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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62020CJ0278

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 28 de junho de 2022.
Comissão Europeia contra Reino de Espanha.
Incumprimento de Estado — Responsabilidade dos Estados‑Membros pelos danos causados aos particulares através de violações do direito da União — Violação do direito da União imputável ao legislador nacional — Violação da Constituição de um Estado‑Membro imputável ao legislador nacional — Princípios da equivalência e da efetividade.
Processo C-278/20.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral — Parte «Informações sobre as decisões não publicadas»

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2022:503

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

28 de junho de 2022 ( *1 )

«Incumprimento de Estado — Responsabilidade dos Estados‑Membros pelos danos causados aos particulares através de violações do direito da União — Violação do direito da União imputável ao legislador nacional — Violação da Constituição de um Estado‑Membro imputável ao legislador nacional — Princípios da equivalência e da efetividade»

No processo C‑278/20,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, que deu entrada em 24 de junho de 2020,

Comissão Europeia, representada por J. Baquero Cruz, I. Martínez del Peral e P. Van Nuffel, na qualidade de agentes,

demandante,

contra

Reino de Espanha, representado por L. Aguilera Ruiz, S. Centeno Huerta, A. Gavela Llopis e J. Rodríguez de la Rúa Puig, na qualidade de agentes,

demandado,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, A. Arabadjiev, K. Jürimäe, C. Lycourgos, E. Regan, S. Rodin, I. Jarukaitis (relator) e J. Passer, presidentes de secção, M. Ilešič, J.‑C. Bonichot, M. Safjan, F. Biltgen, P. G. Xuereb, N. Piçarra e L. S. Rossi, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 28 de setembro de 2021,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 9 de dezembro de 2021,

profere o presente

Acórdão

1

Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que, ao adotar e manter em vigor o artigo 32.o, n.os 3 a 6, e o artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Ley 40/2015 de Régimen Jurídico del Sector Público (Lei 40/2015 Relativa ao Regime Jurídico do Setor Público), de 1 de outubro de 2015 (BOE n.o 236, de 2 de outubro de 2015, p. 89411, a seguir «Lei 40/2015»), e o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Ley 39/2015 del Procedimiento Administrativo Común de las Administraciones Públicas (Lei 39/2015 Relativa ao Procedimento Administrativo Comum das Administrações Públicas), de 1 de outubro de 2015 (BOE n.o 236, de 2 de outubro de 2015, p. 89343, a seguir «Lei 39/2015»), o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos princípios da efetividade e da equivalência.

I. Direito espanhol

A. Constituição

2

A Constituição espanhola (a seguir «Constituição») prevê, no seu artigo 106.o, n.o 2, que «[o]s particulares têm o direito, nos termos previstos pela lei, de ser indemnizados por qualquer lesão causada aos seus bens e aos seus direitos, salvo em caso de força maior, quando tal lesão seja consequência do funcionamento dos serviços públicos».

B. Lei Orgânica 6/1985

3

A Ley orgánica 6/1985 del Poder Judicial (Lei Orgânica 6/1985 Relativa ao Poder Judicial), de 1 de julho de 1985 (BOE n.o 157, de 2 de julho de 1985, p. 20632), conforme alterada pela Lei Orgânica 7/2015, de 21 de julho de 2015 (BOE n.o 174, de 22 de julho de 2015, p. 61593) (a seguir «Lei Orgânica 6/1985»), prevê, no seu artigo 4.o bis, n.o 1, que «[o]s juízes e os tribunais aplicarão o direito da [União] em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia».

C. Lei 29/1998

4

A Ley 29/1998 reguladora de la Jurisdicción Contencioso‑Administrativa (Lei 29/1998 Relativa ao Contencioso Administrativo), de 13 de julho de 1998 (BOE n.o 167, de 14 de julho de 1998, p. 23516), conforme alterada pela Ley 20/2013 de garantía de la unidad de mercado (Lei 20/2013 sobre a Garantia da Unidade do Mercado), de 9 de dezembro de 2013 (BOE n.o 295, de 10 de dezembro de 2013, p. 97953) (a seguir «Lei 29/1998»), enuncia, no seu artigo 31.o:

«1.   O demandante pode pedir a declaração de ilegalidade e, se for caso disso, a anulação dos atos e disposições suscetíveis de serem impugnados ao abrigo do capítulo anterior[, intitulado “Atividade administrativa impugnável”].

2.   Pode igualmente pedir o reconhecimento de uma situação jurídica individualizada e a adoção das medidas adequadas para o pleno restabelecimento da mesma, incluindo, sendo caso disso, a indemnização dos danos.»

5

O artigo 32.o, n.o 2, desta lei prevê:

«Quando o recurso tiver por objeto um ato material constitutivo de uma via de facto, o requerente pode pedir que esta seja declarada ilegal, que seja ordenada a cessação desse ato e que sejam adotadas, se for caso disso, as outras medidas previstas no artigo 31.o, n.o 2.»

6

O artigo 37.o, n.os 2 e 3, desta lei tem a seguinte redação:

«2.   Quando vários recursos com um objeto idêntico estiverem pendentes perante um juiz ou um tribunal, este deverá, se esses recursos não tiverem sido apensos, depois de ouvidas as partes num prazo comum de cinco dias, tratar um ou vários deles com prioridade e suspender a tramitação dos demais até ser proferida decisão sobre os primeiros.

3.   Uma vez transitada em julgado a sentença [do processo tratado com prioridade], o secretário […] comunicá‑la‑á aos recorrentes abrangidos pela suspensão, a fim de que estes possam, no prazo de cinco dias, pedir a extensão dos seus efeitos nas condições previstas no artigo 111.o ou a continuação do processo, ou ainda desistir da instância.»

7

O artigo 71.o, n.o 1, alínea d), da mesma lei dispõe:

«Quando a sentença der provimento ao recurso contencioso administrativo:

[…]

d)

Se for julgado procedente um pedido de reparação de danos, o direito à reparação é declarado em todos os casos, sendo também especificado quem é obrigado a indemnizar. […]»

8

Nos termos do artigo 110.o, n.o 1, da Lei 29/1998:

«Em matéria fiscal, de pessoal ao serviço da Administração Pública e de unidade do mercado, os efeitos de uma sentença transitada em julgado que tenha reconhecido uma situação jurídica individualizada a favor de uma ou mais pessoas poderão ser alargados a outras, em execução dessa sentença, desde que se verifiquem as seguintes circunstâncias:

a)

As partes interessadas se encontrem na mesma situação jurídica que as pessoas que beneficiam da sentença favorável.

b)

O juiz ou tribunal que tenha proferido a decisão também seja territorialmente competente para conhecer dos seus pedidos de reconhecimento dessa situação individualizada.

c)

Os interessados solicitem a extensão dos efeitos da sentença dentro do prazo de um ano a contar da última notificação da mesma às pessoas que foram partes no processo. Em caso de interposição de recurso no interesse da lei ou de revisão, este prazo conta‑se a partir da última notificação da decisão que ponha definitivamente termo ao mesmo.»

9

O artigo 111.o desta lei precisa:

«Quando tiver sido decidido suspender a instância em relação a um ou mais recursos em conformidade com as disposições do artigo 37.o, n.o 2, e uma vez declarada definitiva a sentença no processo tratado com prioridade, o secretário pede aos recorrentes abrangidos pela suspensão que indiquem, no prazo de cinco dias, se pretendem alargar os efeitos da sentença ou o prosseguimento do processo suspenso, ou se desistem da instância.

Se for pedida a extensão dos efeitos daquela sentença, o juiz ou o tribunal concedê‑la‑á, salvo se estiver preenchida a circunstância prevista no artigo 110.o, n.o 5, alínea b), ou algumas das causas de inadmissibilidade do recurso previstas no artigo 69.o da presente lei.»

D. Código Geral dos Impostos

10

O artigo 221.o da Ley 58/2003, General Tributaria (Lei 58/2003 que Aprova o Código Geral dos Impostos), de 17 de dezembro de 2003 (BOE n.o 302, de 18 de dezembro de 2003, p. 44987), na versão aplicável aos factos do caso em apreço (a seguir «Código Geral dos Impostos»), dispõe:

«1.   O procedimento para o reconhecimento do direito ao reembolso de pagamentos indevidos será iniciado oficiosamente ou a pedido do interessado nos casos seguintes:

a)

Quando tenha sido feito um pagamento em duplicado de dívidas fiscais ou de sanções.

b)

Quando o montante pago tenha sido superior ao montante a pagar na sequência um ato administrativo ou de uma autoliquidação.

[…]»

E. Lei 39/2015

11

A Lei 39/2015 dispõe, no seu artigo 67.o, sob a epígrafe «Pedidos de abertura de processos por responsabilidade»:

«1.   Os interessados só poderão pedir a abertura de um processo por responsabilidade quando o seu direito de pedir uma reparação não tenha prescrito. O direito de pedir uma reparação prescreve no prazo de um ano após a ocorrência do facto ou ato que dê origem à reparação ou da verificação do seu efeito lesivo. Em caso de dano físico ou psicológico causado às pessoas, o prazo começa a correr a partir da cura ou da determinação do alcance das sequelas.

[…]

Nos casos de responsabilidade a que se refere o artigo 32.o, n.os 4 e 5, da Lei [40/2015], o direito de pedir uma reparação prescreve um ano após a publicação, no Boletín Oficial del Estado ou no Jornal Oficial da União Europeia, conforme o caso, da decisão que declare a inconstitucionalidade da norma ou que a declare contrária ao direito da União […].

[…]»

12

O artigo 106.o, n.o 4, da Lei 39/2015 prevê:

«As Administrações Públicas, ao declararem a nulidade de uma disposição ou de um ato, podem estabelecer, na mesma decisão, as indemnizações que devam ser reconhecidas aos interessados, se estiverem reunidas as circunstâncias previstas [no artigo] 32.o, n.o 2, e [no artigo] 34.o, n.o 1, da [Lei 40/2015] […]»

F. Lei 40/2015

13

A Lei 40/2015 contém, no seu título preliminar, um capítulo IV, intitulado «Da responsabilidade das Administrações Públicas», no qual figuram os artigos 32.o a 37.o desta lei.

14

O artigo 32.o da referida lei, relativo aos princípios que regem a responsabilidade das Administrações Públicas, dispõe:

«1.   Os particulares têm o direito de ser indemnizados pelas Administrações Públicas correspondentes por qualquer lesão causada aos seus bens ou aos seus direitos, sempre que essa lesão seja consequência do funcionamento normal ou anormal dos serviços públicos, salvo em casos de força maior ou de danos que o particular esteja legalmente obrigado a suportar de acordo com a lei.

A anulação, por via administrativa ou por sentença judicial dos tribunais administrativos, dos atos ou disposições administrativas não dá lugar, em si mesma, a um direito a indemnização.

2.   Em qualquer caso, o dano invocado deve ser efetivo, economicamente avaliável e individualizado relativamente a uma pessoa ou a um grupo de pessoas.

3.   Do mesmo modo, os particulares têm o direito de ser indemnizados pelas Administrações Públicas por qualquer lesão causada aos seus bens e aos seus direitos em consequência da aplicação de atos legislativos que não constituam atos de expropriação de direitos, que não estejam legalmente obrigados a suportar, quando assim se preveja nos próprios atos legislativos e nos termos neles especificados.

A responsabilidade do Estado legislador pode igualmente ser desencadeada nos seguintes casos, desde que estejam preenchidos os requisitos previstos nos números anteriores:

a)

Quando os danos resultem da aplicação de uma norma com valor de lei declarada inconstitucional, desde que estejam preenchidos os requisitos previstos no n.o 4.

b)

Quando os danos resultem da aplicação de uma norma contrária ao direito da União […], nos termos do disposto no n.o 5.

4.   Se o dano resultar da aplicação de uma norma com valor de lei declarada inconstitucional, o particular poderá ser indemnizado se tiver obtido, perante qualquer instância, uma sentença transitada em julgado que negue provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano, desde que o particular tenha invocado a inconstitucionalidade posteriormente declarada.

5.   Se o dano resultar da aplicação de uma norma declarada contrária ao direito da União […], o particular pode ser indemnizado se tiver obtido, perante qualquer instância, uma sentença transitada em julgado que negue provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano, desde que o particular tenha invocado a violação do direito da União […] posteriormente declarada. Além disso, devem estar preenchidos todos os seguintes requisitos:

a)

A norma jurídica deve ter por objeto conferir direitos aos particulares.

b)

A violação deve ser suficientemente caracterizada.

c)

Deve existir um nexo de causalidade direto entre a violação da obrigação imposta à Administração responsável pelo direito da União […] e o dano sofrido pelos particulares.

6.   A decisão que declare a inconstitucionalidade da norma com valor de lei ou que declare que a norma é contrária ao direito da União […] produz efeitos a partir da sua publicação no Boletín Oficial del Estado ou no Jornal Oficial da União Europeia, conforme os casos, salvo disposição em contrário nela prevista.

7.   A responsabilidade do Estado pelo funcionamento da administração da justiça rege‑se pela [Ley Orgánica 6/1985 del Poder Judicial (Lei Orgânica 6/1985 Relativa ao Poder Judicial), de 1 de julho de 1985].

[…]»

15

O artigo 34.o da Lei 40/2015, sob a epígrafe «Indemnização», prevê, no seu n.o 1, segundo parágrafo:

«Nos casos de responsabilidade a que se referem os n.os 4 e 5 do artigo 32.o, poderão ser objeto de reparação os danos sofridos nos cinco anos anteriores à da data de publicação da decisão que declare a inconstitucionalidade da norma com valor de lei ou que declare que a norma é contrária ao direito da União […], salvo disposição em contrário nela prevista.»

II. Procedimento pré‑contencioso

16

Na sequência de queixas apresentadas por particulares, a Comissão deu início, em 25 de julho de 2016, a um processo EU Pilot contra o Reino de Espanha relativamente aos artigos 32.o e 34.o da Lei 40/2015. A Comissão invocava uma possível violação dos princípios da equivalência e da efetividade, visto que estes limitam a autonomia de que os Estados‑Membros dispõem quando fixam os requisitos que regem a sua responsabilidade pelas violações do direito da União que lhes são imputáveis. Tendo‑se revelado infrutífero, esse processo foi encerrado e a Comissão iniciou então um processo por infração.

17

Por ofício de 15 de junho de 2017, esta instituição notificou esse Estado‑Membro para apresentar as suas observações quanto às suas preocupações relativas aos artigos 32.o e 34.o da Lei 40/2015, bem como ao artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015, à luz destes dois princípios. Por ofício de 4 de agosto de 2017, o referido Estado‑Membro expôs à referida instituição as razões pelas quais considerava que essas disposições eram compatíveis com os referidos princípios.

18

Discordando dessas explicações, a Comissão emitiu, em 26 de janeiro de 2018, um parecer fundamentado, no qual reiterou e desenvolveu as razões pelas quais considerava que o artigo 32.o, n.os 3 a 6, e o artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015, e o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2005, eram contrários aos mesmos princípios.

19

Na sequência de uma reunião organizada com os serviços da Comissão em 14 de março de 2018, o Reino de Espanha respondeu ao parecer fundamentado por ofício de 26 de março de 2018, mantendo a sua posição. Por ofício de 20 de novembro de 2018, este Estado‑Membro informou, não obstante, a Comissão de que tinha reconsiderado a sua posição e que transmitiria rapidamente um projeto legislativo destinado a pôr o direito espanhol em conformidade com as exigências do direito da União. Este projeto foi transmitido à Comissão em 21 de dezembro de 2018.

20

Em 15 de maio de 2019, na sequência de uma nova reunião organizada em 18 de março de 2019, a Comissão enviou um documento ao Reino de Espanha, expondo as razões pelas quais, em seu entender, considerava que o projeto comunicado poderia pôr termo à violação do princípio da equivalência, sem, contudo, pôr termo à violação do princípio da efetividade.

21

Por ofício de 31 de julho de 2019, o Reino de Espanha indicou que o seu governo não estava em condições de formular novas propostas legislativas, uma vez que estava apenas encarregado de gerir os assuntos correntes (Gobierno en funciones).

22

Nestas condições, a Comissão decidiu intentar a presente ação.

III. Quanto à ação

A. Quanto à admissibilidade

23

O Reino de Espanha alega que a presente ação é inadmissível na medida em que, com a mesma, a Comissão pede a reformulação do regime espanhol da responsabilidade do Estado e visa casos diferentes do da responsabilidade do Estado legislador, o que vai além do objeto da ação conforme fixado no parecer fundamentado.

24

Importa recordar que o objeto de uma ação por incumprimento, nos termos do artigo 258.o TFUE é delimitado no parecer fundamentado da Comissão, de forma que a ação se deve basear nos mesmos fundamentos e argumentos que esse parecer [Acórdão de 24 de junho de 2021, Comissão/Espanha (Deterioração do espaço natural de Doñana), C‑559/19, EU:C:2021:512, n.o 160 e jurisprudência referida].

25

No caso em apreço, é verdade que, na sua petição, a Comissão expôs várias considerações gerais relativas ao regime da responsabilidade do Estado previsto no direito espanhol. No entanto, resulta sem ambiguidade dos pedidos desta petição e da argumentação desenvolvida em seu apoio que, com a presente ação, a Comissão visa apenas que o Tribunal de Justiça declare que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos princípios da efetividade e da equivalência pelo facto de ter adotado e mantido em vigor o artigo 32.o, n.os 3 a 6, e o artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015, e o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015 (a seguir «disposições controvertidas»).

26

Além disso, resulta do parecer fundamentado, anexo à petição, que, neste, a Comissão visava as mesmas disposições que são objeto da presente ação.

27

Por outro lado, tanto no parecer fundamentado como na petição, as referidas disposições só são referidas na medida em que regulam especificamente a responsabilidade do Estado legislador em consequência de uma violação do direito da União que lhe é imputável. Além disso, nesse parecer fundamentado, a Comissão já tinha desenvolvido os mesmos fundamentos e argumentos que os desenvolvidos na petição.

28

Nestas condições, não se pode considerar que haja um alargamento do objeto da ação. Daqui resulta que a exceção de inadmissibilidade invocada a este respeito pelo Reino de Espanha deve ser julgada improcedente e que a presente ação deve ser julgada admissível.

B. Quanto ao mérito

1.   Observações preliminares

29

A título preliminar, importa recordar que o princípio da responsabilidade do Estado pelos danos causados aos particulares por violações do direito da União que lhe sejam imputáveis é inerente ao sistema dos Tratados em que esta última se funda (Acórdão de 26 de janeiro de 2010, Transportes Urbanos y Servicios Generales, C‑118/08, EU:C:2010:39, n.o 29 e jurisprudência referida, e Acórdão de 18 de janeiro de 2022, Thelen Technopark Berlin, C‑261/20, EU:C:2022:33, n.o 42 e jurisprudência referida).

30

Este princípio aplica‑se a qualquer caso de violação do direito da União por um Estado‑Membro, independentemente do órgão do Estado‑Membro cuja ação ou omissão esteja na origem dessa violação, incluindo o legislador nacional, e independentemente da autoridade pública que, nos termos da legislação do Estado‑Membro em causa, seja, em princípio, responsável pela reparação desses danos (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame, C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.os 32 e 36, e de 25 de novembro de 2010, Fuß, C‑429/09, EU:C:2010:717, n.o 46 e jurisprudência referida).

31

No que se refere aos requisitos da responsabilidade do Estado pelos danos causados aos particulares em consequência de violações do direito da União que lhe são imputáveis, o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que os particulares lesados têm direito a reparação, desde que estejam preenchidos três requisitos, a saber, que a norma de direito da União violada tenha por objeto conferir‑lhes direitos, que a violação dessa norma seja suficientemente caracterizada e que haja um nexo de causalidade direto entre essa violação e o dano sofrido pelos particulares (Acórdãos de 26 de janeiro de 2010, Transportes Urbanos y Servicios Generales, C‑118/08, EU:C:2010:39, n.o 30 e jurisprudência referida, e de 18 de janeiro de 2022, Thelen Technopark Berlin, C‑261/20, EU:C:2022:33, n.o 44 e jurisprudência referida).

32

Estes três requisitos são necessários e suficientes para instituir um direito a reparação a favor dos particulares, sem, no entanto, excluírem que a responsabilidade de um Estado‑Membro possa ser acionada, em condições menos restritivas, com base no direito nacional (Acórdãos de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame, C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 66, e de 29 de julho de 2019, Hochtief Solutions Magyarországi Fióktelepe, C‑620/17, EU:C:2019:630, n.o 37 e jurisprudência referida).

33

Sem prejuízo do direito a reparação baseado diretamente no direito da União quando estão preenchidos os requisitos recordados no n.o 31 do presente acórdão, é no âmbito do direito nacional da responsabilidade que incumbe ao Estado reparar as consequências do prejuízo causado, entendendo‑se que os requisitos estabelecidos pelas legislações nacionais em matéria de reparação dos prejuízos não podem ser menos favoráveis do que os aplicáveis a reclamações semelhantes de natureza interna (princípio da equivalência), nem ser organizados de forma a, na prática, tornarem impossível ou excessivamente difícil a obtenção da reparação (princípio da efetividade) (Acórdãos de 26 de janeiro de 2010, Transportes Urbanos y Servicios Generales, C‑118/08, EU:C:2010:39, n.o 31 e jurisprudência referida, e de 4 de outubro de 2018, Kantarev, C‑571/16, EU:C:2018:807, n.o 123).

34

É à luz da jurisprudência referida nos n.os 29 a 33 do presente acórdão que há que examinar a ação da Comissão.

35

Em apoio desta ação, esta última formula duas alegações relativas, a primeira, à violação do princípio da efetividade e, a segunda, à violação do princípio da equivalência. O Reino de Espanha responde, a título principal, que esta ação deve ser julgada liminarmente improcedente com o fundamento de que a Comissão procedeu a uma análise parcial das vias de recurso, disponíveis em Espanha, que permitem a reparação dos danos causados pelo Estado em consequência de uma violação do direito da União, incluindo no âmbito da sua atividade legislativa, o que priva de fundamento a totalidade da referida ação. A título subsidiário, sustenta que nenhuma destas duas alegações é procedente.

36

Há que analisar a argumentação principal do Reino de Espanha antes de examinar cada um dos fundamentos invocados pela Comissão.

2.   Quanto ao facto de a Comissão se focar em certas disposições da ordem jurídica nacional

a)   Argumentos das partes

37

O Reino de Espanha alega que a Comissão se limitou a uma análise parcial das vias de recurso, previstas na ordem jurídica espanhola, que permitem sanar as violações do direito da União por parte dos poderes públicos. Por conseguinte, a análise apresentada em apoio da presente ação é insuficiente para demonstrar o incumprimento imputado e conduz a uma inversão ilegal do ónus da prova.

38

Em primeiro lugar, a possibilidade de responsabilizar o Estado legislador constitui apenas um «mecanismo de aperfeiçoamento do sistema jurídico espanhol» (cláusula de cierre del sistema), ao qual se recorre a título residual ou final e que não pode ser compreendido de forma isolada. Só tendo em conta o conjunto do regime de reparação dos danos causados pelos poderes públicos em Espanha é possível determinar se a regulamentação relativa à responsabilidade do Estado legislador pelos danos causados aos particulares em consequência de uma violação do direito da União é contrária aos princípios da efetividade e da equivalência, o que a Comissão não fez.

39

Assim, o direito espanhol prevê, antes de mais, uma série de processos que permitem pedir a reparação pela ação lesiva dos poderes públicos à margem dos casos de responsabilidade do Estado, nomeadamente, em primeiro lugar, a possibilidade de obter reparação no âmbito do recurso contencioso administrativo contra o ato que causou o dano, previsto no artigo 31.o, n.o 2, no artigo 32.o, n.o 2, e no artigo 71.o, n.o 1, alínea d), da Lei 29/1998, em segundo lugar, o processo de revisão oficiosa dos atos administrativos, previsto no artigo 106.o, n.o 4, da Lei n.o 39/2015, no âmbito do qual a Administração pode conceder uma indemnização, e, em terceiro lugar, o procedimento de repetição do indevido no domínio fiscal, previsto nos artigos 221.o e seguintes do Código Geral dos Impostos.

40

No âmbito desses processos, não existe nenhuma limitação no que respeita à invocação do direito da União nem à possibilidade de um juiz nacional proferir uma decisão acerca do respeito desse direito ou de conceder uma reparação integral. O Reino de Espanha remete, a este respeito, para o artigo 4.o bis da Lei Orgânica 6/1985, para o Acórdão do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) de 7 de fevereiro de 2012 (recurso 419/2010, Acórdão 1425/2012, ES:TS:2012:1425), mediante o qual foi reconhecido o direito do recorrente ao reembolso dos montantes pagos a título de financiamento da tarifa social pelo facto de a portaria em causa ter aplicado uma disposição de um real decreto‑lei, declarada inaplicável devido à sua incompatibilidade com o direito da União e com a jurisprudência do Tribunal Constitucional (Tribunal Constitucional, Espanha).

41

Em seguida, este Estado‑Membro invoca a via processual que permite a extensão dos efeitos de uma sentença, prevista no artigo 37.o, n.o 3, e nos artigos 110.o e 111.o da Lei 29/1998. Esta via permite, estando preenchidos os requisitos enunciados nestas disposições, reconhecer a responsabilidade do Estado decorrente de um acórdão do Tribunal de Justiça que declare a incompatibilidade de uma norma nacional com o direito da União.

42

Por último, em conformidade com o artigo 106.o da Constituição, os particulares têm a possibilidade de ser indemnizados pelas ações dos poderes públicos que lhes causem um prejuízo considerado ilícito, a saber um prejuízo que o particular lesado não tenha a obrigação jurídica de assumir, desde que exista um nexo de causalidade entre o referido prejuízo e a atividade da Administração e que a ação tenha sido intentada dentro do prazo de prescrição previsto. Este processo é implementado pelo artigo 32.o da Lei 40/2015.

43

O n.o 1 deste artigo regula a reparação dos danos sofridos em consequência do funcionamento normal ou anormal dos serviços públicos — sendo o conceito de «serviço público» entendido no sentido amplo da ação administrativa, ou seja, os factos e atos da Administração, incluindo as ações ou omissões puramente materiais — e permite obter a reparação dos prejuízos causados, primeiro, pelos atos adotados em aplicação de leis ou regulamentos conformes com a Constituição ou com o direito em geral, quando exista um sacrifício individual e especialmente intenso, segundo, pelos atos adotados em aplicação de regulamentos declarados ilegais, quer a ilegalidade decorra do direito nacional ou do direito da União, e, terceiro, pelos atos administrativos cuja ilegalidade tenha sido declarada no âmbito de um processo administrativo ou contencioso administrativo, independentemente de essa ilegalidade resultar do direito nacional ou do direito da União.

44

Além disso, o n.o 4 do referido artigo permite obter a reparação dos prejuízos causados pelos atos adotados em aplicação de leis declaradas inconstitucionais, enquanto o n.o 5 do mesmo artigo enuncia um direito à reparação dos prejuízos causados pelos atos adotados em aplicação de leis declaradas incompatíveis com o direito da União pelo Tribunal de Justiça.

45

Por conseguinte, a possibilidade de obter reparação a título da responsabilidade do Estado legislador, conforme regulamentada nos n.os 4 e 5, constitui apenas uma via de recurso específica e residual, oferecida aos particulares que, tendo já intentado outra ação, obtiveram uma decisão desfavorável que não teve em conta, respetivamente, a inconstitucionalidade ou a incompatibilidade da norma em causa com o direito da União.

46

Em segundo lugar, uma análise comparativa do regime da responsabilidade do Estado em Espanha e do regime da responsabilidade extracontratual da União estabelece que não se pode, em caso algum, concluir que o princípio da efetividade foi violado pelo facto de ter sido instituída uma via específica de reparação complementar como a prevista no artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, sendo o regime espanhol mais favorável para os cidadãos do que o regime de responsabilidade da União. Especialmente, a ação de responsabilidade extracontratual da União não pode ser utilizada para contornar a inadmissibilidade de um recurso de anulação que tenha por objeto a mesma ilegalidade e as mesmas finalidades pecuniárias. Em contrapartida, o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 oferece uma via de recurso às pessoas cujas ações foram julgadas improcedentes por sentença transitada em julgado, que acresce à via do recurso contencioso administrativo que já permite o cúmulo de um pedido de anulação e de um pedido de indemnização. Nestas condições, o Reino de Espanha sustenta que o princípio da efetividade não pode ser interpretado de forma diferente consoante o ato lesivo seja cometido por um Estado‑Membro ou por uma instituição da União.

47

Em terceiro lugar, na falta de harmonização a nível da União, a ampla margem de apreciação de que os Estados‑Membros dispõem no que respeita ao estabelecimento do seu regime de responsabilidade extracontratual impôs à Comissão, antes de poder determinar se os princípios em causa são violados em Espanha, que tomasse em consideração o conjunto do regime espanhol relativo à reparação dos danos causados pelo Estado, bem como a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à responsabilidade dos Estados‑Membros e da União.

48

Em quarto lugar, a análise da Comissão padece de um erro de raciocínio que priva de fundamento a totalidade da sua ação. Com efeito, o artigo 32.o, n.o 5, da Lei n.o 40/2015 visa permitir a reparação de um dano em situações que se tornaram definitivas, na medida em que já foram objeto de uma decisão de indeferimento pelas vias de recurso ordinárias, oferecendo uma reparação que, de outro modo, seria impossível. Embora o direito da União permita a um órgão jurisdicional nacional não aplicar uma lei por ser incompatível com o referido direito, não lhe confere o poder de anular uma disposição de nível legislativo com efeitos erga omnes se a ordem jurídica nacional não previr esse poder, nem exige que se indemnize todos os particulares aos quais tenha sido aplicada uma norma jurídica declarada incompatível com o direito da União por um órgão jurisdicional nacional, seja ela qual for. Exige apenas que exista um meio de obter reparação em caso de violação do direito da União, em conformidade com os princípios da efetividade e da equivalência. Ora, tais meios existem no direito espanhol.

49

No entanto, o facto de um juiz nacional chamado a pronunciar‑se por um particular ter declarado, numa sentença, que uma norma com o valor de lei é incompatível com o direito da União não pode ser motivo suficiente para que outro particular possa desencadear, com base nessa sentença, um processo de responsabilidade do Estado no termos do artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015. Esta abordagem seria contrária ao princípio da segurança jurídica. Os efeitos erga omnes de uma declaração de incompatibilidade só se produzem por força de um acórdão do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Constitucional (Tribunal Constitucional) ou em determinados casos de anulação de disposições regulamentares pelos órgãos jurisdicionais a quem foi atribuída essa competência. A Comissão confunde as ações para obtenção de uma indemnização com o regime da responsabilidade do Estado.

50

Por conseguinte, é errado sustentar, como fez a Comissão no procedimento pré‑contencioso, que um cidadão pode, pelo simples facto de outro cidadão ter obtido uma sentença que declara uma norma com valor de lei incompatível com o direito da União, intentar, com base nesta, uma ação fundada em responsabilidade do Estado ao abrigo do artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015. Esta via de recurso só se quando um acórdão do Tribunal de Justiça declara tal norma incompatível com o direito da União, precisamente devido aos efeitos erga omnes desse acórdão.

51

Em todo o caso, a Comissão não pode pôr em causa, com base no princípio da efetividade, a própria maneira como o regime da responsabilidade do Estado está estruturado na ordem jurídica espanhola, ao não prever uma ação direta em matéria de responsabilidade do Estado que possa ser intentada perante um juiz. Um particular que procura obter a reparação de um dano causado pelos poderes públicos deve sempre começar por dirigir‑se à Administração para que esta reconheça a responsabilidade dos poderes públicos, e, se for caso disso, para deferir esse pedido de indemnização, quer essa responsabilidade resulte de um ato da Administração, dos órgãos jurisdicionais ou do legislador. Em caso de indeferimento expresso ou tácito do referido pedido, o particular deve recorrer ao órgão jurisdicional administrativo que está encarregado de apreciar a legalidade da decisão que indefere essa responsabilidade. Em geral, é declarada a ilegalidade e a reparação é obtida no âmbito desse processo.

52

A responsabilidade do Estado resultante de uma declaração de incompatibilidade emitida pelo Tribunal de Justiça, prevista no n.o 5 do artigo 32.o da Lei 40/2015, constitui outra via de reparação, complementar e não exclusiva, acessível àqueles cujos pedidos foram inicialmente indeferidos. A existência desta via de recurso não impede, em caso algum, os juízes nacionais de afastarem a aplicação das leis contrárias ao direito da União e de concederem uma indemnização no âmbito da ação correspondente ou através de uma ação individualizada de responsabilidade. O caráter complementar desta via de recurso é confirmado pelo n.o 3 deste artigo, que introduz a referida via de recurso através do advérbio «igualmente».

53

A Comissão alega que a eventual existência de outras vias de recurso conformes com os princípios da efetividade e da equivalência não garante que o regime aplicável à responsabilidade do Estado legislador esteja em conformidade com estes princípios. Embora as disposições controvertidas devam ser analisadas no seu contexto, o objetivo desta análise é determinar se essas disposições, e não todas as vias de recurso existentes na ordem jurídica nacional, são de molde a garantir a existência de meios adequados e eficazes para fazer respeitar os direitos conferidos pela ordem jurídica da União quando o legislador viola o direito da União. Ora, em razão das referidas disposições, todos os órgãos jurisdicionais espanhóis, qualquer que seja o seu nível, são obrigados a indeferir os pedidos de responsabilidade extracontratual do Estado legislador que não se baseiem num acórdão anterior do Tribunal de Justiça, ou a submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial, antes de tais pedidos poderem ser acolhidos, mesmo que não estejam sujeitos a tal obrigação por força do artigo 267.o TFUE.

54

Os diversos processos invocados pelo Reino de Espanha têm objetos diferentes daquele de um processo destinado a desencadear a responsabilidade do Estado legislador em consequência de uma violação do direito da União, o único em causa no caso em apreço. Por conseguinte, não são pertinentes para efeitos do mesmo.

55

No que respeita, particularmente, ao princípio da efetividade, o meio indireto de obter reparação através da responsabilidade da Administração só pode produzir efeitos quando o Tribunal de Justiça já tiver declarado que a norma com valor de lei em causa é contrária ao direito da União. A este respeito, a Comissão sustenta que, na ordem jurídica espanhola, o órgão jurisdicional competente para conhecer dos recursos interpostos contra atos administrativos não é competente para se pronunciar sobre a questão de saber se disposições legislativas são contrárias ao direito da União. Por conseguinte, se o ato administrativo que viola o direito da União estiver em conformidade com a legislação nacional, esse órgão jurisdicional não pode, nos termos do artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, pedir a reparação do dano causado por essa violação sem submeter uma questão prejudicial, o que seria contrário ao princípio da efetividade.

56

O artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 não pode ser considerado uma disposição residual, uma vez que regulamenta especificamente a reparação dos danos causados por uma norma com valor de lei que se revela contrária ao direito da União. Em todo o caso, se um Estado‑Membro decidir dissociar a responsabilidade do Estado legislador do regime geral da responsabilidade do Estado, sujeitando‑a a disposições específicas, estas devem respeitar os princípios da efetividade e da equivalência.

57

Quanto aos requisitos que regem a responsabilidade extracontratual da União, os mesmos também não são pertinentes no caso em apreço. Da perspetiva do princípio da efetividade apenas se criticam os requisitos processuais previstos no artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, sendo os requisitos materiais que figuram nesta disposição criticados à luz do princípio da equivalência.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

58

A título preliminar, há que observar que, mesmo na hipótese de a argumentação do Reino de Espanha exposta nos n.os 37 a 52 do presente acórdão ser procedente, esta apenas teria incidência na apreciação do fundamento relativo à violação do princípio da efetividade. Com efeito, o fundamento da Comissão relativo a uma violação do princípio da equivalência limita‑se a comparar a ação de responsabilidade do Estado legislador baseada numa violação do direito da União, prevista no artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, com a ação de responsabilidade do Estado legislador baseada numa violação da Constituição, prevista no artigo 32.o, n.o 4, desta lei. Assim, para efeitos da análise desta segunda alegação, é, em todo o caso, irrelevante que o direito espanhol preveja, por outro lado, eventualmente, outras vias de recurso que permitam aos particulares obter a reparação dos danos que lhes tenham sido causados pelos poderes públicos em consequência de uma violação do direito da União.

59

Feita esta precisão, importa recordar, no que respeita, em primeiro lugar, à argumentação do Reino de Espanha exposta nos n.os 38 a 45 do presente acórdão, que, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça ao abrigo do princípio da efetividade, cada caso em que se coloque a questão de saber se uma disposição processual nacional torna, na prática, impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos aos particulares pela ordem jurídica da União deve ser analisado tendo em conta o lugar que essa disposição ocupa no processo, visto como um todo, bem como a tramitação e as particularidades desse processo, tendo em conta, se necessário, os princípios subjacentes ao sistema jurídico nacional em causa, tais como, nomeadamente, o princípio da segurança jurídica e a necessária correta tramitação do processo (Acórdãos de 6 de outubro de 2015, Târşia, C‑69/14, EU:C:2015:662, n.os 36 e 37 e jurisprudência referida, e de 6 de outubro de 2021, Consorzio Italian Management e Catania Multiservizi, C‑561/19, EU:C:2021:799, n.o 63 e jurisprudência referida).

60

No entanto, não resulta daqui que, em todos os casos em que a Comissão considere que uma disposição processual nacional aplicável a uma via de recurso prevista por um Estado‑Membro infringe o princípio da eficácia, essa instituição esteja obrigada, para demonstrar o mérito da sua posição, a examinar sistematicamente todas as vias de recurso existentes no sistema jurídico desse Estado‑Membro. Com efeito, segundo os termos desta jurisprudência, a apreciação do cumprimento do princípio da efetividade não exige a análise de todas as vias de recurso existentes num Estado‑Membro, mas uma análise contextualizada da disposição que alegadamente viola esse princípio, o que pode implicar, como salientou igualmente o advogado‑geral no n.o 40 das suas conclusões, a análise de outras disposições processuais aplicáveis no âmbito da via de recurso cujo caráter efetivo é posto em causa ou das vias de recurso que tenham o mesmo objeto que esta última.

61

Ora, no caso em apreço, a alegação da Comissão baseada numa violação do princípio da efetividade diz apenas respeito a certas modalidades processuais, previstas nas disposições referidas no n.o 25 do presente acórdão, aplicáveis à ação de responsabilidade do Estado por violações do direito da União imputáveis ao legislador.

62

Daqui resulta que a argumentação do Reino de Espanha, reproduzida nos n.os 38 a 45 do presente acórdão, só é suscetível de demonstrar a improcedência do fundamento relativo à violação do princípio da efetividade se um ou vários dos procedimentos ou vias de recurso invocados por esse Estado‑Membro permitirem aos particulares obter a reparação dos danos que lhes foram causados pelo legislador em consequência de uma violação do direito da União.

63

A este respeito, no que se refere, antes de mais, aos processos identificados no n.o 39 do presente acórdão, há que observar que a possibilidade de obter a reparação de um eventual dano no âmbito de um recurso contencioso administrativo, conforme prevista no artigo 31.o, n.o 2, e no artigo 71.o, n.o 1, alínea d), da Lei 29/1998, se distingue, pela sua natureza, do regime de responsabilidade do Estado legislador.

64

É certo que, no que respeita à situação em que, por um lado, o dano decorre de um ato ou uma omissão do legislador, contrário ao direito da União, e, por outro, existe um ato administrativo impugnável, o Reino de Espanha, nas suas alegações e na audiência, remeteu, nomeadamente, para o acórdão do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) mencionado no n.o 40 do presente acórdão, em apoio da sua posição segundo a qual este órgão jurisdicional reconhece que os órgãos jurisdicionais administrativos têm competência para apreciar a conformidade com o direito da União de uma norma com o valor de lei, para a declarar inaplicável num caso concreto devido a essa falta de conformidade, e para dar provimento, em consequência, a um recurso contencioso administrativo que tem por objeto o ato administrativo de aplicação dessa norma, bem como para, se necessário, no âmbito desse processo, restabelecer a situação jurídica do recorrente, neste caso concreto, através do reembolso dos montantes indevidamente pagos.

65

Por conseguinte, não se pode excluir que a via do recurso contencioso administrativo, prevista no artigo 31.o, n.o 2, da Lei 29/1998, conceda a um particular lesado por um ato ou omissão do legislador, contrário ao direito da União, a possibilidade, em certos casos, de ver os seus direitos restabelecidos conforme conferidos pelo direito da União.

66

No entanto, há que salientar que não resulta dos elementos submetidos ao Tribunal de Justiça que será esse o caso em todas as circunstâncias em que um particular sofrer um dano devido a um ato do legislador, nomeadamente quando a disposição do direito da União cuja violação é invocada não permita, devido à falta de efeito direto, a inaplicabilidade da norma com valor de lei impugnada (v., neste sentido, Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 68) ou quando o dano resulte de uma omissão de agir do legislador.

67

A este respeito, embora seja verdade que o Reino de Espanha afirmou na audiência que o direito espanhol não distingue consoante a disposição de direito da União em causa tenha ou não efeito direto, e que o Tribunal de Justiça admite que, com base apenas no direito interno, um órgão jurisdicional nacional pode afastar qualquer disposição do direito nacional contrária a uma disposição do direito da União desprovida de tal efeito (v., neste sentido, Acórdão de 18 de janeiro de 2022, Thelen Technopark Berlin, C‑261/20, EU:C:2022:33, n.o 33), não é menos verdade que, na falta de ato administrativo impugnável, esta via de recurso não está aberta aos particulares, no sentido de que não podem utilizar a referida via para obter reparação do dano que, embora tendo a sua origem num ato ou omissão do legislador nacional, não se materializou num ato administrativo ou quando o pedido de reconhecimento não possa dar lugar à adoção desse ato administrativo com base no artigo 31.o, n.o 2, da Lei 29/1998.

68

Por último, no que respeita à argumentação reproduzida no n.o 51 do presente acórdão, o Reino de Espanha alegou, por um lado, que, no âmbito do processo previsto no artigo 31.o, n.o 2, da Lei 29/1998, era «quase sempre» possível formular pedidos destinados a obter a reparação de um prejuízo decorrente da violação do direito da União pelo legislador, admitindo assim implicitamente que tal não acontece em todas as situações. Por outro lado, o facto de um particular poder desencadear a adoção de um ato administrativo ao apresentar um pedido de indemnização à Administração não permite que o legislador seja responsabilizado em todas as situações visadas pela jurisprudência referida nos n.os 30 e 31 do presente acórdão, uma vez que o próprio Reino de Espanha se referiu, nos seus articulados, ao Acórdão do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal), de 18 de novembro de 2020 (recurso 404/2019, Acórdão 1534/2020, ES:TS:2020:3936), do qual resulta que a norma que violou o direito da União deve ter norteado a atividade administrativa concreta que está na origem dos danos para os quais é pedida indemnização.

69

Por todas as razões expostas nos n.os 64 a 68 do presente acórdão, a existência da via do recurso contencioso administrativo, prevista no artigo 31.o, n.o 2, da Lei 29/1998, não é suficiente para afastar sem mais o primeiro fundamento da Comissão.

70

Do mesmo modo, nem o recurso previsto no artigo 32.o, n.o 2, da Lei n.o 29/1998, que só visa os casos de via de facto da Administração, nem o procedimento de repetição do indevido no domínio fiscal, previsto nos artigos 221.o e seguintes do Código Geral dos Impostos, que visa apenas permitir a um particular recuperar junto da autoridade pública em causa quantias de dinheiro que esta tenha, por hipótese, recebido ilegalmente, podem ser suficientes para este efeito, nomeadamente devido ao seu âmbito de aplicação limitado a domínios muito específicos que não abrangem todas as situações em que a responsabilidade do Estado legislador baseada numa violação do direito da União pode ser desencadeada e dar lugar a uma indemnização.

71

Quanto ao processo de revisão oficiosa dos atos administrativos, previsto no artigo 106.o, n.o 4, da Lei n.o 39/2015, este permite a uma Administração que declare a nulidade de um ato ou de uma disposição estabelecer, na mesma decisão, a indemnização que deve ser reconhecida às pessoas interessadas. No entanto, resulta da redação desta disposição que essa possibilidade só é concedida relativamente aos danos causados pelas Administrações Públicas e nada indica que permita que um particular seja indemnizado por um prejuízo que lhe tenha sido causado por um ato ou omissão de agir do legislador, contrário ao direito da União.

72

Em seguida, no que se refere à via processual que permite a extensão dos efeitos de uma sentença, prevista no artigo 110.o, n.o 1, da Lei 29/1998, a mesma permite que os efeitos de uma sentença transitada em julgado que tenha reconhecido uma situação jurídica individualizada a favor de uma pessoa sejam, nas condições que esta disposição enuncia, alargados a outras pessoas que se encontrem na mesma situação jurídica. Não obstante, o recurso a essa possibilidade pressupõe que esta situação jurídica tenha sido previamente reconhecida. Por conseguinte, ainda que permita alargar o reconhecimento da responsabilidade do legislador nacional por uma violação do direito da União que lhe é imputável a interessados que se encontram na mesma situação jurídica que as pessoas que beneficiaram de uma sentença que lhes reconheceu essa responsabilidade, a aplicação desse processo de extensão exige que essa responsabilidade tenha sido previamente reconhecida no âmbito de uma ação anterior. Por conseguinte, não pode suprir as insuficiências alegadas pela Comissão no âmbito o seu primeiro fundamento.

73

O mesmo se aplica à possibilidade de extensão dos efeitos de uma sentença, prevista no artigo 37.o, n.o 3, e no artigo 111.o da Lei 29/1998, que, em substância, só se aplica aos processos cujo tratamento tenha sido suspenso enquanto se aguardava o resultado definitivo de um processo conexo tratado com prioridade.

74

Por último, quanto à via de recurso que permite precisamente responsabilizar o Estado, importa salientar que, como indica o Reino de Espanha, o artigo 32.o da Lei 40/2015 prevê diferentes casos em que essa responsabilidade pode ser desencadeada. Todavia, só os n.os 3 a 6 deste artigo visam especificamente a responsabilidade do Estado legislador.

75

Assim, o n.o 1 do referido artigo prevê a possibilidade de os particulares serem indemnizados pelas Administrações Públicas correspondentes por qualquer ofensa aos seus bens ou aos seus direitos quando essa violação seja consequência do funcionamento normal ou anormal dos serviços públicos, salvo em caso de força maior ou de danos que, segundo a lei, o particular seja legalmente obrigado a suportar, precisando esta disposição que a anulação, pela via administrativa ou pela via do contencioso administrativo, dos atos ou das disposições administrativas não dá origem, por si só, a um direito a indemnização.

76

Embora esta via de recurso deva ser considerada a via de direito comum para desencadear a responsabilidade do Estado, a sua abertura pressupõe um «funcionamento […] dos serviços públicos», conceito que não se refere ao legislador. Por conseguinte, a referida via não abrange a reparação dos danos causados diretamente por um ato ou omissão do legislador nacional em consequência da violação do direito da União quando esses danos não possam ser imputados a uma atividade dos serviços públicos.

77

De resto, como observou igualmente o advogado‑geral no n.o 57 das suas conclusões, as disposições específicas relativas à responsabilidade do Estado legislador, previstas no artigo 32.o, n.os 3 a 6, da Lei 40/2015, seriam inúteis se se considerasse que a via de recurso prevista no artigo 32.o, n.o 1, desta lei era suficiente para desencadear a responsabilidade do Estado pelos danos causados pelo legislador nacional.

78

Quanto ao n.o 3, primeiro parágrafo, do artigo 32.o da referida lei, relativamente ao qual o Reino de Espanha sublinhou na audiência que constituía a via de recurso geral para desencadear a responsabilidade do Estado legislador, incluindo pelas violações do direito da União que lhe são imputáveis, há que salientar que, como observou este Estado‑Membro, o segundo parágrafo deste n.o 3 especifica que a responsabilidade do Estado legislador pode «igualmente» ser desencadeada quando os requisitos mencionados no n.o 4 ou no n.o 5 deste artigo estiverem preenchidos. Há que deduzir daqui que, como sustenta este Estado‑Membro, as vias de recurso previstas nestes dois últimos números constituem vias de recurso suplementares ou complementares que permitem desencadear a responsabilidade do Estado legislador, nomeadamente em caso de violação do direito da União, que acresce à geral, prevista no primeiro parágrafo do n.o 3 do referido artigo.

79

Contudo, esse primeiro parágrafo sujeita a possibilidade de obter uma indemnização por essa via à condição de o ato legislativo que está na origem dos danos assim o prever e de serem cumpridos os requisitos que esse ato especifica. Ora, além do facto de essa possibilidade parecer, desde logo, inexistente quando o dano resulta de uma omissão de agir do legislador, a mera circunstância de a obtenção de uma indemnização nos termos do referido parágrafo estar sujeita a condição basta para excluir que o ato previsto neste mesmo parágrafo possa ser considerado uma via de direito suscetível de suprir as insuficiências alegadas pela Comissão no que respeita à efetividade do regime de responsabilidade do Estado legislador pelas violações do direito da União que lhe são imputáveis.

80

A circunstância, invocada pelo Reino de Espanha na audiência, de o primeiro parágrafo do n.o 3 do artigo 32.o da Lei 40/2015 ser objeto de uma interpretação maleável pelo Tribunal Supremo (Supremo Tribunal), que o aplica de forma flexível a fim de garantir uma proteção jurisdicional efetiva dos direitos dos particulares, não permite infirmar a conclusão a que se chegou no número anterior.

81

Com efeito, importa recordar que, embora o alcance das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais deva ser apreciado tendo em conta a interpretação dada pelos órgãos jurisdicionais nacionais (Acórdãos de 8 de junho de 1994, Comissão/Reino Unido, C‑382/92, EU:C:1994:233, n.o 36 e jurisprudência referida, e de 16 de setembro de 2015, Comissão/Eslováquia, C‑433/13, EU:C:2015:602, n.o 81 e jurisprudência referida), a existência de jurisprudência, ainda que decorrente de um órgão jurisdicional supremo, não pode, tendo em conta o caráter fundamental do princípio da responsabilidade do Estado por violações do direito da União que lhe são imputáveis (v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2015, Ferreira da Silva e Brito e o., C‑160/14, EU:C:2015:565, n.o 59) e tendo em conta as considerações expostas no n.o 76 do presente acórdão, ser suficiente para garantir com a clareza e precisão exigidas que o artigo 32.o, n.o 3, primeiro parágrafo, da Lei 40/2015 conceda uma via de recurso que permita afastar sem mais as críticas que a Comissão formula no âmbito do seu primeiro fundamento.

82

Por conseguinte, uma vez que nenhum dos processos ou vias legais invocados pelo Reino de Espanha nos n.os 38 a 45 do presente acórdão permite efetivamente aos particulares desencadearem a responsabilidade do Estado legislador para obterem a reparação dos danos que lhes foram causados pelas violações do direito da União imputáveis a esse Estado, não se pode acusar a Comissão de ter centrado a sua análise no n.o 5 do artigo 32.o da Lei 40/2015, lido em conjugação com os n.os 3, 4 e 6 deste artigo, bem como no artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015 e no artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015, uma vez que estas são as únicas disposições nacionais que preveem especificamente a possibilidade de desencadear essa responsabilidade.

83

Em segundo lugar, no que se refere à não tomada em consideração, pela Comissão, do regime da responsabilidade extracontratual da União, decorre da jurisprudência recordada no n.o 59 do presente acórdão que a apreciação da conformidade de uma disposição processual com o princípio da efetividade pressupõe que se efetue essa apreciação não em relação a disposições que estejam previstas noutros sistemas jurídicos, mas tendo em conta o lugar que a disposição em causa ocupa no processo, visto como um todo, a tramitação deste e as suas particularidades, perante as várias instâncias nacionais do Estado‑Membro em causa. Por conseguinte, as críticas apresentadas pelo Reino de Espanha contra o caráter efetivo do regime da responsabilidade extracontratual da União não podem, em todo o caso, levar a que o primeiro fundamento da Comissão seja, sem mais, julgado improcedente.

84

Em terceiro lugar, a margem de discricionariedade de que gozam os Estados‑Membros no estabelecimento do seu regime de responsabilidade pelos danos causados a particulares por violações do direito da União pelas quais são responsáveis não os isenta, no exercício dessa margem de discricionariedade, de cumprir as obrigações que para eles decorrem do direito da União (v., por analogia, Acórdão de 18 de maio de 2021, Asociaţia Forumul Judecătorilor din România e o., C‑83/19, C‑127/19, C‑195/19, C‑291/19, C‑355/19 e C‑397/19, EU:C:2021:393, n.o 111 e jurisprudência referida). Por conseguinte, no âmbito desse exercício, continuam obrigados, nomeadamente, a respeitar o princípio da efetividade.

85

Em quarto lugar, no que se refere à argumentação exposta nos n.os 48 a 51 do presente acórdão, há que observar que a Comissão não pretende pôr em causa a própria forma como o regime da responsabilidade do Estado está estruturado na ordem jurídica espanhola. Com efeito, a presente ação tem unicamente por objeto determinar se o regime da responsabilidade do Estado legislador, como previsto pelas disposições controvertidas, permite aos particulares obter, no respeito pelos princípios da efetividade e da equivalência, a reparação dos danos que lhes sejam causados pelo legislador nacional em consequência de uma violação do direito da União.

86

Ora, uma vez que, por um lado, nenhum dos processos ou vias de recurso invocados pelo Reino de Espanha, mencionados nos n.os 38 a 45 do presente acórdão, permite determinar à partida que assim seja e, por outro, a disposição geral que, segundo as afirmações deste Estado‑Membro na audiência, é pertinente a este respeito, ou seja, o artigo 32.o, n.o 3, primeiro parágrafo, da Lei 40/2015, não concede, como já foi declarado nos n.os 79 a 81 do presente acórdão, a possibilidade efetiva de desencadear, em todas as situações em que a violação do direito da União deve ser objeto de reparação em aplicação da jurisprudência referida nos n.os 30 e 31 do presente acórdão, a responsabilidade do Estado legislador, é necessário que a única via de recurso prevista para esse efeito nos casos de violação do direito da União, ou seja, a prevista no artigo 32.o, n.o 5, desta lei, seja organizada de forma, designadamente, a não tornar impossível ou excessivamente difícil na prática a obtenção de uma indemnização.

87

Por último, por um lado, uma vez que decorre de todas as considerações precedentes que não se pode acusar a Comissão de ter centrado a presente ação apenas nas disposições do direito espanhol relativas à responsabilidade do Estado legislador pelas violações do direito da União que lhe são imputáveis, não se pode considerar que a análise da Comissão tenha levado a uma inversão ilegal do ónus da prova.

88

Por outro lado, tendo em conta todas estas considerações, a circunstância de o regime de responsabilidade do Estado legislador, conforme concebido pelas disposições controvertidas, constituir um «mecanismo de completude do sistema jurídico espanhol» também não tem como consequência que a ação intentada pela Comissão, na medida em que visa contestar apenas a efetividade desse regime de responsabilidade, deva ser, sem mais, julgada improcedente.

89

Resulta de todo o exposto que há que rejeitar a argumentação apresentada a título principal pelo Reino de Espanha e prosseguir o exame da presente ação analisando os fundamentos invocados pela Comissão.

3.   Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do princípio da efetividade

a)   Quanto às disposições do artigo 32.o da Lei 40/2015

90

A Comissão sustenta que os três requisitos cumulativos a que o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 sujeita a reparação dos danos causados aos particulares pelo legislador espanhol em consequência de uma violação do direito da União, considerados isolada ou conjuntamente, tornam, na prática, impossível ou excessivamente difícil a obtenção de uma indemnização.

1) Quanto à primeira parte, relativa ao requisito da existência de uma declaração, pelo Tribunal de Justiça, da incompatibilidade da norma aplicada com o direito da União

i) Argumentos das partes

91

A título preliminar, a Comissão observa que o facto de a reparação do dano causado pelo Estado legislador em consequência de uma violação do direito da União estar subordinada à existência de uma decisão do Tribunal de Justiça que declare a incompatibilidade com o direito da União da norma com valor de lei aplicada decorre do artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, na medida em que esta disposição prevê que o prejuízo deve resultar «da aplicação de uma norma declarada contrária ao direito da União», lido em conjugação com o n.o 6 deste artigo, e o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei n.o 39/2015, que aludem à publicação no Jornal Oficial da União Europeia da decisão que declara que o direito da União foi violado.

92

A este respeito, a Comissão alega, em primeiro lugar, que só as decisões do Tribunal de Justiça proferidas no âmbito de uma ação por incumprimento incluem uma declaração de incompatibilidade do direito nacional com o direito da União. Além disso, ainda que se admita que qualquer decisão do Tribunal de Justiça seja suficiente para cumprir o requisito em causa no âmbito desta primeira parte, é jurisprudência constante que não é indispensável que o Tribunal de Justiça tenha decidido para que a existência de uma violação suficientemente caracterizada do direito da União possa ser demonstrada e que é contrário ao princípio da efetividade fazer depender a reparação do dano causado por uma violação do direito da União imputável a um Estado‑Membro da exigência de uma decisão prévia do Tribunal de Justiça.

93

Em segundo lugar, os órgãos jurisdicionais competentes para conhecer de uma ação de responsabilidade do Estado, incluindo em razão da atividade do legislador, devem ter competência para decidir por eles próprios, para efeitos do processo em causa, quanto a todos os requisitos da responsabilidade do Estado, incluindo o relativo à violação do direito da União, sem terem de se basear num acórdão anterior do Tribunal de Justiça e sem terem necessariamente de interrogar este tribunal a título prejudicial nem aguardar uma decisão do Tribunal de Justiça no âmbito de uma ação por incumprimento. Isso não implica que qualquer órgão jurisdicional deva poder anular uma norma nacional com efeitos erga omnes.

94

Em terceiro lugar, a Comissão salienta que o Reino de Espanha admite que esta via de recurso só pode ser exercida se existir uma decisão prévia do Tribunal de Justiça, mas justifica‑o pelo facto de, quando um órgão jurisdicional nacional tiver negado provimento ao recurso interposto contra o ato administrativo que causou o dano, ser necessária uma decisão do Tribunal de Justiça com efeitos erga omnes para poder, no âmbito de uma ação de indemnização posterior, ultrapassar a força de caso julgado da decisão proferida por esse órgão jurisdicional e garantir a segurança jurídica. No entanto, resulta do Acórdão de 30 de setembro de 2003, Köbler (C‑224/01, EU:C:2003:513), que uma sentença que indefere uma ação que tenha por objeto um ato administrativo só tem, perante qualquer instância, força de caso julgado sobre a validade do ato administrativo e não sobre a existência ou não de um direito a indemnização.

95

O Reino de Espanha alega que o direito espanhol não subordina em caso algum a reparação do dano causado por uma violação do direito da União à existência prévia de uma decisão do Tribunal de Justiça. O recurso contencioso administrativo, a ação de repetição do indevido fiscal ou ainda a ação de responsabilidade do Estado pelos atos das Administrações Públicas não fazem distinção nem contêm especificações nesse sentido.

96

Qualquer órgão jurisdicional espanhol pode declarar uma norma com valor de lei incompatível com o direito da União e pode, quando declara a ilegalidade de um ato, de uma ação ou omissão do legislador nacional por incompatibilidade com o direito da União, afastar a sua aplicação e, eventualmente, conceder a reparação necessária em consequência da anulação do ato, da ação ou da declaração da ilegalidade da omissão sem que seja necessária uma decisão prévia do Tribunal de Justiça que declare essa incompatibilidade. O facto de um caso particular, relacionado com a existência de uma decisão do Tribunal de Justiça que declara a incompatibilidade de uma norma que tem valor de lei com o direito da União, estar previsto no artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 não priva os juízes espanhóis desses poderes. Além disso, qualquer particular, se considerar que nem todos os danos que sofreu foram reparados, embora tenha obtido a anulação do ato ilegal, pode pedir uma indemnização à Administração, nos termos do artigo 4.o bis da Lei orgânica 6/1985 e da Lei 29/1998.

97

Com o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, o direito espanhol prevê, além disso, que, mesmo nos casos em que o pedido de anulação do ato administrativo tenha sido indeferido, tornando‑se este, por conseguinte, definitivo, este caráter definitivo pode ser posteriormente sanado através de uma ação de indemnização dos danos. No entanto, para ultrapassar assim a força de caso julgado da decisão de indeferimento de um órgão jurisdicional espanhol, é necessário um acórdão do Tribunal de Justiça, sem que daí decorra uma violação do princípio da efetividade.

98

A Comissão ignora como funciona o regime de responsabilidade do Estado em Espanha, bem como o poder de revisão exercido pelo órgão jurisdicional administrativo. Através dos seus requisitos específicos, o artigo 32.o, n.o 5, da Lei n.o 40/2015 visa apenas evitar que um particular possa reabrir um processo indemnizatório pelo simples facto de outro particular, noutro órgão jurisdicional nacional, ter obtido uma sentença favorável. Apenas uma sentença com efeito erga omnes pode produzir esse efeito de «revisão» de outras sentenças, sem atentar contra a segurança jurídica e, na ordem jurídica espanhola, só certos órgãos jurisdicionais têm competência para anular com efeitos erga omnes uma disposição de natureza geral.

99

Exigir que se institua uma via autónoma de ação de responsabilidade extracontratual pelos danos causados pelo legislador nacional em consequência de uma violação do direito da União, abstraindo da aplicação individualizada da norma com valor de lei em causa e independentemente do respeito de qualquer prazo para intentar tal ação, iria muito além das exigências do princípio da efetividade e esvaziaria de conteúdo a competência dos Estados‑Membros para regulamentar a responsabilidade extracontratual do Estado.

100

A Comissão comete igualmente um erro quanto ao tipo de decisão referido no artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015. O termo «incumplimiento» não deve ser entendido no sentido de «incumprimento», mas na aceção de «infração» ou de «violação». Por conseguinte, esta disposição não se limita a fazer referência a um acórdão do Tribunal de Justiça proferido no âmbito de um processo instaurado ao abrigo do artigo 258.o TFUE.

ii) Apreciação do Tribunal de Justiça

101

O artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 prevê que, se o dano resultar da aplicação de uma norma declarada contrária ao direito da União, o particular pode ser indemnizado se tiver obtido, perante qualquer instância, uma sentença transitada em julgado que negue provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano, desde que o particular tenha invocado a violação do direito da União posteriormente declarada e na condição de estarem preenchidos os requisitos enunciados nas alíneas a) a c) desta disposição. Por outro lado, é facto assente entre as partes que o termo «norma» utilizado na referida disposição deve ser entendido no sentido de que se refere, à semelhança do n.o 4 do artigo 32.o desta lei, a uma «norma com valor de lei».

102

Por sua vez, o artigo 34.o, n.o 1, da Lei 40/2015 precisa, no seu segundo parágrafo, que, nos casos de responsabilidade referidos no n.o 5 do artigo 32.o desta lei, os danos sofridos nos cinco anos anteriores à data de publicação da decisão que declare que a norma é contrária ao direito da União poderão ser objeto de reparação, salvo disposição em contrário prevista nessa decisão, enquanto o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015 indica que, nesses mesmos casos de responsabilidade, o direito de pedir reparação prescreve um ano após a publicação da referida decisão no Jornal Oficial.

103

Daqui decorre que a Comissão tem razão ao sustentar que as disposições controvertidas estabelecem, como condição para que um particular possa ser indemnizado por um prejuízo que lhe é causado por uma violação do direito da União imputável ao legislador nacional, que essa violação tenha sido previamente declarada pelo Tribunal de Justiça.

104

Ora, o Tribunal de Justiça já declarou que sujeitar a reparação, pelo Estado‑Membro, do dano que causou a um particular ao violar o direito da União à exigência de uma declaração prévia, por parte deste, de uma violação do direito da União imputável ao mesmo Estado‑Membro é contrário ao princípio da efetividade desse direito (v., neste sentido, Acórdão de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame, C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 95). Do mesmo modo, já declarou que a reparação do dano causado por uma violação do direito da União imputável a um Estado‑Membro não pode estar subordinada à exigência de que a existência dessa violação resulte de um acórdão proferido a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça (Acórdão de 26 de janeiro de 2010, Transportes Urbanos y Servicios Generales, C‑118/08, EU:C:2010:39, n.o 38 e jurisprudência referida).

105

Além disso, decorre da jurisprudência recordada no n.o 30 do presente acórdão que estes princípios são válidos independentemente do órgão do Estado‑Membro cuja ação ou omissão esteja na origem da violação do direito da União.

106

Por conseguinte, é indiferente, para apreciar o mérito da presente parte, determinar se, como sustenta a Comissão, as disposições controvertidas exigem que tenha sido proferida uma decisão do Tribunal de Justiça que declare um incumprimento pelo Reino de Espanha de uma das obrigações que lhe incumbem por força do direito da União ou se, como sustenta este Estado‑Membro, estas devem ser entendidas no sentido de que se referem a qualquer decisão do Tribunal de Justiça da qual se possa deduzir a incompatibilidade com o direito da União de um ato ou de uma omissão do legislador espanhol. Com efeito, resulta da jurisprudência recordada no n.o 104 do presente acórdão que, em qualquer caso, a reparação do dano causado por um Estado‑Membro, incluindo pelo legislador nacional, em consequência de uma violação do direito da União não pode, exceto se violar o princípio da efetividade, estar subordinada à pronúncia prévia de uma decisão do Tribunal de Justiça que declare um incumprimento do Estado‑Membro em causa ao direito da União ou da qual resulte a incompatibilidade do ato ou omissão na origem do dano com o direito da União.

107

Não obstante, importa, para este efeito, apreciar se, como sustenta o Reino de Espanha, outras vias legais permitem desencadear a responsabilidade do Estado legislador sem que, no âmbito destas, seja exigida a existência dessa decisão prévia do Tribunal de Justiça.

108

Ora, antes de mais, já foi declarado nos n.os 63 a 82 do presente acórdão que nenhum dos processos ou vias de recurso invocados pelo Reino de Espanha nos n.os 95 e 96, ou nos n.os 38 a 45, garante que um particular possa, em todas as situações em que a violação do direito da União deve ser objeto de reparação em aplicação da jurisprudência referida nos n.os 30 e 31 do presente acórdão, obter uma indemnização adequada dos danos que lhe tenham sido causados por uma violação do direito da União imputável ao legislador.

109

Em seguida, na medida em que a argumentação exposta nos n.os 97 a 99 do presente acórdão corresponde, em substância, àquela já rejeitada nos n.os 85, 86 e 88 do mesmo, esta deve também ser rejeitada pelos mesmos motivos.

110

Por último, na medida em que, com esta argumentação, o Reino de Espanha alega, em substância, que, com a presente ação, a Comissão pretende impor a criação de uma via de recurso que permite a qualquer pessoa responsabilizar o Estado legislador abstraindo de qualquer apreciação individualizada ou do cumprimento de um prazo para interpor tal recurso, há que observar que a mesma assenta numa premissa errada quanto ao âmbito da presente ação e que, por conseguinte, deve ser afastada.

111

Com efeito, embora, com a presente ação, a Comissão pretenda garantir que um particular lesado por uma violação do direito da União imputável ao legislador espanhol possa obter a reparação do seu prejuízo, incluindo na falta de um ato administrativo impugnável, esta instituição não põe de modo nenhum em causa o requisito imposto pelo n.o 2 do artigo 32.o da Lei 40/2015, segundo o qual o dano cuja reparação é pedida deve, nomeadamente, ser individualizado em relação a uma pessoa ou a um grupo de pessoas, e que, por força do n.o 3, segundo parágrafo, deste artigo, também se aplica aos recursos previstos no artigo 32.o, n.o 5, desta lei.

112

Também não contesta que o exercício da ação de responsabilidade do Estado legislador esteja sujeito a um prazo de prescrição, sendo a fixação de prazos razoáveis de recurso sob pena de preclusão, aliás, em princípio, compatível com o princípio da efetividade, mesmo que, por definição, o decurso desses prazos implique a improcedência, total ou parcial, da ação intentada (v., neste sentido, Acórdão de 7 de novembro de 2019, Flausch e o., C‑280/18, EU:C:2019:928, n.o 54 e jurisprudência referida).

113

À luz destes elementos, há que julgar procedente a primeira parte do primeiro fundamento.

2) Quanto à segunda parte, relativa ao requisito segundo o qual o particular lesado deve ter obtido, perante qualquer instância, uma sentença transitada em julgado que negue provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano

i) Argumentos das partes

114

A Comissão alega que, embora o direito da União não se oponha à aplicação de uma regulamentação nacional que prevê que um indivíduo não pode obter a reparação de um dano que, intencionalmente ou por negligência, não tenha conseguido evitar recorrendo a uma via legal, isso só é verdade na condição de a utilização dessa via legal não dar origem a dificuldades excessivas e poder ser razoavelmente exigida ao lesado. Ora, sendo este requisito imposto pelo artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 de forma absoluta e incondicional, o mesmo é contrário ao princípio da efetividade.

115

Nem o facto de a ação de responsabilidade do Estado legislador constituir um mecanismo supletivo do regime geral da responsabilidade do Estado, nem o facto de ser necessário proteger a segurança jurídica, nem o facto de existirem, em Espanha, outras vias processuais para invocar os direitos conferidos pela ordem jurídica da União, permite sanar essa violação do princípio da efetividade.

116

Além disso, a Administração limita‑se frequentemente a adotar atos regulamentares de aplicação das disposições legislativas, sem ter qualquer margem de apreciação, e os legisladores nacionais estão numa posição particular em relação ao direito da União, uma vez que devem respeitar todo o direito primário e derivado da União. Por conseguinte, as violações diretas do direito da União por parte dos legisladores nacionais não são invulgares nem difíceis de prever.

117

Por outro lado, não é pertinente do ponto de vista do princípio da efetividade que a sentença transitada em julgado exigida possa ter sido proferida por qualquer órgão jurisdicional, uma vez que é o próprio requisito de tal sentença que é incompatível com esse princípio, ao não estar prevista nenhuma exceção para os casos em que o exercício da via de recurso exigida cause aos lesados dificuldades excessivas ou em que o mesmo não lhes possa ser razoavelmente exigido.

118

Antes de mais, o Reino de Espanha alega que o requisito em causa no âmbito da segunda parte é imposto devido ao caráter supletivo do regime da responsabilidade do Estado legislador e à necessidade de conciliar o princípio da reparação dos danos causados pelo legislador com o princípio da segurança jurídica. Um dano dificilmente pode ser causado por um ato do legislador na falta de qualquer ato administrativo de aplicação e, para determinar a existência do direito a indemnização, é, em todo o caso, necessário apreciar caso a caso a ilicitude do dano sofrido, uma vez que uma declaração de incompatibilidade de uma disposição com o direito da União não dá automaticamente lugar a um direito a indemnização.

119

Quando o fundamento é relativo à incompatibilidade de uma lei com o direito da União, o particular deve, por isso, justificar as razões pelas quais essa lei lhe causa um dano individualizado e demonstrar que a causa é «a aplicação da lei». Na falta de fundamento que justifique a existência de um «facto danoso», não é possível intentar uma ação de indemnização por via judicial. Os particulares não podem alegar que as leis que têm efeitos temporais extensos e que se revelam incompatíveis com o direito da União dão origem a um direito de indemnização ilimitado no tempo.

120

Em seguida, embora seja exigida uma sentença transitada em julgado a negar provimento ao recurso prévio, não é necessário que as vias de recurso judiciais tenham sido esgotadas, podendo a sentença transitada em julgado, nos termos do artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, ter sido obtida «perante qualquer instância».

121

Por último, e em qualquer caso, o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) interpreta o requisito em causa no âmbito da presente parte num sentido favorável aos particulares, o que garante o respeito pelo princípio da efetividade.

ii) Apreciação do Tribunal de Justiça

122

O artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 prevê que, se o prejuízo resultar da aplicação de uma norma com valor de lei declarada contrária ao direito da União, o particular só pode ser indemnizado se, nomeadamente, tiver obtido, em qualquer instância, uma sentença transitada em julgado a negar provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano.

123

Ora, no que respeita à responsabilidade de um Estado‑Membro pela violação do direito da União, o Tribunal de Justiça já reconheceu que o juiz nacional pode verificar se o lesado atuou com diligência razoável, no sentido de evitar o prejuízo ou de limitar a sua extensão, e se, designadamente, utilizou em tempo útil todas as vias legais à sua disposição. Com efeito, segundo um princípio geral comum aos sistemas jurídicos dos Estados‑Membros, o lesado, correndo o risco de ter de suportar pessoalmente o dano, deve atuar com diligência razoável para limitar a extensão do prejuízo. Em contrapartida, seria contrário ao princípio da efetividade impor aos lesados o recurso sistemático a todas as vias legais à sua disposição, mesmo quando isso criasse dificuldades excessivas ou não lhes pudesse ser razoavelmente exigido (v., neste sentido, Acórdãos de 24 de março de 2009, Danske Slagterier, C‑445/06, EU:C:2009:178, n.os 60 a 62 e jurisprudência referida, e de 4 de outubro de 2018, Kantarev, C‑571/16, EU:C:2018:807, n.os 140 a 142 e jurisprudência referida).

124

Por conseguinte, embora o direito da União não se oponha à aplicação de uma regulamentação nacional que prevê que um particular não pode obter a reparação de um dano cuja ocorrência, intencionalmente ou por negligência, não evitou através da utilização de uma via legal, tal aplica‑se apenas na condição de a utilização desta não ser fonte de dificuldades excessivas ou poder ser razoavelmente exigida à pessoa lesada (v., neste sentido, Acórdão de 24 de março de 2009, Danske Slagterier, C‑445/06, EU:C:2009:178, n.o 69).

125

No caso em apreço, como também salientou o advogado‑geral no n.o 82 das suas conclusões, é precisamente o que prevê o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015. Com efeito, ao contestar em tempo útil o ato administrativo pelo qual ocorre o dano, o particular em causa pode, em princípio, evitar a ocorrência de um prejuízo ou, pelo menos, limitar o seu alcance.

126

Além disso, esta disposição não impõe que o particular tenha esgotado todas as vias de recurso à sua disposição, mas apenas que tenha sido obtida uma sentença transitada em julgado sobre um recurso interposto desse ato administrativo, obtida em qualquer instância, o que é suscetível de facilitar o preenchimento deste requisito.

127

Não obstante, é forçoso observar que, como alega a Comissão, quando o dano resulta de um ato ou omissão do legislador contrário ao direito da União, sem que exista um ato administrativo que o particular possa impugnar, a referida disposição torna impossível a obtenção de uma reparação, não podendo o particular lesado, nesse caso, interpor recurso num órgão jurisdicional como exigido. A este respeito, tendo em conta a jurisprudência recordada no n.o 124 do presente acórdão, está excluído que o particular lesado que se encontra nessa situação seja obrigado, através de um comportamento ativo, a provocar a adoção de um ato administrativo que possa posteriormente impugnar, uma vez que não se poderia considerar, em todo o caso, que esse ato tivesse causado o dano alegado.

128

Por conseguinte, o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 é contrário ao princípio da efetividade, na medida em que não prevê uma exceção para os casos em que o exercício do recurso imposto pelo mesmo seja fonte de dificuldades excessivas ou não possa ser razoavelmente exigido ao lesado, o que acontece quando o dano decorre de um ato ou omissão do legislador, contrário ao direito da União, sem que exista um ato administrativo impugnável.

129

A este respeito, a alegação de que um dano dificilmente poderia resultar, de forma assim imediata, de um ato ou omissão do legislador nacional, não tem incidência nesta apreciação. Por um lado, a circunstância de, na falta de previsão de exceções como as descritas no número anterior, só raramente ser violado o princípio da efetividade não pode justificar a violação deste princípio. Por outro lado, tendo em conta as obrigações específicas que incumbem aos legisladores nacionais em matéria de transposição do direito da União para o direito interno, não é, na realidade, invulgar que a atividade destes esteja, de forma imediata, na origem de um dano causado aos particulares.

130

Do mesmo modo, o facto de, em aplicação do princípio da efetividade, o exercício de um recurso prévio destinado a evitar ou a limitar o prejuízo não poder ser exigido nos casos em que esse exercício é fonte de dificuldades excessivas ou não possa ser razoavelmente exigido ao lesado não significa que o particular que pretenda desencadear a responsabilidade do Estado legislador esteja dispensado de demonstrar, no âmbito de uma ação com esse objeto, que estão preenchidos os requisitos necessários para desencadear essa responsabilidade no seu caso particular. Os argumentos do Reino de Espanha, expostos nos n.os 118 e 119 do presente acórdão, devem, por conseguinte, ser rejeitados.

131

Quanto à afirmação de que o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) interpreta o requisito contestado num sentido favorável aos particulares, deve ser rejeitada por motivos análogos aos expostos no n.o 81 do presente acórdão.

132

Por conseguinte, há que julgar procedente a segunda parte do primeiro fundamento na medida em que o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 sujeita a reparação dos danos causados aos particulares pelo legislador espanhol à condição de o particular lesado ter obtido, perante qualquer instância, uma sentença transitada em julgado a negar provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano, sem prever exceções para os casos em que o dano decorre diretamente de um ato ou omissão do legislador, contrário ao direito da União, quando não exista um ato administrativo impugnável.

3) Quanto à terceira parte, relativa ao requisito segundo o qual o particular lesado deve ter invocado a violação do direito da União no âmbito do recurso interposto do ato administrativo que causou o dano

i) Argumentos das partes

133

A Comissão sustenta que o requisito segundo o qual o particular lesado deve ter invocado a violação do direito da União no âmbito do recurso contra o ato administrativo que causou o dano parece limitar o direito a indemnização aos casos em que a disposição violada do direito da União produz efeito direto, quando na realidade a responsabilidade do Estado pode ser desencadeada mesmo em caso de violação de uma disposição do direito da União que não tenha esse efeito.

134

Ora, uma vez que, segundo a Comissão, quando a disposição violada do direito da União não produz efeito direto, os particulares não podem obter a proteção dos seus direitos perante os órgãos jurisdicionais nacionais através da não aplicação do direito interno e da aplicação do direito da União, seria supérfluo, no que respeita a este tipo de disposições, exigir que a parte lesada tenha invocado a violação do direito da União no âmbito de um processo judicial prévio. Por conseguinte, este requisito torna excessivamente difícil a obtenção de uma reparação dos danos causados pelo legislador nacional em consequência de uma violação do direito da União.

135

Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo facto de os particulares poderem invocar qualquer disposição do direito da União no âmbito de um recurso de anulação de um ato administrativo, uma vez que os órgãos jurisdicionais nacionais só estão obrigados a não aplicar uma medida nacional e a proteger diretamente os direitos conferidos pela ordem jurídica da União no caso de disposições do direito da União com efeito direto.

136

O Reino de Espanha reitera que este requisito é imposto devido ao caráter supletivo do regime da responsabilidade do Estado legislador e à necessidade de conciliar o princípio da reparação dos danos causados pelo legislador com o princípio da segurança jurídica. Assim, a obrigação de invocar, no âmbito de um recurso prévio, a violação do direito da União não é excessiva, uma vez que o recorrente é obrigado a exercer com diligência os seus direitos e o artigo 32.o, n.o 5, da Lei n.o 40/2015 permite reabrir o processo de reparação em situações que se tornaram definitivas.

137

Além disso, o direito espanhol não limita de forma nenhuma o direito a indemnização aos casos em que a disposição violada do direito da União tenha efeito direto. Uma vez que esta hipótese não encontra fundamento nas disposições controvertidas e que o ónus da prova incumbe à Comissão, a presente parte deve, por conseguinte, ser julgada improcedente. Em todo o caso, por um lado, a obrigação de um particular interpor um recurso prévio invocando uma violação do direito da União não significa que só uma disposição com efeito direto possa ser invocada no âmbito desse recurso, podendo ser invocados argumentos relativos à incompatibilidade do direito espanhol com o direito da União, independentemente do efeito direto da norma jurídica da União invocada. Por outro lado, o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) interpreta esta obrigação num sentido favorável aos particulares.

ii) Apreciação do Tribunal de Justiça

138

O artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 prevê, entre os requisitos a que está sujeita a possibilidade de um particular ser indemnizado por um prejuízo resultante de uma violação do direito da União imputável ao legislador nacional, o requisito de esse particular ter invocado, no âmbito do recurso interposto contra o ato administrativo que causou o dano, a violação do direito da União posteriormente reconhecida.

139

A título preliminar, há que precisar que só é necessário analisar a presente parte na medida em que a interposição desse recurso possa ser validamente imposta aos particulares lesados, tendo em conta as considerações expostas nos n.os 125 a 128 do presente acórdão.

140

Com esta parte, a Comissão limita‑se a contestar a conformidade com o princípio da efetividade da obrigação geral, imposta ao particular lesado, de invocar, no âmbito do recurso prévio à ação de responsabilidade que lhe pode ser imposta para evitar o prejuízo ou limitar o seu alcance, a violação do direito da União, uma vez que essa invocação está necessariamente votada ao fracasso quando a disposição do direito da União em causa não tem efeito direto, não podendo a invocação dessa disposição, na falta desse mesmo efeito, evitar ou limitar o seu prejuízo.

141

A este respeito, embora, como alega a Comissão, um órgão jurisdicional nacional não esteja obrigado, apenas com fundamento no direito da União, a não aplicar uma disposição do seu direito nacional contrária a uma disposição do direito da União se esta última disposição não tiver efeito direto (Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski, C‑573/17, EU:C:2019:530, n.o 68), esta consideração não prejudica, no entanto a possibilidade de esse órgão jurisdicional afastar, com fundamento no direito interno, qualquer disposição de direito nacional contrária a uma disposição do direito da União desprovida de efeito direto (Acórdão de 18 de janeiro de 2022, Thelen Technopark Berlin, C‑261/20, EU:C:2022:33, n.o 33).

142

Além disso, o caráter vinculativo das disposições do direito da União, mesmo sem efeito direto, cria para os órgãos jurisdicionais nacionais uma obrigação de interpretação conforme do direito nacional com essas disposições (v., neste sentido, Acórdãos de 13 de novembro de 1990, Marleasing, C‑106/89, EU:C:1990:395, n.os 6 e 8, e de 21 de janeiro de 2021, Whiteland Import Export, C‑308/19, EU:C:2021:47, n.o 30) Essa interpretação está limitada pelos princípios gerais de direito, nomeadamente os princípios da segurança jurídica e da não retroatividade, e não pode servir de fundamento a uma interpretação contra legem do direito nacional (v., neste sentido, Acórdãos de 4 de julho de 2006, Adeneler e o., C‑212/04, EU:C:2006:443, n.o 110, e de 18 de janeiro de 2022, Thelen Technopark Berlin, C‑261/20, EU:C:2022:33, n.o 28).

143

Tendo em conta estes elementos, a argumentação da Comissão deve ser afastada na medida em que, com esta, alega que só as disposições de direito da União com efeito direto podem ser utilmente invocadas no âmbito de um recurso interposto de um ato administrativo que materializa o dano, uma vez que não está excluído que, como afirmou aliás o Reino de Espanha na audiência, os poderes do juiz nacional não variem consoante a disposição de direito da União em causa tenha ou não efeito direto e que este último disponha, com base no direito interno, de poderes mais amplos do que os que lhe são conferidos pelo direito da União. Além disso, uma disposição de direito da União desprovida de efeito direto também pode, consoante o caso, ser invocada para obter uma interpretação do direito nacional que esteja em conformidade com o direito da União.

144

Para todos os efeitos úteis, importa, no entanto, observar que o facto de exigir que o particular lesado tenha, desde a fase prévia do recurso interposto contra o ato administrativo que materializa o dano, e visando a prevenção ou a limitação deste, invocado a violação do direito da União que é posteriormente reconhecida, sob pena de não poder obter a reparação do prejuízo sofrido, pode constituir uma complicação processual excessiva, contrária ao princípio da efetividade. Com efeito, nessa fase, pode ser excessivamente difícil, ou mesmo impossível, antecipar que violação do direito da União acabará por ser reconhecida pelo Tribunal de Justiça.

145

Nestas condições, há que julgar improcedente a terceira parte do primeiro fundamento.

b)   Quanto às disposições do artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015 e do artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015

1) Argumentos das partes

146

A Comissão sustenta que violam igualmente o princípio da efetividade, por um lado, o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015, por força do qual o direito de pedir reparação prescreve um ano após a publicação no Jornal Oficial da decisão que declara a norma com valor de lei em questão contrária ao direito da União e, por outro, o artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015, que limita os danos que podem ser objeto de reparação aos danos ocorridos nos cinco anos anteriores à data dessa publicação, salvo disposição em contrário prevista nessa decisão.

147

Em primeiro lugar, não é aceitável começar a contar o prazo de prescrição da ação a partir de uma data dependente de uma decisão do Tribunal de Justiça que não é necessária para que um órgão jurisdicional nacional possa não só declarar que existe responsabilidade do Estado mas também obrigar o Estado‑Membro em causa a reparar um dano causado em consequência de uma violação do direito da União. Isto teria por efeito converter a decisão prévia do Tribunal de Justiça num elemento constitutivo da responsabilidade do Estado legislador, como confirma aliás a redação do artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, violando assim a jurisprudência do Tribunal de Justiça.

148

Em segundo lugar, a limitação dos danos indemnizáveis aos danos ocorridos nos cinco anos anteriores à publicação da decisão que declara a disposição em causa contrária ao direito da União viola o princípio da efetividade em dois aspetos. Por um lado, esse prazo não pode ser fixado a partir de uma data dependente de uma decisão do Tribunal de Justiça que não pode ser exigida. Por outro lado, tal limitação seria contrária ao princípio da reparação integral do prejuízo, que é inerente ao princípio da efetividade, uma vez que a reparação integral do prejuízo é exigida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, incluindo a atribuição de juros de mora.

149

Se, em princípio, o direito da União não se opõe à aplicação, relativamente aos créditos sobre o Estado, de um prazo de prescrição de cinco anos, desde que se aplique aos créditos semelhantes de direito interno, é evidente no caso em apreço que, uma vez que o sistema criado pelo artigo 32.o, n.os 5 e 6, da Lei 40/2015 requer um longo percurso judicial, é mais do que provável que decorram mais de cinco anos antes de o Tribunal de Justiça proferir a sua decisão. Por conseguinte, devido à duração do processo previsto no artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, a tomada em consideração da referência estabelecida no artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, desta lei poderia impedir a reparação integral do dano sofrido.

150

Quanto à precisão de que a limitação no tempo dos danos indemnizáveis é de cinco anos «salvo disposição em contrário» prevista na decisão que declara a norma com valor de lei contrária ao direito da União, a mesma não figura no artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015, mas no artigo 32.o, n.o 6, desta lei. Por conseguinte, não alude a uma possibilidade concedida ao juiz nacional chamado a decidir sobre um pedido de reparação, mas apenas ao conteúdo de uma decisão do Tribunal de Justiça.

151

O Reino de Espanha responde, no que respeita, em primeiro lugar, ao início do prazo de prescrição da ação em causa, que, uma vez que o requisito de um acórdão prévio do Tribunal de Justiça não é contrário ao princípio da efetividade, a crítica formulada pela Comissão a este respeito deve ser rejeitada. Em todo o caso, qualquer órgão jurisdicional espanhol pode declarar que uma norma com valor de lei é contrária ao direito da União, sem que uma decisão do Tribunal de Justiça seja proferida nesse sentido.

152

Além disso, por um lado, na medida em que o dano resulta, no caso em apreço, de uma norma jurídica com efeito geral, esse prazo só pode começar a correr a partir da publicação da sentença que declara a ilegalidade dessa norma jurídica, uma vez que só essa publicação permite tomar conhecimento dessa ilegalidade e, consequentemente, do prejuízo. Ora, a publicação num jornal oficial figura entre os meios mais eficazes para dar a conhecer um acontecimento jurídico.

153

Por outro lado, o facto de o prazo começar a correr a partir da data de publicação do acórdão não significa que não possa ser intentada uma ação antes dessa data pelas vias de recurso ordinárias, bem como através do regime geral da responsabilidade dos poderes públicos mencionado no artigo 106.o da Constituição e regulado pelo artigo 32.o, n.o 1, da Lei 40/2015.

154

No que respeita, em segundo lugar, à limitação no tempo dos danos indemnizáveis, o Reino de Espanha sustenta que resulta dos n.os 68 e 69 do Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Gutiérrez Naranjo e o. (C‑154/15, C‑307/15 e C‑308/15, EU:C:2016:980), que, não obstante uma declaração de incompatibilidade com o direito da União, é necessário respeitar as situações jurídicas definitivas. A este respeito, sublinha, mais uma vez, que o n.o 5 do artigo 32.o da Lei 40/2015 visa, como o n.o 4 deste artigo, um caso adicional em que é reaberto um prazo que estaria encerrado em aplicação das vias de recurso ordinárias, o que permite obter reparação em casos em que, em princípio, estaria excluída qualquer reparação. Este n.o 5 estabelece, deste modo, uma norma jurídica favorável aos particulares, ao permitir o exercício de uma ação de responsabilidade cujo resultado pode ser contrário a uma sentença que já adquiriu força de caso julgado.

155

Em todo o caso, um particular pode obter a reparação integral do seu prejuízo exercendo as ações adequadas antes de prescreverem, remetendo o Reino de Espanha, a este respeito, para o artigo 34.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Lei 40/2015, aplicável à situação geral da responsabilidade dos poderes públicos referida no artigo 32.o, n.o 1, desta lei.

156

Por outro lado, a jurisprudência não prevê que seja devida uma indemnização por todos os danos relacionados com atos já prescritos. Seria desproporcionado exigir uma reparação absoluta por leis que estão em vigor há décadas. A reparação integral não é um princípio absoluto e há que ter em conta as potenciais consequências para o Tesouro Público.

157

Por último, uma vez que o artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015 precisa que se aplica «salvo disposição em contrário [prevista na decisão que declara a norma contrária ao direito da União]», o órgão jurisdicional que decide sobre a ação de responsabilidade pode modular a indemnização em função das circunstâncias e decidir não aplicar a limitação no tempo dos danos indemnizáveis, como previsto nesta disposição.

2) Apreciação do Tribunal de Justiça

158

No que respeita, em primeiro lugar, à parte da argumentação da Comissão relativa ao artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015, importa recordar que esta disposição prevê que, nos casos de responsabilidade a que se refere o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, o direito de pedir reparação prescreve um ano após a publicação, no Jornal Oficial, da decisão que declara que a norma com valor de lei é contrária ao direito da União. Além disso, a Comissão só critica o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015 na medida em que esta disposição fixa a data em que começa a correr o prazo de prescrição da ação de responsabilidade do Estado legislador por violações do direito da União que lhe sejam imputáveis.

159

Ora, uma vez que, como foi declarado no n.o 106 do presente acórdão, a reparação de um prejuízo causado a um particular pelo legislador nacional em consequência de uma violação do direito da União não pode, sem violar o princípio da efetividade, estar sujeita à condição de existir uma decisão do Tribunal de Justiça que declare um incumprimento do direito da União pelo Estado‑Membro em causa ou da qual resulte a incompatibilidade com o direito da União do ato ou omissão na origem do dano, a publicação dessa decisão no Jornal Oficial também não pode, sem violar esse mesmo princípio, constituir o único ponto de partida possível do prazo de prescrição de uma ação destinada a desencadear a responsabilidade desse legislador pelas violações do direito da União que lhe sejam imputáveis.

160

A este respeito, deve ser rejeitada a afirmação do Reino de Espanha de que um particular lesado pode obter a reparação integral do seu prejuízo com base nas vias de recurso ordinárias ou através do regime geral da responsabilidade dos poderes públicos previsto no artigo 32.o, n.o 1, da Lei 40/2015. Por um lado, como resulta dos n.os 63 a 82 do presente acórdão, nenhum dos outros processos ou vias de recurso invocados pelo Reino de Espanha garante que se possa responsabilizar o Estado por violações do direito da União imputáveis ao legislador nacional em todas as circunstâncias em que um particular sofra um dano em consequência dessa violação por parte do legislador. Por outro lado, a existência dessa decisão constitui, segundo os próprios termos das disposições controvertidas, uma condição que deve necessariamente estar preenchida mesmo antes de tal ação poder ser intentada.

161

Por conseguinte, há que concluir que a parte da argumentação da Comissão relativa ao ponto de partida do prazo de prescrição, previsto no artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Lei 39/2015, é procedente na medida em que esta disposição abrange apenas os casos em que existe uma decisão do Tribunal de Justiça que declara a incompatibilidade, com o direito da União, da norma com valor de lei aplicada.

162

Em segundo lugar, quanto à limitação no tempo dos danos indemnizáveis, importa recordar que o artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015 prevê que, nos casos de responsabilidade a que se refere o n.o 5 do artigo 32.o desta lei, podem ser indemnizados os danos ocorridos nos cinco anos anteriores à data da publicação da decisão que declara a norma com valor de lei em causa contrária ao direito da União, salvo disposição em contrário prevista nessa decisão.

163

Por conseguinte, é forçoso constatar que esta disposição tem por efeito limitar, nos casos de responsabilidade do Estado legislador pelas violações do direito da União que lhe são imputáveis, os danos que podem ser objeto de reparação aos danos ocorridos nos cinco anos anteriores à data da publicação no Jornal Oficial da decisão do Tribunal de Justiça que declara um incumprimento do Reino de Espanha ao direito da União ou da qual resulta a incompatibilidade com o direito da União do ato ou omissão do legislador na origem desses danos.

164

A este respeito, embora, na falta de disposições de direito da União na matéria, caiba à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro determinar o alcance da reparação e as regras relativas à avaliação dos danos causados por uma violação do direito da União, as regulamentações nacionais fixam os critérios que permitem determinar esse alcance e as referidas regras que devem cumprir o princípio da efetividade (v., neste sentido, Acórdãos de 25 de novembro de 2010, Fuß, C‑429/09, EU:C:2010:717, n.o 93 e jurisprudência referida, e de 28 de julho de 2016, Tomášová, C‑168/15, EU:C:2016:602, n.o 39). Assim, o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que a reparação dos danos causados aos particulares por violações do direito da União deve ser adequada ao prejuízo sofrido (v. Acórdãos de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame, C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 82, e de 29 de julho de 2019, Hochtief Solutions Magyarországi Fióktelepe, C‑620/17, EU:C:2019:630, n.o 46), no sentido de que deve permitir, se necessário, compensar integralmente os prejuízos efetivamente sofridos (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de agosto de 1993, Marshall, C‑271/91, EU:C:1993:335, n.o 26, e de 15 de abril de 2021, Braathens Regional Aviation, C‑30/19, EU:C:2021:269, n.o 49).

165

Ora, no caso em apreço, basta constatar que, ao prever, no artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015, que os danos causados pelo legislador aos particulares em consequência de uma violação do direito da União só podem ser indemnizados se tiverem ocorrido nos cinco anos anteriores à data de publicação de uma decisão do Tribunal de Justiça que declare um incumprimento do direito da União por parte do Reino de Espanha ou da qual resulte a incompatibilidade do ato ou omissão do legislador na origem desses danos com o direito da União, o Reino de Espanha obsta a que os particulares lesados possam, em todas as situações, obter uma reparação adequada do seu prejuízo.

166

Com efeito, além de a reparação de um dano causado pelo legislador em consequência de uma violação do direito da União não poder, em caso algum, estar subordinada à existência de tal decisão, essa condição tem por efeito, tendo em conta a duração do processo no termo do qual essa decisão é proferida, a saber um processo de declaração de incumprimento, na aceção do artigo 258.o TFUE, ou um processo de reenvio prejudicial, ao abrigo do artigo 267.o TFUE, tornar, na prática, impossível ou excessivamente difícil a obtenção de tal reparação. Além disso, a duração do processo é ampliada pela aplicação do artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015, para o qual remete o artigo 34.o, n.o 1, desta lei, e que exige uma sentença transitada em julgado do recurso interposto do ato administrativo que causou o dano.

167

Deste modo, a referida condição é igualmente contrária ao princípio da efetividade. A este respeito, o Reino de Espanha não pode, pelos mesmos motivos já expostos, respetivamente, nos n.os 85, 86 e 88 e nos n.os 63 a 82 do presente acórdão, retirar qualquer argumento útil nem do facto de o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 constituir uma via de recurso complementar nem dos outros procedimentos ou vias de recurso que invoca.

168

Da mesma forma, a referência, no artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015, ao facto de uma «disposição em contrário» poder estar «prevista nessa decisão» não corrobora a tese desse Estado‑Membro, uma vez que resulta inequivocamente desta disposição que o termo «decisão» remete, no que respeita aos danos resultantes de uma violação do direito da União imputável ao legislador, para a «decisão […] que declara a norma contrária ao direito da União», ou seja, para uma decisão do Tribunal de Justiça.

169

Atendendo às considerações precedentes, há que concluir que a parte da argumentação da Comissão relativa à limitação no tempo dos danos indemnizáveis, prevista no artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Lei 40/2015, é procedente.

170

Por conseguinte, há que acolher parcialmente o primeiro fundamento, relativo a uma violação do princípio da efetividade.

4.   Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do princípio da equivalência

a)   Argumentos das partes

171

Com o seu segundo fundamento, a Comissão alega que, ao prever, no artigo 32.o, n.o 5, alíneas a) e b), da Lei 40/2015, como condição da responsabilidade do Estado legislador em caso de violação do direito da União, respetivamente, que a norma jurídica violada deve ter por objeto conferir direitos aos particulares e que essa violação deve ser suficientemente caracterizada, o Reino de Espanha não cumpre as obrigações que lhe incumbem por força do princípio da equivalência.

172

Segundo esta instituição, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o princípio da equivalência é pertinente para apreciar não só os requisitos processuais que regem as ações de responsabilidade do Estado pelos danos causados em violação do direito da União mas também os requisitos essenciais que regem a propositura dessas ações. Por conseguinte, o facto de o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 reproduzir os três requisitos que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, são suficientes para desencadear a responsabilidade de um Estado‑Membro pelos danos causados aos particulares em violação do direito da União não é pertinente, uma vez que o direito nacional só pode impor esses três requisitos sem violar o princípio da equivalência se estes se aplicarem igualmente aos pedidos de reparação semelhantes de natureza interna.

173

Ora, no caso em apreço, os dois requisitos mencionados no n.o 171 do presente acórdão não estão previstos no n.o 4 do artigo 32.o da Lei 40/2015 no que respeita à responsabilidade do Estado legislador em caso de violação da Constituição, apesar de resultar do Acórdão de 26 de janeiro de 2010, Transportes Urbanos y Servicios Generales (C‑118/08, EU:C:2010:39), que, tendo em conta o seu objeto e os seus elementos essenciais, as ações de responsabilidade do Estado intentadas com fundamento numa violação do direito da União por uma norma com valor de lei e as intentadas com base numa violação da Constituição por uma norma com valor de lei, declarada pelo Tribunal Constitucional (Tribunal Constitucional), são semelhantes para efeitos da aplicação do princípio da equivalência.

174

O Reino de Espanha alega que o segundo fundamento invocado pela Comissão é improcedente, uma vez que as duas ações em causa não podem ser consideradas semelhantes. Os casos de inconstitucionalidade de uma lei podem ser muito diferentes dos casos de incompatibilidade de uma norma jurídica com o direito da União, podendo certos casos de inconstitucionalidade, nomeadamente, não dizer respeito à violação dos direitos dos particulares. Além disso, existe uma diferença substancial entre a responsabilidade do Estado decorrente de uma violação do direito da União e a que decorre de uma declaração de inconstitucionalidade de uma lei, na medida em que esta última implica a invalidade ex tunc da lei, pelo que os atos administrativos adotados ao abrigo de uma lei posteriormente declarada inconstitucional ficam estão igualmente viciados. Não é esse o caso de uma decisão do Tribunal de Justiça que declara um incumprimento ou de uma decisão proferida no âmbito de um processo prejudicial.

175

Por outro lado, mesmo admitindo que essas duas ações sejam semelhantes, o artigo 32.o, n.o 5, da Lei 40/2015 mais não faz do que codificar os requisitos estabelecidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, com vista a aumentar a segurança jurídica. Estes requisitos são inerentes ao regime da responsabilidade do Estado em Espanha, incluindo nos casos de responsabilidade resultante de uma declaração de inconstitucionalidade de uma norma com valor de lei. Por conseguinte, trata‑se, em todo o caso, de uma diferença meramente formal.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

176

Em conformidade com o que já foi recordado no n.o 33 do presente acórdão, sob reserva do direito a indemnização que encontra diretamente o seu fundamento no direito da União desde que estejam preenchidos os requisitos enunciados no n.o 31 do presente acórdão, é no âmbito do direito nacional da responsabilidade que incumbe ao Estado‑Membro reparar as consequências do prejuízo que causou ao violar o direito da União.

177

Com efeito, na falta de regulamentação da União na matéria, cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro a que pertence designar os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais das ações judiciais destinadas a assegurar a salvaguarda dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União, impondo o princípio da equivalência, todavia, que os requisitos fixados pelas legislações nacionais em matéria de reparação dos danos não sejam menos favoráveis que os relativos a reclamações semelhantes de natureza interna (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de novembro de 1991, Francovich e o., C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.os 41 a 43 e jurisprudência referida, e de 19 de maio de 2011, Iaia e o., C‑452/09, EU:C:2011:323, n.o 16 e jurisprudência referida).

178

O princípio da equivalência visa, assim, enquadrar a autonomia processual de que os Estados‑Membros dispõem quando aplicam o direito da União e este último não prevê nenhuma disposição na matéria. Daqui resulta que, em matéria de responsabilidade do Estado por violação do direito da União, este princípio só se destina a intervir quando essa responsabilidade é desencadeada com fundamento no direito da União e, deste modo, quando os respetivos requisitos, conforme recordados no n.o 31 do presente acórdão, estão preenchidos (v., por analogia, Acórdão de 9 de dezembro de 2010, Combinatie Spijker Infrabouw‑De Jonge Konstruktie e o., C‑568/08, EU:C:2010:751, n.o 92).

179

Com efeito, como salientou igualmente o advogado‑geral no n.o 122 das suas conclusões, este princípio não pode servir de base à obrigação dos Estados‑Membros de permitirem a constituição de um direito a indemnização em condições mais favoráveis do que as previstas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.

180

No caso em apreço, a Comissão pretende, com o segundo fundamento, pôr em causa não as condições em que é posto em prática, em Espanha, o princípio da responsabilidade do Estado pelas violações do direito da União que lhe são imputáveis, conforme precisado pelo Tribunal de Justiça, mas sim os próprios requisitos da responsabilidade do Estado legislador pelas violações do direito da União que lhe são imputáveis, conforme definidos no direito espanhol, relativamente aos quais, de resto, é facto assente que retomam fielmente as condições estabelecidas na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

181

Ora, como decorre da constatação feita no n.o 179 do presente acórdão, mesmo admitindo que os requisitos da responsabilidade do Estado legislador por violações do direito da União que lhe são imputáveis sejam menos favoráveis do que os requisitos da responsabilidade do Estado legislador em caso de violação da Constituição, o princípio da equivalência não se destina a ser aplicado a essa hipótese.

182

Aliás, o Tribunal de Justiça já precisou reiteradamente que, embora os Estados‑Membros possam prever que a sua responsabilidade seja desencadeada em condições menos restritivas do que as enunciadas pelo Tribunal de Justiça, essa responsabilidade deve então ser considerada desencadeada com fundamento não no direito da União, mas no direito nacional (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame, C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.o 66, e de 8 de julho de 2021, Koleje Mazowieckie, C‑120/20, EU:C:2021:553, n.o 62 e jurisprudência referida).

183

De forma geral, o princípio da equivalência não pode, aliás, ser interpretado no sentido de obrigar um Estado‑Membro a alargar o seu regime interno mais favorável a todas as ações intentadas num certo domínio jurídico (Acórdão de 26 de janeiro de 2010, Transportes Urbanos y Servicios Generales, C‑118/08, EU:C:2010:39, n.o 34 e jurisprudência referida).

184

Cabe ainda salientar que é verdade que, como indica a Comissão, o Tribunal de Justiça especificou, por várias vezes, que tanto os requisitos formais como os requisitos substantivos fixados por legislações nacionais em matéria de reparação dos danos causados pelos Estados‑Membros em consequência da violação do direito da União não podem ser, nomeadamente, menos favoráveis do que os relativos a reclamações semelhantes de natureza interna (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de novembro de 1991, Francovich e o., C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.o 43; de 5 de março de 1996, Brasserie du pêcheur e Factortame, C‑46/93 e C‑48/93, EU:C:1996:79, n.os 98 e 99 e jurisprudência referida, e de 17 de abril de 2007, AGM‑COS.MET, C‑470/03, EU:C:2007:213, n.o 89 e jurisprudência referida). Não deixa de ser verdade, como resulta dos próprios termos dessa jurisprudência, que esta precisão se refere sempre aos requisitos fixados pelas legislações nacionais em matéria de reparação dos danos, uma vez que o direito à reparação se constituiu com base no direito da União.

185

Daqui resulta que o segundo fundamento assenta numa leitura errada da jurisprudência do Tribunal de Justiça. Por conseguinte, deve ser julgado improcedente.

186

Atendendo a todas as considerações precedentes, há que declarar que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do princípio da efetividade ao adotar e manter em vigor as disposições controvertidas, na medida em que estas sujeitam a reparação dos danos causados aos particulares pelo legislador espanhol em consequência de uma violação do direito da União:

ao requisito de existir uma decisão do Tribunal de Justiça que declare a incompatibilidade com o direito da União da norma com valor de lei aplicada;

ao requisito de o particular lesado ter obtido, em qualquer instância, uma sentença transitada em julgado que tenha negado provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano, sem prever qualquer exceção para os casos em que o dano decorre diretamente de um ato ou uma omissão do legislador, contrário ao direito da União, quando não exista um ato administrativo impugnável;

a um prazo de prescrição de um ano a contar da publicação no Jornal Oficial da decisão do Tribunal de Justiça que declara a incompatibilidade com o direito da União da norma com valor de lei aplicada, sem abranger os casos em que essa decisão não exista; e

ao requisito de que só possam ser indemnizados os danos ocorridos nos cinco anos anteriores à data dessa publicação, salvo disposição em contrário prevista nessa decisão.

IV. Quanto às despesas

187

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Por força do disposto no artigo 138.o, n.o 3, do Regulamento do Processo, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas.

188

Tendo a Comissão e o Reino de Espanha pedido a condenação da outra parte nas despesas e tendo cada um sido vencido num ou em vários dos seus pedidos, há que decidir que suportarão as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

 

1)

O Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do princípio da efetividade ao adotar e manter em vigor o artigo 32.o, n.os 3 a 6, e o artigo 34.o, n.o 1, segundo parágrafo, da Ley 40/2015 de Régimen Jurídico del Sector Público (Lei 40/2015 Relativa ao Regime Jurídico do Setor Público), de 1 de outubro de 2015, e o artigo 67.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Ley 39/2015 del Procedimiento Administrativo Común de las Administraciones Públicas (Lei 39/2015 Relativa ao Procedimento Administrativo Comum das Administrações Públicas), de 1 de outubro de 2015, na medida em que estas disposições sujeitam a reparação dos danos causados aos particulares pelo legislador espanhol em consequência de uma violação do direito da União:

ao requisito de existir uma decisão do Tribunal de Justiça que declare a incompatibilidade com o direito da União da norma com valor de lei aplicada;

ao requisito de o particular lesado ter obtido, em qualquer instância, uma sentença transitada em julgado que tenha negado provimento a um recurso interposto do ato administrativo que causou o dano, sem prever qualquer exceção para os casos em que o dano decorre diretamente de um ato ou uma omissão do legislador, contrário ao direito da União, quando não exista um ato administrativo impugnável;

a um prazo de prescrição de um ano a contar da publicação no Jornal Oficial da União Europeia da decisão do Tribunal de Justiça que declara a incompatibilidade com o direito da União da norma com valor de lei aplicada, sem abranger os casos em que essa decisão não exista; e

ao requisito de que só possam ser indemnizados os danos ocorridos nos cinco anos anteriores à data dessa publicação, salvo disposição em contrário prevista nessa decisão.

 

2)

A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

 

3)

A Comissão Europeia e o Reino de Espanha suportam as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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