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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62022CJ0072

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 30 de junho de 2022.
    M.A.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Lietuvos vyriausiasis administracinis teismas.
    Reenvio prejudicial — Tramitação prejudicial urgente — Política de asilo e de imigração — Diretiva 2011/95/UE — Artigo 4.o — Procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional — Diretiva 2013/32/UE — Artigos 6.o e 7.o — Normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional — Artigo 18.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Diretiva 2013/33/UE — Artigo 8.o — Detenção do requerente — Fundamento da detenção — Proteção da segurança nacional e da ordem pública — Detenção do requerente de asilo devido à sua entrada irregular no território da União.
    Processo C-72/22 PPU.

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2022:505

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    30 de junho de 2022 ( *1 )

    «Reenvio prejudicial — Tramitação prejudicial urgente — Política de asilo e de imigração — Diretiva 2011/95/UE — Artigo 4.o — Procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional — Diretiva 2013/32/UE — Artigos 6.o e 7.o — Normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional — Artigo 18.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Diretiva 2013/33/UE — Artigo 8.o — Detenção do requerente — Fundamento da detenção — Proteção da segurança nacional e da ordem pública — Detenção do requerente de asilo devido à sua entrada irregular no território da União»

    No processo C‑72/22 PPU,

    que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Lietuvos vyriausiasis administracinis teismas (Supremo Tribunal Administrativo da Lituânia), por Decisão de 2 de fevereiro de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 4 de fevereiro de 2022, no processo

    M.A.

    sendo intervenientes:

    Valstybės sienos apsaugos tarnyba,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: A. Arabadjiev (relator), presidente de secção, L. Bay Larsen, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Primeira Secção, I. Ziemele, P. G. Xuereb e A. Kumin, juízes,

    advogado‑geral: N. Emiliou,

    secretário: M. Siekierzyńska, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 7 de abril de 2022,

    vistas as observações apresentadas:

    em representação de M.A., por I. Botyrienė, advokatė,

    em representação do Governo lituano, por K. Dieninis e V. Vasiliauskienė, na qualidade de agentes,

    em representação da Comissão Europeia, por A. Azema, S. L. Kalėda e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

    ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 2 de junho de 2022,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2011/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que estabelece normas relativas às condições a preencher pelos nacionais de países terceiros ou por apátridas para poderem beneficiar de proteção internacional, a um estatuto uniforme para refugiados ou pessoas elegíveis para proteção subsidiária e ao conteúdo da proteção concedida (JO 2011, L 337, p. 9), do artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 60), bem como do artigo 8.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 96).

    2

    Este pedido foi apresentado no âmbito de um processo que opõe M.A., nacional de país terceiro, ao Valstybės sienos apsaugos tarnyba (Serviço Nacional de Proteção das Fronteiras sob a tutela do Ministério da Administração Interna da República da Lituânia) (a seguir «VSAT»), relativo ao pedido deste com vista à detenção de M.A.

    Quadro jurídico

    Direito da União

    Diretiva 2011/95

    3

    O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2011/95 dispõe:

    «Os Estados‑Membros podem considerar que incumbe ao requerente apresentar o mais rapidamente possível todos os elementos necessários para justificar o pedido de proteção internacional. Incumbe ao Estado‑Membro apreciar, em cooperação com o requerente, os elementos pertinentes do pedido.»

    Diretiva 2013/32

    4

    Segundo o artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2013/32:

    «Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

    […]

    c)

    “Requerente”, um nacional de um país terceiro ou apátrida que apresentou um pedido de proteção internacional relativamente ao qual não foi ainda proferida uma decisão definitiva».

    5

    O artigo 6.o da Diretiva 2013/32 prevê:

    «1.   Quando uma pessoa apresenta um pedido de proteção internacional a uma autoridade competente segundo a lei nacional para o registo de tais pedidos, esse registo é feito no prazo de três dias úteis a contar da apresentação do pedido.

    Se o pedido de proteção internacional for feito a outras autoridades suscetíveis de o receber, mas não competentes para o registo segundo a lei nacional, os Estados‑Membros asseguram que o registo seja feito no prazo de seis dias úteis a contar da apresentação do pedido.

    Os Estados‑Membros asseguram que as autoridades suscetíveis de receber pedidos de proteção internacional, como a polícia, a guarda de fronteiras, as autoridades de imigração e o pessoal de estabelecimentos de detenção, disponham das informações pertinentes e o seu pessoal receba o necessário nível de formação adequada ao exercício das suas funções e responsabilidades, bem como instruções para informar os requerentes da forma e do local próprio para apresentar pedidos de proteção internacional.

    2.   Os Estados‑Membros devem assegurar que as pessoas que apresentam um pedido de proteção internacional tenham a possibilidade efetiva de o apresentar o mais rapidamente possível. Se o requerente não apresentar o pedido, os Estados‑Membros podem aplicar o artigo 28.o

    3.   Sem prejuízo do n.o 2, os Estados‑Membros podem exigir que os pedidos de proteção internacional sejam apresentados presencialmente e/ou em local designado.

    4.   Não obstante o n.o 3, considera‑se que um pedido de proteção internacional foi apresentado no momento em que as autoridades competentes do Estado‑Membro em causa recebam um formulário apresentado pelo requerente ou, caso a lei nacional o preveja, um auto lavrado pela autoridade.

    5.   Nos casos em que o pedido simultâneo de proteção internacional por um grande número de nacionais de países terceiros ou de apátridas torne muito difícil na prática respeitar o prazo fixado no n.o 1, os Estados‑Membros podem permitir que esse prazo seja fixado em 10 dias úteis.»

    6

    O artigo 7.o, n.o 1, dessa diretiva dispõe:

    «Os Estados‑Membros asseguram que todo o indivíduo adulto, dotado de capacidade jurídica, tenha o direito de apresentar um pedido de proteção internacional em seu próprio nome.»

    7

    O artigo 43.o da referida diretiva enuncia:

    «1.   Os Estados‑Membros podem estabelecer, de acordo com os princípios e garantias fundamentais enunciados no capítulo II, procedimentos para aprovar decisões na fronteira ou em zonas de trânsito do Estado‑Membro, sobre:

    a)

    A admissibilidade de um pedido, nos termos do artigo 33.o, apresentado nesses locais; e/ou

    b)

    Os fundamentos de um pedido num procedimento de acordo com o artigo 31.o, n.o 8.

    2.   Os Estados‑Membros asseguram que as decisões no âmbito dos procedimentos previstos no n.o 1 sejam proferidas num prazo razoável. Na ausência de uma decisão no prazo de quatro semanas, o requerente deve ser autorizado a entrar no território do Estado‑Membro para que o seu pedido possa ser tratado de acordo com as restantes disposições da presente diretiva.

    3.   Na eventualidade de chegada de um grande número de nacionais de países terceiros ou de apátridas que apresentem pedidos de proteção internacional na fronteira ou em zonas de trânsito, impossibilitando a aplicação do n.o 1, esses procedimentos podem igualmente ser aplicados nos locais onde tais nacionais de países terceiros ou apátridas forem normalmente alojados, ou seja, nas imediações da fronteira ou das zonas de trânsito, pelo tempo da sua estadia nesses locais.»

    Diretiva 2013/33

    8

    Nos termos dos considerandos 15 e 20 da Diretiva 2013/33:

    «(15)

    A detenção de requerentes deverá ser aplicada de acordo com o princípio subjacente de que as pessoas não deverão ser detidas apenas com fundamento no facto de solicitarem proteção internacional, de acordo, em especial, com as obrigações jurídicas internacionais dos Estados‑Membros e com o artigo 31.o da Convenção de Genebra. Os requerentes só poderão ser detidos em circunstâncias excecionais, definidas de forma muito clara na presente diretiva, e nos termos dos princípios da necessidade e da proporcionalidade, no que se refere à forma e à finalidade da detenção. Se um requerente for detido, deverá ter acesso efetivo às garantias processuais necessárias, tal como o direito de recurso perante uma autoridade judicial nacional.

    […]

    (20)

    A fim de garantir melhor a integridade física e psicológica dos requerentes, a detenção deverá ser uma medida de último recurso e só poderá ser aplicada depois de terem sido devidamente analisadas todas as medidas alternativas à detenção que não impliquem privação de liberdade. As medidas alternativas à detenção devem respeitar os direitos humanos fundamentais dos requerentes.»

    9

    O artigo 2.o, alínea h), dessa diretiva prevê:

    «Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

    […]

    h)

    “Detenção”, qualquer medida de reclusão de um requerente por um Estado‑Membro numa zona especial, no interior da qual o requerente é privado da liberdade de circulação».

    10

    O artigo 8.o da referida diretiva, nos seus n.os 2 e 3, dispõe:

    «2.   Quando se revele necessário, com base numa apreciação individual de cada caso, os Estados‑Membros podem manter os requerentes detidos se não for possível aplicar de forma eficaz outras medidas alternativas menos coercivas.

    3.   Os requerentes só podem ser detidos:

    […]

    e)

    Se a proteção da segurança nacional e da ordem pública o exigirem;

    […]»

    11

    Nos termos do artigo 9.o da mesma diretiva:

    «1.   A detenção de um requerente deve ter a duração mais breve possível e só pode ser mantida enquanto forem aplicáveis os fundamentos previstos no artigo 8.o, n.o 3.

    Os procedimentos administrativos relativos aos fundamentos da detenção previstos no artigo 8.o, n.o 3, devem ser executados com a devida diligência. Os atrasos nos procedimentos administrativos que não se devam ao requerente não podem justificar a prorrogação da detenção.

    2.   A detenção dos requerentes deve ser ordenada por escrito pelas autoridades judiciais ou administrativas. A ordem de detenção deve indicar os motivos de facto e de direito em que se baseia.

    3.   Se a detenção for ordenada por uma autoridade administrativa, os Estados‑Membros submetem a legalidade da detenção a um controlo judicial acelerado, que se efetua oficiosamente e/ou a pedido do requerente. No caso do controlo oficioso, a decisão deve ser tomada o mais rapidamente possível a contar do início da detenção. No caso do controlo a pedido do requerente, a decisão deve ser tomada o mais rapidamente possível a partir do início dos procedimentos correspondentes. Para o efeito, os Estados‑Membros definem, no direito nacional, um prazo para a realização do controlo judicial oficioso e/ou do controlo judicial a pedido do requerente.

    Se, na sequência do controlo judicial, a detenção for declarada ilegal, o requerente em causa deve ser libertado imediatamente.

    4.   Os requerentes detidos são imediatamente informados por escrito, numa língua que compreendam ou seja razoável presumir que compreendam, dos motivos da sua detenção e dos meios previstos no direito nacional para contestar a decisão de detenção, bem como da possibilidade de solicitarem assistência jurídica e representação legal a título gratuito.

    5.   A detenção deve ser reapreciada por uma autoridade judicial a intervalos razoáveis, oficiosamente e/ou a pedido do requerente em causa, especialmente nos casos de duração prolongada ou se sobrevierem circunstâncias relevantes ou novas informações passíveis de comprometer a legalidade da detenção.

    6.   Em caso de controlo judicial da ordem de detenção prevista no n.o 3, os Estados‑Membros asseguram o acesso gratuito dos requerentes a assistência jurídica e representação legal. Estas devem incluir, pelo menos, a preparação dos documentos processuais exigidos e a participação, em nome do requerente, nas audiências perante as autoridades judiciais.

    A representação legal e a assistência jurídica gratuitas devem ser exercidas por pessoas devidamente qualificadas, autorizadas ou habilitadas pelo direito nacional, e cujos interesses não estejam nem possam vir a entrar em conflito com os interesses do requerente.

    7.   Os Estados‑Membros podem igualmente prever que a assistência jurídica e a representação legal gratuitas sejam facultadas unicamente:

    a)

    Às pessoas que carecem de meios suficientes; e/ou

    b)

    Através dos serviços prestados pelos conselheiros jurídicos ou outros consultores especificamente designados pelo direito nacional para assistir e representar os requerentes.

    8.   Os Estados‑Membros podem igualmente:

    a)

    Impor limites monetários e/ou temporais à assistência jurídica e à representação legal gratuitas, desde que tais limites não restrinjam arbitrariamente o acesso à assistência jurídica e à representação legal;

    b)

    Prever que, no que respeita a taxas e outros encargos, o tratamento concedido aos requerentes não seja mais favorável do que o geralmente dispensado aos seus nacionais em matérias de assistência jurídica.

    9.   Os Estados‑Membros podem exigir o reembolso total ou parcial de quaisquer despesas pagas, se e quando a situação financeira do requerente tiver melhorado consideravelmente ou caso a decisão de lhe conceder esses benefícios tenha sido tomada com base em informações falsas fornecidas pelo requerente.

    10.   Os procedimentos para o acesso à assistência jurídica e representação legal devem ser definidos no direito nacional.»

    Direito lituano

    12

    O artigo 2.o, n.o 20, da Lietuvos Respublikos įstatymas «Dėl užsieniečių teisinės padėties» (Lei da República da Lituânia Relativa ao Estatuto Jurídico dos Estrangeiros), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «Lei Relativa aos Estrangeiros»), prevê que é considerado requerente de asilo o estrangeiro que introduza um pedido de asilo segundo as modalidades previstas na mesma lei e em relação ao qual ainda não foi adotada uma decisão definitiva.

    13

    O capítulo X2 da Lei Relativa aos Estrangeiros rege a aplicação desta lei em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros. Neste capítulo, o artigo 14012 dispõe:

    «1.   O estrangeiro pode apresentar um pedido de asilo:

    1)

    nos postos de controlo fronteiriços ou nas zonas de trânsito, ao [VSAT];

    2)

    no território da República da Lituânia, se o estrangeiro tiver entrado legalmente [na] Lituânia, ao [Departamento de Imigração];

    3)

    num Estado estrangeiro, por intermédio das representações diplomáticas e consulares da República da Lituânia designadas pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros.

    2.   O pedido de asilo apresentado por um estrangeiro que não respeite as modalidades previstas no n.o 1 do presente artigo não é admissível, sendo as modalidades de apresentação de um pedido de asilo explicadas ao requerente. Atentas a vulnerabilidade do estrangeiro ou outras circunstâncias individuais, o [VSAT] pode receber o pedido de asilo de um estrangeiro que tenha atravessado ilegalmente a fronteira da República da Lituânia.

    […]»

    14

    O artigo 14017 da Lei Relativa aos Estrangeiros, que prevê os fundamentos da detenção do requerente de asilo em caso de declaração do estado de sítio ou do estado de emergência, bem como de uma situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, dispõe, no ponto 2, que o requerente de asilo pode ser detido se entrar no território da República da Lituânia atravessando ilegalmente a fronteira deste Estado‑Membro.

    15

    O procedimento de concessão e de retirada do direito de asilo na Lituânia, aprovado pelo Decreto n.o 1V‑131 do Ministro da Administração Interna da República da Lituânia, de 24 de fevereiro de 2016 (na versão do Decreto n.o 1V‑626 do Ministro da Administração Interna da República da Lituânia, de 27 de julho de 2021; a seguir «descrição do procedimento»), dispõe, no ponto 23, que, se o pedido de asilo for apresentado a uma autoridade que não esteja designada no artigo 67.o, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros ou desrespeitando as prescrições enunciadas no n.o 2 do mesmo artigo ou no ponto 22 da descrição do procedimento, este pedido é devolvido ao estrangeiro no prazo de dois dias úteis contado a partir do momento em que se verifique que o pedido recebido pela autoridade é um pedido de asilo, informando‑se o requerente das modalidades de apresentação de um pedido de asilo. Esta informação é apresentada por escrito numa língua que o requerente compreenda ou que possa razoavelmente presumir‑se que compreenda. Consoante o local de residência do estrangeiro, caso seja conhecido, é enviada à autoridade designada no artigo 67.o, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros, uma cópia da resposta que lhe foi dada.

    Litígio no processo principal e questões prejudiciais

    16

    No Decreto n.o 517, intitulado «Declaração de uma situação de emergência a nível nacional e designação do comandante das operações decorrentes dessa situação de emergência», de 2 de julho de 2021 (TAR, 2021, n.o 2021‑15235; a seguir «Decreto n.o 517/21»), o Governo da República da Lituânia declarou a situação de emergência em todo o seu território. Em10 de novembro de 2021, foi declarado o estado de emergência numa parte desse território para este Estado‑Membro tentar enfrentar o afluxo maciço de migrantes provenientes, nomeadamente, da Bielorrússia.

    17

    Em 17 de novembro de 2021, M.A., nacional de país terceiro, foi detido na Polónia, com um grupo de pessoas proveniente da Lituânia, por não possuir documentação de viagem ou o visto necessário para permanecer neste Estado‑Membro e na União. Em 19 de novembro de 2021, M.A. foi entregue aos agentes do VSAT em território lituano. No mesmo dia, esta autoridade manteve M.A. detido por um período inferior a 48 horas e requereu ao Alytaus apylinkės teismas (Tribunal de Primeira Instância de Alytus, Lituânia) que ordenasse a sua detenção por um período máximo de seis meses.

    18

    Perante este órgão jurisdicional, o VSAT indicou que as bases de dados lituanas não dispunham de informações relativas ao interessado e que este estava em situação de permanência ilegal na Lituânia. Atendendo a todas as circunstâncias pertinentes, o VSAT considerou que M.A. se poderia pôr em fuga para se subtrair a uma detenção ou a um eventual afastamento desse Estado‑Membro. Assim, o VSAT requereu que M.A. fosse detido para definir a sua situação jurídica, por um período máximo de seis meses.

    19

    Na audiência perante o Alytaus apylinkès teismas (Tribunal de Primeira Instância de Alytus), M.A. apresentou um pedido de proteção internacional. Por Decisão de 20 de novembro de 2021, este órgão jurisdicional ordenou que M.A. fosse sujeito a uma medida de detenção até à adoção de uma decisão relativa ao seu estatuto jurídico na Lituânia, o mais tardar até 18 de fevereiro de 2022, uma vez que existia risco de fuga e que não era possível determinar as razões em que se baseava o seu pedido de asilo sem essa medida.

    20

    M.A. interpôs recurso dessa decisão para o órgão jurisdicional de reenvio, o Lietuvos vyriausiasis administracinis teismas (Supremo Tribunal Administrativo da Lituânia). Na audiência perante este órgão jurisdicional, M.A. reiterou o seu pedido de asilo e alegou que já tinha apresentado um pedido de asilo em 20 de novembro de 2021 a um funcionário não identificado do VSAT. No entanto, essa autoridade afirma não dispor de dados relativos a esse pedido.

    21

    Em 24 de janeiro de 2022, M.A. apresentou, por escrito, um pedido de asilo ao VSAT. Este pedido foi considerado inadmissível pelo Departamento de Imigração, designadamente com base no artigo 14012, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros.

    22

    Perante o órgão jurisdicional de reenvio, M.A alegou que não dispunha de informações sobre o seguimento dado ao seu pedido de asilo e que não tinha sido informado das modalidades de apresentação do mesmo. Em 1 de fevereiro de 2022, aquando de uma nova audiência neste órgão jurisdicional, o representante de M.A. e o do VSAT pediram ao referido órgão jurisdicional que ordenasse ao Departamento de Imigração a apreciação do pedido de proteção internacional do interessado.

    23

    O órgão jurisdicional de reenvio salienta, em primeiro lugar, que, numa situação de emergência originada pelo afluxo maciço de migrantes, como a declarada pelo Decreto n.o 517/21, o pedido de asilo deve, sob pena de inadmissibilidade, preencher as condições previstas no artigo 14012, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros. Por outro lado, nos termos do artigo 14017 da Lei Relativa aos Estrangeiros, nessa situação de emergência, o estrangeiro que entrou ilegalmente no território lituano pode ser detido.

    24

    Da aplicação conjunta destas disposições da Lei Relativa aos Estrangeiros resultaria que M.A., pelo facto de ter entrado ilegalmente no território lituano e por ter sido detido, estaria impossibilitado de apresentar um pedido de proteção internacional e, por conseguinte, não poderia ser qualificado de requerente de asilo.

    25

    Ora, devido à situação de emergência declarada pelo Decreto n.o 517/21, só os requerentes de asilo podem ser objeto de uma medida menos restritiva do que a detenção.

    26

    O órgão jurisdicional de reenvio considera, assim, que a um nacional de país terceiro que entrou e permanece ilegalmente na Lituânia não pode ser aplicada uma medida menos restritiva do que a detenção.

    27

    É certo que, nos termos do artigo 14012, n.o 2, da Lei Relativa aos Estrangeiros, o VSAT dispõe de uma margem de apreciação que lhe permite reconhecer o estatuto de requerente de asilo aos nacionais de países terceiros que tenham atravessado ilegalmente as fronteiras lituanas, atentas a respetiva vulnerabilidade ou outras circunstâncias individuais. Contudo, uma vez que as condições do exercício desta margem de apreciação não estavam regulamentadas especificamente, o órgão jurisdicional de reenvio considera que não está em condições de se pronunciar quanto à legalidade das medidas adotadas, no presente caso, pelo VSAT.

    28

    Nestas circunstâncias, esse órgão jurisdicional pretende determinar se as Diretivas 2011/95 e 2013/32 se opõem a disposições nacionais segundo as quais, em caso de declaração de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, um estrangeiro que tenha entrado e permaneça ilegalmente no território de um Estado‑Membro se vê efetivamente privado da possibilidade de apresentar um pedido de proteção internacional.

    29

    Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas sobre a conformidade com o direito da União das disposições que permitem às autoridades lituanas, em presença de uma situação de emergência declarada em face do afluxo maciço de migrantes, deter uma pessoa na situação de M.A. pelo simples facto de ter entrado ilegalmente no território lituano. Esse órgão jurisdicional pretende ser esclarecido sobre a compatibilidade dessas disposições com o considerando 15 e com o artigo 8.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2013/33, segundo os quais os requerentes de proteção internacional só poderão ser detidos em circunstâncias excecionais claramente definidas e nos termos do princípio da proporcionalidade.

    30

    Por outro lado, tendo em consideração as dúvidas quanto à legalidade da detenção inicial de M.A., o órgão jurisdicional de reenvio, na decisão de reenvio, ordenou ao VSAT, a título provisório, que mantivesse M.A. num centro de acolhimento ou noutro local adequado, ficando a sua liberdade de circulação restrita à área deste local, até 18 de fevereiro de 2022. Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio ordenou ao Departamento de Imigração que M.A. não fosse expulso ou reenviado para um país terceiro até à adoção de uma decisão definitiva no processo principal.

    31

    Nestas circunstâncias, o Lietuvos vyriausiasis administracinis teismas (Supremo Tribunal Administrativo da Lituânia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Deve o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva [2013/32], lido em conjugação com o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva [2011/95], ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a aplicável no presente processo, que, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo [maciço] de estrangeiros, não permite, em princípio, que um estrangeiro que tenha entrado e permaneça ilegalmente no território de um Estado‑Membro apresente um pedido de proteção internacional?

    2)

    Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, deve o artigo 8.o, n.os 2 e 3, da Diretiva [2013/33] ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional segundo a qual, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo [maciço] de estrangeiros, um requerente de asilo pode ser detido pelo simples facto de ter entrado no território da República da Lituânia atravessando ilegalmente a fronteira da República da Lituânia?»

    Quanto à tramitação urgente

    32

    O órgão jurisdicional de reenvio pediu que o presente reenvio fosse submetido a tramitação prejudicial urgente, prevista no artigo 107.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

    33

    Em apoio deste pedido, referiu que M.A. tinha sido detido de 17 de novembro de 2021 até à adoção da decisão de reenvio, em 2 de fevereiro de 2022. Por força da referida decisão, M.A. foi colocado num centro de acolhimento do VSAT nas condições referidas no n.o 30 do presente acórdão. O órgão jurisdicional de reenvio acrescentou que a regulamentação aplicável permite ao VSAT, no termo desta medida provisória, fixada em 18 de fevereiro de 2022, requerer novamente ao órgão jurisdicional de primeira instância a detenção do interessado ou a sua sujeição a outra medida.

    34

    Em 21 de fevereiro de 2022, a Primeira Secção do Tribunal de Justiça solicitou ao órgão jurisdicional de reenvio, por um lado, informações relativas à situação de M.A., após o termo da medida ordenada por este órgão jurisdicional, e, por outro, indicações respeitantes, nomeadamente, às restrições à liberdade pessoal decorrentes dessa medida.

    35

    Da resposta do órgão jurisdicional de reenvio resulta que, em 11 de fevereiro de 2022, o Marijampolės apylinkės teismas (Tribunal de Primeira Instância de Marijampole, Lituânia) adotou, em relação a M.A., uma medida análoga à ordenada pelo órgão jurisdicional de reenvio, referida no n.o 30 do presente acórdão. Essa medida foi ordenada até à definição do estatuto jurídico de M.A., no máximo até 11 de maio de 2022.

    36

    Há que referir, em primeiro lugar, que o presente reenvio prejudicial tem por objeto a interpretação das Diretivas 2011/95, 2013/32 e 2013/33 abrangidas pelo título V da terceira parte do Tratado FUE, relativo ao espaço de liberdade, segurança e justiça. Este reenvio é, por conseguinte, suscetível de ser submetido a tramitação prejudicial urgente.

    37

    Em segundo lugar, no que diz respeito ao pressuposto da urgência, importa sublinhar que esse pressuposto está preenchido, nomeadamente, quando a pessoa em causa no processo principal está atualmente privada da liberdade e a manutenção da sua detenção depende da decisão do litígio no processo principal. A esse respeito, a situação da pessoa em causa deve ser apreciada tal como se apresenta à data da análise do requerimento de sujeição do reenvio prejudicial a tramitação urgente (Acórdão de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság, C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 99 e jurisprudência referida).

    38

    Segundo jurisprudência constante, a colocação de um nacional de um país terceiro num centro de detenção, seja na pendência do seu pedido de proteção internacional seja com vista ao seu afastamento, constitui uma medida privativa de liberdade (Acórdão de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság, C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 100 e jurisprudência referida).

    39

    Por outro lado, no que respeita ao conceito de «detenção», na aceção do artigo 2.o, alínea h), da Diretiva 2013/33, o Tribunal de Justiça já declarou que decorre da redação e da génese desta disposição, bem como do contexto em que a mesma se insere, que a detenção de um requerente de proteção internacional constitui uma medida coerciva que priva esse requerente da sua liberdade de circulação e o isola do resto da população, impondo‑lhe que permaneça permanentemente num perímetro restrito e fechado (v., neste sentido, Acórdão de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság, C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 223).

    40

    No presente caso, há que salientar, primeiro, que, à data da análise do requerimento de sujeição do reenvio prejudicial a tramitação urgente, M.A. estava sujeito a uma medida «diferente» da detenção, na aceção do direito lituano, a saber, alojamento em centro de acolhimento do VSAT, ficando a sua liberdade de circulação restrita à área desse local de alojamento.

    41

    A este respeito, das informações transmitidas pelo órgão jurisdicional de reenvio resulta que, embora M.A. pudesse efetivamente circular no interior do centro do VSAT em causa, não podia sair da área deste sem autorização e acompanhamento. Por conseguinte, o interessado encontra‑se isolado do resto da população e privado da sua liberdade de circulação.

    42

    Nestas circunstâncias, essa pessoa deve ser considerada em detenção na aceção do artigo 2.o, alínea h), da Diretiva 2013/33.

    43

    Segundo, quanto à relação entre a manutenção em detenção e a resolução do litígio no processo principal, resulta da decisão de reenvio, por um lado, que a primeira questão submetida tem por objeto a possibilidade de o recorrente no processo principal apresentar um pedido de proteção internacional e, assim, ser qualificado de requerente de asilo. Ora, segundo as indicações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, essa qualificação de requerente de asilo é exigida para que uma medida que não implica a restrição da liberdade de circulação que caracteriza o conceito de detenção possa ser aplicada.

    44

    Por outro lado, a segunda questão prejudicial visa, em substância, determinar se o artigo 8.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2013/33 autoriza a detenção de M.A. pelo simples facto de estar em situação irregular em território lituano.

    45

    Tendo em conta estas considerações, em 3 de março de 2022, a Primeira Secção do Tribunal de Justiça decidiu, sob proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, deferir o pedido do órgão jurisdicional de reenvio de submeter o presente reenvio prejudicial a tramitação prejudicial urgente.

    Quanto às questões prejudiciais

    Quanto à primeira questão

    Quanto à manutenção do objeto da primeira questão

    46

    Na audiência, o Governo lituano referiu que, em 18 de março de 2022, M.A. apresentou um pedido de proteção internacional, atualmente em análise pelas autoridades competentes. Assim, sem sustentar expressamente que esta questão é inadmissível, esse Governo refere que o Tribunal de Justiça já não teria de responder à primeira questão prejudicial, uma vez que esta ficou desprovida do seu objeto.

    47

    O processo instituído pelo artigo 267.o TFUE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União que lhes são necessários para a resolução do litígio que lhes cabe decidir [Acórdão de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Independência da Secção Disciplinar do Supremo Tribunal), C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 69].

    48

    A este respeito, há que referir que a justificação do reenvio prejudicial não é a formulação de opiniões consultivas sobre questões gerais ou hipotéticas, mas a necessidade inerente à resolução efetiva de um litígio. Por conseguinte, se se afigura que as questões submetidas não são manifestamente pertinentes para a resolução do litígio, o Tribunal de Justiça não tem de conhecer do mérito [Acórdão de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Independência da Secção Disciplinar do Supremo Tribunal), C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 70].

    49

    Ora, mesmo admitindo que M.A. tenha efetivamente apresentado um pedido de proteção internacional em 18 de março de 2022, que ainda estaria em análise, resulta da decisão de reenvio que, com a primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende aferir da legalidade das medidas aplicadas a essa pessoa desde a sua primeira tentativa de apresentação do pedido de proteção internacional, que terá ocorrido em 20 de novembro de 2021.

    50

    Daqui resulta que a primeira questão prejudicial continua a ser útil para a resolução do litígio no processo principal e que, portanto, há que responder a essa questão.

    Quanto ao mérito

    51

    No âmbito do processo de cooperação previsto no artigo 267.o TFUE, referido no n.o 47 do presente acórdão, ainda que, no plano formal, o órgão jurisdicional de reenvio tenha limitado a sua questão à interpretação de uma disposição específica do direito da União, essa circunstância não obsta a que o Tribunal de Justiça lhe forneça todos os elementos de interpretação do direito da União que possam ser úteis para a decisão do processo que lhe foi submetido, quer esse órgão jurisdicional lhes tenha ou não feito referência no enunciado das suas questões. A este respeito, cabe ao Tribunal de Justiça extrair do conjunto dos elementos fornecidos pelo órgão jurisdicional nacional, designadamente da fundamentação da decisão de reenvio, os elementos do direito da União que requerem uma interpretação, tendo em conta o objeto do litígio no processo principal (Acórdão de 15 de julho de 2021, DocMorris, C‑190/20, EU:C:2021:609, n.o 23 e jurisprudência referida).

    52

    No presente caso, há que referir que a primeira questão submetida, que incide, nomeadamente, sobre a interpretação do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2011/95, se justifica pelas dúvidas manifestadas pelo órgão jurisdicional de reenvio relativamente às condições nas quais um pedido de proteção internacional pode ser introduzido na Lituânia. Ora, essa disposição diz respeito à avaliação feita pelo Estado‑Membro em causa dos elementos pertinentes desse pedido e, por conseguinte, não se mostra relevante para a resolução do litígio no processo principal.

    53

    Por outro lado, na medida em que a primeira questão prejudicial diz respeito às referidas condições para a apresentação de um pedido de proteção internacional, importa interpretar igualmente o artigo 6.o da Diretiva 2013/32, que prevê as regras relativas à acessibilidade do procedimento de análise desses pedidos.

    54

    Além disso, segundo as indicações do órgão jurisdicional de reenvio, numa situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, o não cumprimento das condições para a apresentação de um pedido de proteção internacional previstas no artigo 14012, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros implica a inadmissibilidade do pedido, o qual, em conformidade com o ponto 23 da descrição do procedimento, é devolvido ao interessado sem ser analisado.

    55

    Daqui decorre, como salienta o advogado‑geral no n.o 58 das suas conclusões, que os nacionais de países terceiros que não preenchem as condições de entrada na Lituânia, em substância, só podem apresentar um pedido de asilo válido neste Estado‑Membro se estiverem no estrangeiro ou na fronteira deste Estado. Em contrapartida, esses nacionais perdem essa possibilidade quando entram ilegalmente no território do referido Estado‑Membro. Com efeito, nestes casos, o pedido não é tido em conta pelas autoridades nacionais.

    56

    Nestas circunstâncias, para responder utilmente à primeira questão, importa considerar que, com esta, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32 devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro segundo a qual, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, os nacionais de países terceiros que estão em situação irregular são efetivamente privados da possibilidade de aceder, no território desse Estado‑Membro, ao procedimento de análise de um pedido de proteção internacional.

    57

    Resulta do artigo 6.o, n.os 1, 3 e 4, da Diretiva 2013/32 que a ação de «apresentar» um pedido de proteção internacional não exige nenhuma formalidade administrativa, devendo tais formalidades ser cumpridas no momento da «apresentação [formal]» do pedido. Com efeito, esta última ação exige, em princípio, que o requerente de proteção internacional preencha um formulário previsto para esse efeito no artigo 6.o, n.o 4, dessa diretiva [v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 93].

    58

    Em especial quanto à referida ação de «apresentar» um pedido de proteção internacional, importa precisar que o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32 prevê que todo o indivíduo adulto, dotado de capacidade jurídica, tenha o direito de apresentar um pedido de proteção internacional em seu próprio nome. Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o nacional de país terceiro ou apátrida tem o direito de formular um pedido de proteção internacional no território de um Estado‑Membro, incluindo nas suas fronteiras ou nas suas zonas de trânsito, mesmo que esteja em situação irregular nesse território. Este direito deve ser‑lhe reconhecido, independentemente das hipóteses de sucesso de tal pedido [Acórdão de 16 de novembro de 2021, Comissão/Hungria (Criminalização da assistência aos requerentes de asilo), C‑821/19, EU:C:2021:930, n.o 136].

    59

    Por outro lado, o artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 2013/32 prevê a obrigação de os Estados‑Membros assegurarem que as pessoas que apresentam um pedido de proteção internacional tenham a possibilidade efetiva de o apresentar [formalmente] o mais rapidamente possível [v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 63].

    60

    A este respeito, há que sublinhar, por um lado, que a apresentação, o registo e a introdução de um pedido devem respeitar o objetivo da Diretiva 2013/32 de garantir um acesso efetivo, a saber, um acesso efetivo tão fácil quanto possível, ao procedimento de concessão da proteção internacional [v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 63].

    61

    Por outro lado, o direito de apresentar tal pedido condiciona, em primeiro lugar, a observância dos direitos a que esse pedido seja registado e possa ser introduzido e examinado dentro dos prazos fixados pela Diretiva 2013/32 e, em segundo lugar, em definitivo, a efetividade do direito de asilo, como garantido pelo artigo 18.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») [v., neste sentido, Acórdão de 17 de dezembro de 2020, Comissão/Hungria (Acolhimento dos requerentes de proteção internacional), C‑808/18, EU:C:2020:1029, n.o 102].

    62

    Assim, embora a apresentação e a introdução de um pedido de proteção internacional constituam fases sucessivas e distintas [v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 93], existe, no entanto, um vínculo estreito entre essas ações, uma vez que visam assegurar, por um lado, o acesso efetivo ao procedimento que permite a análise de um pedido de proteção internacional e, por outro, a efetividade do artigo 18.o da Carta.

    63

    Por conseguinte, há que concluir que a aplicação de uma legislação nacional, como o artigo 14012, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros, que prevê que, pelo simples facto de estar em situação irregular, um nacional de país terceiro é privado, após a sua entrada em território lituano, da possibilidade de apresentar ou introduzir um pedido de proteção internacional, impede, consequentemente, o referido nacional de beneficiar efetivamente do direito consagrado no artigo 18.o da Carta.

    64

    Não se pode considerar que as modalidades de acesso ao procedimento de análise de um pedido de proteção internacional previstas no artigo 14012, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros cumpram os requisitos fixados no artigo 6.o e no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32.

    65

    É certo que, segundo o artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva 2013/32, os Estados‑Membros podem exigir que os pedidos de proteção internacional sejam apresentados presencialmente e/ou em local designado. Contudo, como refere o advogado‑geral no n.o 75 das suas conclusões, os Estados‑Membros não podem exercer essa faculdade de forma a impedir, na prática, esses nacionais, ou mesmo só alguns deles, de formalizarem os seus pedidos ou de os formalizarem «o mais rapidamente possível». A interpretação contrária não respeita o objetivo da Diretiva 2013/32, que consiste em garantir um acesso efetivo, fácil e rápido ao procedimento de concessão de proteção internacional, e prejudica gravemente o efeito útil do direito de requerer asilo, que o artigo 7.o dessa diretiva reconhece a qualquer nacional de país terceiro.

    66

    O mesmo acontece quando o acesso de um nacional de país terceiro ao procedimento referido no artigo 6.o da Diretiva 2013/32 pode ainda assim ser assegurado pelo exercício de um poder discricionário, previsto no artigo 14012, n.o 2, da Lei Relativa aos Estrangeiros, que permite que a autoridade responsável aceite analisar um pedido de proteção internacional devido à vulnerabilidade do requerente ou a outras circunstâncias excecionais.

    67

    A este respeito, basta constatar que, como resulta do n.o 58 do presente acórdão, segundo a redação do artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32 e a jurisprudência do Tribunal de Justiça, «todo o indivíduo adulto» e «o nacional de país terceiro» tem o direito de apresentar um pedido de proteção internacional. Assim, uma disposição nacional, como o artigo 14012, n.o 2, da Lei Relativa aos Estrangeiros, que prevê um poder discricionário da autoridade competente para considerar apenas os pedidos de determinados interessados em situação irregular, devido à respetiva vulnerabilidade, não preenche as condições previstas no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32.

    68

    Contudo, o Governo lituano invoca, a título de justificação das restrições ao direito de apresentar um pedido de proteção internacional decorrentes do artigo 14012, n.o 1, da Lei Relativa aos Estrangeiros, a ameaça à ordem pública ou à segurança interna enfrentada pela República da Lituânia devido ao afluxo maciço de migrantes às suas fronteiras, nomeadamente provenientes da Bielorrússia.

    69

    Nestas circunstâncias, importa referir que, nos termos do artigo 72.o TFUE, as disposições do título V da terceira parte desse Tratado não prejudicam o exercício das responsabilidades que incumbem aos Estados‑Membros em matéria de manutenção da ordem pública e de garantia da segurança interna.

    70

    A este respeito, importa recordar que, ainda que caiba aos Estados‑Membros adotar as medidas adequadas a garantir a ordem pública no seu território, bem como a sua segurança interna e externa, daqui não resulta, porém, que tais medidas escapem totalmente à aplicação do direito da União. Com efeito, como o Tribunal de Justiça já declarou, o Tratado FUE apenas prevê derrogações expressas aplicáveis em caso de situações suscetíveis de pôr em causa a ordem pública ou a segurança pública em situações bastante bem delimitadas. Daí não se pode deduzir que exista uma reserva geral, inerente ao Tratado FUE, que exclua do âmbito de aplicação do direito da União todas as medidas tomadas por razões de ordem pública ou de segurança pública. Reconhecer a existência de tal reserva, para além das condições específicas estabelecidas nas disposições desse tratado, seria correr o risco de pôr em causa o caráter obrigatório e a aplicação uniforme do direito da União [v., neste sentido, Acórdão de 17 de dezembro de 2020, Comissão/Hungria (Acolhimento dos requerentes de proteção internacional), C‑808/18, EU:C:2020:1029, n.o 214].

    71

    Além disso, a derrogação prevista no artigo 72.o TFUE deve ser objeto de interpretação restrita, pelo que este artigo não pode ser interpretado de modo a conferir aos Estados‑Membros o poder de derrogar as disposições do direito da União através da mera invocação de responsabilidades que lhe incumbem com vista à manutenção da ordem pública e à garantia da segurança interna [v., neste sentido, Acórdão de 17 de dezembro de 2020, Comissão/Hungria (Acolhimento dos requerentes de proteção internacional), C‑808/18, EU:C:2020:1029, n.o 215].

    72

    Neste contexto, e tendo em consideração a jurisprudência referida nos n.os 70 e 71 do presente acórdão, o facto de invocar, de um modo geral, ofensas à ordem pública ou à segurança interna causadas pelo afluxo maciço de nacionais de países terceiros não permite justificar, ao abrigo do artigo 72.o TFUE, uma disposição, como o artigo 14012 da Lei Relativa aos Estrangeiros, que leva a privar, de facto, o nacional de país terceiro em situação irregular num Estado‑Membro do direito de apresentar um pedido de proteção internacional no território desse Estado‑Membro.

    73

    Aliás, o Governo lituano não especificou qual seria o efeito dessa medida em matéria de manutenção da ordem pública e de garantia da segurança interna na situação de emergência decorrente do afluxo maciço de migrantes em causa.

    74

    Por outro lado, como resulta dos n.os 125 a 127 e 130 das conclusões do advogado‑geral, a Diretiva 2013/32 permite, designadamente no artigo 43.o, aos Estados‑Membros estabelecerem procedimentos específicos, aplicáveis nas suas fronteiras, destinados a apreciar a admissibilidade de pedidos de proteção internacional em situações nas quais o comportamento do requerente indica que o seu pedido é manifestamente infundado ou abusivo. Esses procedimentos permitem aos Estados‑Membros exercerem, nas fronteiras externas da União, as suas responsabilidades em matéria de manutenção da ordem pública e de garantia da segurança interna, sem que seja necessário recorrer a uma derrogação nos termos do artigo 72.o TFUE.

    75

    Atendendo a todas as considerações expostas, há que responder à primeira questão prejudicial que o artigo 6.o e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32 devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro segundo a qual, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, os nacionais de países terceiros que estão em situação irregular são efetivamente privados da possibilidade de aceder, no território desse Estado‑Membro, ao procedimento de análise de um pedido de proteção internacional.

    Quanto à segunda questão

    Quanto à admissibilidade

    76

    O Governo lituano alegou, em substância, na audiência, que não há que se pronunciar sobre a segunda questão prejudicial, uma vez que, em 2 de fevereiro de 2022, o órgão jurisdicional de reenvio ordenou que M.A. fosse sujeito a uma medida «diferente» da detenção, na aceção do direito lituano, e que essa medida terá sido renovada, em substância, até 11 de maio de 2022.

    77

    Ora, a este respeito, basta recordar que resulta do n.o 42 do presente acórdão que a medida aplicada a M.A. constitui uma detenção na aceção do artigo 2.o, alínea h), da Diretiva 2013/33.

    78

    Neste contexto, importa concluir que há que responder à segunda questão, a qual é admissível.

    Quanto ao mérito

    79

    O órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 8.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2013/33 deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro segundo a qual, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, um requerente de asilo pode ser detido pelo simples facto de estar em situação irregular no território desse Estado‑Membro.

    80

    A título preliminar, há que precisar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, um nacional de país terceiro adquire a qualidade de requerente de proteção internacional, na aceção do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2013/32, a partir do momento em que «apresenta» esse pedido [Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 92].

    81

    Da jurisprudência do Tribunal de Justiça decorre que os artigos 8.o e 9.o da Diretiva 2013/33, em conjugação com os seus considerandos 15 e 20, estabelecem limitações importantes ao poder conferido aos Estados‑Membros para procederem a detenções [Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 101].

    82

    Assim, nos termos do artigo 8.o, n.o 2, da referida diretiva, o requerente de proteção internacional só pode ser detido se, na sequência de uma apreciação individual de cada caso, isso se revelar necessário e se não for possível aplicar de forma eficaz outras medidas alternativas menos coercivas. Daqui resulta que as autoridades nacionais só podem manter em detenção um requerente de proteção internacional depois de terem verificado, casuisticamente, se essa detenção é proporcionada aos efeitos que prossegue [Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.o 102].

    83

    Quanto ao artigo 8.o, n.o 3, da Diretiva 2013/33, decorre de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que esta disposição enumera de forma exaustiva os diferentes motivos suscetíveis de justificar uma detenção e que cada um desses motivos corresponde a uma necessidade específica e reveste caráter autónomo. Atendendo à importância do direito à liberdade consagrado no artigo 6.o da Carta e à gravidade da ingerência nesse direito que uma medida de detenção constitui, as restrições ao seu exercício devem ocorrer na estrita medida do necessário [v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2020, Ministerio Fiscal (Autoridade suscetível de receber um pedido de proteção internacional), C‑36/20 PPU, EU:C:2020:495, n.os 104 e 105].

    84

    Ora, importa referir que o facto de um requerente de proteção internacional estar em situação irregular no território de um Estado‑Membro não figura entre os motivos suscetíveis, em aplicação do artigo 8.o, n.o 3, da Diretiva 2013/33, de justificar a sua detenção. Por conseguinte, um nacional de país terceiro não pode ser sujeito a uma medida de detenção por esse simples motivo.

    85

    Mostra‑se, no entanto, necessário determinar, para proporcionar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio, se essa circunstância pode justificar a detenção de um requerente de asilo pelos motivos de proteção da segurança nacional e da ordem pública mencionados na alínea e) do referido artigo 8.o, n.o 3, como considera, em substância, o Governo lituano. Em particular, segundo este Governo, no contexto excecional representado pelo afluxo maciço de estrangeiros provenientes da Bielorrússia, o comportamento de uma pessoa que se encontra na situação de M.A. constitui uma ameaça à ordem pública e à segurança nacional da República da Lituânia. Na audiência, o Governo deste Estado‑Membro evocou igualmente a ameaça que um nacional estrangeiro na situação de M.A representa para a ordem pública e a segurança pública dos restantes Estados‑Membros da União.

    86

    A este respeito, importa recordar que a delimitação estrita a que está sujeito o poder reconhecido às autoridades nacionais competentes de colocarem um requerente em detenção, com base no artigo 8.o, n.o 3, primeiro parágrafo, alínea e), da Diretiva 2013/33, é igualmente assegurada pela interpretação de que são objeto, na jurisprudência do Tribunal de Justiça, os conceitos de «segurança nacional» e de «ordem pública» que figuram noutras diretivas e que também é aplicável no que respeita à Diretiva 2013/33 (Acórdão de 15 de fevereiro de 2016, N., C‑601/15 PPU, EU:C:2016:84, n.o 64).

    87

    O Tribunal de Justiça já declarou que o conceito de «ordem pública» pressupõe, de qualquer modo, a existência, para além da perturbação da ordem social que qualquer infração à lei constitui, de uma ameaça real, atual e suficientemente grave, que afete um interesse fundamental da sociedade (Acórdão de 15 de fevereiro de 2016, N., C‑601/15 PPU, EU:C:2016:84, n.o 65 e jurisprudência referida).

    88

    Quanto ao conceito de «segurança nacional», este compreende quer a segurança interna de um Estado‑Membro quer a sua segurança externa e, portanto, uma ameaça ao funcionamento das instituições e dos serviços públicos essenciais, bem como a sobrevivência da população, do mesmo modo que o risco de uma perturbação grave das relações externas ou da coexistência pacífica dos povos, ou ainda uma ameaça aos interesses militares, podem afetar a segurança pública (v., neste sentido, Acórdão de 15 de fevereiro de 2016, N., C‑601/15 PPU, EU:C:2016:84, n.o 66 e jurisprudência referida).

    89

    Decorre destas considerações que a ameaça à segurança nacional ou à ordem pública só pode justificar, à luz da exigência de necessidade, a colocação ou a manutenção de um requerente em detenção com base no artigo 8.o, n.o 3, primeiro parágrafo, alínea e), da Diretiva 2013/33 se o seu comportamento individual representar uma ameaça real, atual e suficientemente grave, que afete um interesse fundamental da sociedade ou a segurança interna ou externa do Estado‑Membro em causa (Acórdão de 15 de fevereiro de 2016, N., C‑601/15 PPU, EU:C:2016:84, n.o 67).

    90

    Nestas circunstâncias, a irregularidade da situação de um requerente de proteção internacional não pode ser considerada como demonstrando, por si só, a existência de uma ameaça suficientemente grave, que afete um interesse fundamental da sociedade ou que revele uma ofensa aos interesses mencionados no n.o 89 do presente acórdão. Assim, não é de admitir que esse requerente possa, pelo simples facto de estar em situação irregular num Estado‑Membro, constituir uma ameaça à segurança nacional ou à ordem pública desse Estado‑Membro, na aceção do artigo 8.o, n.o 3, alínea e), da Diretiva 2013/33.

    91

    Esta conclusão não prejudica a possibilidade de se considerar que um requerente de proteção internacional que está em situação irregular num Estado‑Membro constitua uma ameaça dessa natureza devido a circunstâncias específicas que demonstrem a sua perigosidade, o que acresce à irregularidade dessa situação.

    92

    Por último, mesmo que os argumentos do Governo lituano apresentados na audiência possam ser entendidos como invocando a possibilidade de derrogar, devido à situação excecional de afluxo de migrantes, todas disposições da Diretiva 2013/33, com base no artigo 72.o TFUE, há que salientar que esse Governo se limita a invocar, a este respeito, considerações gerais que não são suscetíveis, à luz da jurisprudência referida nos n.os 70 e 71 do presente acórdão, de justificar a aplicação desse artigo.

    93

    Atentas todas as considerações expostas, há que responder à segunda questão prejudicial que o artigo 8.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2013/33 deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro segundo a qual, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, um requerente de asilo pode ser detido pelo simples facto de estar em situação irregular no território desse Estado‑Membro.

    Quanto às despesas

    94

    Revestindo o processo, quanto às partes no processo principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

     

    1)

    O artigo 6.o e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional, devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro segundo a qual, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, os nacionais de países terceiros que estão em situação irregular são efetivamente privados da possibilidade de aceder, no território desse Estado‑Membro, ao procedimento de análise de um pedido de proteção internacional.

     

    2)

    O artigo 8.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro segundo a qual, em caso de declaração de estado de sítio, de estado de emergência ou de situação de emergência devido a um afluxo maciço de estrangeiros, um requerente de asilo pode ser detido pelo simples facto de estar em situação irregular no território desse Estado‑Membro.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: lituano.

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