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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62019CJ0559

    Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 24 de junho de 2021.
    Comissão Europeia contra Reino de Espanha.
    Incumprimento de Estado — Artigo 258.o TFUE — Espaço natural protegido de Doñana (Espanha) — Diretiva 2000/60/CE — Quadro de ação da União Europeia no domínio da política da água — Artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), artigo 5.o e artigo 11.o, n.o 1, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4 — Deterioração das massas de águas subterrâneas — Falta de caracterização mais aprofundada das massas de águas subterrâneas identificadas como estando em risco de deterioração — Medidas básicas e medidas suplementares adequadas — Diretiva 92/43/CEE — Artigo 6.o, n.o 2 — Deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies.
    Processo C-559/19.

    Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral — Parte «Informações sobre as decisões não publicadas»

    Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2021:512

     ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

    24 de junho de 2021 ( *1 )

    «Incumprimento de Estado — Artigo 258.o TFUE — Espaço natural protegido de Doñana (Espanha) — Diretiva 2000/60/CE — Quadro de ação da União Europeia no domínio da política da água — Artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), artigo 5.o e artigo 11.o, n.o 1, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4 — Deterioração das massas de águas subterrâneas — Falta de caracterização mais aprofundada das massas de águas subterrâneas identificadas como estando em risco de deterioração — Medidas básicas e medidas suplementares adequadas — Diretiva 92/43/CEE — Artigo 6.o, n.o 2 — Deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies»

    No processo C‑559/19,

    que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, que deu entrada em 22 de julho de 2019,

    Comissão Europeia, representada, inicialmente, por C. Hermes, E. Manhaeve e E. Sanfrutos Cano, em seguida, por C. Hermes, E. Manhaeve e M. Jáuregui Gómez, na qualidade de agentes,

    demandante,

    contra

    Reino de Espanha, representado, inicialmente, por L. Aguilera Ruiz, em seguida, por J. Rodríguez de la Rúa Puig e M‑J. Ruiz Sánchez, na qualidade de agentes,

    demandado,

    O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

    composto por: J.‑C. Bonichot, presidente de secção, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Primeira Secção, M. Safjan, P. G. Xuereb, exercendo funções de juiz da Primeira Secção, e N. Jääskinen (relator), juízes,

    advogado‑geral: J. Kokott,

    secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

    vistos os autos e após a audiência de 17 de setembro de 2020,

    ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 3 de dezembro de 2020,

    profere o presente

    Acórdão

    1

    Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força, por um lado, do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água (JO 2000, L 327, p. 1; retificação no JO 2006, L 113, p. 26), conforme alterada pela Diretiva 2013/64/UE do Conselho, de 17 de dezembro de 2013 (JO 2013, L 353, p. 8) (a seguir «Diretiva 2000/60»), em conjugação com o artigo 1.o, alínea a), e o ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60, do artigo 5.o desta diretiva, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II da mesma, e do artigo 11.o, n.o 1, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4, da referida diretiva, e, por outro, do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO 1992, L 206, p. 7), em conjugação com o artigo 7.o da mesma, no que respeita às massas de águas subterrâneas e aos habitats do espaço natural protegido de Doñana (Espanha).

    I. Quadro jurídico

    A. Diretiva 2000/60

    2

    Nos termos do artigo 1.o da Diretiva 2000/60:

    «O objetivo da presente diretiva é estabelecer um enquadramento para a proteção das águas de superfície interiores, das águas de transição, das águas costeiras e das águas subterrâneas que:

    a)

    Evite a continuação da degradação e proteja e melhore o estado dos ecossistemas aquáticos, e também dos ecossistemas terrestres e zonas húmidas diretamente dependentes dos ecossistemas aquáticos, no que respeita às suas necessidades em água;

    […]

    contribuindo, dessa forma, para:

    o fornecimento em quantidade suficiente de água superficial e subterrânea de boa qualidade, conforme necessário para uma utilização sustentável, equilibrada e equitativa da água,

    […]»

    3

    O artigo 4.o, n.o 1, alíneas b) e c), e n.o 4, desta diretiva dispõe:

    «1.   Ao garantir a operacionalidade dos programas de medidas especificados nos planos de gestão de bacias hidrográficas:

    […]

    b)

    Para as águas subterrâneas

    i)

    Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias a fim de evitar ou limitar a descarga de poluentes nas águas subterrâneas e de evitar a deterioração do estado de todas as massas de água, sob reserva de aplicação dos n.os 6 e 7 e sem prejuízo do disposto no n.o 8 do presente artigo, sob condição de aplicação da alínea j) do n.o 3 do artigo 11.o;

    ii)

    Os Estados‑Membros protegerão, melhorarão e reconstituirão todas as massas de água subterrâneas, garantirão o equilíbrio entre as captações e as recargas dessas águas, com o objetivo de alcançar um bom estado das águas subterrâneas, 15 anos, o mais tardar, a partir da entrada em vigor da presente diretiva, de acordo com o disposto no anexo V, sem prejuízo da aplicação das prorrogações determinadas nos termos do n.o 4 e da aplicação dos n.os 5, 6 e 7, bem como do n.o 8 do presente artigo e sob condição de aplicação da alínea j) do n.o 3 do artigo 11.o;

    iii)

    Os Estados‑Membros aplicarão as medidas necessárias para inverter quaisquer tendências significativas persistentes para o aumento da concentração de poluentes que resulte do impacto da atividade humana, por forma a reduzir gradualmente a poluição das águas subterrâneas.

    […]

    c)

    Para as zonas protegidas

    Os Estados‑Membros darão cumprimento a quaisquer normas e objetivos o mais tardar 15 anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva, exceto nos casos em que a legislação comunitária ao abrigo da qual tenha sido criada uma determinada zona protegida preveja outras condições, através da aplicação gradual das medidas tomadas nos termos do artigo 11.o

    […]

    4.   Os prazos estabelecidos no n.o 1 podem ser prorrogados para efeitos de uma realização gradual dos objetivos para as massas de água, desde que não se verifique mais nenhuma deterioração no estado da massa de água afetada ou se verifiquem todas as seguintes condições:

    […]»

    4

    O artigo 5.o da referida diretiva prevê:

    «1.   Cada Estado‑Membro garantirá que, em relação a cada região hidrográfica ou a cada secção de uma região hidrográfica internacional que abranja o seu território, se realizarão, de acordo com as especificações técnicas definidas nos anexos II e III:

    uma análise das respetivas características,

    um estudo do impacto da atividade humana sobre o estado das águas de superfície e sobre as águas subterrâneas, e

    uma análise económica da utilização da água,

    que deverão estar concluídos o mais tardar quatro anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva.

    2.   As análises e estudos referidos no n.o 1 serão revistos e, se necessário, atualizados o mais tardar 13 anos a contar da data de entrada em vigor da presente diretiva e, posteriormente, de seis em seis anos.»

    5

    O artigo 11.o da mesma diretiva dispõe:

    «1.   Cada Estado‑Membro assegurará, para cada região hidrográfica ou para a parte de qualquer região hidrográfica internacional que pertença ao seu território, o estabelecimento de um programa de medidas, tendo em conta os resultados das análises exigidas nos termos do artigo 5.o, com o objetivo da prossecução dos objetivos definidos no artigo 4.o Esses programas de medidas podem fazer referência a medidas decorrentes de legislação adotada a nível nacional e abrangendo todo o território de um Estado‑Membro. Sempre que necessário, os Estados‑Membros podem adotar medidas aplicáveis a todas as regiões hidrográficas e/ou às partes das regiões hidrográficas internacionais situadas no seu território.

    2.   Cada programa de medidas inclui as medidas “básicas” especificadas no n.o 3 e, se necessário, medidas “suplementares”.

    3.   As “medidas básicas” são os requisitos mínimos a cumprir e consistirão no seguinte:

    a)

    Medidas necessárias para a execução da legislação comunitária de proteção da água, incluindo as medidas exigidas ao abrigo da legislação prevista no artigo 10.o e na parte A do anexo VI;

    […]

    c)

    Medidas destinadas a promover uma utilização eficaz e sustentável da água, a fim de evitar comprometer a realização dos objetivos especificados no artigo 4.o;

    […]

    e)

    Controlo das captações de águas doces de superfície e subterrâneas, bem como do represamento de águas doces de superfície, incluindo um registo ou registos das captações de água e a exigência de autorização prévia para a captação e represamento. Esses controlos serão revistos periodicamente e atualizados, se necessário. Os Estados‑Membros podem isentar desses controlos as captações ou represamentos que não tenham um impacto significativo sobre o estado das águas;

    […]

    4.   As “medidas suplementares” são medidas concebidas e aplicadas, para além das medidas básicas, com a finalidade de alcançar os objetivos estabelecidos nos termos do artigo 4.o A parte B do anexo VI contém uma lista exemplificativa dessas medidas.

    Os Estados‑Membros podem adotar, além destas, outras medidas suplementares para conseguir uma maior proteção ou uma melhoria adicional das águas abrangidas pela presente diretiva, inclusivamente em execução dos acordos internacionais relevantes a que se refere o artigo 1.o

    […]»

    6

    O ponto 2.1 do anexo II da Diretiva 2000/60, sob a epígrafe «Caracterização inicial», enuncia:

    «Os Estados‑Membros procederão a uma primeira caracterização de todas as massas de águas subterrâneas a fim de avaliar as suas utilizações e o grau de risco de não se cumprirem os objetivos definidos no artigo 4.o para cada massa de águas subterrâneas. Os Estados‑Membros poderão agrupar massas de águas subterrâneas para efeitos desta caracterização inicial. Para esta análise, poderão utilizar dados já existentes em matéria de hidrologia, geologia, pedologia, ordenamento do território, descargas, captação e outros, mas deverão identificar:

    a localização e os limites de cada massa de águas subterrâneas

    as pressões a que a massa ou massas de águas subterrâneas são suscetíveis de ser sujeitas, incluindo:

    fontes difusas de poluição,

    fontes tópicas de poluição,

    captação,

    […]»

    7

    O ponto 2.2 do anexo II desta diretiva, sob a epígrafe «Caracterização mais aprofundada», enuncia:

    «Após esta primeira caracterização, os Estados‑Membros procederão a uma caracterização mais aprofundada das massas ou grupos de massas de águas subterrâneas que tenham sido consideradas em situação de risco, de forma a permitir uma avaliação mais precisa da importância desse risco e a identificação das medidas necessárias nos termos do artigo 11.o Assim, esta caracterização incluirá informações relevantes sobre o impacto das atividades humanas e também informações pertinentes sobre:

    as características geológicas da massa de águas subterrâneas, incluindo a extensão e o tipo das unidades geológicas,

    as características hidrogeológicas da massa de águas subterrâneas, incluindo a condutividade hidráulica, a porosidade e o confinamento,

    as características dos solos e depósitos de superfície na área de drenagem que alimenta a massa de águas subterrâneas, nomeadamente a espessura, a porosidade, a condutividade hidráulica e as propriedades de absorção desses solos e depósitos,

    as características de estratificação das águas no interior da massa de águas subterrâneas,

    o inventário dos sistemas de superfície associados, incluindo ecossistemas terrestres e massas de águas de superfície, com os quais a massa de águas subterrâneas está dinamicamente relacionada,

    estimativas das direções e caudais de transferência de águas entre a massa de águas subterrâneas e os sistemas de superfície associados,

    dados suficientes para calcular a taxa de recarga global média anual a longo prazo,

    caracterização da composição química das águas subterrâneas, incluindo a especificação do contributo da atividade humana. Os Estados‑Membros podem usar tipologias para a caracterização das águas subterrâneas quando estabelecerem os níveis de fundo naturais para essas massas de água.»

    8

    O ponto 2.1.2 do anexo V da referida diretiva, sob a epígrafe «Definição do estado quantitativo», define o «nível freático» do seguinte modo:

    «O nível da água na massa de águas subterrâneas é tal que os recursos hídricos subterrâneos disponíveis não são ultrapassados pela taxa média anual de captação a longo prazo.

    Assim, os níveis freáticos não estão sujeitos a alterações antropogénicas que possam:

    impedir que sejam alcançados os objetivos ambientais especificados nos termos do artigo 4.o para as águas de superfície que lhe estão associadas,

    deteriorar significativamente o estado dessas águas,

    provocar danos significativos nos ecossistemas terrestres diretamente dependentes do aquífero. Podem ocorrer temporariamente, ou continuamente em áreas limitadas, alterações na direção do escoamento subterrâneo em consequência de variações de nível, desde que essas alterações não provoquem intrusões de água salgada, ou outras, e não indicam uma tendência antropogenicamente induzida, constante e claramente identificada, suscetível de conduzir a tais intrusões.»

    B. Diretiva 92/43

    9

    O artigo 1.o, alínea e), da Diretiva 92/43 tem a seguinte redação:

    «Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

    […]

    e)

    Estado de conservação de um habitat natural: o efeito de conjunto das influências que atuam sobre o habitat natural em causa, bem como sobre as espécies típicas que nele vivem, suscetíveis de afetar a longo prazo a sua repartição natural, a sua estrutura e as suas funções, bem como a sobrevivência a longo prazo das suas espécies típicas no território referido no artigo 2.o

    O “estado de conservação” de um habitat natural será considerado “favorável” sempre que:

    a sua área de repartição natural e as superfícies que dentro dela abrange forem estáveis ou estiverem em expansão

    e

    a estrutura e as funções específicas necessárias à sua manutenção a longo prazo existirem e forem suscetíveis de continuar a existir num futuro previsível

    e

    o estado de conservação das espécies típicas for favorável na aceção da alínea i).»

    10

    O artigo 6.o, n.os 2 e 3, desta diretiva prevê:

    «2.   Os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como as perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações possam vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objetivos da presente diretiva.

    3.   Os planos ou projetos não diretamente relacionados com a gestão do sítio e não necessários para essa gestão, mas suscetíveis de afetar esse sítio de forma significativa, individualmente ou em conjugação com outros planos e projetos, serão objeto de uma avaliação adequada das suas incidências sobre o sítio no que se refere aos objetivos de conservação do mesmo. Tendo em conta as conclusões da avaliação das incidências sobre o sítio e sem prejuízo do disposto no n.o 4, as autoridades nacionais competentes só autorizarão esses planos ou projetos depois de se terem assegurado de que não afetarão a integridade do sítio em causa e de terem auscultado, se necessário, a opinião pública.»

    11

    O artigo 7.o da referida diretiva dispõe:

    «As obrigações decorrentes dos n.os 2, 3 e 4 do artigo 6.o substituem as decorrentes do n.o 4, primeira frase, do artigo 4.o da Diretiva 79/409/CEE [do Conselho, de 2 de abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens (JO 1979, L 103, p. 1; EE 15 F2 p. 125)], no respeitante às zonas de proteção especial classificadas nos termos do n.o 1 do artigo 4.o ou analogamente reconhecidas nos termos do n.o 2, do artigo 4.o da presente diretiva a partir da data da sua entrada em aplicação ou da data da classificação ou do reconhecimento pelo Estado‑Membro nos termos da Diretiva [79/409], se esta for posterior.»

    II. Antecedentes do litígio e procedimento pré‑contencioso

    12

    Doñana é um espaço natural protegido situado no sudoeste de Espanha (a seguir «espaço natural protegido de Doñana»). Este espaço compreende simultaneamente o parque nacional de Doñana, criado em 1969, e o parque natural de Doñana, criado em 1989 e depois alargado em 1997. Através da Decisão 2006/613/CE da Comissão, de 19 de julho de 2006, que adota, nos termos da Diretiva 92/43/CEE do Conselho, a lista dos sítios de importância comunitária da região biogeográfica mediterrânica (JO 2006, L 259, p. 1), a Comissão incluiu nessa lista três zonas protegidas, situadas neste último parque, a saber, Doñana, considerada uma zona de proteção especial, com o código ZEPA/LIC ES0000024, Doñana Norte y Oeste, também considerada uma zona de proteção especial, com o código ZEPA/LIC ES 6150009, e Dehesa del Estero y Montes de Moguer, considerada uma zona especial de conservação, com o código ZEC ES 6150012. Estas zonas são protegidas pelas disposições do direito da União relativas à preservação da natureza. Em especial, os charcos temporários mediterrânicos do espaço natural protegido de Doñana, designados pelo código 3170*, enquanto tipo de habitat prioritário, constituem o ecossistema que os caracteriza melhor e cuja importância foi reconhecida a nível internacional, por um lado, pela Convenção sobre Zonas Húmidas de Importância Internacional, Especialmente comoHabitat de Aves Aquáticas, celebrada em 2 de fevereiro de 1971, em Ramsar, e, por outro, inscritos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que as incluiu na Lista do Património Mundial em 1994.

    13

    Para efeitos da aplicação da Diretiva 2000/60, o espaço natural protegido de Doñana foi integrado numa única massa de águas subterrâneas, a de Almonte‑Marismas (a seguir «aquífero de Almonte‑Marismas»), no Plan Hidrológico del Guadalquivir 2009‑2015 (Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015), aprovado, nos termos do artigo 13.o desta diretiva, pelo Real Decreto 355/2013 por el que se aprueba el Plan Hidrológico de la Demarcación Hidrográfica del Guadalquivir (Decreto Real 355/2013, que Aprova o Plano de Gestão do Distrito Hidrográfico de Guadalquivir), de 17 de maio de 2013 (BOE n.o 121, de 21 de maio de 2013, p. 38229; a seguir «Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015»). Este plano foi substituído pelo Plan Hidrológico del Guadalquivir 2015‑2021 (Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021), aprovado pelo Real Decreto 1/2016 por el que se aprueba la revisión de los Planes Hidrológicos de las demarcaciones hidrográficas del Cantábrico Occidental, Guadalquivir, Ceuta, Melilla, Segura y Júcar, y de la parte española de las demarcaciones hidrográficas del Cantábrico Oriental, Miño‑Sil, Duero, Tajo, Guadiana y Ebro (Decreto Real 1/2016, que Aprova a Revisão dos Planos Hidrográficos dos Distritos Hidrográficos da Cantábria Ocidental, do Guadalquivir, de Ceuta, de Melilla, de Segura e de Júcar, e da Parte Espanhola dos Distritos Hidrográficos da Cantábria Oriental, do Minho Sul, do Douro, do Tejo, do Guadiana e do Ebro), de 8 de janeiro de 2016 (BOE n.o 16, de 19 de janeiro de 2016, p. 2972; a seguir «Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021»). Neste segundo plano, o aquífero de Almonte‑Marismas foi dividido em cinco massas de águas subterrâneas, a saber, as de Manto eólico de Doñana, de Marismas de Doñana, de Marismas, de Almonte e de La Rocina (a seguir «aquífero de Doñana»).

    14

    Em 2009, a Comissão recebeu várias denúncias relativas à deterioração dos habitats do espaço natural protegido de Doñana. Essas denúncias referiam‑se, nomeadamente, à exploração excessiva das massas de águas subterrâneas deste espaço, às quais estão ligadas as zonas húmidas do referido espaço natural. Os receios manifestados nas referidas denúncias foram igualmente levados ao conhecimento do Parlamento Europeu sob a forma de questões escritas ou de petições.

    15

    Em 17 de outubro de 2014, na sequência de um procedimento iniciado no âmbito do mecanismo EU‑Pilot relativo à aplicação da legislação ambiental europeia pelo Reino de Espanha, a Comissão enviou a esse Estado‑Membro uma carta de notificação, informando‑o de que considerava que não tinha cumprido, por um lado, as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60, em conjugação com o artigo 1.o, alínea a), e com o ponto 2.1.2 do anexo V da mesma, do artigo 5.o desta diretiva, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II da mesma, e do artigo 11.o, n.o 1, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4, da referida diretiva, e, por outro, as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, em conjugação com o artigo 7.o da mesma, no que respeita tanto às massas de águas subterrâneas como aos habitats do espaço natural protegido de Doñana.

    16

    Em 11 de fevereiro de 2015, o Reino de Espanha respondeu a esta carta de notificação.

    17

    Após ter examinado a resposta do Reino de Espanha, a Comissão enviou‑lhe, em 29 de abril de 2016, um parecer fundamentado (a seguir «parecer fundamentado»), no qual mantinha a posição expressa na carta de notificação, segundo a qual este Estado‑Membro:

    em primeiro lugar, não adotou as medidas necessárias para evitar a deterioração do estado das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana;

    em segundo lugar, não procedeu a uma caracterização mais aprofundada de todas as massas de águas subterrâneas do aquífero de Almonte‑Marismas que corriam um risco de deterioração;

    em terceiro lugar, não elaborou medidas básicas e suplementares adequadas para incluir essas medidas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015 e no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021; e

    em quarto lugar, não adotou as medidas adequadas para evitar a deterioração dos habitats naturais e dos habitats das espécies situadas nas zonas protegidas da Região de Doñana, especialmente nas zonas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) e Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012), referidas no n.o 12 do presente acórdão.

    18

    Nesse parecer fundamentado, a Comissão intimou o Reino de Espanha a corrigir os incumprimentos verificados antes de 29 de junho de 2016.

    19

    Em 9 de agosto de 2016, o Reino de Espanha respondeu ao parecer fundamentado, informando a Comissão das medidas adotadas para corrigir os referidos incumprimentos, as quais estariam essencialmente incluídas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021. O Reino de Espanha salientou igualmente as medidas adotadas no Plano Especial de Gestão das Zonas de Irrigação Situadas a Norte da Coroa Florestal de Doñana, aprovado em 2014 (a seguir «Plano Especial de Irrigação de Doñana de 2014»).

    20

    Considerando que as medidas comunicadas pelo Reino de Espanha eram insuficientes para pôr termo à situação de incumprimento assinalada no espaço natural protegido de Doñana, a Comissão decidiu, em 24 de janeiro de 2019, intentar a presente ação.

    III. Quanto ao pedido de apresentação de novas provas após o encerramento da fase escrita do processo

    21

    Por carta de 14 de abril de 2021, o Reino de Espanha submeteu um pedido de autorização para apresentar novas provas após o encerramento da fase escrita do processo, nos termos do artigo 128.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, e apresentou a este último o documento intitulado «Relatório final da missão de monitorização conjunta do Centro do Património Mundial/UICN/Ramsar do Parque Nacional de Doñana», enviado pela Unesco a este Estado‑Membro em 8 de abril de 2021.

    22

    Em conformidade com o artigo 128.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte que pretende apresentar ou oferecer provas após o encerramento da fase escrita do processo fundamenta o atraso na apresentação das mesmas e o presidente pode, mediante proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, conceder à outra parte um prazo para tomar posição sobre esses elementos de prova.

    23

    No caso em apreço, o Tribunal de Justiça já dispõe da maior parte das informações contidas nesse relatório e considera‑se suficientemente esclarecido para decidir sem que o processo necessite de ser decidido com base em novas provas que não tenham sido debatidas entre as partes. Por conseguinte, há que indeferir o pedido apresentado pelo Reino de Espanha.

    IV. Quanto à ação

    24

    Como fundamento da sua ação, a Comissão alega que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva 2000/60 no que respeita às massas de águas subterrâneas das zonas protegidas do espaço natural protegido de Doñana nem as obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva 92/43 no que respeita aos habitats naturais e aos habitats de espécies situados nas referidas zonas.

    A. Quanto ao incumprimento das obrigações decorrentes da Diretiva 2000/60

    25

    A Comissão critica, em substância, o Reino de Espanha por não ter adotado todas as medidas exigidas pela Diretiva 2000/60 para corrigir a deterioração das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana. Em seu entender, essa deterioração é, nomeadamente, imputável a atividades antropogénicas que têm por efeito alterar o equilíbrio entre as captações e a recarga das águas subterrâneas.

    26

    A Comissão apresenta três alegações, relativas, a primeira, à violação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60, em conjugação com o artigo 1.o, alínea a), e o ponto 2.1.2 do anexo V da mesma; a segunda, à violação do artigo 5.o desta diretiva, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II da referida diretiva, e, o terceiro, à violação do artigo 11.o, n.o 1, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4, da mesma diretiva.

    1.   Quanto à primeira alegação

    a)   Argumentos das partes

    27

    A Comissão sustenta que, em violação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60, o Reino de Espanha não tomou as medidas necessárias para prevenir a deterioração do estado das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana. Salienta que esta disposição, conjugada com o ponto 2.1.2 do anexo V desta diretiva, impõe aos Estados‑Membros que evitem que intervenções antropogénicas alterem o nível das águas subterrâneas, provocando assim danos aos ecossistemas terrestres que dependem diretamente dessas massas de água.

    28

    A Comissão sublinha, especialmente, que o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015 e o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 demonstram que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60.

    29

    Assim, por um lado, ao indicar erradamente, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, que o aquífero de Almonte‑Marismas apresentava um «bom estado quantitativo», na aceção do ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60, o Reino de Espanha subestimou a deterioração constante ocasionada pela exploração excessiva dos aquíferos da região de Doñana através de captações excessivas de água para terrenos irrigáveis, que estão em constante aumento, e não adotou as medidas necessárias para evitar essa deterioração. A Comissão sublinha, a este respeito, que a diminuição dos níveis das águas subterrâneas no referido aquífero provocou a acidificação das lagunas temporárias, causando assim um dano significativo aos ecossistemas terrestres que dependiam diretamente desse mesmo aquífero.

    30

    Por outro lado, a Comissão alega que a deterioração imputada foi confirmada pela aprovação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, no qual o aquífero de Almonte‑Marismas foi dividido em cinco massas de águas subterrâneas. A Comissão salienta que, nesse plano hidrológico, foi reconhecido oficialmente que três dessas massas de águas, a saber, as de Marismas, de Almonte e de La Rocina (a seguir «três massas de água»), apresentavam um mau estado quantitativo e que duas delas, a saber, as de Marismas e de Almonte, apresentavam igualmente um mau estado químico.

    31

    Por último, a Comissão sublinha que a deterioração das três massas de água que alimentam o aquífero de Almonte‑Marismas prossegue atualmente, como atesta um relatório da Confederación Hidrográfica del Guadalquivir (Confederação Hidrográfica do Guadalquivir, Espanha), e continua a causar danos aos ecossistemas terrestres que dependem diretamente das referidas massas de águas, mesmo após a adoção das medidas incluídas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    32

    O Reino de Espanha contesta os argumentos da Comissão e sustenta que as obrigações resultantes do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60 foram plenamente respeitadas, primeiro, pelo Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, e depois, pelo Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    33

    Por um lado, o Reino de Espanha afirma que o artigo 4.o, n.o 4, da Diretiva 2000/60 prevê a possibilidade de adiar o cumprimento das obrigações resultantes do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), desta diretiva para efeitos da realização progressiva dos «objetivos para as massas de água». O Reino de Espanha alega ter recorrido a esta possibilidade, tendo verificado, após a entrada em vigor do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, que não era possível atingir o objetivo de um bom estado quantitativo do aquífero de Almonte‑Marismas, nomeadamente no que respeita às três massas de água.

    34

    Por outro lado, o Reino de Espanha alega que foram adotadas medidas adequadas para dar cumprimento às disposições da Diretiva 2000/60 e evitar assim novas deteriorações das massas de águas em causa. Estas medidas comportam a diminuição de cerca de 10 % das captações de água totais das massas de águas, a qualificação das três massas de água que não atingem o objetivo de um «bom estado quantitativo» enquanto massas de águas «em risco de não conseguirem atingir um bom estado quantitativo», a substituição das captações de águas subterrâneas por captações de águas de superfície, a intensificação desde 2015 das inspeções na região de Doñana a fim de evitar as captações de águas não autorizadas, bem como a abertura de processos sancionatórios e o encerramento de poços de captação de águas ilegais. O Reino de Espanha salienta que as medidas adotadas se revelaram eficazes na medida em que, por um lado, a deterioração constante da massa de água de Almonte cessou e, por outro, o estado das massas de águas de La Rocina e de Marismas melhorou.

    b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

    35

    A título preliminar, importa recordar que a Diretiva 2000/60 é uma diretiva‑quadro adotada com fundamento no artigo 175.o, n.o 1, CE (atual artigo 192.o, n.o 1, TFUE). A mesma diretiva estabelece princípios comuns e um quadro global de ação para a proteção das águas e assegura a coordenação, a integração assim como, a mais longo prazo, o desenvolvimento dos princípios gerais e das estruturas que permitam a proteção e uma utilização ecologicamente viável da água na União Europeia. Os princípios comuns e o quadro global de ação por ela estabelecidos devem ser posteriormente desenvolvidos pelos Estados‑Membros através da adoção de uma série de medidas particulares em conformidade com os prazos previstos por esta diretiva. Esta última não tem, porém, por objetivo a harmonização completa da legislação dos Estados‑Membros no domínio da água (Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.o 34 e jurisprudência referida).

    36

    Segundo o artigo 1.o, alínea a), da Diretiva 2000/60, esta tem por objetivo estabelecer um enquadramento para a proteção das águas de superfície interiores, das águas de transição, das águas costeiras e das águas subterrâneas que evite a continuação da degradação e proteja e melhore o estado dos ecossistemas aquáticos, e também dos ecossistemas terrestres diretamente dependentes dos ecossistemas aquáticos (Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.o 36).

    37

    Por conseguinte, o objetivo último da Diretiva 2000/60 consiste em atingir, através de uma ação coordenada, o «bom estado» de todas as águas da União, incluindo as águas subterrâneas.

    38

    Os objetivos ambientais que os Estados‑Membros são obrigados a alcançar no que respeita às águas subterrâneas são especificados no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60.

    39

    Esta disposição impõe duas obrigações distintas, embora intrinsecamente ligadas. Por um lado, nos termos da subalínea i) desta disposição, os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias a fim de evitar ou limitar a descarga de poluentes nas águas subterrâneas e de evitar a deterioração do estado de todas as massas de águas subterrâneas. Por outro lado, em aplicação das subalíneas ii) e iii) da referida disposição, os Estados‑Membros protegerão, melhorarão e reconstituirão todas as massas de água subterrâneas, com o objetivo de alcançar um bom estado o mais tardar no final de 2015. Daqui decorre que a primeira obrigação resultante do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60 constitui uma obrigação de prevenir a deterioração do estado de todas as massas de águas subterrâneas, ao passo que a segunda obrigação, enunciada no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), ii) e iii), desta diretiva constitui uma obrigação de melhoria desse estado (v., neste sentido, Acórdão de 28 de maio de 2020, Land Nordrhein‑Westfalen, C‑535/18, EU:C:2020:391, n.o 69).

    40

    Além disso, o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60 estabelece um nexo entre as medidas de conservação necessárias para evitar a deterioração do estado de todas as massas de águas subterrâneas que os Estados‑Membros são obrigados a tomar por força da referida disposição e a existência prévia de um plano de gestão de bacia hidrográfica para a região hidrográfica em causa (v., neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2012, Nomarchiaki Aftodioikisi Aitoloakarnanias e o., C‑43/10, EU:C:2012:560, n.o 52).

    41

    Por outro lado, importa recordar que, para garantir a realização, por parte dos Estados‑Membros, dos objetivos qualitativos que o legislador da União procura alcançar, concretamente a preservação ou a recuperação de um bom estado quantitativo e químico das águas subterrâneas, a Diretiva 2000/60 prevê uma série de disposições, entre as quais as dos artigos 5.o e 11.o, e do anexo V, que estabelecem um processo complexo e composto por várias etapas detalhadamente regulamentadas, para permitir que os Estados‑Membros executem as medidas necessárias, em função das especificidades e características das massas de águas identificadas nos seus territórios (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.os 41 e 42).

    42

    Por último, decorre do enunciado, da sistemática e da finalidade do artigo 4.o da Diretiva 2000/60 que as obrigações previstas no artigo 4.o, n.o 1, alíneas a) e b), desta diretiva para as águas de superfície e para as águas subterrâneas têm caráter vinculativo (v., neste sentido, Acórdão de 28 de maio de 2020, Land Nordrhein‑Westfalen, C‑535/18, EU:C:2020:391, n.o 72).

    43

    Conclui‑se que, como sustenta a Comissão, o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60 não se limita a enunciar, através de uma formulação programática, simples objetivos de planeamento de gestão, mas tem efeitos vinculativos, uma vez determinado o estado ecológico da massa de água em causa em cada etapa do procedimento descrito por esta diretiva (Acórdão de 28 de maio de 2020, Land Nordrhein‑Westfalen, C‑535/18, EU:C:2020:391, n.o 73).

    44

    No âmbito da presente alegação, a Comissão critica o Reino de Espanha por ter violado unicamente a obrigação de evitar a deterioração do estado das massas de águas subterrâneas, prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60.

    45

    Daqui decorre que há que afastar, desde já, o argumento do Reino de Espanha segundo o qual o artigo 4.o, n.o 4, da Diretiva 2000/60 lhe permitia adiar o cumprimento das obrigações resultantes do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), desta diretiva no que respeita, nomeadamente, às três massas de água situadas no espaço natural protegido de Doñana. Com efeito, como salientou a advogada‑geral no n.o 153 das conclusões, a exceção de adiar a realização dos objetivos fixados no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60 só é aplicável à obrigação de melhoria estabelecida na subalínea ii) desta disposição, mas não à obrigação de evitar a deterioração referida na subalínea i), cujo incumprimento é alegado no caso em apreço pela Comissão.

    46

    Quanto à questão de saber se o Reino de Espanha não cumpriu a obrigação de evitar a deterioração do estado das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana, em violação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60, há que recordar, antes de mais, que, segundo jurisprudência constante, no âmbito de um processo por incumprimento, incumbe à Comissão demonstrar a existência do incumprimento alegado e fornecer ao Tribunal de Justiça os elementos necessários à verificação por este último da existência desse incumprimento, sem que a Comissão possa invocar qualquer presunção [v., neste sentido, Acórdão de 5 de março de 2020, Comissão/Chipre (Recolha e tratamento de águas residuais urbanas), C‑248/19, não publicado, EU:C:2020:171, n.o 20 e jurisprudência referida].

    47

    Em seguida, só quando a Comissão tiver fornecido elementos suficientes para demonstrar a existência do incumprimento alegado é que incumbe ao Estado‑Membro contestar, substancial e pormenorizadamente, os elementos assim apresentados e as consequências que daí decorrem [v., por analogia, Acórdão de 28 de março de 2019, Comissão/Irlanda (Sistema coletor e de tratamento de águas residuais), C‑427/17, não publicado, EU:C:2019:269, n.o 39 e jurisprudência referida].

    48

    Por último, segundo a jurisprudência, resulta da economia do artigo 4.o da Diretiva 2000/60 que as deteriorações do estado de uma massa de águas, ainda que transitórias, só são admitidas em condições muito exigentes e que o limite a partir do qual se verifica a violação da obrigação de prevenir a deterioração do estado de uma massa de águas deve ser baixo (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2015, Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland, C‑461/13, EU:C:2015:433, n.o 67).

    49

    Como salientou a advogada‑geral nos n.os 123 a 134 das conclusões, o conceito de «deterioração», na aceção desta disposição, no contexto das águas subterrâneas que já estão em mau estado, pressupõe um aumento adicional do défice já existente e, consequentemente, uma exploração excessiva crescente em relação a uma situação anterior. A este respeito, a falta de um equilíbrio entre as captações e a recarga das águas subterrâneas significa que uma massa de águas subterrâneas não se encontra num bom estado quantitativo, tal como definido no ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60, sem que constitua em si mesma uma deterioração, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), desta diretiva. A adoção das medidas necessárias para alcançar esse equilíbrio, como a cessação da captação excessiva, e, por isso, um bom estado da massa de águas subterrâneas em questão, é abrangida pela obrigação de melhoria nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), ii), da referida diretiva. Por conseguinte, enquanto o grau de exploração excessiva de uma massa de águas subterrâneas em mau estado quantitativo não aumentar, não há uma deterioração desse estado que seja contrária à obrigação prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da mesma diretiva.

    50

    A Comissão considera que existe uma deterioração do estado das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60, com base, em primeiro lugar, no facto de o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015 conter um erro de qualificação do estado quantitativo do aquífero de Almonte‑Marismas; em segundo lugar, no facto de o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 qualificar as três massas de água como estando em «mau estado quantitativo» e, em terceiro lugar, no facto de, em resultado das medidas insuficientes estabelecidas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, o estado das três massas de água se ter deteriorado.

    1) Quanto ao erro de qualificação do estado quantitativo do aquífero de Almonte‑Marismas cometido no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015

    51

    Em primeiro lugar, a Comissão critica o Reino de Espanha por ter erradamente indicado, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, que o aquífero de Almonte‑Marismas apresentava um «bom estado quantitativo», na aceção do ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60, e de considerar, por conseguinte, que o nível das águas subterrâneas do referido aquífero não estava sujeito a alterações antropogénicas suscetíveis de ter como resultado o não alcançar dos objetivos ambientais previstos por esta diretiva ou de causar danos ambientais aos ecossistemas diretamente dependentes da mesma. Segundo a Comissão, esta qualificação errada constitui a prova de que o Reino de Espanha não estabeleceu as medidas necessárias para evitar a deterioração do estado das massas de águas subterrâneas na região de Doñana, nomeadamente para reduzir as captações de água excessivas.

    52

    Como resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe, à data da aprovação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, ou seja, em 17 de maio de 2013, existiam suficientes indícios para considerar que o aquífero de Almonte‑Marismas não cumpria os requisitos exigidos para ser qualificado de massa de água que apresentava um «bom estado quantitativo», na aceção do ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60.

    53

    Com efeito, a Comissão apresentou vários documentos provenientes de diferentes fontes científicas e oficiais, que anexou à sua petição, que demonstram que, à data da aprovação do referido plano, o aquífero de Almonte‑Marismas corria o risco de não alcançar os objetivos fixados pela Diretiva 2000/60 devido a alterações antropogénicas e, particularmente, a captações de água excessivas provenientes de terrenos irrigáveis na região de Doñana.

    54

    Além disso, como alega a Comissão, o Plano de Ordenamento do Território para a Região de Doñana, aprovado pelo Decreto 341/2003 del Gobierno de la Comunidad Autónoma de Andalucía por el que se aprueba el Plan de Ordenación del Territorio del ámbito de Doñana y se crea su Comisión de Seguimiento (Decreto 341/2003 do Governo da Comunidade Autónoma da Andaluzia, que Aprova o Plano de Ordenamento do Território para a Região de Doñana e Cria a sua Comissão de Monitorização), de 9 de dezembro de 2003 (BOJA n.o 22, de 3 de janeiro de 2004, p. 2866), já tinha recomendado que a Administração Hidráulica Espanhola declarasse todo o aquífero de Almonte‑Marismas excessivamente explorado ou em risco de o ser, com vista a reduzir o risco de exploração excessiva e a deterioração da qualidade da água naquele aquífero.

    55

    No entanto, apesar de os elementos mencionados nos n.os 53 e 54 do presente acórdão, que datam de 2003, 2008, 2009 e 2012, são suscetíveis de demonstrar que, à data da aprovação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, o aquífero de Almonte‑Marismas não apresentava um «bom estado quantitativo», na aceção do ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60, esses elementos não permitem, em contrapartida, concluir que a qualificação errada do estado quantitativo desse aquífero, efetuada no referido plano, teve como consequência a deterioração das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana, tal como definida no n.o 48 do presente acórdão.

    56

    Decorre do que precede que a Comissão não demonstrou que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60, ao qualificar erradamente, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, o estado quantitativo das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana.

    2) Quanto à qualificação de «mau estado quantitativo» das três massas de água no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021

    57

    A Comissão alega que a prova da deterioração do estado quantitativo do aquífero de Almonte‑Marismas resulta do facto de, quando o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 foi aprovado em janeiro de 2016, esse aquífero ter sido dividido em cinco massas de águas, tendo sido considerado que três delas apresentavam um «mau estado quantitativo», na aceção do ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60. Segundo a Comissão, a alteração do referido plano constitui uma manifestação implícita da existência de uma deterioração do estado das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana em relação ao seu estado, tal como estabelecido no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015.

    58

    Todavia, tal argumentação não pode ser acolhida.

    59

    Com efeito, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a nova qualificação do estado quantitativo das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana é apenas a consequência da divisão de todo o aquífero de Almonte‑Marismas em cinco massas de água distintas com vista à sua avaliação. Com efeito, devido a essa divisão, o mau estado quantitativo das três massas de água passou a ser aparente, ao passo que, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, se considerava que o aquífero de Almonte‑Marismas, que era avaliado no seu conjunto, apresentava um bom estado quantitativo.

    60

    Assim, tal como o Reino de Espanha demonstrou, após a aprovação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, as informações que foram sendo progressivamente recolhidas demonstraram que esse plano carece de precisão técnica no que diz respeito às medidas iniciais de implementação da Diretiva 2000/60. Por essa razão, o aquífero de Almonte‑Marismas foi dividido em cinco massas de água distintas no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, para se poder localizar mais facilmente os problemas a nível territorial, identificar com maior precisão as zonas em risco de não alcançar os objetivos estabelecidos pela referida diretiva e, assim, elaborar uma resposta mais eficaz e adequada, consistindo essencialmente na redução das captações de águas subterrâneas.

    61

    Por outro lado, os elementos de prova apresentados pela Comissão não são suscetíveis de demonstrar que as três massas de água consideradas em «mau estado quantitativo» estavam em melhor estado antes da divisão do aquífero de Almonte‑Marismas. Pelo contrário, como resulta do n.o 52 do presente acórdão, os documentos fornecidos pela Comissão provam que existiam suficientes indícios, antes da aprovação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, para considerar que este aquífero não apresentava um bom estado quantitativo. Por conseguinte, não se pode deduzir da indicação, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, do mau estado quantitativo das três massas de água que este estado se deteriorou mais em relação ao indicado no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015.

    62

    Daqui resulta que a Comissão não demonstrou que a alteração da qualificação de «bom estado quantitativo» do aquífero de Almonte‑Marismas, tal como figura no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, pela indicação, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, de que as três massas de água estão em «mau estado quantitativo», foi consequência de uma deterioração do estado do referido aquífero, tal como definida no n.o 48 do presente acórdão.

    3) Quanto à deterioração das massas de água do espaço natural protegido de Doñana na sequência das medidas insuficientes estabelecidas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021

    63

    A Comissão sustenta que, na sequência das medidas insuficientes adotadas pelo Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, a «deterioração», na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60, prossegue e ainda não foi invertida, com o risco de o bom estado quantitativo das três massas de água não ser alcançado nos prazos previstos pela referida diretiva.

    64

    A título preliminar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, devendo a existência de um incumprimento ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro em causa tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, as alterações ocorridas posteriormente não podem ser tomadas em consideração pelo Tribunal de Justiça [v. Acórdão de 28 de março de 2019, Comissão/Irlanda (Sistema coletor e de tratamento de águas residuais), C‑427/17, não publicado, EU:C:2019:269, n.o 140 e jurisprudência referida].

    65

    No caso em apreço, uma vez que o prazo fixado no parecer fundamentado era 29 de junho de 2016, há que afastar uma parte dos elementos apresentados pela Comissão para demonstrar uma deterioração contínua do estado quantitativo das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana, especialmente, a maior parte dos artigos de imprensa espanhola e os relatórios da organização não governamental «World Wildlife Fund» (WWF) que contêm informações relativas a 2017, 2018 e 2019.

    66

    Quanto à questão de saber se o Reino de Espanha violou a sua obrigação de evitar a deterioração dessas massas de água até 29 de junho de 2016, a Comissão considera, em substância, que a deterioração atual e contínua do estado quantitativo das referidas massas de água está demonstrada, por um lado, pela captação excessiva e contínua das águas subterrâneas da região de Doñana e, por outro, pelas deteriorações das águas de superfície e dos ecossistemas.

    67

    Quanto à captação excessiva e contínua das águas subterrâneas da região de Doñana, a Comissão sustenta que diferentes elementos de prova provenientes de estudos científicos, de relatórios das autoridades espanholas e de artigos de imprensa, cujas cópias são anexadas à petição, confirmam o lento e constante aumento, desde 2000, da superfície irrigável na região de Doñana.

    68

    Ora, embora seja verdade que esses elementos são suscetíveis de constituir elementos de uma exploração excessiva contínua do aquífero de Almonte‑Marismas, não é menos verdade que esses documentos não demonstram que essa exploração excessiva aumentou ainda mais, ocasionando uma deterioração do referido aquífero após a aprovação, em 8 de janeiro de 2016, do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    69

    Com efeito, os documentos apresentados pela Comissão, em especial o relatório da Confederação Hidrográfica do Guadalquivir, de abril de 2017, sobre o estado do aquífero de Almonte‑Marismas para o ano hidrológico de 2015 a 2016, bem como o relatório do Defensor del Pueblo (Provedor de Justiça, Espanha), de 10 de agosto de 2018, anexados à petição, advertem apenas que a constante exploração dos recursos de águas subterrâneas ameaça o bom estado deste aquífero e dos ecossistemas terrestres que dele dependem com o risco de não se alcançar um bom estado quantitativo no que respeita às três massas de água consideradas em mau estado quantitativo. Ora, o facto de as massas de águas subterrâneas permanecerem em mau estado quantitativo não significa, por si só, como foi salientado no n.o 49 do presente acórdão, que este se deteriorou ainda mais após a aprovação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    70

    Por outro lado, como salientou a advogada‑geral no n.o 130 das conclusões, no caso de mau estado quantitativo das águas subterrâneas, a obrigação de evitar a deterioração desse estado, prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60, não exige a redução da captação excessiva das águas subterrâneas ao ponto de se alcançar um equilíbrio entre essa captação e a recarga das águas subterrâneas. Este equilíbrio corresponde à definição de bom estado quantitativo, na aceção do ponto 2.1.2, primeiro período, do anexo V, desta diretiva, que deve ser realizado no âmbito da obrigação de melhoria prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), ii) e iii), da referida diretiva, cujo cumprimento não foi contestado no contexto da presente alegação.

    71

    Por conseguinte, resulta das considerações precedentes que, em caso de mau estado quantitativo das massas de águas subterrâneas, como foi constatado no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, a obrigação de evitar a deterioração do estado quantitativo dessas massas de água, prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60, exige apenas que a captação de águas subterrâneas não aumente ainda mais para não agravar as causas do mau estado quantitativo verificado. Ora, a Comissão não provou que a captação de águas subterrâneas aumentou após a aprovação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 nem que as causas do mau estado quantitativo do aquífero de Almonte‑Marismas se agravaram.

    72

    Em contrapartida, o Reino de Espanha forneceu dados de monitorização recolhidos pela Confederação Hidrográfica do Guadalquivir que indicam que, pelo menos desde 2015, o indicador do estado das massas de águas subterrâneas do aquífero de Almonte‑Marismas tende a regressar aos seus níveis anteriores, o que constitui uma tendência observável tanto para o conjunto das massas de águas subterrâneas do aquífero de Almonte‑Marismas como para as três massas de água, especialmente a de La Rocina. Assim, há que constatar que, segundo os registos oficiais disponíveis, aproximadamente desde 2015, as massas de água subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana têm vindo a sofrer uma alteração muito ligeiramente positiva na sequência da aplicação de medidas concretas com vista a reduzir as captações de águas subterrâneas na região de Doñana.

    73

    Tendo em conta as considerações precedentes, deve considerar‑se que a Comissão não demonstrou que o mau estado quantitativo das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana se agravou por uma captação acrescida, em violação da obrigação de evitar a deterioração das águas subterrâneas, prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60.

    74

    No que respeita às deteriorações das águas de superfície e dos ecossistemas, importa salientar, à semelhança da advogada‑geral no n.o 149 das conclusões, que essas deteriorações são suscetíveis de constituir indícios de mau estado quantitativo da massa de águas subterrâneas em causa, mas não elementos que comprovem deteriorações adicionais desse estado. Além disso, a Comissão também não estabeleceu que esses indícios demonstram um agravamento do mau estado quantitativo de todas as massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana.

    75

    Daqui resulta que a Comissão não demonstrou a deterioração das três massas de água na sequência das medidas estabelecidas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    76

    Resulta do exposto que a Comissão não demonstrou que o Reino de Espanha não cumpriu a sua obrigação de evitar a deterioração do estado das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), i), da Diretiva 2000/60.

    2.   Quanto à segunda alegação

    a)   Argumentos das partes

    77

    A Comissão alega que o Reino de Espanha não aplicou corretamente o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II desta diretiva, ao não ter procedido a uma caracterização mais aprofundada das massas de águas subterrâneas da região de Doñana que apresentavam um risco de não alcançar os objetivos fixados pela referida diretiva e, por conseguinte, não ter determinado as medidas necessárias para alcançar os objetivos da referida diretiva.

    78

    A Comissão critica, em substância, o Reino de Espanha por ter subestimado, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, as incidências das captações de água nas massas de águas subterrâneas da região de Doñana e por não ter identificado as massas de águas subterrâneas que apresentavam um risco de não alcançar os referidos objetivos. Em seu entender, esta caracterização inicial insuficiente teve como consequência que o Reino de Espanha não efetuou uma caracterização mais aprofundada, conforme exigida no ponto 2.2 do anexo II da Diretiva 2000/60, o que levou à subsequente não adoção das medidas necessárias para atingir esses mesmos objetivos.

    79

    Por outro lado, a Comissão sustenta que a caracterização realizada no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 não sanou a violação das disposições da Diretiva 2000/60, na medida em que esta nova caracterização permanece incompleta e não preenche todos os requisitos desta diretiva, nomeadamente os relativos à correta determinação do estado quantitativo das massas de águas subterrâneas em causa. A este respeito, a Comissão salienta, em primeiro lugar, que a divisão do aquífero de Almonte‑Marismas em cinco massas de águas subterrâneas distintas não contém uma descrição suficientemente precisa do estado químico e do estado quantitativo dessas massas de água, impedindo assim a realização dos objetivos fixados pela Diretiva 2000/60. Em segundo lugar, a Comissão invoca a insuficiência das informações científicas disponíveis no momento em que foi efetuada a caracterização das referidas massas de água. Em terceiro lugar, observa que a análise das pressões e do impacto das captações nas massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana apresenta lacunas importantes.

    80

    A Comissão conclui que as autoridades espanholas não avaliaram corretamente o estado quantitativo das referidas massas de água, na medida em que uma avaliação adequada teria revelado que a totalidade das massas de água em causa corria o risco de não alcançar os objetivos ambientais fixados pela Diretiva 2000/60.

    81

    O Reino de Espanha refuta estes argumentos e alega que cumpriu devidamente a obrigação, imposta pelo artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60, de efetuar um estudo de caracterização inicial das massas de águas subterrâneas em causa, em conformidade com as especificações técnicas enunciadas nos anexos II e III desta diretiva. Esse estudo foi realizado inicialmente em 2013, no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, e depois em 2016, no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    82

    Em especial, o Reino de Espanha sustenta que procedeu a uma caracterização inicial adequada das massas de águas subterrâneas da região hidrográfica de Doñana. Afirma que o aquífero de Almonte‑Marismas foi globalmente considerado como apresentando um «bom estado quantitativo» no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, o que o dispensava a realização de um estudo de caracterização mais aprofundado em conformidade com o artigo 5.o da Diretiva 2000/60. Além disso, o referido plano hidrológico incluía este aquífero entre as massas de águas subterrâneas de caráter estratégico e reservadas fundamentalmente ao consumo humano, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 3, do referido plano.

    83

    Por outro lado, o Reino de Espanha sustenta que, na revisão efetuada no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, a caracterização do aquífero de Almonte‑Marismas foi alterada e este aquífero foi dividido, por razões hidrogeológicas e de proteção do ambiente, de utilização e de gestão do território. Alega que esta divisão do referido aquífero em cinco massas de águas subterrâneas distintas permitiu avaliar com maior precisão e representatividade o estado de cada uma dessas massas de água e aplicar mais eficazmente o programa de medidas estabelecido por esse plano hidrológico. Segundo o Reino de Espanha, esta caracterização do aquífero de Almonte‑Marismas não só está em plena conformidade com as disposições da Diretiva 2000/60, mas é também adequada e suficiente para verificar o grau de realização dos objetivos nela estabelecidos.

    84

    Por último, o Reino de Espanha, que alega que a caracterização referida no artigo 5.o da diretiva foi efetuada com base em numerosos estudos hidrológicos que contêm dados e informações de volume e qualidade dificilmente comparáveis aos de outras planificações hidrológicas em Espanha, sustenta que esses estudos devem ser considerados uma fonte de informações válida para efeitos do presente processo.

    b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

    85

    Para cumprir os objetivos ambientais definidos no artigo 4.o da Diretiva 2000/60, os Estados‑Membros devem dispor de uma imagem de conjunto das características das massas de água em questão.

    86

    Para este efeito, nos termos do artigo 3.o da Diretiva 2000/60, os Estados‑Membros identificarão, antes de mais, as bacias hidrográficas, incluirão cada uma delas numa região e designarão as autoridades competentes.

    87

    Em seguida, procedem à caracterização das massas de água prevista no artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60 e nos anexos II e III da mesma. Por força desta disposição, cada Estado‑Membro assegurará que, para cada região hidrográfica situada no seu território, seja efetuada uma análise das respetivas características, um estudo do impacto da atividade humana sobre o estado das águas subterrâneas e uma análise económica da utilização da água, em conformidade com as especificações técnicas enunciadas nos referidos anexos II e III.

    88

    O n.o 2 do artigo 5.o desta diretiva prevê que as análises e os estudos referidos no n.o 1 deste artigo serão revistos e, se necessário, atualizados o mais tardar 13 anos a contar da data de entrada em vigor da referida diretiva e, posteriormente, de seis em seis anos.

    89

    Quanto às especificidades técnicas, há que salientar que o ponto 2 do anexo II da Diretiva 2000/60 especifica os requisitos que os Estados‑Membros devem cumprir na caracterização inicial das massas de águas subterrâneas e, se necessário, na sua caracterização mais aprofundada.

    90

    Em especial, o ponto 2.1 do anexo II desta diretiva estabelece os pormenores dessa primeira caracterização de todas as massas de águas subterrâneas a fim de avaliar as suas utilizações e o grau de risco de não se cumprirem os objetivos definidos no artigo 4.o da referida diretiva para cada massa de águas subterrâneas.

    91

    Por outro lado, o ponto 2.2 do anexo II da Diretiva 2000/60 prevê que os Estados‑Membros devem efetuar, após esta primeira caracterização de todas as massas de águas subterrâneas, uma caracterização mais aprofundada das que tenham sido consideradas em situação de risco de não cumprirem os referidos objetivos, de modo a permitir uma avaliação mais precisa da importância desse risco e a identificação das medidas necessárias nos termos do artigo 11.o desta diretiva. Esta caracterização mais aprofundada incluirá informações relevantes sobre o impacto das atividades humanas no estado das referidas massas de água e também informações pertinentes sobre outras características da massa de águas subterrâneas em causa.

    92

    No âmbito da presente alegação, a Comissão critica o Reino de Espanha, em primeiro lugar, por não ter efetuado essa caracterização mais aprofundada no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015 e, em segundo lugar, por a ter efetuado de maneira incompleta no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    93

    A título preliminar, importa recordar, como salientou a advogada‑geral no n.o 80 das conclusões, que resulta do artigo 5.o, n.o 1, e do artigo 13.o, n.o 6, bem como do anexo VII da Diretiva 2000/60, que a caracterização das massas de águas subterrâneas deve ser elaborada antes do plano de gestão e antes que essa caracterização sirva de base para o conteúdo desse plano.

    94

    Por outro lado, como mencionado no n.o 52 do presente acórdão, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que, no momento da elaboração do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, havia suficientes indícios para considerar que o aquífero de Almonte‑Marismas, tal como definido nesse plano, era excessivamente explorado e corria o risco de não alcançar os objetivos fixados pela Diretiva 2000/60. A este respeito, importa constatar que o Plano de Ordenamento do Território da Região de Doñana, referido no n.o 54 do presente acórdão, propunha que este aquífero fosse declarado excessivamente explorado ou em risco de o ser. Além disso, na réplica, a Comissão cita dois relatórios provenientes do Instituto Geológico y Minero de España (Instituto Geológico e Mineiro de Espanha) e do Consejo Superior de Investigaciones Científicas (Conselho Superior de Investigação Científica, Espanha), datados respetivamente de 2009 e de 2017, que anexou à petição, que também registavam a captação excessiva de águas subterrâneas no referido aquífero.

    95

    A este respeito, o Reino de Espanha admite que o risco de não alcançar os objetivos fixados pela Diretiva 2000/60 já tinha sido evocado num primeiro relatório publicado em 2004 e 2005, elaborado no âmbito da caracterização das massas de águas subterrâneas prevista no artigo 5.o, n.o 1, desta diretiva. Todavia, salienta que, após ter realizado uma avaliação global do aquífero de Almonte‑Marismas, considerou que este apresentava, no seu conjunto, um «bom estado quantitativo» no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, o que a dispensaria a realização de um estudo de caracterização mais aprofundado nos termos do artigo 5.o da referida diretiva. Por outro lado, alega que essa avaliação foi corrigida e melhorada logo que obteve informações mais precisas e que teve de esperar pela publicação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, em conformidade com o calendário previsto pela Diretiva 2000/60, para demonstrar as melhorias verificadas.

    96

    Ora, como resulta dos n.os 84 a 87 das conclusões da advogada‑geral, a «avaliação global» referida no número anterior não permitia ao Reino de Espanha afastar o risco de o aquífero de Almonte‑Marismas ou de alguma das suas partes poderem não cumprir os objetivos previstos no artigo 4.o desta diretiva. Por conseguinte, esse risco deveria ter sido declarado no âmbito da primeira caracterização de todas as massas de águas subterrâneas exigida pela Diretiva 2000/60, em conformidade com o ponto 2.1 do seu anexo II.

    97

    Além disso, como também salientou a advogada‑geral no n.o 87 das conclusões, nos termos do ponto 2.2 do anexo II da Diretiva 2000/60, é necessária uma caracterização mais aprofundada, desde o momento em que exista um risco de mau estado quantitativo das massas de águas subterrâneas em causa, ou seja, desde o momento em que exista um risco de uma massa de água não cumprir os objetivos previstos no artigo 4.o desta diretiva. Por conseguinte, o Reino de Espanha não pode alegar que essa caracterização mais aprofundada das massas de águas subterrâneas em causa não era necessária, nem adequada, nem exigível no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, uma vez que era facto assente que esse risco existia e não podia ser afastado.

    98

    Resulta destas considerações que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 5.o da Diretiva 2000/60, ao não ter declarado, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015, o risco de o aquífero de Almonte‑Marismas não alcançar os objetivos fixados por esta diretiva, em conformidade com o ponto 2.1 do anexo II da mesma, e, por conseguinte, ao não ter apresentado uma caracterização mais aprofundada nos termos do ponto 2.2 do anexo II da referida diretiva.

    99

    A este respeito, há que recordar, como resulta dos n.os 64 e 65 do presente acórdão, que a existência de um incumprimento deve ser apreciada, no caso em apreço, em função da situação do aquífero de Doñana tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, a saber, 29 de junho de 2016. Ora, nessa data, o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, aprovado em 8 de janeiro de 2016, já era aplicável.

    100

    Nesse plano, o Reino de Espanha procedeu a uma caracterização mais aprofundada nos termos do ponto 2.2 do anexo II da Diretiva 2000/60. Todavia, a Comissão alega que as informações científicas utilizadas para esse fim eram insuficientes. Sustenta que, para determinar o estado quantitativo das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana, o Reino de Espanha se baseou unicamente na evolução do nível das águas do aquífero de Doñana, nomeadamente nos dados da rede piezométrica de Doñana, e que, por conseguinte, as conclusões que daí retirou são incompletas à luz dos requisitos decorrentes do artigo 5.o, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II, da Diretiva 2000/60.

    101

    Em primeiro lugar, a Comissão alega a insuficiência das informações científicas disponíveis para a caracterização das massas de águas subterrâneas em causa no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021. Em especial, critica o facto de esse plano se ter baseado num relatório relativo ao estado do aquífero de Almonte‑Marismas para o ano hidrológico de 2012‑2013, elaborado pela Confederação Hidrográfica do Guadalquivir, que não indica pontos de medição do nível das águas subterrâneas para as massas de águas subterrâneas de La Rocina e de Marismas de Doñana. Contudo, há que salientar que a Comissão não explica nem demonstra que esses dados são essenciais para estabelecer tal caracterização. Por outro lado, a Comissão limita‑se a remeter para um portal Internet do Governo espanhol, que contém informações geográficas, sem expor a forma de encontrar as informações que invoca.

    102

    Em segundo lugar, a Comissão critica as autoridades espanholas por terem realizado estimativas baseadas no nível piezométrico das massas de águas subterrâneas do aquífero de Doñana. Sustenta que essas estimativas têm unicamente em conta a evolução do nível das águas desse aquífero e que não são, por conseguinte, suficientes para determinar o estado quantitativo das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana. Além disso, salienta que a tendência global do conjunto dos piezométricos é negativa.

    103

    A este respeito, importa começar por observar que o ponto 2.1.2 do anexo V da Diretiva 2000/60 prevê «o regime de níveis freáticos» como parâmetro para a classificação do estado quantitativo das águas subterrâneas, sem indicar a forma como se deve determinar esse nível.

    104

    Em seguida, como resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, a Comissão não apresenta nenhum elemento de prova suscetível de demonstrar, na aceção da jurisprudência referida no n.o 46 do presente acórdão, que o método utilizado pelo Reino de Espanha não é suficiente para efetuar a caracterização prevista no artigo 5.o da Diretiva 2000/60. Com efeito, o facto de o aquífero de Doñana ser excessivamente explorado e de o bom estado quantitativo das massas de águas subterrâneas deste aquífero não ser atingido até 2027 não demonstra que o nível das referidas massas de água não é pertinente para determinar o estado quantitativo do referido aquífero em conformidade com os requisitos do anexo V desta diretiva.

    105

    Por último, o Reino de Espanha demonstra que, no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, teve em conta outros parâmetros para avaliar o estado quantitativo do aquífero de Doñana, como o equilíbrio entre as captações de água e os recursos hídricos disponíveis.

    106

    Nestas circunstâncias, deve considerar‑se que a Comissão não demonstrou que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 5.o e do ponto 2.2 do anexo II da Diretiva 2000/60 ao utilizar os dados piezométricos para determinar o estado quantitativo das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana.

    107

    Em terceiro lugar, a Comissão alega que a análise das pressões e do impacto das captações de água nas massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana apresenta lacunas importantes. Em especial, critica o facto de o anexo 3 do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, com base num inventário de 2008, se limitar a calcular os volumes de água exigidos pelas diferentes utilizações na região sem ter suficientemente em conta, no que respeita às culturas irrigadas, as fortes pressões exercidas pelas captações de água ilegais. Por outro lado, observa a falta de análise do impacto das captações de água destinadas ao abastecimento urbano, especialmente para a zona turística costeira de Matalascañas (Espanha).

    108

    No caso em apreço, há que observar que o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 não tem em conta, no âmbito da caracterização efetuada nos termos do artigo 5.o da Diretiva 2000/60, as pressões provenientes das captações ilegais e as captações destinadas ao abastecimento urbano, em particular para a referida zona turística. Com efeito, por um lado, o ponto 5.2 do anexo 2 do referido plano, relativo à «caracterização das massas de águas subterrâneas», limita‑se a descrever de forma geral as fontes e a metodologia utilizadas para determinar a captação total das massas de águas subterrâneas. Por outro lado, o ponto 5.2 do anexo 3 do mesmo plano, relativo às «pressões das massas de águas subterrâneas», não menciona que a captação de água ilegal foi tida em conta para determinar as pressões provenientes de superfícies irrigáveis. Além disso, embora o impacto das pressões urbanas seja mencionado nesse anexo, este é difícil de avaliar.

    109

    Ora, como resulta do ponto 2.2 do anexo II da Diretiva 2000/60, é necessária uma avaliação mais precisa da importância do risco em causa, nomeadamente da captação ilegal e da captação para a produção de água potável, para determinar qualquer medida exigida nos termos do artigo 11.o desta diretiva. Com efeito, como salientou a advogada‑geral no n.o 108 das conclusões, na falta dessa avaliação, o estado da massa de águas subterrâneas não pode ser corretamente apreciado e, consequentemente, é difícil determinar se as medidas estabelecidas para alcançar um bom estado quantitativo das águas subterrâneas em causa, em particular as medidas destinadas a lutar contra a captação de água ilegal, são suficientes.

    110

    Por conseguinte, há que considerar que o Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 não contém todas as informações necessárias para determinar o impacto da atividade humana nas massas de águas subterrâneas da região de Doñana, na aceção do artigo 5.o da diretiva, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II da mesma.

    111

    Resulta destas considerações que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II desta diretiva, ao não ter tido em conta a captação de água ilegal e a captação de água destinada ao abastecimento urbano para efeitos da estimativa da captação das águas subterrâneas da região de Doñana no âmbito da caracterização mais aprofundada do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021.

    3.   Quanto à terceira alegação

    a)   Argumentos das partes

    112

    A Comissão alega que o Reino de Espanha, ao não incluir medidas básicas e medidas suplementares adequadas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015 e no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 11.o, n.o 1, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4, da Diretiva 2000/60. Por outro lado, sustenta que um número significativo de medidas anunciadas por esse Estado‑Membro ainda não foi posto em prática, sem que este tenha indicado as razões para esse atraso.

    113

    Mais especificamente, a Comissão alega, em primeiro lugar, que as medidas estabelecidas nesses planos se destinam essencialmente a resolver o problema das captações de água ilegais, mas não fornecem nenhuma solução para reduzir a pressão exercida sobre os aquíferos do espaço natural protegido de Doñana ou a atual procura de água. Por outro lado, critica o facto de o Plano Especial de Irrigação de Doñana de 2014 considerar «terrenos agrícolas irrigáveis» os terrenos que, embora não tendo sido concedido qualquer direito nesse sentido, são irrigados pelo menos desde 2004, que corresponde à data da entrada em vigor do Plano de Ordenamento do Território para a Região de Doñana, mencionado no n.o 54 do presente acórdão.

    114

    Em segundo lugar, sustenta que o Plano Especial de Irrigação de Doñana de 2014 atribui uma importância excessiva às transferências de água sem resolver os problemas relativos ao estado qualitativo das águas e, sobretudo, ao seu bom estado químico. Em seu entender, o referido plano também não assegura a conservação dos ecossistemas que dependem das águas subterrâneas. Além disso, considera que a diminuição dos níveis de captação das águas subterrâneas obtida graças às transferências de água é por vezes anulada pelo aumento dos direitos de irrigação concedidos pelas autoridades espanholas.

    115

    Em terceiro lugar, embora reconheça que algumas das medidas comunicadas pelo Reino de Espanha são suscetíveis de corrigir a deterioração das águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana e garantir assim o cumprimento das obrigações decorrentes da Diretiva 2000/60, a Comissão mantém que os recursos atribuídos a essas medidas são insuficientes, o que diminui a sua eficácia. Refere‑se, nomeadamente, às medidas destinadas a controlar a utilização da água, como as inspeções e a deteção de poços ilegais, bem como às medidas destinadas a punir e a pôr termo às captações de água ilegais.

    116

    Em quarto lugar, a Comissão sustenta que o relatório anual do Defensor del Pueblo (Provedor de Justiça, Espanha) relativo ao ano de 2018 põe em evidência que as referidas insuficiências resultam do facto de a Confederação Hidrográfica do Guadalquivir não exercer com suficiente firmeza os poderes que a legislação lhe confere no domínio da água. Foi por esta razão que, segundo a Comissão, este Provedor de Justiça sugeriu a esta confederação, por um lado, que declarasse que as três massas de água eram aquíferos excessivamente explorados. Por outro lado, o referido Provedor de Justiça recomendou a aprovação de um programa de ação destinado a regular as captações de água e a coordenar as medidas previstas nos diferentes instrumentos de planeamento dos recursos hídricos, da atividade agrícola e da proteção dos espaços naturais, a fim de garantir a utilização sustentável da água. A Comissão sustenta que fontes não‑governamentais confirmam as conclusões desse mesmo Provedor de Justiça.

    117

    Em quinto lugar, a Comissão alega que as medidas anunciadas pelo Reino de Espanha não fornecem nenhuma solução para o problema da utilização excessiva da água devido ao turismo, especialmente na localidade costeira de Matalascañas, que vários estudos identificam como sendo a principal causa da exploração excessiva de determinadas massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana.

    118

    A Comissão conclui que o Reino de Espanha não aplicou nem implementou as medidas de controlo, de inspeção e sancionamento que teriam sido necessárias para dissuadir eficazmente as pessoas que realizam captações de água não autorizadas e criam instalações ilegais. Na sua opinião, o Reino de Espanha também não adotou as medidas adequadas para ajustar o volume de captação de água a um nível sustentável que garanta a obtenção de um bom estado quantitativo e químico para as águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana, bem como um estado de conservação favorável para os habitats associados. Por outro lado, a Comissão critica o Reino de Espanha por não ter adotado medidas suscetíveis de adaptar o volume de água disponível para o setor agrícola da região, de reduzir o consumo ou de incentivar uma utilização mais racional da água.

    119

    O Reino de Espanha contesta estas alegações argumentando que são imprecisas e improcedentes.

    120

    Antes de mais, o Reino de Espanha sustenta que cumpriu as obrigações impostas pelo artigo 11.o, n.o 2, n.o 3, alíneas a) e c), e n.o 4, da Diretiva 2000/60, com as medidas adotadas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 para restaurar o bom estado das massas de águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana e garantir a utilização sustentável dos recursos hídricos através da gestão das captações de água e da coordenação dos diferentes instrumentos de planeamento relativos aos recursos hídricos, à atividade agrícola e à proteção dos espaços naturais. O Reino de Espanha salienta, a este respeito, que a eficácia destas medidas foi verificada nos últimos relatórios anuais relativos ao estado dos aquíferos do espaço natural protegido de Doñana.

    121

    Em seguida, o Reino de Espanha sublinha que adotou novas medidas desde a redação do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 para alcançar os objetivos ambientais fixados pela Diretiva 2000/60. Essas medidas incluem o desenvolvimento de um processo de regularização das captações de água, a elaboração do relatório sobre o estado do aquífero de Doñana correspondente a 2017 e 2018, a elaboração de um documento que tem por objetivo a abertura de um processo de consulta pública, a monitorização das superfícies cultivadas através de técnicas de teledeteção, a coordenação dos trabalhos de investigação nas águas subterrâneas, a realização de inspeções, a abertura de processos sancionatórios e de processos de execução forçada no âmbito de captações de água não autorizadas, o encerramento de poços de captação de água ilegais, o reexame dos processos relativos aos direitos concedidos para a captação de água na massa de água de La Rocina e a inspeção dos processos de cessação por não utilização ou incumprimento das condições de captação.

    122

    Por outro lado, o Reino de Espanha salienta a importância do processo de declaração das três massas de água como massas de água «em risco de não conseguirem atingir um bom estado quantitativo». Destaca que este procedimento constitui a ferramenta administrativa mais poderosa disponível na ordem jurídica espanhola em matéria de águas subterrâneas, na medida em que permite fixar limites para as captações de água, forçar a constituição de comunidades de utilizadores das águas e adotar programas de ação específicos para solucionar os problemas detetados.

    123

    Além disso, o Reino de Espanha chama a atenção para o facto de a agricultura praticada em certas zonas vizinhas do espaço natural protegido de Doñana, particularmente a cultura de frutos vermelhos, constituir o principal motor económico da região. Trata‑se de um setor consolidado, que respeita a legislação em vigor em matéria de água e que não pode ser suprimido tendo em conta o seu caráter fundamental para a perenidade económica da região. Segundo o Reino de Espanha, o objetivo é adaptar este setor às possibilidades oferecidas pelos recursos hídricos da região, respeitando simultaneamente os utilizadores que têm direitos legais quanto à utilização da água.

    124

    Por último, o Reino de Espanha contesta as alegações da Comissão relativas à ineficácia das medidas de transferência de água aplicadas por este Estado‑Membro, considerando que a Comissão baseia as suas críticas em informações irreais ou não verificadas.

    b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

    125

    Importa recordar que, após ter estabelecido a classificação do estado quantitativo das águas subterrâneas em conformidade com o anexo V da Diretiva 2000/60, compete aos Estados‑Membros determinar, para as massas de água em causa, a forma de alcançar o bom estado quantitativo ou, pelo menos, o bom potencial ecológico, bem como prevenir a deterioração do estado das referidas massas de água, nos termos do artigo 4.o desta diretiva.

    126

    Para o efeito, em conformidade com o artigo 11.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60, os Estados‑Membros estabelecem os programas de medidas, elaborados para cada região hidrográfica ou para uma parte da região hidrográfica internacional situada no seu território. Estes programas constituem instrumentos básicos de planeamento que permitem responder às pressões observadas sobre as massas de água em causa e alcançar um bom estado das águas nas bacias hidrográficas ou nas massas de água. Para este efeito, devem ter em conta os resultados das análises previstas no artigo 5.o desta diretiva, com o objetivo da prossecução dos objetivos definidos no artigo 4.o da mesma. Por outro lado, os referidos programas de medidas podem remeter para as medidas decorrentes da legislação adotada a nível nacional e que abrangem todo o território de um Estado‑Membro.

    127

    Estes mesmos programas de medidas incluem «medidas básicas», enquanto requisitos mínimos a cumprir, previstas no n.o 3 do artigo 11.o da Diretiva 2000/60, e, se necessário, «medidas suplementares», previstas no n.o 4 deste artigo e definidas no anexo VI, parte B, desta diretiva.

    128

    No caso em apreço, a Comissão contesta, em primeiro lugar, uma série de medidas individuais tomadas pelo Reino de Espanha, conforme foram expostas nos n.os 110 a 112 do presente acórdão. Todavia, esta instituição não apresentou o mínimo elemento de prova suscetível de demonstrar que as medidas contestadas não são adequadas para alcançar um «bom estado quantitativo» das massas de águas subterrâneas em causa, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2000/60.

    129

    A Comissão também não explica as razões pelas quais o Reino de Espanha violou o artigo 11.o, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4, da Diretiva 2000/60 ao adotar as medidas contestadas nem as razões pelas quais tais medidas são alegadamente insuficientes à luz desta disposição. Com efeito, a Comissão limita‑se a contestar o facto de as medidas tomadas visarem essencialmente resolver o problema das captações de água ilegais, de o Plano Especial de Irrigação de Doñana de 2014 atribuir uma importância excessiva às transferências de água, de os recursos atribuídos não serem suficientes, e de as autoridades espanholas terem sido pouco transparentes em relação à inspeção e ao encerramento dos poços ilegais ou ao problema da utilização excessiva da água devido ao turismo. Ora, a demandante não explica nem demonstra por que razão essas ações ou essas medidas contestadas são contrárias ou insuficientes nos termos do artigo 11.o, n.o 3, alíneas a), c) e e), e n.o 4, da Diretiva 2000/60.

    130

    Por último, a Comissão alega que o Reino de Espanha não aplicou nem implementou uma série de medidas. Ora, como este Estado‑Membro demonstrou tanto por escrito como na audiência, foram estabelecidas e implementadas medidas, especialmente, medidas de controlo e de inspeção. A este respeito, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, mais concretamente dos anexos à contestação e à tréplica, que este Estado‑Membro estabeleceu uma série de medidas de controlo e de inspeção com vista a pôr termo às captações de água ilegais, incluindo sanções.

    131

    Em segundo lugar, a Comissão alega que as medidas anunciadas pelo Reino de Espanha no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 não fornecem nenhuma solução para o problema da utilização excessiva da água devido ao turismo, particularmente na localidade costeira de Matalascañas. Por outro lado, a Comissão sustenta que o impacto das captações de água destinadas ao abastecimento urbano na conservação dos habitats, devido à sua proximidade geográfica, foi demonstrado em diversos estudos científicos. Em seu entender, as medidas adotadas pelo Reino de Espanha, nomeadamente as incluídas no Plano Especial de Irrigação de Doñana de 2014 e no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, não são adequadas a evitar a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies protegidas.

    132

    A este respeito, importa salientar, à semelhança da advogada‑geral nos n.os 162, 180 e 181 das conclusões, que, por força, nomeadamente, do artigo 4.o, n.o 1, alínea c), do artigo 6.o e do anexo IV da Diretiva 2000/60, ao adotarem programas de medidas nos termos do artigo 11.o desta diretiva, os Estados‑Membros devem não só alcançar os objetivos ambientais relativos à água fixados por esta mesma diretiva mas também assegurar o cumprimento da legislação europeia relativa às zonas protegidas em causa antes de 2015. Assim, o Reino de Espanha estava igualmente obrigado a implementar os mecanismos previstos pela Diretiva 2000/60 para cumprir os objetivos fixados pela Diretiva 92/43 relativa aos habitats do espaço natural protegido de Doñana antes do referido ano.

    133

    Em especial, como resulta igualmente dos n.os 152 e 153 do presente acórdão, o artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43 impõe aos Estados‑Membros uma obrigação geral de tomarem as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats e as perturbações significativas das espécies para as quais essas zonas foram designadas (Acórdão de 16 de julho de 2020, WWF Italia Onlus e o., C‑411/19, EU:C:2020:580, n.o 32 e jurisprudência referida).

    134

    Por conseguinte, o programa de medidas previsto no artigo 11.o da Diretiva 2000/60 deve igualmente ter por objeto o estabelecimento das medidas necessárias para evitar qualquer deterioração das zonas protegidas visadas pela Diretiva 92/43.

    135

    Por outro lado, como resulta do n.o 155 do presente acórdão, para comprovar uma violação do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, basta que a Comissão demonstre a existência de uma probabilidade ou de um risco de que uma ação ou uma inação provoque uma deterioração ou uma perturbação d os habitats ou para as espécies em causa. Como salientou a advogada‑geral, em substância, no n.o 185 das conclusões, daqui decorre que, no que respeita ao exame da necessidade de adotar medidas nos termos do artigo 11.o da Diretiva 2000/60 para cumprir a obrigação que decorre do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, não pode ser exigido um nível de prova mais elevado.

    136

    Resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, por um lado, que existem suficientes indícios para considerar que as captações de água excessivas destinadas ao abastecimento urbano da zona turística de Matalascañas violaram a conservação dos habitats prioritários designados pelo código 3170*, como os charcos temporários mediterrânicos da zona protegida Doñana (ZEPA/LIC ES0000024) situados nas proximidades desse núcleo urbano, e, por outro, que o Reino de Espanha não adotou, nos termos do artigo 11.o da Diretiva 2000/60, as medidas necessárias para evitar uma eventual deterioração das zonas protegidas nas proximidades da zona turística de Matalascañas, tal como exigido pelo artigo 4.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva.

    137

    Com efeito, vários estudos mencionados e apresentados pela Comissão para fundamentar estas alegações, anexadas à petição e à contestação, demonstram o impacto das captações de água destinadas ao abastecimento urbano da zona turística de Matalascañas nos ecossistemas da zona protegida Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), especialmente nos habitats prioritários designados pelo código 3170*, a saber, os charcos temporários mediterrânicos. Estes estudos salientam a preocupante tendência para o encurtamento das lagunas temporárias na reserva de Doñana e para a seca do Charco del Toro e do charco de El Brezo, associados aos efeitos nocivos das captações de água para abastecer o núcleo turístico de Matalascañas com água potável, água para fins recreativos ou para a rega dos campos de golfe. Segundo esses estudos, as captações localizadas e intensivas de águas subterrâneas a fim de abastecer o complexo turístico urbano de Matalascañas têm igualmente um efeito negativo manifesto no nível dos lençóis freáticos e, portanto, nas necessidades hídricas do ambiente, como a vegetação ou a inundação das zonas húmidas.

    138

    Daqui resulta que a Comissão demonstrou suficientemente a probabilidade de a captação excessiva de água para o abastecimento urbano da zona de Matalascañas ter provocado perturbações significativas nos habitats protegidos da zona protegida Doñana (ZEPA/LIC ES0000024) situada nas proximidades do núcleo turístico de Matalascañas. Esta perturbação dos habitats protegidos devia, por conseguinte, ter sido tida em conta, como resulta dos n.os 132 a 134 do presente acórdão, no programa de medidas elaborado pelo Reino de Espanha no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, ao abrigo do artigo 11.o da Diretiva 2000/60, para pôr termo à deterioração já verificada dos tipos de habitats protegidos como os charcos temporários mediterrânicos nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva.

    139

    Ora, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que o programa de medidas invocado pelo Reino de Espanha, tal como definido no anexo 12 do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, não contém medidas destinadas a pôr termo à deterioração já verificada dos tipos de habitats protegidos na zona protegida situada na proximidade de Matalascañas.

    140

    Além disso, há que recordar que a violação do artigo 5.o da Diretiva 2000/60, já verificada nos n.os 108 a 110 do presente acórdão, permite concluir que as informações relativas à captação de água destinada à zona urbana de Matalascañas no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021 não são suficientes para estabelecer medidas adequadas para pôr termo à deterioração já verificada dos tipos de habitats protegidos, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva. Com efeito, na falta de uma avaliação mais precisa e adequada da importância dos riscos resultantes das captações de água potável para a zona turística de Matalascañas, o Reino de Espanha não poderia, em qualquer caso, ter aplicado as medidas necessárias e efetivas, previstas no artigo 11.o da referida diretiva, para evitar qualquer perturbação das zonas protegidas situadas na proximidade de Matalascañas, ligada à captação de águas subterrâneas.

    141

    Tendo em conta estas considerações, o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 11.o da Diretiva 2000/60, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva, ao não prever, no programa de medidas estabelecido no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, nenhuma medida para evitar uma perturbação dos tipos de habitats protegidos situados na zona protegida Doñana (ZEPA/LIC ES0000024) pela captação das águas subterrâneas para as necessidades da zona turística de Matalascañas.

    B. Quanto ao incumprimento das obrigações decorrentes da Diretiva 92/43

    1.   Argumentos das partes

    142

    A Comissão sustenta que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, em conjugação com o artigo 7.o desta diretiva. Considera que as autoridades espanholas não adotaram as medidas adequadas para evitar a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies situados nas zonas protegidas da região de Doñana, particularmente nas zonas Doñana (ZEPA/LIC ES 6150000024), Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) e Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012). Alega com precisão que a exploração excessiva do aquífero de Almonte‑Marismas provocou a seca das lagunas em redor das dunas do Parque Nacional de Doñana e, por conseguinte, a deterioração dos espaços naturais protegidos que dependem deste aquífero, nomeadamente de vários habitats naturais e habitats de espécies protegidas pela Diretiva 92/43.

    143

    A este respeito, a Comissão alega, em primeiro lugar, que a deterioração dos habitats protegidos do espaço natural protegido de Doñana, resultante da exploração excessiva do seu aquífero, foi demonstrada através de abundante prova científica, bem como de vários relatórios oficiais. Segundo a Comissão, os tipos de habitats protegidos mais sensíveis à seca, pela diminuição do lençol freático, foram os charcos temporários mediterrânicos, que são habitats protegidos designados pelo código 3170*, bem como os cursos de águas superficiais (riachos, canais e cursos inferiores) e os habitats ribeirinhos (pequenos bosques e florestas de galeria). Estes alojam uma variedade de espécies vegetais e animais que existem em número reduzido e ficam ameaçadas por essa seca.

    144

    Em segundo lugar, a Comissão não contesta que as alterações climáticas possam ter tido um impacto na deterioração progressiva desses tipos de habitats, como alega o Reino de Espanha. No entanto, sustenta que, a título das «medidas adequadas», na aceção do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, esse Estado‑Membro deve adotar medidas destinadas a lutar contra a principal causa da deterioração dos habitats protegidos do espaço natural protegido de Doñana, a saber, as captações de águas subterrâneas, mesmo que essas medidas tenham igualmente em conta o agravamento da deterioração dos habitats imputável, de forma paralela e secundária, aos efeitos das alterações climáticas.

    145

    Em terceiro lugar, a Comissão alega que as medidas adotadas pelo Reino de Espanha, nomeadamente as incluídas no Plano Especial de Irrigação de Doñana de 2014 e no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, não são adequadas a evitar a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies protegidas, nos termos do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43. Além disso, embora a Comissão reconheça que algumas das medidas adotadas pelo Reino de Espanha com vista à recuperação dos habitats afetados, como, nomeadamente, a eliminação gradual das plantações de eucalipto no espaço natural protegido de Doñana, a aquisição de propriedades e os seus direitos de acesso à água ou transferências de água de outras bacias, têm efeitos potencialmente positivos, considera que essas medidas nem sempre são suficientes para o cumprimento das obrigações decorrentes do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43.

    146

    O Reino de Espanha refuta os argumentos da Comissão e considera não ter deixado de cumprir as obrigações decorrentes desta diretiva.

    147

    Em primeiro lugar, o Reino de Espanha contesta a afirmação da Comissão segundo a qual todos os espaços naturais da região de Doñana estão ligados ao aquífero de Almonte‑Marismas. Especifica que só as zonas protegidas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024) e Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) estão ligadas ao referido aquífero, tal como definido no Plano Hidrológico do Guadalquivir 2009‑2015.

    148

    Por outro lado, alega que o parecer fundamentado dizia unicamente respeito ao aquífero de Almonte‑Marismas e que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o alcance da ação por incumprimento não pode ser alargado para além do objeto desse parecer fundamentado. Por conseguinte, as considerações relativas aos nexos e aos efeitos nessas três zonas protegidas, devido à diminuição dos níveis das águas subterrâneas do referido aquífero, não são admissíveis no que respeita à zona protegida Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012).

    149

    Em segundo lugar, o Reino de Espanha sustenta que as transformações e a deterioração da zona protegida Doñana (ZEPA/LIC ES0000024) são imputáveis aos danos sofridos durante o último século pelas zonas pantanosas que o compõem e que, consequentemente, não podem ser consideradas como estando na base dos incumprimentos da Diretiva 92/43. Por outro lado, este Estado‑Membro afirma que, atualmente, grandes zonas pantanosas e sistemas de zonas húmidas foram submetidos a uma restauração ecológica graças aos diferentes projetos de ação aplicados.

    150

    Em terceiro lugar, o Reino de Espanha alega que adotou medidas adequadas e eficazes para evitar a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies protegidas nos termos do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43. Por um lado, sustenta que essas medidas contribuíram para a resolução dos problemas que afetam a região de Doñana e que surgiram antes de a Comissão ter designado esta região como sítio de interesse comunitário. Por outro lado, o Reino de Espanha alega que o artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva 92/43 prevê que as medidas tomadas ao abrigo desta diretiva deverão ter em conta as exigências económicas, sociais e culturais, bem como as particularidades regionais e locais.

    151

    Em quarto lugar, o Reino de Espanha sustenta que a Comissão não demonstrou de forma suficientemente convincente a existência da alegada deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies.

    2.   Apreciação do Tribunal de Justiça

    152

    Nos termos do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como as perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações podem vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objetivos fixados por esta diretiva.

    153

    Esta disposição impõe aos Estados‑Membros uma obrigação geral de tomarem as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats e as perturbações significativas das espécies para as quais essas zonas foram designadas (Acórdão de 16 de julho de 2020, WWF Italia Onlus e o., C‑411/19, EU:C:2020:580, n.o 32 e jurisprudência referida).

    154

    Essa obrigação geral corresponde ao objetivo, prosseguido no âmbito da política da União em matéria de ambiente, nos termos do artigo 191.o, n.o 1, primeiro travessão, TFUE, de preservar, proteger e melhorar a qualidade do ambiente, bem como ao princípio da correção, prioritariamente na fonte, dos danos causados ao ambiente, enunciado no artigo 191.o, n.o 2, TFUE.

    155

    No entanto, segundo jurisprudência constante, para se poder constatar um incumprimento do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, não cabe à Comissão provar a existência de uma relação causal entre a ação ou a inação do Estado‑Membro em causa e uma deterioração ou uma perturbação significativa provocada aos habitats ou às espécies em questão. Com efeito, é suficiente que essa instituição demonstre a existência de uma probabilidade ou de um risco de essa ação ou inação provocar uma deterioração ou perturbação significativa a esses habitats ou espécies (v., neste sentido, Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Comissão/Bulgária, C‑414/14, EU:C:2016:8, n.o 58 e jurisprudência referida).

    156

    Por outro lado, na medida em que os n.os 2 e 3 do artigo 6.o da Diretiva 92/43 asseguram o mesmo nível de proteção, deve aplicar‑se o critério de uma avaliação das incidências, nos termos do artigo 6.o, n.o 3, desta diretiva. Nos termos dessa disposição, um plano ou um projeto só pode ser autorizado se as autoridades competentes tiverem a certeza de que o referido plano ou o referido projeto não terá efeitos prejudiciais duradouros para a integridade do sítio em causa ou quando não subsista nenhuma dúvida razoável, do ponto de vista científico, quanto à inexistência de tais efeitos [v., neste sentido, Acórdão de 17 de abril de 2018, Comissão/Polónia (Floresta de Białowieża), C‑441/17, EU:C:2018:255, n.o 117 e jurisprudência referida].

    157

    Nestas condições, há que examinar se a Comissão demonstrou a probabilidade de a captação das águas subterrâneas da região de Doñana perturbar significativamente os habitats naturais ou os habitats de espécies situados nas três zonas protegidas, tal como referidas no n.o 12 do presente acórdão, e, sendo caso disso, se o Reino de Espanha contradisse cientificamente tal probabilidade.

    158

    A título preliminar, importa salientar que este Estado‑Membro arguiu a inadmissibilidade das alegações da Comissão apresentadas no âmbito do presente incumprimento na parte em que dizem respeito à zona protegida Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012), pelas razões evocadas nos n.os 147 e 148 do presente acórdão. A este respeito, alega que o parecer fundamentado dizia unicamente respeito à violação das obrigações resultantes da Diretiva 92/43 no que respeita ao aquífero de Almonte‑Marismas e que só as zonas protegidas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024) e Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) estão ligadas ao referido aquífero.

    159

    A Comissão refuta estes argumentos, sublinhando que a zona protegida Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012) foi integrada nas zonas visadas pelo presente incumprimento desde o início do procedimento pré‑contencioso.

    160

    Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o objeto de uma ação por incumprimento proposta nos termos do artigo 258.o TFUE é delimitado no parecer fundamentado da Comissão, de forma que a ação se deve basear nos mesmos fundamentos e argumentos que esse parecer (Acórdãos de 8 de julho de 2010, Comissão/Portugal, C‑171/08, EU:C:2010:412, n.o 25, e de 5 de abril de 2017, Comissão/Bulgária, C‑488/15, EU:C:2017:267, n.o 37).

    161

    No caso em apreço, basta observar que tanto o convite dirigido pela Comissão ao Reino de Espanha para apresentar observações como o parecer fundamentado expõem expressamente que o objeto do presente processo por incumprimento visava a exploração excessiva das águas subterrâneas da região de Doñana e a subsequente deterioração dos habitats e dos ecossistemas localizados em várias zonas protegidas pelo direito da União, especialmente as zonas protegidas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), e Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012). Assim, embora a zona protegida Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012) não esteja ligada ao aquífero de Almonte‑Marismas, mas à massa de águas subterrâneas de Condado, correspondente a um plano de gestão diferente dos mencionados no n.o 13 do presente acórdão, há que constatar, como salientou a advogada‑geral no n.o 38 das conclusões, que esse facto não é relevante no âmbito da presente ação, uma vez que a referida zona protegida era objeto do presente processo por incumprimento desde o início do procedimento pré‑contencioso.

    162

    Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade invocada pelo Reino de Espanha e, por conseguinte, considerar as alegações relativas ao incumprimento das obrigações resultantes da Diretiva 92/43 igualmente admissíveis na parte em que dizem respeito à zona protegida Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012).

    163

    Quanto ao mérito, o Reino de Espanha sustenta que as transformações e a deterioração das zonas protegidas do espaço natural protegido de Doñana são imputáveis aos danos sofridos durante o último século pelas zonas pantanosas que o compõem e que, consequentemente, não podem ser consideradas como estando na base dos incumprimentos da Diretiva 92/43.

    164

    É certo que estas transformações e deterioração anteriores, como salientou a advogada‑geral no n.o 60 das suas conclusões, não podem constituir um incumprimento do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43.

    165

    Todavia, importa recordar que, no que se refere aos sítios suscetíveis de serem identificados como sítios de importância comunitária (SIC), que figuram nas listas elaboradas pela Comissão nos termos do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, e, em especial, aos sítios que alojam tipos de habitats naturais prioritários, os Estados‑Membros estão, por força desta diretiva e à luz do objetivo de conservação referido pela diretiva, obrigados a tomar medidas de proteção que sejam adequadas para salvaguardar o interesse ecológico pertinente que esses sítios revestem a nível nacional (v., neste sentido, Acórdão de 13 de janeiro de 2005, Dragaggi e o., C‑117/03, EU:C:2005:16, n.o 30).

    166

    A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou igualmente que o facto de não prejudicar a integridade de um sítio como habitat natural, na aceção do artigo 6.o, n.o 3, segundo período, da Diretiva 92/43, pressupõe a sua preservação num estado de conservação favorável, o que implica a manutenção sustentável das características constitutivas desse sítio, ligadas à presença de um tipo de habitat natural, cujo objetivo de preservação justificou a designação desse sítio na lista dos SIC, na aceção dessa diretiva (Acórdão de 7 de novembro de 2018, Holohan e o., C‑461/17, EU:C:2018:883, n.o 35).

    167

    No caso em apreço, importa recordar, por um lado, que as zonas protegidas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) e Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012) foram inseridas pela Comissão, em 19 de julho de 2006, na lista dos SIC e que, por conseguinte, o artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43 é aplicável desde essa data por força do artigo 4.o, n.o 5, desta diretiva. Os elementos de prova apresentados pela Comissão relativamente a uma fase anterior não podem, portanto, ser tidos em conta para declarar a existência de uma violação desta diretiva.

    168

    Por outro lado, há que recordar que o artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43 estabelece uma obrigação geral de tomar medidas de proteção adequadas, que consistem em evitar, nas zonas especiais de conservação como é o caso em apreço, que se produzam deteriorações dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações possam vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objetivos fixados por esta diretiva.

    169

    Ora, resulta de várias informações científicas juntas aos autos que a exploração excessiva do aquífero de Doñana levou a uma diminuição do nível das águas subterrâneas, ocasionando uma perturbação constante das zonas protegidas do espaço natural protegido de Doñana. Em especial, como foi salientado no n.o 137 do presente acórdão, vários estudos científicos demonstram o impacto das captações de água destinadas ao abastecimento urbano da zona turística de Matalascañas nos ecossistemas da zona protegida Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), nomeadamente sobre os tipos de habitats prioritários designados pelo código 3170*, a saber, os charcos temporários mediterrânicos. Estes dados confirmam, por um lado, que as deteriorações destes habitats persistem e que o estado desses habitats continuará a deteriorar‑se devido à diminuição do nível das águas subterrâneas do referido aquífero e, por outro, que o Reino de Espanha não tomou as medidas necessárias para pôr termo a essas deteriorações.

    170

    Como salientou a advogada‑geral nos n.os 70 e 73 das conclusões, para invalidar estas conclusões, o Reino de Espanha deveria ter apresentado elementos que permitissem dissipar qualquer dúvida cientificamente razoável quanto à inocuidade da prossecução da prática atual de captação de águas subterrâneas para os referidos habitats protegidos. Para este efeito, como salientado no n.o 156 do presente acórdão, a Diretiva 92/43 exige uma avaliação das incidências como a que deve ser efetuada ao abrigo do artigo 6.o, n.o 3, desta diretiva.

    171

    Ora, como resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, o Reino de Espanha não realizou um estudo suscetível de cumprir os requisitos que decorrem desta disposição e, por conseguinte, também não demonstrou que a prossecução da prática atual da captação de água no espaço natural protegido de Doñana não tem impacto sobre os habitats das zonas protegidas em causa.

    172

    Tendo em conta o que precede, há que considerar que a Comissão estabeleceu de forma suficiente, na aceção da jurisprudência referida no n.o 155 do presente acórdão, a existência da probabilidade de a captação das águas subterrâneas praticada no espaço natural protegido de Doñana ter provocado, desde 19 de julho de 2006, uma deterioração dos habitats protegidos nas zonas protegidas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) e Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012) e que o Reino de Espanha não adotou as medidas adequadas para evitar essa deterioração.

    173

    Por conseguinte, há que declarar que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, ao não ter adotado as medidas adequadas para evitar perturbações significativas dos tipos de habitats protegidos situados nas zonas protegidas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) e Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012), ocasionadas pela captação das águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana desde 19 de julho de 2006.

    174

    Atendendo a todas as considerações que precedem, há que declarar que o Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem:

    por força do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II desta diretiva, ao não ter tido em conta a captação de água ilegal e a captação de água destinada ao abastecimento urbano para efeitos da estimativa da captação das águas subterrâneas da região de Doñana no âmbito da caracterização mais aprofundada do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021;

    por força do artigo 11.o da Diretiva 2000/60, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva, ao não prever, no programa de medidas estabelecido no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, nenhuma medida para evitar uma perturbação dos tipos de habitats protegidos situados na zona turística Doñana (ZEPA/LIC ES0000024) pela captação das águas subterrâneas para as necessidades da zona turística de Matalascañas; e

    por força do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43, ao não ter adotado as medidas adequadas para evitar perturbações significativas dos tipos de habitats protegidos, situados nas zonas protegidas Doñana (ZEPA/LIC ES0000024), Doñana Norte y Oeste (ZEPA/LIC ES 6150009) e Dehesa del Estero y Montes de Moguer (ZEC ES 6150012), ocasionadas pela captação das águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana desde 19 de julho de 2006.

    Quanto às despesas

    175

    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

    176

    Por força do disposto no artigo 138.o, n.o 3, do Regulamento do Processo, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas.

    177

    No caso em apreço, tendo a Comissão e o Reino de Espanha ficado parcialmente vencidos, suportarão as suas próprias despesas.

     

    Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

     

    1)

    O Reino de Espanha não cumpriu as obrigações que lhe incumbem:

    por força do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000, que estabelece um quadro de ação comunitária no domínio da política da água, conforme alterada pela Diretiva 2013/64/UE do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, em conjugação com o ponto 2.2 do anexo II desta diretiva, ao não ter tido em conta a captação de água ilegal e a captação de água destinada ao abastecimento urbano para efeitos da estimativa da captação das águas subterrâneas da região de Doñana (Espanha) no âmbito da caracterização mais aprofundada do Plan Hidrológico del Guadalquivir 2015‑2021 (Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021), aprovado pelo Real Decreto 1/2016 por el que se aprueba la revisión de los Planes Hidrológicos de las demarcaciones hidrográficas del Cantábrico Occidental, Guadalquivir, Ceuta, Melilla, Segura y Júcar, y de la parte española de las demarcaciones hidrográficas del Cantábrico Oriental, Miño‑Sil, Duero, Tajo, Guadiana y Ebro (Decreto Real 1/2016 que Aprova a Revisão dos Planos Hidrográficos dos Distritos Hidrográficos da Cantábria Ocidental, do Guadalquivir, de Ceuta, de Melilla, de Segura e de Júcar, e da Parte Espanhola dos Distritos Hidrográficos da Cantábria Oriental, do Minho Sul, do Douro, do Tejo, do Guadiana e do Ebro), de 8 de janeiro de 2016;

    por força do artigo 11.o da Diretiva 2000/60, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 1, alínea c), desta diretiva, ao não prever, no programa de medidas estabelecido no âmbito do Plano Hidrológico do Guadalquivir 2015‑2021, nenhuma medida para evitar uma perturbação dos tipos de habitats protegidos situados na zona protegida «Doñana», com o código ZEPA/LIC ES0000024, pela captação das águas subterrâneas para as necessidades da zona turística de Matalascañas (Espanha); e

    por força do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, ao não ter adotado as medidas adequadas para evitar perturbações significativas dos tipos de habitats protegidos situados na zona protegida «Doñana», com o código ZEPA/LIC ES0000024, na zona protegida «Doñana Norte y Oeste», com o código ZEPA/LIC ES 6150009, e na zona protegida «Dehesa del Estero y Montes de Moguer», com o código ZEC ES 6150012, ocasionadas pela captação das águas subterrâneas do espaço natural protegido de Doñana desde 19 de julho de 2006.

     

    2)

    A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

     

    3)

    A Comissão Europeia e o Reino de Espanha suportam as suas próprias despesas.

     

    Assinaturas


    ( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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