em matéria de concorrência identificadas pela Comissão nessa decisão e, em particular, à preocupação da Qualcomm relacionada com o fornecimento gratuito das unidades de bordo da Toll Collect.

    149

    Importa recordar a este respeito que o fornecimento gratuito da unidade de bordo da Toll Collect constitui uma obrigação imposta às empresas envolvidas na concentração após a adjudicação pela República Federal da Alemanha do contrato público em questão a essas empresas e que, em si mesma, a Comissão não podia pôr em causa na sua análise da operação de concentração (v. n.o 117 supra).

    150

    Esta circunstância, conjugada com o facto de, à data em que a Comissão apreciou a operação de concentração, não ser economicamente viável para os transportadores a instalação, às suas próprias custas, de uma segunda unidade de bordo, faz certamente com que a unidade de bordo da Toll Collect venha a ocupar uma posição preponderante no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária. Todavia, como a Comissão afirmou na sua apreciação da operação de concentração, isso constitui uma consequência directa da adjudicação do contrato público em causa pela República Federal da Alemanha e não da operação de concentração.

    151

    Por outro lado, garantindo a terceiros por meio do compromisso relativo ao portal da TGG — que não é contestado pela Qualcomm no presente processo — a possibilidade de prestar em condições não discriminatórias os seus próprios serviços de telemática rodoviária através da unidade de bordo da Toll Collect, a Comissão assegurou-se de que a DaimlerChrysler, por intermédio da Toll Collect, não poderá vedar o acesso aos serviços de telemática rodoviária no mercado relevante ou dominá-los.

    152

    Além do mais, o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, conjugado com o compromisso da República Federal da Alemanha de não discriminação relativamente à sua contribuição para os custos desse módulo, garante a terceiros a possibilidade de oferecerem as suas próprias unidades de bordo com funções de cobrança de portagens em condições de concorrência. Há que lembrar que a gratuitidade das unidades de bordo da Toll Collect não constitui para as empresas envolvidas na concentração uma vantagem concorrencial relativamente à Qualcomm, dada a existência desse compromisso da República Federal da Alemanha (v. n.os 122 e seguintes supra).

    153

    Finalmente, o compromisso relativo à moratória qualitativa garante que a unidade de bordo de Toll Collect não se possa tornar uma plataforma dominante antes que terceiros tenham podido beneficiar efectivamente do compromisso relativo à interface GPS e do compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens.

    154

    Por conseguinte, deve concluir-se que a Comissão considerou com razão que, globalmente, isto é, considerados no seu todo, os compromissos impedem que a operação de concentração conduza à criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, por intermédio da empresa comum Toll Collect, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária destinados a empresas de transportes e de logística.

    155

    Por outro lado, relativamente à afirmação da Qualcomm de que o compromisso relativo à interface GPS não gera nenhuma poupança, deve observar-se que o considerando 72 da decisão impugnada não precisa que esta poupança de 150 euros a 200 euros por aparelho decorre unicamente do preço de compra dos aparelhos, como a Qualcomm pressupõe. Ora, na sua contestação, a Comissão afirma, sem ser contraditada pela Qualcomm, que esta poupança também abrange os custos da antena, da cablagem e da instalação da função GPS que devem ser suportados por terceiros que pretendam fornecer o seu próprio equipamento telemático dotado de uma função GPS. Além disso, tendo em conta as tomadas de posição apresentadas durante o processo administrativo por operadores presentes no mercado, há que considerar que esta estimativa da poupança de custos efectuada pela Comissão não é errada. Assim, um primeiro operador afirmou que uma interface GSM e GPS permitiria reduzir em cerca de 500 euros os custos do sistema telemático, um segundo operador alegou que um aparelho telemático sem um módulo GPS e GSM apenas custaria 500 euros e um terceiro afirmou que o custo do módulo GPS e GSM representava mais de metade do custo da unidade telemática, avaliado entre 1000 euros e 2500 euros na decisão impugnada (considerando 62 da decisão impugnada). Por outro lado, o Tribunal considera que a mera circunstância de terceiros que pretendam fornecer sistemas telemáticos através da interface GPS incorrerem em despesas relacionadas com a adaptação do seu próprio material e da unidade de bordo da Toll Collect para poderem beneficiar desta interface não permite concluir que a estimativa da Comissão é manifestamente errada. Com efeito, além do facto de a Comissão considerar o montante de 150 euros a 200 euros por aparelho uma estimativa prudente da poupança que pode ser realizada devido ao compromisso relativo à interface GPS, a Qualcomm admite que as despesas que têm de ser suportadas para a adaptação do material de terceiros e da unidade de bordo da Toll Collect com vista à utilização da interface GPS não podem actualmente ser quantificadas com um grau suficiente de precisão. Por último, impõe-se assinalar que a afirmação da Qualcomm de que, em todo o caso, é provável que o montante total dos custos elimine totalmente as poupanças relativas à unidade GPS não é demonstrada e não é, portanto, susceptível de pôr em causa a apreciação da Comissão. Por conseguinte, cumpre concluir que não é possível considerar que a Comissão cometeu um erro de apreciação manifesto ao declarar que o compromisso relativo à interface GPS pode gerar poupanças de 150 euros a 250 euros por aparelho para terceiros fornecedores de sistemas telemáticos.

    156

    Na medida em que a Qualcomm considera que, mesmo que o compromisso relativo à interface GPS gere poupanças de 150 euros a 200 euros por aparelho, esta vantagem não é susceptível de eliminar a vantagem concorrencial das unidades de bordo da Toll Collect, que são fornecidas gratuitamente, há que assinalar que, pelos motivos acima expostos nos n.os 148 e seguintes, os outros compromissos, considerados no seu todo, garantem que a operação de concentração não conduza à criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, por intermédio da Toll Collect, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária.

    157

    Por último, na medida em que a Qualcomm contesta a admissibilidade do argumento da República Federal da Alemanha de que a Toll Collect não pode prestar serviços telemáticos porque ainda não obteve a autorização da República Federal da Alemanha para o fazer, cumpre assinalar que, ao observar que tem de autorizar a prestação de serviços de telemática rodoviária através da unidade de bordo da Toll Collect e que, até ao presente, essa autorização não foi nem concedida nem pedida pela Toll Collect, a República Federal da Alemanha limita-se a enunciar uma das condições que devem estar preenchidas para que possam ser prestados serviços de telemática rodoviária através da unidade de bordo em causa. Esta observação não é inadmissível.

    158

    Tendo em conta as considerações expostas, há que julgar improcedente o primeiro fundamento da Qualcomm.

    C — Quanto ao segundo fundamento, relativo ao desvio de poder

    1. Argumentos das partes

    159

    A Qualcomm alega que a Comissão incorreu em desvio de poder ao ter em conta, na sua apreciação da operação de concentração, considerações políticas gerais. Mais precisamente, a Comissão teve erradamente em conta o facto de o sistema da Toll Collect constituir uma oportunidade para lançar os serviços de telemática na Alemanha e na Europa e de este lançamento não dever ser retardado.

    160

    A Comissão nega ter de alguma forma incorrido em desvio de poder.

    2. Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

    161

    Segundo jurisprudência assente, o conceito de desvio de poder refere-se ao facto de uma autoridade administrativa ter usado os seus poderes com um objectivo diferente daquele para que lhe foram conferidos. Uma decisão só enferma de desvio de poder se, com base em indícios objectivos, pertinentes e concordantes, se verificar que foi adoptada com a finalidade exclusiva, ou pelo menos determinante, de atingir fins diversos dos invocados (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o., C-331/88, Colect., p. I-4023, n.o 24, e de 25 de Janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C-407/04 P, Colect., p. I-829, n.o 99; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Ferriere Nord/Comissão, T-143/89, Colect., p. II-917, n.o 68). Em caso de pluralidade de objectivos prosseguidos, mesmo quando um motivo injustificado se junta aos motivos válidos, a decisão não enferma por esse facto de desvio de poder, quando não sacrifique o objectivo essencial (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Dezembro de 1954, Itália/Alta Autoridade, 2/54, Recueil, pp. 73, 103, Colect. 1954-1961, p. 5, e acórdão EDP/Comissão, referido no n.o 89 supra, n.o 87).

    162

    No caso em apreço, a Qualcomm não contesta o facto de a decisão impugnada não conter nenhuma referência a considerações políticas gerais. A Qualcomm limita-se a alegar que a Comissão se baseou em considerações políticas para aprovar os compromissos finais e invoca, a este respeito, as observações feitas na audição de 20 de Março de 2003 pelo chefe de equipa da Comissão encarregado do processo.

    163

    Os excertos da acta da audição de 20 de Março de 2003 revelam que o representante da Comissão referiu que a unidade de bordo da Toll Collect virá provavelmente a ser uma enorme plataforma telemática e permitirá uma maior penetração no mercado do que a que haveria se ela não existisse. Tendo em conta essas observações ditas «mais estratégicas», o representante da Comissão pediu às empresas presentes na audição que apresentassem as suas observações sobre os problemas gerados pela Toll Collect, as consequências que resultariam do facto de a DaimlerChrysler não controlar essa plataforma e as possibilidades de ligar equipamentos mais sofisticados a essa plataforma.

    164

    No entanto, não é possível deduzir dessas observações que a decisão impugnada tenha sido tomada e, em particular, que os compromissos tenham sido apreciados com um objectivo que não fosse garantir uma concorrência efectiva no mercado dos sistemas de telemática rodoviária. Com efeito, a análise do impacto sobre a concorrência de compromissos propostos num processo de concentração implica necessariamente apreciações da situação presente e da evolução futura do mercado relevante. Uma vez que a Comissão aceitou compromissos que garantem uma concorrência efectiva no mercado relevante, a circunstância de a Comissão ter aceitado compromissos que potencialmente conduzem ao desenvolvimento do mercado relevante por via de uma maior penetração dos sistemas de telemática rodoviária não demonstra que a Comissão tenha usado os seus poderes com um objectivo diferente daquele para que lhe foram conferidos pelo regulamento relativo às concentrações.

    165

    Por outro lado, o facto de outros compromissos que não conduziriam a esse desenvolvimento do mercado terem igualmente podido ser aceites não pode conduzir à anulação da decisão impugnada, na medida em que a Comissão podia concluir que os compromissos mencionados nesta decisão lhe permitiam declarar a concentração em causa compatível com o mercado comum.

    166

    Em qualquer caso, a mera circunstância de um representante da Comissão ter interrogado empresas afectadas pela operação de concentração fazendo referência aos possíveis desenvolvimentos do mercado na sequência da abertura da plataforma Toll Collect a serviços de telemática rodoviária não demonstra que a Comissão tenha prosseguido o objectivo de não prejudicar uma maior penetração dos sistemas e dos serviços telemáticos na Alemanha, ou mesmo de não retardar o seu lançamento, e ainda menos demonstra que a decisão impugnada tenha sido adoptada com base nesse objectivo.

    167

    Assim, a Qualcomm não demonstrou, com base em indícios objectivos, pertinentes e concordantes, que a decisão impugnada foi tomada com a finalidade de atingir fins diversos dos referidos no regulamento relativo às concentrações. Por esta razão, há que julgar improcedente o segundo fundamento, relativo ao desvio de poder.

    D — Quanto ao terceiro fundamento, relativo à falta de fundamentação

    1. Argumentos das partes

    168

    A Qualcomm alega que a Comissão violou o artigo 253.o CE porque não fundamentou suficientemente a sua conclusão de que os compromissos são suficientes para afastar as reservas por si colocadas. Invocando o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Outubro de 2002, Schneider Electric/Comissão (T-310/01, Colect., p. II-4071, n.os 197 e 203), a Qualcomm afirma que a conclusão a que a Comissão chega deve ser apoiada por uma fundamentação detalhada a respeito de todos os aspectos por ela qualificados de relevantes para a sua avaliação do impacto da concentração sobre a concorrência. Além disso, as conclusões específicas a que chegue no interior do seu raciocínio geral devem apresentar uma coerência interna. A recorrente alega que essas exigências não foram respeitadas no presente caso.

    169

    A Qualcomm observa que, quando a Comissão apurou, no âmbito da sua apreciação da operação de concentração, se a plataforma Toll Collect iria tornar-se a plataforma dominante no mercado e se esta situação conduziria ao desaparecimento dos fornecedores de sistemas telemáticos alternativos actualmente presentes no mercado, examinou várias questões detalhadas (considerandos 38 a 56, 64 e 65 da decisão impugnada). Contudo, quando a Comissão examinou o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, não examinou nenhuma dessas questões.

    170

    Assim, no que diz respeito ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens, a Comissão limitou-se, no considerando 71 da decisão impugnada, a declarar, sem fornecer explicações a este respeito, que esta possibilidade técnica impedia, em grande medida, a unidade de bordo da Toll Collect de se tornar a plataforma dominante no mercado relevante. Segundo a Qualcomm, a mesma conclusão é válida para a afirmação da Comissão constante do considerando 72 da decisão impugnada, segundo a qual o compromisso relativo à interface GPS permite a terceiros concorrer com os serviços telemáticos fornecidos com base nas unidades de bordo da Toll Collect. No seu entender, esta situação é comparável à examinada pelo Tribunal de Justiça no processo em que foi proferido o acórdão de 9 de Janeiro de 2003, Petrotub e Republica (C-76/00 P, Colect., p. I-79, n.o 87). Neste último acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que a fundamentação era insuficiente por apenas ter sido feita uma afirmação peremptória que não continha nenhuma explicação que pudesse esclarecer os interessados e o juiz comunitário quanto às razões que tinham conduzido o seu autor às considerações aí em questão.

    171

    Além disso, o raciocínio da Comissão não é coerente. Com efeito, nos considerandos 62 e 63 da decisão impugnada, afirmou que a vantagem da unidade de bordo de Toll Collect em termos de preço oscilava entre 1000 euros e 2500 euros e que as empresas de transportes não pagariam por sistemas telemáticos alternativos se pudessem obter serviços telemáticos através das unidades de bordo da Toll Collect. Todavia, quando do exame do compromisso relativo à interface GPS, a Comissão declarou que uma poupança de 150 euros a 200 euros por aparelho seria suficiente para permitir aos sistemas telemáticos propostos por terceiros competir com as unidades de bordo da Toll Collect. Segundo a Qualcomm, mesmo que a unidade de bordo da Toll Collect permita realizar uma poupança de 150 euros a 200 euros por aparelho, a vantagem da unidade de bordo da Toll Collect gratuita continua a ser «esmagadora».

    172

    Na réplica, a Qualcomm alega que, embora a interpretação da Comissão segundo a qual os compromissos apenas visam limitar o carácter dominante da unidade de bordo da Toll Collect confira mais coerência à fundamentação da decisão impugnada, a mesma assenta em critérios errados. Isto coloca a Qualcomm num dilema quanto à fundamentação da decisão impugnada: ou a fundamentação é coerente, caso em que assenta num critério jurídico errado, ou assenta no critério jurídico correcto, mas é manifestamente contraditória.

    173

    A Comissão alega, no essencial, que a decisão impugnada está suficientemente fundamentada e não contém contradições, porquanto apenas afirmou que o compromisso relativo à interface GPS e o compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens limitariam a posição dominante da DaimlerChrysler.

    2. Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

    174

    A fundamentação exigida pelo artigo 253.o CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, a argumentação da instituição autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao tribunal competente exercer o seu controlo (acórdãos do Tribunal de Justiça de 2 de Abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C-367/95 P, Colect., p. I-1719, n.o 63, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, T-25/95, T-26/95, T-30/95 a T-32/95, T-34/95 a T-39/95, T-42/95 a T-46/95, T-48/95, T-50/95 a T-65/95, T-68/95 a T-71/95, T-87/95, T-88/95, T-103/95 e T-104/95, Colect., p. II-491, n.o 4725). A questão de saber se a fundamentação satisfaz as exigências do artigo 253.o CE deve ser apreciada em função da natureza do acto em causa e do contexto em que foi adoptado (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Abril de 1997, Irish Farmers Association e o., C-22/94, Colect., p. I-1809, n.o 39).

    175

    Daqui resulta que a falta ou a insuficiência de fundamentação constitui um fundamento relativo à violação de formalidades substanciais, distinto, enquanto tal, do fundamento relativo à incorrecção dos fundamentos da decisão, cuja fiscalização faz parte da análise da justeza desta decisão (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Maio de 1998, Gruber + Weber/Comissão, T-310/94, Colect., p. II-1043, n.o 41, e BPB de Eendracht/Comissão, T-311/94, Colect., p. II-1129, n.o 66).

    176

    No presente caso, resulta da leitura dos considerandos 69 e seguintes da decisão impugnada que estes revelam de forma clara e inequívoca o raciocínio da Comissão.

    177

    Com efeito, nesses diferentes considerandos, a Comissão expõe o conteúdo de cada um dos compromissos assim como o seu impacto sobre a Toll Collect e/ou os serviços de telemática rodoviária prestados através da Toll Collect. Além disso, a Comissão concluiu, após ter considerado os compromissos no seu todo, que estes eram suficientes para impedir a criação de uma posição dominante da DaimlerChrysler, por intermédio da Toll Collect, no mercado alemão dos sistemas de telemática rodoviária.

    178

    Conforme resulta dos n.os 119 e seguintes do presente acórdão, esses diferentes considerandos permitiram ao Tribunal exercer a sua fiscalização na sequência da contestação pela Qualcomm da sua justeza. Assim sendo, não é possível considerar que a Comissão se tenha limitado a fazer declarações peremptórias ou que as contradições invocadas pela Qualcomm conduzem à falta de fundamentação. De resto, a própria Qualcomm admite na sua réplica que a fundamentação da Comissão não é incoerente, na medida em que os compromissos relativos à interface GPS ou ao módulo de cobrança de portagens apenas visam limitar a posição dominante da plataforma Toll Collect.

    179

    Por fim, na medida em que a Qualcomm invoca os n.os 197 e 203 do acórdão Schneider Electric/Comissão, acima referido no n.o 168, bem como confusões ou contradições no raciocínio da Comissão na decisão impugnada, deve observar-se que estes elementos dizem respeito à incorrecção dos fundamentos utilizados pela Comissão na decisão impugnada, o que se enquadra na apreciação da justeza desta decisão e não da sua fundamentação (v., no que se refere à justeza da decisão, os n.os 86 e seguintes do presente acórdão).

    180

    Em face do exposto, há que julgar improcedente o fundamento relativo à falta de fundamentação.

    181

    Tendo em conta todas as considerações que precedem, é negado provimento ao recurso interposto pela Qualcomm.

    Quanto às despesas

    182

    Por força do disposto no artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

    183

    Tendo a Comissão pedido a condenação da Qualcomm e tendo esta sido vencida, há que condená-la nas despesas.

    184

    A Deutsche Telekom, a Daimler e a Daimler Financial Services suportarão as suas próprias despesas, uma vez que se limitaram a aderir aos pedidos da Comissão e não pediram expressamente a condenação da Qualcomm nessas despesas.

    185

    Nos termos do artigo 87.o, n.o 4, primeiro parágrafo, do mesmo Regulamento de Processo, os Estados-Membros que intervenham no processo devem suportar as respectivas despesas. Por conseguinte, a República Federal da Alemanha suportará as suas próprias despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos,

    O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

    decide:

     

    1)

    É negado provimento ao recurso.

     

    2)

    A Qualcomm Wireless Business Solutions Europe BV suportará as suas próprias despesas e as despesas da Comissão.

     

    3)

    A República Federal da Alemanha suportará as suas próprias despesas.

     

    4)

    A Deutsche Telekom AG, a Daimler AG e a Daimler Financial Services AG suportarão as suas próprias despesas.

     

    Azizi

    Cremona

    Frimodt Nielsen

    Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 19 de Junho de 2009.

    Assinaturas

    Índice

     

    Quadro jurídico

     

    Factos na origem do litígio

     

    Tramitação processual

     

    Pedidos das partes

     

    Questão de direito

     

    I — Quanto à admissibilidade

     

    A — Argumentos das partes

     

    1. Argumentos da Comissão e da República Federal da Alemanha

     

    a) Quanto à notificação da decisão impugnada

     

    b) Quanto à tomada de conhecimento

     

    2. Argumentos da Qualcomm

     

    B — Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

     

    1. Observações preliminares

     

    2. Quanto à publicação ou à notificação da decisão impugnada

     

    3. Quanto à tomada de conhecimento da decisão impugnada

     

    4. Conclusão

     

    II — Quanto ao mérito

     

    A — Introdução

     

    B — Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de apreciação manifesto, a um apuramento errado dos factos e a um raciocínio contraditório no que diz respeito ao carácter adequado dos compromissos para resolver os problemas de concorrência no mercado relevante

     

    1. Argumentos das partes

     

    a) Argumentos da Qualcomm

     

    — Introdução

     

    — Quanto ao compromisso relativo à interface GPS

     

    — Quanto ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens

     

    — Quanto ao carácter infundado dos argumentos apresentados pela Comissão no processo contencioso

     

    b) Argumentos da Comissão e da República Federal da Alemanha

     

    2. Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

     

    a) Introdução

     

    b) Considerações de princípio

     

    c) Análise efectuada pela Comissão da operação de concentração e dos compromissos

     

    d) Quanto ao critério de apreciação dos compromissos

     

    e) Quanto ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens e ao compromisso relativo à interface GPS

     

    Introdução

     

    Quanto ao compromisso relativo ao módulo de cobrança de portagens

     

    — Introdução

     

    — Quanto à vantagem resultante da gratuitidade da unidade de bordo da Toll Collect

     

    — Quanto às despesas adicionais

     

    — Quanto ao desenvolvimento, pelos fabricantes de camiões, de terminais telemáticos dotados de uma função de cobrança de portagens

     

    — Conclusão

     

    Quanto ao compromisso relativo à interface GPS

     

    C — Quanto ao segundo fundamento, relativo ao desvio de poder

     

    1. Argumentos das partes

     

    2. Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

     

    D — Quanto ao terceiro fundamento, relativo à falta de fundamentação

     

    1. Argumentos das partes

     

    2. Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

     

    Quanto às despesas


    ( *1 ) Língua do processo: inglês.

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